Você está na página 1de 14

Tripé da comédia

1
BOX 01
E aí, brother! Tudo certo?

Antes de começar, vamos falar bem rápido aqui do que é


o AP72?

Esse curso surgiu de uma ideia do Nando, que fez um


TCC sobre o que tem em comum entre a linguagem de
stand up e a publicidade e propaganda. Daí, conversando
com os outros caras, eles fecharam umas ideias e
criaram os vídeos, que você vai acompanhar agora.

Uma coisa que é importante lembrar: ninguém está


aqui para cagar regra, beleza? Os caras se deram bem
na comédia e tal, e querem trocar uma ideia com você,
sacou? É um bate papo colaborativo. Você aprende, eles
aprendem e é isso!

Vem com a gente!


Tripé da comédia
3

AULA 01
S U PE RIO R I DA D E
A superioridade é o um dos itens do Tripé da Comédia, que é basicamente
um conjunto de três coisas que fazem uma piada ser engraçada.

Você já reparou que toda piada tem um “alvo”? Não no sentido de que
alguém vai ser atacado, mas sim da coisa, do “objeto” sobre o qual é a
piada. Muitas dessas piadas criam a graça pelo estereótipo: português
burro, judeu pão duro…

Mas por que que você acha graça desses “objetos”? Por causa dessa
primeira teoria do tripé: a superioridade.

Como a superioridade funciona no stand up?


Uma pergunta:

Você já viu algum comediante de stand up fazendo piada sobre


ele mesmo? Se sim, qual foi o último?

R:
Tripé da comédia
4

É bem comum isso acontecer. Um comediante ir lá e se zoar, contar


alguma história em que ele se ferra e tal, e todo mundo rir disso. Mas por
que isso acontece?

A graça aí acontece porque quando o comediante está passando vergonha


ali, na frente de todo mundo, ele coloca o público em um patamar mais
alto. Basicamente a plateia sente uma coisa do tipo: “Caraca, ainda bem
que não sou eu que passei por essa treta aí”, sacou?

Essa é uma das técnicas mais usadas pelos comediantes, principalmente


no início da carreira, pois como diz o Bruno Romano: “Todo mundo tem
espelho em casa. Ninguém sabe mais dos seus defeitos do que você
mesmo.”

Vamos pensar: se você fosse usar essa técnica, que história (ou
histórias) você contaria, ou o que você falaria do seu corpo,
personalidade…?

R:

Falar umas tretas da vida é uma boa para começar um texto e já ganhar
seu público, e como você sabe bem da história toda, é mais fácil ainda de
falar sobre isso e começar seu texto a partir dali.

Além disso, tem também o lance de que você, quando fala mal de si
mesmo, “ganha o direito” de falar mal dos outros! Você já entra quebrando
todas as expectativas, falando, por exemplo, o que as pessoas viram em
você de cara.
Tripé da comédia
5

O autoflagelo e o desapego da vaidade

Antes, há um tempo, a graça toda de uma piada estava no fato de


que você estava zoando o outro, certo? Agora não é mais assim. Não
que antes, quando a gente falava do outro, não existia a ideia da
superioridade. Existia!

Mas, agora, quando você fala mal de si mesmo no palco, o inferior é


você. Essa é a graça que o stand up trouxe.

A pessoa se zoar é praticamente um exercício de desapego da vaidade.


Quando você é um professor, por exemplo, quem está no palco é você. Daí
você fala, todo mundo ouve e automaticamente é você que está “acima”
deles, entendeu? Isso cria uma distância entre professor e alunos.

Quando a graça é zoar você mesmo, tem uma conexão com a plateia,
fica todo mundo mais próximo e você conquista muito mais a galera,
porque eles percebem que você não está nesse pedestal, se achando.
Você também faz suas cagadas.

Aproveite seus atos falhos

Tem uma questão quase terapêutica na vida do comediante, que é mais


ou menos o que dizia o Woody Allen: “Humor é tragédia + tempo.”

O lance é o jeito que o humorista vê a situação. Algo pode dar muito


errado na vida, e ele vai recorrer àquilo para criar um tema novo, sacou?

Daí vem a autodepreciação. Deu ruim? Vai ser incrível no show, e todo
mundo vai adorar. Principalmente se alguém ferrou você, porque daí a
ideia é somar a sua treta com a pessoa que fez isso. A plateia compra e
vocês vão juntos na história.
Tripé da comédia
6

É só pensar: qual a sua versão mais engraçada sobre aquele tema?

Diante de um ato falho, a gente costuma ficar retraído, preocupado. Mas


para o comediante é o contrário. Como você tira graça daquilo para contar
para os outros?

AULA 02
I N CO NGRUÊ N C I A
A incongruência é o segundo pé do Tripé da Comédia. Ela acontece,
basicamente, quando você acha que algo vai terminar de um jeito, mas ele
termina de outro e o final que você imagina nem existe.

Quanto mais inesperado for o final da história, mais as pessoas vão rir.
Pense: você está lá, contando a história com o final mais óbvio da vida
toda e, no fim, não é aquilo. Essa virada é o que gera a comicidade, sacou?
É a quebra da expectativa, quando o trem sai do caminho esperado.

Isso é algo bem usado pelos humoristas “one liner” (aqueles que fazem
piadas curtas, de uma linha, sem precisar de “links” entre elas), porque
você não precisa de tanto texto ou de uma história longa para criar essa
incongruência.

Vale dizer que para isso funcionar, o melhor é contar toda a história da
maneira mais natural possível, assim ninguém percebe que você vai dar a
virada, entendeu?

Um exercício aqui:
Tripé da comédia
7

Qual foi a última coisa que aconteceu na sua vida que não acabou
como você esperava?

R:

Agora pensa aí…

Dá pra criar uma piada com ela, usando esse conceito da incongruência?
Aliás, se ela for uma treta meio tensa, dá pra unir a superioridade aqui
também, hein?

Se rolar, já anota no caderninho!

A preparação da piada

Um ponto essencial para conseguir essa virada da incongruência é a


preparação da piada. Você precisa, o tempo todo, fazer o público acreditar
que tudo vai acabar como eles imaginam, então é importante pensar no
tom de voz, em como você vai contar os detalhes, na ordem da história…

Nessa piada do Daniel Duncan, por exemplo:

“Eu também, quando era solteiro, saía toda noite e deixava as mulheres
alucinadas..”

Se você já sabe quem é o Daniel, você deve estar se perguntando: “Mas


como…?”

Daí ele termina:

“É..eu vendia drogas.”


Tripé da comédia
8

E aí que está a virada! Você já estava pensando no lado da sexualidade e


tudo o mais, mas não era bem isso.

O melhor é que isso ainda combina com a pegada do Daniel, que fica
zoando o tempo todo no palco a aparência e o jeito com as mulheres
(lembra da superioridade?) e funciona super bem.

DICA DE LIVRO

Henri Bergson - O Riso

Nesse livro, Bergson fala muito sobre essa


quebra e vai a fundo nesse lance de sabotar sua
cabeça e criar a ruptura do pensamento.

Vale procurar!
Tripé da comédia
9

Fusão e contraste

O contraste é algo que sempre gera graça. Você pode usar um exagero,
ou algo que realmente gere um contraste entre a realidade e como as
pessoas pensam naquilo, entendeu?

O exemplo do próprio Nando: se a gente diz que namorou alguém com


95kg, é diferente de falar que namoramos alguém com 637kg, certo?
Meio óbvio, mas como ninguém tem 600 e tantos quilos, claramente
aquilo ali foi falado para gerar comicidade.

Outro ponto é a fusão, que envolve conectar algo que todo mundo
conhece com uma quebra de expectativa no final. É uma nova versão do
original para gerar outra reação, na maioria das vezes contrária.

Aqui, o que importa não é só o sentido da frase, mas também como


você constrói a frase. No exemplo que o Nando deu: “mulher de amigo
meu para mim é...ótimo” isso fica bem claro, porque é possível construir
essa ideia com diversas frases, mas por ser tão próxima da original, essa
funciona muito melhor.

Diz aí: teve alguma ideia de contraste ou fusão que você achou boa?
Escreve!

R:

Fusão não diz respeito também só às frases, mas às coisas da vida


também. Falar de casamento, por exemplo, que é algo que comumente
é visto como “ruim” por algumas pessoas, é uma ótima ideia para
trabalhar a fusão. Assim você cria um paralelo cômico entre o imaginário
comum e uma conclusão curiosa sobre ele.
Tripé da comédia
10

AULA 03
P RO IBIDO
O terceiro pé do Tripé da Comédia é o proibido.

Vamos começar com uma dica de livro: Sigmund Freud - O chiste e sua
relação com o inconsciente. Lá, ele fala sobre a motivação do riso mais
histérico, que era notado em uns momentos que normalmente não se
deveria dar risada.

É como um riso de nervoso, que é uma válvula de escape do cérebro


para lidar com uma situação mais complicada. Ele encontra isso e faz a
pessoa rir, mesmo não sendo a reação mais adequada para o momento.

Para o Freud, o chiste envolve as barreiras sociais que não podem ser
quebradas. É a ideia de rir quando alguém peida em público, ou o lance
de gente pelada onde a sociedade não respeitaria.

Conta aí: qual foi a situação mais absurda em que você já riu, mas
não deveria?

R:

Ah sim, e vale lembrar que se isso aí render uma piada, já coloca no


caderninho!
Tripé da comédia
11

O riso pelo proibido

Quem nunca riu de alguma coisa meio ruim? Nem que seja tomar um
tombo gigante?

Voltando ao peido: peidar é errado? Não, mas a sociedade não aceita


exatamente que você peide em qualquer lugar, e por isso é tão engraçado.

Desde criança a gente sempre ri dessas coisas proibidas. O amiguinho que


fala quando não pode, os outros alunos caindo de joelho no chão e ralando
a perna, quando um adulto arrota, por exemplo, porque é “errado”, sacou?

A própria barreira da sociedade que torna o proibido algo cômico, no fim


das contas.

Freud descreve esse riso como um “bocejo cerebral”, algo para aliviar o seu
organismo da tensão que aquilo causa, dissipar o riso incontrolável.

O Bruno Romano, por exemplo, trabalha muito com o lado corporativo.


Normalmente, para começar o show, ele faz o que? Diz que é comediante e
zoa o chefe, que está na plateia.

Como ninguém julga isso certo e zoaria o chefe, ele não só gera a
comicidade, mas também traz todo o público para perto dele, porque ele
disse algo que todo mundo queria dizer, mas nunca fez.

Isso acontece porque ele diz que é comediante, ganha a “licença” para fazer
essa brincadeira e o público apoia. Pensa: ele faz uma piada sobre o seu chefe
que você sempre quis fazer. Não é um alívio pode, pelo menos, rir daquilo?

Anota aí: do que você sempre quis rir, fazer piada, mas não pôde?

R:
Tripé da comédia
12

Como usar o proibido hoje em dia?

Hoje, com as coisas como estão, em que a sociedade é muito mais


tranquila em alguns termos, mas há a preocupação com o que é
politicamente correto muito mais evidente, afinal, o que é o proibido?

As discussões do limite do humor podem oprimir um pouco essas


piadas, e errar pode ser mortal para um comediante. Porém, é
necessário correr esse risco.

Piadas de humor ácido, hoje, não costumam ser interpretadas nesse


sentido, mas sim no ponto único da briga entre oprimido e opressor.
Ir para esse lado faz com que a aplicação do proibido seja mal vista,
mas a graça não está aí, e sim no fato de que isso não pode ser dito!

Por isso tem gente que gosta tanto desse tipo de comédia. Toda essa
questão de limites, do “gente, mas até onde ele vai?”, com a questão
do que é politicamente correto e tudo o mais, gera uma confusão
mental que faz com que aquilo seja engraçado.

Porém, vale uma ressalva aqui, brother! Quando a gente fala de piada
“pesada” a ideia não é liberar piadas preconceituosas, que podem
configurar crime. É muito importante tomar cuidado para não fazer
nenhum tipo de texto racista, homofóbico ou que normalize ou
defenda a pedofilia.
Tripé da comédia
13

Vamos fazer um exercício:

Pense na piada mais maluca e absurda que puder. Uma que você
talvez nunca tivesse coragem de contar para alguém, e escreve aqui:

R:

Agora pense nela com tudo isso que falamos nessa aula. Dá uma outra
visão, não é mesmo?

A comédia e a censura

A comédia tem uma função de censura, afinal, ninguém quer ser alvo de
riso, não é mesmo? Se você sai com uma roupa e todo mundo fala que é
ridícula, e riem de você, isso funciona como um toque do tipo “não saia
assim de novo!”

Historicamente a comédia regula esse comportamento, sacou?


Sempre tem piada de quem é gordo demais ou magro demais, ou seja,
os exageros. E, nessa hora, você pode cometer uns equívocos, claro.
Porém, é necessário, como já falamos.

É louco pensar nisso, né brother? Mas a comédia funciona, sim, como


um regulador social. Resumindo: ela está em muito mais lugares do que
você imagina.

É isso aí, cara. Até a próxima!


Tripé da comédia
14

Você também pode gostar