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A REVELAÇÃO DE DEUS E A PARTICIPAÇÃO HUMANA: algumas

reflexões
Airismar Pereira da Rocha Sousa1
Gilson Pereira da Rocha
Maria do Amparo Lima Pinheiro
Vanilson Soares Rodrigues
Tutor Externo²Jefferson Jerônimo Rolim Rodrigues

RESUMO: O presente artigo tem como principal objetivo refletir sobre o estudo da
Revelação de Deus ao homem, entendendo que a revelação é a autocomunicação de
Deus aos seres humanos. Este estudo foi dividido historicamente, a partir da teologia
protestante, em revelação natural, quando o homem chega ao conhecimento a acerca
de Deus, em revelação mediante as coisas criadas, em revelação pela razão e em
revelação especial, que tem como finalidade Deus se fazer conhecer ao homem e a
salvação do ser humano. Como objetivo secundário, buscamos compreender em que
consiste a revelação divina, identificar as formas como a revelação acontece e seus
objetivos e descrever as formas de participação do homem no processo da revelação.
Destacaremos que, sobre a participação humana, existem duas maneiras de se notar
o envolvimento humano neste processo, sendo a primeira que compreende que o
homem atua como protagonista da ação reveladora e a segunda que dá ênfase ao agir
de Deus em detrimento da ação humana. Concluímos que o próprio Deus promove o
envolvimento do ser humano por inteiro, o que lhe permite alcançar o ápice de sua
contingência, propiciando a esse homem a capacidade de experimentar Deus, como
experiência transcendente.

Palavras-chave: Revelação de Deus. Revelação natural e especial. Participação do


homem.

1 INTRODUÇÃO

O tema sobre a revelação de Deus é um dos principais assuntos dentro


da teologia cristã, estando em destaque desde o início da história da Igreja e
da consolidação da sua teologia. Ao longo dos séculos de reflexão teológica,
vários pontos de vista diferentes foram evidenciados acerca da temática, sendo
ainda hoje atual, no escopo da Igreja quanto a revelação de Deus ao homem
contemporâneo, em suas singularidades.
Uma das divergências evidenciadas historicamente, com relação ao
tema da revelação de Deus, é sobre a participação do homem no processo de
revelação, pois, é o homem um mero receptor da revelação de Deus? Ou o
homem é também protagonista neste processo pelo qual Deus se revelou? Há

1 Nome dos acadêmicos


2 Nome do Professor tutor externo
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI - Curso (Código da Turma) – Prática do
Módulo I - dd/mm/aa
2

ainda outros questionamentos, tais como: atribuir importância à ação humana


neste processo, não seria diminuir a soberania de Deus? Não seria um
contrassenso dar ênfase à humanidade, uma vez que revelação é a
autocomunicação de Deus? A partir dessas inquietações iniciais,
estabelecemos a seguinte questão-problema: qual a participação do homem no
processo da revelação? Assumimos como objetivo principal refletir sobre o
estudo da Revelação de Deus ao homem e, como objetivo secundário,
buscamos compreender em que consiste a revelação divina, identificar as
formas como a revelação acontece e seus objetivos e descrever as formas de
participação do homem no processo da revelação.
Com esta intencionalidade, primeiro apresentaremos um panorama
sobre revelação, incluindo a sua categorização em revelação natural e
revelação especial, com base nos estudos de Santana Filho (2008). Em
seguida, trazemos a discussão acerca da revelação e da participação do
homem neste ato. Quanto ao argumento da ênfase na participação humana,
nos apoiamos no pensamento de Tillich (1987). Na perspectiva da ação e da
soberania de Deus no ato de se revelar, recorremos às produções de McGrath
(2005).
No presente estudo, partimos do pressuposto de que a busca do homem
por Deus alcança o seu objetivo porque o próprio Deus vem ao encontro do
homem. Sem essa iniciativa divina, o encontro com Deus não seria possível,
pois este “habita em luz inacessível”. A Revelação é mais do que comunicação
de leis, de preceitos e de informações, pois, Deus, em sua bondade e
condescendência, se aproxima para se revelar e se doar ao homem e para lhe
revelar o seu desígnio de salvação. A revelação divina é autorrevelação e
autodoação.

2 A REVELAÇÃO: DEUS SE FAZ CONHECER

O termo revelação é a clara exibição que Deus faz de sua glória e poder
nas obras da criação e da providência divina. Como as Escrituras explicam,
conforme o livro de Salmos: “Os céus proclamam a glória de Deus, e o
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firmamento anuncia as obras das suas mãos. Um dia discursa a outro dia e
uma noite revela conhecimento a outra noite” (BÍBLIA, Salmos 19.1-2).
Portanto, de acordo com o apóstolo Paulo, na sua carta aos Romanos
(BÍBLIA, Romanos 1.19), “[...] o que de Deus se pode conhecer é manifesto
entre eles, porque Deus lhes manifestou”. O escritor da Carta aos Romanos
estava explicitando de que é o próprio Deus que se dá a conhecer. Assim Ele
se deixa conhecer, por exemplo, por meio da sua criação. Neste mesmo
sentido, Paulo diz que, tanto os seus atributos invisíveis, bem como o seu
eterno poder, “[...] como também a sua própria divindade, claramente se
reconhecem, desde o princípio do mundo, sendo percebidos por meio das
coisas que foram criadas” (BÍBLIA, Romanos 1.19-20).
Quanto ao termo revelação, segundo Ximenes (2017, p. 113):

[...] vem da palavra grega apocalypto. Desde Heródoto,


historiador grego nascido no século V a.C. em Halicarnasso
(hoje Bodrum, na Turquia), este termo aparece com sentido de
desvendar. A palavra é formada pela raiz kalypto (encobrir,
ocultar) com o prefixo apo (de). Juntos, tem o sentido de
manifestar algo oculto. Já o substantivo apocalypsis, com o
significado de manifestação e revelação, é empregado desde o
século primeiro num sentido essencialmente religioso.

Segundo o teólogo, revelação quer dizer desvelar, ou seja, colocar em


exposição, removendo o véu que impedia o conhecimento de Deus pelo
homem. Dentro do contexto religioso, na expressão que o termo assume na
literatura bíblica, revelação é um ato que só diz respeito a Deus. É ele que
assume o papel de agente da revelação, ou seja, Deus é aquele que se revela.
Nesse sentido, não há o que se questionar sobre revelação, expressão que se
tornou técnica para falar da automanifestação de Deus. O ato de Deus se
revelar baseia-se na soberania da sua vontade.
De acordo com o pensamento de Barth (2000), não há outro meio do
homem conhecer a Deus, a não ser pela revelação. A mente humana não teria
elementos para iniciar essa busca, devido a sua finitude. Muitas coisas ainda
são consideradas enigmas e desconhecidas para o ser humano uma vez que
este não conhece o mundo em sua totalidade. Assim, o mistério incondicionado
só pode concebido por meio da revelação, pois não pertence a esse mundo,
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vai além do mundo humano. Só através da manifestação de Deus podemos


perceber a sua atividade, de acordo com a primeira carta de Paulo aos
Coríntios (BÍBLIA, I Coríntios 2.9).
Deus, o criador e o Senhor, são mostrados pela Bíblia como mistério
absoluto. A revelação e o Deus da Bíblia estão tão ligados que não há outro
conhecimento possível de Deus. Mas, ao falar a respeito de revelação,
podemos dividi-la em categorias diferentes, de acordo com as formas como ela
acontece e, também, quanto aos seus objetivos específicos.
Outros pensadores, como por exemplo McGrath (2005), vai enfatizar que
a revelação depende muito mais de Deus e de sua soberania e vontade, do
que dos seus recebedores, pois estes podem estar em qualquer situação,
contexto ou condição e, mesmo assim, serem alvos dessa manifestação de
Deus, temos por exemplo Abraão e Moisés, de acordo com os livros de
Gênesis e Êxodo (BLÌBLIA), respectivamente.
Tillich (1987) faz questão de colocar como elemento fundamental, a
revelação como manifestação daquilo que diz respeito ao homem de forma
última. O mistério revelado é de preocupação última para a humanidade,
porque é fundamento de seu ser.

2.1 Revelação Natural

Na Carta de Paulo aos Romanos (BÍBLIA, Romanos 1:20), a Palavra de


Deus declara que ninguém pode dizer que não tem consciência da existência
de Deus, pois tanto Seu poder como Sua divindade são reconhecidos por meio
das coisas por Ele criadas.
A revelação geral é chamada de “revelação natural”. Entendendo que, às
vezes, pode-se fazer algumas confusões, mas, na fala teológica, a expressão
revelação natural pode ser compreendida como revelação geral, pois a mesma
vem até nós por meio da natureza. A criação é um meio pelo qual Deus se
revela a si mesmo ativo, ou seja, como criador de todas as coisas naturais,
inclusive do próprio ser humano.
Segundo Ximenes (2017, p. 114):
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O ser humano, ao olhar o mundo, percebe claros sinais da


presença de Deus, o que o torna capaz de reconhecer os
sinais de sua presença. [...] foi lhe dado, além da racionalidade
e perfeição moral, também o conhecimento do seu criador.
Mesmo este conhecimento estando prejudicado pelo pecado, é
capaz de ver na natureza a presença do Deus criador.

O criador se mostra na criatura, mostrando-se como perfeito e singular,


sendo todas as coisas criadas para a sua glória e revelam a sua glória. Desde
a criação do mundo os atributos invisíveis de Deus, seu eterno poder e sua
natureza divina têm sido dado a conhecer, ou seja, revelados por meio das
coisas criadas, conforme a Bíblia Sagrada em Romanos 1.20.
Esse conhecimento de Deus seria pleno, se não houvesse o pecado,
pois segundo Ximenes (2017), foi prejudicado pelo pecado do homem, visto
que lá no Jardim do Éden conversavam diariamente com Deus e, segundo a
sua palavra (BÍBLIA, Gênesis, 3), o pecado criou uma barreira entre criador e
criatura.
 Quanto a natureza, ela não independe de Deus, ao contrário, Deus nos
transmite conhecimento de si mesmo por meio do mundo que ele criou. É
através de sua glória que Ele se comunica a si mesmo, mostrando sua
majestade dos céus, do mundo e de tudo que Ele mesmo criou, pois, nem
mesmo Salomão, em toda a sua glória, não se vestiu com todo o esplendor dos
lírios do campo criados por Deus (BÍBLIA, Mateus 6: 28-30).

2.2 Revelação Especial

Podemos ainda falar de outro tipo de revelação, que é denominada de


revelação especial, cujo o objetivo no Antigo testamento tinha sentido duplo: a
revelação do próprio Deus e de sua finalidade na salvação.
Assim, Deus se revela primeiro como um ser pessoal como de fato Ele
“É”, diferentemente de outros deuses. Nesse sentido Israel foi sendo educado
dia a pós dia, a ter uma compreensão mais profunda dos atributos divinos.
Enfatizando que a Escritura traz em si a revelação de Deus a todos os seres
humanos, escrita para ensinar todos os seus propósitos de Yahweh. Deus se
deu a conhecer primeiramente aos profetas que notificaram os eventos
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relacionados em diversos tempos e maneiras. Depois Ele se revela pelo Filho


(BÍBLIA, Hebreus 1:1-2) .
Como afirma Santana Filho (2008), Deus revelou a vinda do seu filho
para tomar perceptível o incondicionado, pois, diferente dos profetas, com
exceção de João Batista, os apóstolos pregaram sobre alguém que viram e
ouviram. Portanto, Deus revelou por meio dos profetas o plano de salvação da
humanidade e eles profetizaram sobre a vinda, a existência e a morte de Jesus
Cristo, que ainda estava por vim.
O conteúdo central da revelação de Deus é Jesus, o Logos, ou seja, o
fundamento, a pedra angular, que se fez carne e que se deixou conhecer. Há
algo especial nesta revelação, pois conduz o homem para o caminho da
salvação da alma, trazendo comunhão entre Deus e os homens, rompida
desde o Jardim do Éden. Buscando uma forma de entender essa revelação,
racionalmente, o homem se esforça a fim buscar o significado da manifestação
de Deus. Ele, em sua infinita sabedoria, revelou aos seres humanos o plano da
salvação da humanidade.
De acordo com Ximenes (2017, p. 115),

Chega-se, então, ao momento onde se percebe o valor da


Revelação Especial, que conduz a humanidade, pelos
caminhos da fé e da racionalidade, a buscar uma forma de
interpretar esta revelação. E é exatamente a isto que se dá o
nome de teologia, o esforço intelectual do homem tentando
compreender o significado da manifestação de Deus.

A revelação é uma realidade complexa, pois ao mesmo tempo é a


manifestação e comunicação de Deus, de uma realidade dinâmica que cumpre
os seus desígnios na história humana. É pela revelação que Deus se abre ao
ser humano para uma relação de amor e o convida para uma atitude de
arrependimento, regeneração e santificação.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Apresentamos, portanto, uma análise, com base nos teóricos estudados,


de como a revelação de Deus à humanidade contribui para o conhecimento
pelo homem do seu criador e do seu amor imensurável, compreendendo que a
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revelação é a manifestação e a autocomunicação de Deus aos seres humanos,


ou seja, Deus se manifesta, dando-se a conhecer, e se revela aos seres
humanos, sendo um ato intencional de Deus.
Podemos compreender com a reflexão proposta, alguns fundamentos
bíblicos. Primeiro, que foi Deus que se fez conhecer por meio da sua criação e
do seu filho, pois o próprio Jesus Cristo diz que “[...] “Aquele que me ama será
amado por meu Pai, e eu também o amarei e me revelarei a ele” (BÍBLIA, João
14.21b).
Segundo, podemos compreender que a revelação pode ser classificada
em Natural e Especial. A Revelação Natural é a revelação de Deus por meio da
natureza, sendo o próprio homem parte desse ato de Deus na criação do
mundo e do que há no mundo. Para criação do ser humano, Deus se inspirou
na sua imagem e semelhança (BÍBLIA, Gênesis 1:27), sendo este o ápice da
sua criação, pois o dotou de racionalidade. Portanto, o homem conhece Deus
por meio da obra das suas mãos, sendo o próprio homem parte dessa criação
de Deus.
Além da revelação natural, temos a revelação especial que trata da
revelação do próprio Deus ao homem e do seu plano de salvação à
humanidade. Assim, por exemplo, o "Eu sou” se revelou a Abrão e a Moisés,
em Gênesis 12:1 e Êxodo 3:4, respectivamente.
Com a finalidade de fazer o homem conhecer o caminho da salvação,
Deus mudou a história de homens e mulheres para executar o seu plano e
revelou ao homem por meio dos profetas, ou seja, de homens, mas este fato
não retirou o protagonismo de Deus, pois o projetar e o executar pertencem a
ele.
Depois da vinda de Jesus Cristo a este mundo, o próprio filho de Deus
revelou o plano de salvação aos homens, ensinando-os sobre os mistérios da
cruz. Fez discípulos para continuarem revelando à humanidade a salvação na
pessoa do filho de Deus e estes propagaram o que ouviram, mas também
experienciaram no tempo em que permaneceram com o Mestre. Hoje, a
revelação é anunciada por sua Igreja aqui na terra, para que todos possam
conhecer a salvação que há em Cristo Jesus, sem distinção de qualquer
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natureza, pois Cristo veio para todos os homens, indistintamente. Foi o próprio
Deus que se quis revelar e a salvação ocorre quando o homem conhece a
Deus, ou seja, se revela ao homem trazendo vida plena e salvação de nossas
almas, numa experiência transcendental.

4. CONCLUSÃO

Após a análise do tema em destaque, torna-se evidente a importância de


se desenvolver o estudo da Revelação de Deus ao homem, entendendo que a
revelação é a autocomunicação de Deus aos seres humanos.
Refletimos, com base nos teóricos selecionados quando se fala em
revelação natural e especial, estando a primeira relacionada o conhecimento
do criador por meio da sua criação e a segunda, como finalidade última, a
salvação do ser humano.
Como resposta ao questionamento inicial quanto a participação do
homem no processo da revelação, chegamos à conclusão de que a revelação
de Deus ao homem contribui no envolvimento do ser humano por inteiro, o que
lhe permite alcançar o ápice de sua contingência, propiciando a esse homem a
capacidade de experimentar Deus, como experiência transcendente.

REFERÊNCIAS

ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 6023. Informação e


documentação – Referências – Elaboração. Rio de Janeiro, 2002.

BARTH, Karl. A Proclamação do Evangelho. Tradução de Daniel Sotelo e


Daniel Costa. São Paulo: Novo Século, 2000. p. 15-16.

BÍBLIA. Bíblia Sagrada: Nova Versão Internacional. São Paulo: Sociedade


Bíblica Internacional, 2003.

MCGRATH, Alister E. Teologia sistemática, histórica e filosófica: uma


introdução a teologia cristã. São Paulo: Shedd, 2005.

SANTANA FILHO, Manoel Bernardino. Revelação. In: BORTOLLETO FILHO,


Fernando (org.). Dicionário Brasileiro de Teologia. São Paulo: ASTE, 2008.
9

TILLICH, Paul. Teologia sistemática. São Paulo: Paulinas; São Leopoldo:


Sinodal, 1987.

XIMENES, Marcelo Leonardo. Assim diz o senhor: a revelação de deus e o


papel do homem neste ato. Revista Batista Pioneira, vol. 6, n. 1, Junho/2017,
p. 111-121.

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