Seguindo a Augusto de Lima perto de cruzar a Barbacena, sentido centro, havia
um ponto de táxi. Não digo que exista ainda hoje porque o fato, ou melhor, a prática referida a seguir se passou num tempo em que os carros de praça, dali frequentadores, eram importados e de ferro maciço. Cada chofer pertencia a seu ponto específico e, ainda, cada ponto tinha seu chefe, geralmente o mais velho, que como responsabilidade cuidava de atender o telefone instalado nos pontos de melhor reputação. Vamos direto aos fatos preservando o nome de nosso personagem principal, pois algumas pessoas podem tomá-lo como uma espécie de serial killer. Contudo, crimes famélicos desta natureza são de alguma forma perdoados pela lei do homem e na de Deus nem contabilizados. De origem árabe, Al. – nosso homem real, apesar de morto há tempo – era já velho nos anos cinquenta do século passado, solteirão, sozinho, talvez habitante de um apartamento de alguma esquina do centro da cidade e proprietário de um carrão rabo de peixe com as rodas cobertas deixando aparecer só pequena parte do pneu perto do chão. Al. usava bigodes e um óculos fundo de garrafas redondo. Como hábito, inclusive que influenciava sua nutrição, só rodava durante a noite como chofer de praça. Como veremos, sua jornada de trabalho lhe garantia o pão, ou para usar de algum rigor, a carne. Parece que nos anos cinquenta os gatos urbanos ainda não eram familiarizados com os grandes farolões dos Nash. Como consta, quando um bichano se via ofuscado pela luz dessa máquina ele se desorientava e, sem saber o que fazer, escolhia parar em sua frente. De lá para cá, parece que os gatos se civilizaram um pouco e aprenderam que com esses búfalos motorizados não dá para bobear. Quanto mais comer bola mais se arrisca, paralisado, a perder uma das sete vidas. Será isso imperialismo desde aquela época? O fato é que Al. se aproveitando dessa reação felina frente à modernidade metia o farolão alto para cegar os gatinhos e, bem preparado, abria o porta-malas, depois obviamente de resgatar o bicho da frente de seu carro, e o metia em um sacão de linhagem. Diz-se que em noite de caça farta lucrava dois ou três animaizinhos que, logo, virariam mistura. Gato no saco e saco na mala, faltou referência nossa ao apetrecho principal, companheira fiel necessária à boa realização da ação, era uma faquinha das mais afiadas. No fim do expediente noturno, com o perdão da contradição nos termos, Al. parava perto do sindicato dos chofer’s localizado à Av. Paraná. Dirigia-se aos arredores da praça da rodoviária. Mais especificamente ao arvoredo de troncos grossos desde aquele tempo, na época, imediações do ministério da fazenda cuja mureta era baixinha e hoje é gradeada. Numa das árvores que Al. usava de açougue tinha um pregão batido. O prego fora colocado por ele mesmo, tendo nesta sua única finalidade. Matava a pauladas. Pendurava as peças pelo rabo no prego e com a faquinha, afiada qual navalha, arrancava o couro do gato sem dar um pique. A carne comia. O couro do gato, inteiriço, tornou-se veracidade máxima do samba.