Você está na página 1de 14

ALGUMAS CARACTERÍSTICAS (GERAIS) SOBRE A MÚSICA BARROCA

Novas ideias musicais

Num mundo cujo pensamento se via tão profundamente revolucionado, a linguagem


musical também não permaneceu inalterada. Os músicos deste período exploraram novos
campos emocionais e ampliaram a sua linguagem por forma a poderem enfrentar as novas
necessidades expressivas. De início, tentaram verter nas formas musicais herdadas do
Renascimento poderosos impulsos no sentido de um mais amplo espectro e de uma maior
intensidade de conteúdo emocional. Em meados do século XVII estavam já consolidados novos
recursos de harmonia, colorido e forma, uma linguagem comum através da qual os
compositores podiam exprimir adequadamente as suas ideias.

As duas práticas

Ao longo de todo o período barroco estabeleceu-se uma distinção entre diversos estilos
de composição, reconhecida entre uma prática mais antiga e outra mais recente. Em inícios do
século XVII Monteverdi estabeleceu a distinção entre uma prima prattica e uma seconda
prattica. Na primeira prática, a música dominava o texto, enquanto na segunda prática o texto
dominava a música. Daqui decorria que no novo estilo as antigas regras podiam ser modificadas
e, em particular, que as dissonâncias podiam ser mais livremente utilizadas para adequar a
música à expressão dos sentimentos do texto.

Em meados do século surgiram outros sistemas mais amplos e mais complexos de


classificação estilística. O mais importante foi a divisão tripartida entre o estilo sacro, o estilo de
câmara ou concerto e do estilo teatral ou cénico, todos eles distintos entre si e detentores de
uma função social particular e de características técnicas próprias.

Escrita idiomática

Nesta época os compositores começaram a sentir-se atraídos pela ideia de escreverem


música especificamente para um determinado meio, como o violino ou a voz solista, em vez de
música que podia ser interpretada por quase qualquer combinação de vozes e instrumentos, tal
como acontecia anteriormente.

 Itália: a família do violino começava a substituir as antigas violas e os compositores


desenvolviam um estilo especificamente violinístico;
 França: os compositores começaram a cultivar a viola, que se tornou nos últimos
decénios do século XVII, o instrumento de arco mais apreciado neste país;
 Os instrumentos de sopro foram sendo tecnicamente aperfeiçoados e passaram a ser
usados de acordo com os seus timbres e recursos particulares;
 Continuou-se a desenvolver um estilo específico de música de tecla;
 Começaram a aparecer as indicações dinâmicas;
 A arte do canto virtuosístico avançou muito rapidamente;
 Começaram a diferenciar-se os estilos vocais e instrumentais.

1
Os Afetos

Quase todos os compositores deste período esforçaram-se no sentido de representarem


uma vasta gama de ideias e sentimentos com a máxima vivacidade e veemência (de certa forma,
uma extensão da música reservata renascentista). Prolongando certas tendências já evidentes
no madrigal de finais do século XVI, os compositores procuravam encontrar meios musicais de
exprimir os afetos ou estados de espírito, como a ira, a agitação, a majestade, o heroísmo, a
elevação contemplativa, o assombro ou a exaltação mística, e de intensificarem estes efeitos
musicais por meio de contrastes violentos. A música deste período não era escrita em primeira
instância para exprimir os sentimentos de um artista individual, mas sim para representar os
afetos num sentido genérico. Para a comunicação desses afetos foi gradualmente surgindo um
vocábulo de recursos ou figuras musicais.

Alternativa:

Tentativa de representar sonoramente os sentimentos, paixões humanas, ideias e


estados de espírito (coletivo, não apenas do compositor). A música deste período era
escrita para exprimir os afetos num sentido genérico. Inúmeros tratadistas musicais
estabeleceram relações entre os sentimentos, virtudes ou os estados de alma (ira,
agitação, majestade, heroísmo…), quer com os modos/ tonalidades, quer com os
instrumentos que os deveriam representar. Foi surgindo, pouco a pouco, um vocábulo
de recursos ou figuras musicais para a comunicação desses afetos.

Códigos mais ou menos pré-estabelecidos para determinadas representações afetivas:

Ideia de Alegria Ideia de Tristeza/ melancolia


 Acordes de 3ª menor;
 Acordes de 3ª Maior;  Dissonâncias;
 Consonâncias;  Registos mais graves;
 Registos mais agudos;  Andamentos lentos;
 Andamentos rápidos.  Descidas em apogiatura no baixo (o
chamado Baixo de Lamento)

O Baixo contínuo

Ao contrário da polifonia de vozes independentes, típica do Renascimento, a tessitura


típica do barroco foi um baixo firme e uma voz aguda ornamentada, sendo a coesão entre ambos
assegurada por uma harmonia discreta. A grande novidade era a ênfase posta no baixo, o
isolamento do baixo e do soprano como as duas linhas essenciais na textura e a aparente
indiferença às partes internas enquanto linhas melódicas. Esta indiferença traduz-se no sistema
de notação denominado baixo contínuo: o compositor escrevia a melodia e o baixo; o baixo era
tocado num ou mais instrumentos de contínuo (cravo, órgão, alaúde), geralmente reforçado por
um instrumento de apoio, como uma viola da gamba baixo, um violoncelo ou um fagote, e acima
das notas do baixo o executante do instrumento de tecla ou o alaudista colocava os acordes
convenientes, cujas notas não estavam escritas. Se esses acordes diferiam dos acordes perfeitos
no estado fundamental, ou se havia que tocar notas não pertencentes à harmonia (como
retardos, por exemplo) ou acidentes ocorrentes, o compositor podia indicá-los através de
pequenas cifras ou sinais colocados acima ou abaixo das notas do baixo.

2
Nem sempre era fundamental a realização do baixo: muitas peças eram providas de
contínuo, embora todas as notas necessárias à harmonia completa já estivessem presentes na
notação das partes melódicas vocais ou instrumentais. Muitas vezes, o instrumento do contínuo
não fazia mais do que dobrar ou apoiar as vozes. Nos solos ou duetos, o contínuo era necessário
para completar as harmonias, bem como para produzir uma sonoridade mais plena. Essa
realização era, muitas vezes, designada por ripieno.

Alternativa:

Também designado por baixo-cifrado, consta fundamentalmente de uma linha melódica


no baixo, sobre o qual, com ou sem a indicação de cifras, se executam acordes
convenientes. É, portanto, um baixo firme que sustenta as outras vozes (como um
alicerce). O baixo era sempre realizado por um instrumento harmónico (geralmente
cravo/ órgão ou alaúde) e podia ser reforçado com outros instrumentos (como a viola
da gamba, violoncelo ou fagote), sozinhos ou em simultâneo. Com a prática do baixo-
contínuo é dado ênfase ao baixo (e não ao tenor, como em épocas passadas) e dá-se
uma definição clara das vozes (independência entre as vozes).

O novo contraponto

Um novo tipo de contraponto foi gradualmente emergindo no século XVII. Continuava a


ser uma conjugação de diferentes linhas melódicas, no entanto essas linhas tinham, agora, de
encaixar todas no quadro de uma série de acordes decorrentes do contínuo ou definidas pelas
cifras. Que o acompanhavam. Era um contraponto dominado pela harmonia, onde as linhas
individuais se subordinavam a uma sucessão de acordes.

Alternativa:

As linhas melódicas eram diferentes mas subordinadas à sucessão de acordes. Havia um


grande débito harmónico (quase que cada nota tinha um acorde diferente), ao contrário
do Romantismo.

ÓPERA

A ópera é uma obra teatral/ drama musical no qual a música (contínua) participa essencialmente
no desenrolar da ação e na descrição de atmosferas e de sentimentos. A reunião das diferentes
artes envolvidas numa ópera (poesia, música, teatro, dança, encenação, representação,
diálogos, artes plásticas/ cenografia, guarda-roupa…) é fértil em possibilidades e torna este
género num espetáculo completo, mais tarde chamado “obra-de-arte-total”.

Embora a ligação entre música e teatro remonte à antiguidade, a ópera surgiu em finais do
século XVI em Florença, onde um círculo de humanistas (poetas, músicos, eruditos) – Camerata
Fiorentina – procuravam dar vida ao drama antigo (numa tentativa de fazer renascer as tragédias
gregas). Os primeiros libretos tinham por base lendas heroicas e personagens da história antiga
ou mitológica que os compositores tratavam musicalmente de acordo com os meios da época:
a nova monodia, os coros madrigalescos, os ritornelos e danças instrumentais.

3
Antecedentes/ origens da ópera:

1. Dramas litúrgicos medievais:


Pequenas dramatizações medievais, cantadas, de histórias bíblicas.

2. Teatro do Renascimento (Intermezzi):


Divertimentos musicais à base de danças e madrigais que eram executados entre atos
das peças teatrais (geralmente em ocasiões festivas). Estes interlúdios tinham caráter
bucólico, alegórico ou mitológico; nas comemorações oficiais importantes, como
casamentos reais, eram produções musicais espetaculares e elaboradas, com coros
solistas e grandes conjuntos instrumentais.

3. Ciclos de madrigais
Destinavam-se a concertos ou entretenimento privado. Musicalmente apresentavam
um caráter ligeiro, animado e humorístico. Representavam uma série de cenas que
seguiam um enredo teatral ou caracterizavam um estado de alma. As personagens
diferenciavam-se através de grupos de vozes e solos.

4. Camerata Fiorentina
A Camerata Fiorentina era um grupo de intelectuais, constituído por músicos, poetas,
escritores, sábios, atores, etc., que procuravam recriar os ideais estéticos da antiga
tragédia grega e da arte perdida da declamação musical. O seu patrono era o Conde de
Vernio, Giovanni de’ Bardi (1534-1612), nobre florentino e ele próprio poeta e músico.
Este grupo de intelectuais insurgiu-se contra a polifonia do cinquecento, que segundo
as ideias do grupo não era adequada à expressão do texto. Defendiam uma melodia que
colocasse em relevo as inflexões do discurso oral: a voz devia ser única (linha vocal
monódica), altamente declamatória (stille recitativo, que tentava imitar a monodia
grega) e totalmente subordinada ao texto, num acompanhamento muito simples de
acordes, feito a partir de uma linha de baixo-cifrado, efetuada num instrumento
harmónico, geralmente o cravo ou o alaúde. As cenas e os números musicais eram
bastante reduzidas e os coros eram rígidos.

Os primeiros exemplos de drama per musica (de Peri e Caccini) são, na verdade, as primeiras
óperas da História da Música. No entanto, pouco se pareciam com a atual conceção de ópera.
Monteverdi foi o primeiro compositor a conseguir corresponder às definições estabelecidas
pelos intelectuais, escrevendo uma ópera com o caráter de obra-prima, de interesse
permanente e atual: L’Orfeo (um dos primeiros exemplos da ópera tal como é atualmente
concebida).

Em L’Orfeo, está já presente a estrutura-base da ópera barroca inicial:

 Abertura (exclusivamente instrumental);


 Prólogo e vários Atos (onde alternam-se já recitativos e árias).

Nesta obra, Monteverdi especificou na partitura o tipo de instrumentos pretendidos,


fazendo, assim, o primeiro ensaio de uma verdadeira orquestração. Pôs em relevo o papel
dos instrumentos, atribuindo-lhes partes independentes; recorreu várias vezes a técnicas de
ritornelos (repetições melódicas tipo refrão que conferem à obra um caráter unitário).

Genero concitato: técnica que se traduz na repetição da mesma nota, subdividida em valores
muito pequenos. É um efeito musical característico de Monteverdi (presente em L’Orfeo)
que confere à obra momentos de grande excitação.

4
Lançados os fundamentos deste novo tipo de espetáculo, rapidamente a ópera se torna um dos
grandes géneros musicais do Barroco. As próprias maquinarias (surgidas com a 1ª revolução
industrial) tiveram aplicação no mundo da ópera, originando toda uma engenharia teatral que
proporcionava encenações fabulosas. Construíram-se inúmeros teatros ao longo do séc. XVII e
XVIII; surgiram vários fenómenos novos como os empresários de ópera, o culto do bel-canto,
todo o vedetismo ligado ao próprio canto (divos e divas); assiste-se ao florescimento dos
castratti (cantores que na infância eram sujeitos a um processo de castração, de modo a
preservarem a sua voz de soprano infantil).

Podemos distinguir diferentes correntes de ópera:

 Itália (Ópera Veneziana, Romana e Napolitana)


 França;
 Inglaterra;
 Alemanha.

Itália

Itália era considerado o centro da música, onde se destacavam dois grandes polos de difusão de
ópera: Veneza e Nápoles.

1. Veneza

A ópera em Veneza abriu caminho à ópera do século XVII (principalmente após a


chegada de Monteverdi àquela cidade, em 1613, onde se tornou mestre-de-capela da
catedral de S. Marcos).

Características da ópera veneziana:

 Segue as pisadas do modelo de ópera apontado por Monteverdi;


 Aberturas com um número variável de andamentos (um ou dois);
 Árias maioritariamente estróficas;
 Melodias populares e agradáveis (com temas de cariz heroico, sobre
personagens históricos ou mitológicos);
 Bel canto;
 Solistas;
 Esplêndida, grandiosa;
 Grandes cenários (com grande maquinaria);
 O texto não era o mais importante.

Após Monteverdi, distinguiram-se outros compositores importantes, tais como Cavalli


(1602-1676), aluno de Monteverdi, e, mais tarde, Vivaldi (1678-1741), também ele autor
de vasta produção operática. Embora importante, sobretudo no século XVII, o estilo
veneziano foi ultrapassado pelo estilo napolitano no século XVIII.

5
2. Roma

Inicialmente, a ópera em Roma segue o modelo da Camerata Fiorentina. Apesar de


Roma ser uma capital religiosa, a ópera séria e, em especial, a ópera buffa não deixaram
de se desenvolver também. Das características mais relevantes da ópera romana
sobressai o gosto pelos cenários imponentes, grandes orquestras e grandes coros.

3. Nápoles

Foi em Nápoles que se desenvolveu o modelo de ópera mais representativo do estilo


italiano. Vai ser este modelo (completamente diferente ao do estilo veneziano) aquele
que se internacionalizará e dará origem ao chamado estilo italiano.

 Linha melódica acompanhada por harmonia simples;


 Bem mais elegante do que a ópera veneziana (textos mais cuidados);
 Não era tão espetacular, tão grandiosa, como a ópera veneziana;
 Cenários sumptuosos;
 Orquestrações ricas e cuidadas;
 Virtuosismo vocal, por vezes exagerado (dando atenção aos sentimentos e
estados de alma).

Alessandro Scarlatti (1660-1725) dominou a ópera em Nápoles, durante as duas décadas


em que lá viveu, compondo mais de 40 obras representadas quer no palácio do vice-rei,
quer no teatro público de S. Bartolomeu, onde desempenhava o cargo de diretor. Este
compositor introduziu modificações importantes no género:

 Compôs óperas mais curtas (em 3 atos);


 Colocou em cena personagens do quotidiano;
 Estabeleceu a abertura à italiana (estrutura tripartida: rápido-lento-rápido);
 Criou a ária da capo e utilizou-a como ária padrão (trabalhada pelos
restantes compositores).

Outro compositor representativo do estilo napolitano foi G. B. Pergolesi (1710-1736).

França

Em todo o lado, as óperas eram, normalmente, “réplicas” das óperas italianas (com textos
escritos em italiano, por exemplo). Em França, não! França possuía um poder centralizador
muito forte, tendencialmente absolutista.

À semelhança da Camerata Fiorentina, surgiu também em França (em 1570) a Académie de


Poésie et Musique que tentava recuperar o ideal grego da reunião das artes. Daí surgiu o ballet-
de-cour (bailado de corte) que reunia a dança, a poesia, a música (que vocal, quer instrumental)
e as demais artes cénicas (necessárias à elaboração de cenários, guarda-roupa, etc.) em quadros
sucessivos e autónomos.

Em França, algumas das características italianas foram aproveitadas (verificaram-se tentativas


para estabelecer o estilo italiano em Paris, com o intercâmbio de artistas italianos e franceses e
com a representação de várias óperas italianas na corte); contudo, a ópera italiana exigia
cantores profissionais (excluindo assim a participação da nobreza, o que não acontecia no ballet-

6
de-cour), representava grandes despesas (num momento em que o povo francês passava fome)
e os franceses tinham um forte interesse em desenvolver algo nacional. Assim, foi criado um
género próprio, a Tragédie Musicale, e verificou-se um silêncio da ópera italiana até cerca de
1654. As Tragédie Musicale eram escritas em francês e tinham como base tragédias clássicas
francesas. Quase todas as obras tinham ballet.

Do ponto de vista musical, a Tragédie Lyrique apresenta:

 Um novo tipo de abertura em 2 (por vezes 3) andamentos. Distinto do


modelo italiano, onde o ritmo das danças está bem presente, o primeiro
andamento é lento, em ritmo pontuado; o segundo andamento é rápido,
geralmente em forma de fuga; e o terceiro andamento é, geralmente, o
retorno ao andamento inicial (ou um novo e breve andamento lento);
 Um prólogo (geralmente em louvor ao rei);
 Números de ballet (no seguimento da tradição do ballet-de-cour);
 Árias menos virtuosísticas que as de tipo italiano;
 Recitativos normalmente mais melodiosos (adequados à prosódia francesa).

Em finais do século XVII, desenvolveu-se em França um tipo de espetáculo denominado opéra-


ballet, de grandes dimensões e sumptuosidade, onde o elemento balético desempenhava um
papel mais importante do que o dramático. As primeiras aberturas de ópera fizeram-se em
França (aberturas essas que mais tarde se autonomizaram). Criada por Lully, a abertura à
francesa tornou-se o tipo abertura mais divulgado na época do barroco. Compunha-se de 3
partes:

1. Lenta, de caráter majestoso em compasso binário e ritmo pontuado, em textura


homofónica;
2. Rápida, geralmente em ternário, apresentando uma textura contrapontística
(começa habitualmente por um fugato);
3. Parte facultativa que retoma o caráter da primeira (textura homofónica).

Inglaterra

O extraordinário brilho cultural que Inglaterra conheceu em finais do Renascimento não teve
continuidade no século XVII, devido a acontecimentos como a guerra civil inglesa.

A arte dramático-musical que invadia quase toda a Europa não teve praticamente repercussão
nenhuma até então, na Inglaterra. Havia, sim, um espetáculo muito próprio e tradicional,
derivado dos cortejos e mascaradas do Renascimento europeu: a Masque, semelhante aos
Ballet franceses. Constavam de um Prólogo, seguido de uma Entrada das máscaras (artistas
mascarados, normalmente nobres, amadores de teatro), continuava com a representação de
uma Peça (mitológica ou alegórica) que incluía danças, pantominas, diálogos, árias (geralmente
acompanhadas com alaúde) e coros. As Masque terminavam com um Baile no qual todos
retiravam as suas máscaras.

Com a restauração da monarquia (Carlos II), o panorama altera-se, pois o novo rei, no seu exílio
em França, ficara cativado pela tradição francesa, importando muitas influências para a vida
musical da corte inglesa. Carlos II contratou o compositor Cambert (1628-1677) mas, apesar de
este ter levado a cabo várias representações de óperas italianas, verificou-se uma

7
predominância do estilo francês nas Masques (influências do ballet-de-cour e do estilo musical
de Lully).

Outra particularidade dos ingleses eram as óperas miniatura que serviam para fazer digressões
a baixo custo ou para serem apresentadas em espaços pequenos. Não eram, ainda, operetas. As
características que mais as particularizavam eram:

 Terem até 1h de duração;


 Exigirem poucos cantores (5 a 6);
 Serem simples.

Surgiram, entretanto, dois compositores importantes no estabelecimento de um género


operático inglês: John Blow (1649-1708) e, sobretudo, o seu aluno Henry Purcell (1659-1695).

Alemanha

Nesta época, a Alemanha encontrava-se dividida em vários principados e pouco se sabe sobre
os seus antecedentes da ópera. A referência mais antiga que se conhece é de uma ópera que H.
Schütz (1585-1672) terá composto em 1627, intitulada “Dafne”. Para além da ópera italiana,
existia, na Alemanha, o singspiel. A Guerra dos 30 anos impediu, de certo modo, o
desenvolvimento da ópera nas várias cortes alemãs, salientando-se, no entanto, a corte de
Dresden (o principal centro de ópera italiana) e a corte de Hamburgo (sem dúvida um dos
principais centros de ópera, onde se verificou um grande impulso no sentido de estabelecer uma
ópera alemã). S. Kusser (1660-1727) e R. Keiser (1674-1739) transformaram a cidade de
Hamburgo na capital de ópera em alemão (trabalhando um recitativo adaptado à língua alemã,
embora com influências francesas e italianas).

Haendel trabalhou em Hamburgo como violinista da orquestra, antes de se naturalizar cidadão


britânico (em 1726). Nesse período, escreveu algumas das suas primeiras óperas. Ligados
também a este núcleo de Hamburgo está o compositor Telemann (1681-1767).

Recitativos e Árias

Com o evoluir da ópera surgiram dois grandes momentos, os recitativos e as árias, que se
alternavam ao longo da obra.

Recitativos: parte muito importante do libreto, o recitativo suporta a ação (na ópera) ou
a narração da ação (na oratória ou na cantata). É o que faz desenvolver a história. No
início, era acompanhado por um simples baixo-contínuo instrumental, destinado a
assegurar a afinação da entoação, permitindo uma grande liberdade de interpretação
ao cantor (o acompanhamento limitava-se a acordes). Musicalmente, caracterizava-se
por:

 Membros de frase separados pelo silêncio;


 Sílabas acentuadas nos tempos fortes;
 Canto silábico;
 Repetições frequentes de uma mesma nota;
 Intervalos de âmbito reduzido;
 Forma e ritmo livres.

8
a) Recitativo secco (ou simples): música quase falada, como que em modo de cantilena,
normalmente acompanhado ao cravo mais baixo-contínuo (interpretado pela viola
da gamba ou pela teorba, por exemplo). Quando queriam dar mais intensidade
dramática à ação, passava a orquestra (ou apenas as cordas, por exemplo) a
acompanhar o recitativo. Dessa forma, era conferida uma maior riqueza tímbrica à
obra (ideal para situações mais dramáticas, como já foi referido).

b) Obligato (ou acompanhado): em certa medida, vem da tendência dos compositores


escreverem a partitura completa, com todas as notas que queriam que fossem
tocadas (e não apenas o baixo cifrado). Quando os compositores queriam dar um
pouco mais de tensão, mesmo ao desenrolar da história, acrescentavam mais
instrumentos para enriquecer o recitativo (embora estes se limitassem, geralmente,
a fazer aquilo que o baixo faria).

Árias: grande melodia vocal (ou instrumental), geralmente acompanhada à orquestra,


constituindo a parte conclusiva de cada cena onde a progressão dramática é secundária.
São momentos de maior cuidado musical (mais empolgantes musicalmente). É uma
forma estática, não permitindo que a ação prossiga. Serve, normalmente para expressar
sentimentos, emoções.

 Apresenta um âmbito mais alargado que o recitativo;


 Combina canto silábico e canto melismático;
 Com caráter virtuosístico (normalmente, após a sua interpretação, o cantor sai
de cena saudado pelos aplausos).

a) Ária da capo: o texto é constituído por duas curtas estrofes. Após um ritornelo
instrumental, a voz principal expõe um longo período (A) assente na tonalidade
inicial; segue-se a parte central (B), num tom próximo (relativo ou dominante) e, por
fim, dá-se a repetição de A que, de forma inequívoca, afirma a tonalidade inicial (a
repetição de A pode ser precedida do seu ritornelo).

Ópera Seria e Ópera Buffa

Ópera seria: modelo tradicional sobre temas heroicos, históricos ou mitológicos.


Ópera Buffa: temas de caráter cómico e popular.

Paralelamente à ópera séria, desenvolve-se um outro tipo de ópera, de cariz burlesco e cómico
– a opera buffa. O principal desenvolvimento deste tipo de ópera dá-se em Nápoles. Por
influência do teatro espanhol (Nápoles esteve sob o domínio espanhol entre os séculos XIII e
XIX), a ópera napolitana começa a incluir cenas cómicas com personagens e temas ligados à vida
quotidiana, mais sentimentais, ou mais populares e, inclusive, cenas de paródia da ópera séria.
“La serva padrona” (1733) de Pergolesi, escrita como intermezzi para a ópera “Il prigionier
superbo”, é normalmente considerada como a primeira ópera buffa.

Algumas características da ópera buffa:

 Desenvolvida a partir de intermedi da ópera séria;


 Sem a ornamentação excessiva (característica da ópera séria);
 Canções do tipo mais ligeiro (favorecendo-se os números de conjunto, em
detrimento das árias de castratti).

9
JOHANN SEBASTIAN BACH (1685-1750)

No seu tempo, J. S. Bach era considerado um grande pedagogo e pouco mais. Não era
extraordinariamente conhecido nem reconhecido, ao contrário dos dias de hoje. Na altura, J. S.
Bach não tinha esse carisma: não era um inovador. Já os seus filhos C. P. E. Bach e J. C. Bach
eram compositores vanguardistas para a época. No entanto, J. S. Bach esgotou tudo o que havia
para fazer no Barroco. Daí a expressão que considera J. S. Bach o criador da Música. Grande
parte da sua obra era música de Igreja. De referir que J. S. Bach tinha muita obra de contrafação:
na altura havia uma “sede” de música nova; por esse motivo, os compositores tinham de
apresentar obras novas quase todas as semanas. Muitas vezes, J. S. Bach pegava em melodias
suas antigas, às quais adaptava novos textos. Foi Mendelssohn quem “redescobriu” J. S. Bach
(bem mais tarde), ao tomar contacto com a sua obra “Paixão segundo S. Mateus”.

J. S. Bach nasceu em Eisenach, no seio de uma família de músicos. Aprendeu a tocar


instrumentos de cordas e sopro na própria família. Foi um grande virtuoso da música de tecla
(cravo, órgão e clavicórdio), para a qual compôs muitas obras. É o representante máximo na arte
do contraponto, do cromatismo e do simbolismo musical.

É possível dividir o desenvolvimento criativo de J. S. Bach em vários períodos, de acordo com a


posição que assegurou durante a sua vida e que foram determinantes para a sua produção
musical. Desses períodos, destacam-se Weimar, Cöthen e Leipzig.

Weimar (1708-1717):
Nesta cidade, Bach foi organista da corte, mestre de concerto e de orquestra e
pedagogo. Transcreveu obras de compositores italianos como Frescobaldi e Vivadi. O
seu reconhecimento deve-se, sobretudo, à sua habilidade de executante e à sua
estupenda técnica de pedal. Entre as obras deste período destacam-se:
 Toccata e Fuga em Ré menor;
 Prelúdio e Fuga em Ré menor;
 Grande Prelúdio e Fuga em Lá menor.

Cöthen (1717-1723):
Por condicionalismos religiosos, J. S. Bach dedica-se, aqui, sobretudo à música profana
e instrumental. Foi neste período que o compositor escreveu a maior parte da música
para tecla e da música de câmara. É de salientar o importante papel de pedagogo: o
primeiro caderno do “Cravo bem temperado” tornou-se obra obrigatória no exercício
prático deste instrumento. Em Cöthen, Bach compôs as cantatas profanas e grandes
obras instrumentais, nomeadamente os concertos Brandeburgueses.

Leipzig (1723-1750):
Este período teve início com o emprego que J. S. Bach aceitou em S. Tomás de Leipzig.
Os seus deveres principais eram: ensinar Música, Latim e Catecismo na escola da Igreja
de S. Tomás. Este foi o período de maior criação no domínio da música sacra (Bach devia
executar uma cantata cada domingo, por exemplo). A partir de 1740, o compositor
dedica-se mais ao ensino, compondo com fins pedagógicos. Entre as obras deste
período, contam-se a maior parte das suas cantatas litúrgicas, as Paixões, as Missas, a
segunda parte do “Cravo bem temperado”, as “Variações Goldberg”, a “Oferenda
Musical” e a “Arte da Fuga”.

10
Música instrumental de J. S. Bach

1703-1707: organista em Arnstadt


1707-1708: organista em Mühlhausen
1708-1717: organista da corte e mais tarde mestre de capela do duque de Weimar
1717-1723: diretor musical na corte de um príncipe em Cöthen
1723-1750: chantre do colégio de S. Tomás e diretor musical em Leipzig

 Ganhou uma certa fama como virtuoso do órgão (e compositor de obras


contrapontísticas eruditas) na Alemanha protestante;

 Recebeu as primeiras lições do pai e, mais tarde, do irmão mais velho;

 Estudou a música de muitos outros compositores através de do método tradicional, que


consistia em copiar ou escrever arranjos das suas partituras. Deste modo, familiarizou-
se com o estilo dos principais compositores da Europa;

 Compôs praticamente em todas as formas em voga no seu tempo (à exceção da ópera);

A evolução de Bach foi condicionada por 5 fatores:

1. Tradição profissional familiar;

2. Método laborioso de assimilação de todas as fontes (através da cópia de partituras);

3. Sistema setecentista do mecenato (quer o mecenas fosse um indivíduo, a Igreja ou


o Município);

4. Conceção religiosa da função da arte e dos deveres de um artista;

5. Génio

Arnstadt, Mühlhausen e Weimar: a maior parte das suas composições foram para órgão;

Cöthen: compôs essencialmente obras para instrumentos de tecla ou para conjuntos


instrumentais, música vocacionada para o ensino e para os divertimentos domésticos ou de
corte;

Leipzig: anos mais produtivos no domínio da cantata e restante música religiosa; importantes
obras de maturidade para órgão e outros instrumentos de tecla.

Música instrumental de Bach

1. Obras para órgão


2. Prelúdio e fugas
3. Trio sonatas
4. Prelúdios corais
5. Música para cravo e clavicórdio

11
6. Tocatas
7. Cravo bem temperado
8. Suites para cravo ou clavicórdio
9. Variações Goldberg
10. Obras para violino e violoncelo solo
11. Sonatas para conjunto
12. Concertos
13. Suites orquestrais
14. Outras obras (Oferenda Musical, A Arte da Fuga

Obras para órgão

Embora J. S. Bach tenha recebido também formação de violinista, foi a música de órgão
que primeiro lhe despertou as atenções enquanto compositor.

Primeiras composições:

 Prelúdios corais;
 Variações sobre corais
 Tocatas e fantasias (influência de Buxtehude);

Em Weimar:

 Interessou-se pela música de compositores italianos;

 Arranjos de vários concertos de Vivaldi para órgão ou cravo (escrevendo


ornatos, reforçando o contraponto, acrescentando, por vezes, vozes
intermédias);
Aprendeu a escrever temas mais concisos; a clarificar e reforçar a estrutura
harmónica e a desenvolver temas através de fluxo rítmico ininterrupto, criando
estruturas formais de grande transparência e de proporções grandiosas.
Combinadas com a sua imaginação prolífera e com um profundo domínio da
técnica contrapontística, estas qualidades deram origem ao estilo que hoje
identificamos como sendo seu (mas na realidade, uma fusão de características
italianas, francesas e alemãs).

Prelúdios e fugas

Uma das estruturas musicais mais comuns era a combinação de um prelúdio (ou tocata,
ou fantasia) e de uma fuga.

 As composições mais importantes datam do período de Weimar;


 Escritas na linguagem própria do instrumento a que se destinam;
 Tecnicamente difíceis.

Obras mais conhecidas: tocata em Ré menor; prelúdio em Mi maior e a fuga na mesma
tonalidade.

12
Trio Sonata

Não eram tão espetaculares como os prelúdios e fugas, mas eram igualmente
importantes. Bach escreveu 6 trios sonatas, possivelmente em Leipzig para o filho mais
velho.

 Adaptação do trio sonata italiana para conjunto, transformada numa peça para
solista;

 Textura contrapontística de 3 vozes iguais e independentes (uma para cada


teclado manual e uma para a pedaleira);

 Influência italiana no caráter geral dos temas e na ordem dos andamentos


(quase sempre rápido-lento-rápido).

Música para cravo e clavicórdio

Para cravo e clavicórdio, J. S. Bach compôs obras-primas de todos os géneros populares


no seu tempo, desde prelúdios, a fantasias e tocatas, passando pelas suites de danças,
variações, etc. De um modo geral, as composições de tecla revelam os aspetos
cosmopolitas ou internacionais do estilo de Bach.

Tocatas

Entre as quais se contam as notáveis tocatas em Fá # menor e Dó menor.

Cravo bem temperado

Uma das obras mais conhecidas de J. S. Bach, para cordofones de tecla. Composta por
duas partes.

1ª Parte: mais homogénea no estilo. Nesta parte, Bach mostrou que era possível utilizar
todas as tonalidades (graças à novidade da afinação com temperamento igual).
2ª Parte: inclui composições de muitos períodos diferentes da vida de Bach.

Variações Goldberg

Obra onde Bach condensou todos os aspetos relevantes de uma outra forma
característica da música de tecla: o tema e as variações.

Obras para violino e violoncelo solo

Bach escreveu 6 sonatas e partitas para violino solo (Cöthen), 6 suites para violoncelo
solo (Cöthen) e uma partita para flauta solista. Nestas obras Bach conseguiu criar a ilusão de
uma textura harmónica e contrapontística, nomeadamente através do recurso a cordas

13
múltiplas. Principal destaque para a Chaconne da partita em Ré menor para violino solista, uma
das obras mais famosas dentro deste género musical.

Sonatas para conjunto

Nas formas musicais de conjunto (ou música de câmara), as obras mais importantes de
Bach compreendem as sonatas para violino e cravo, para viola da gamba e cravo e para flauta e
cravo. A maior parte destas obras tem 4 andamentos, lento-rápido-lento, como a sonata da
chiesa.

Concertos

 6 Concertos Brandeburgueses (quase todos eles respeitam a sequência habitual


dos concertos italianos (rápido-lento-rápido);

 2 Concertos para violino solista (e um para dois violinos e orquestra);

 Vários concertos para cravo (grande parte são arranjos de outras composições
quer do próprio compositor, quer de outros, como Vivaldi);

Suites Orquestrais

As suites orquestrais contêm alguma da música mais exuberante de J. S. Bach. A peça


vulgarmente conhecida como Ária na Corda Sol é um arranjo do andamento lento da 3ª suite.

Bach ocupa, indubitavelmente, um lugar central na história da música. Absorveu na sua música
a multiplicidade dos géneros, estilos e formas cultivados no século XVIII, desenvolvendo em cada
um deles potencialidades até então desconhecidas. É visível na sua obra, nomeadamente na
música instrumental, um equilíbrio entre harmonia e contraponto, e entre melodia e polifonia.
Destacam-se qualidades como a clareza da forma, a intensidade da expressão, a força do ritmo
e a perfeição técnica de todos os pormenores.

14

Você também pode gostar