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Resumo
Este artigo trata da complexidade de investigação dos objetos de pesquisa da atualidade e a
necessidade da elaboração de metodologias de pesquisa interdisciplinares que auxiliem a responder
as perguntas que inquietam a atual sociedade. Para isso, objetivou-se elaborar um guia de referência
para a elaboração de metodologias de pesquisa interdisciplinares. Para galgar esse objetivo,
realizou-se pesquisa bibliográfica e observação participante em um evento científico de um programa
de pós-graduação interdisciplinar. Elaboraram-se encaminhamentos para a construção metodológica
interdisciplinar a partir de um diálogo das ciências humanas e sociais. Como considerações finais,
entende-se que se faz necessário repensar os conceitos científicos estabelecidos e a construção da
atual ciência para apreender as novas demandas da sociedade que se fazem temas para as ciências na
atualidade.
Palavras-chave
Metodologia de pesquisa; Ciências sociais; Interdisciplinaridade.
Abstract
This article deals with the complexity of research of current research objects and the need to develop
interdisciplinary research methodologies that help answer the questions that concern the current
society. The purpose of this study was to develop a reference guide for the development of
interdisciplinary research methodologies. To achieve this goal, a bibliographic research and
participant observation was carried out in a scientific event of an interdisciplinary postgraduate
program. Guidelines were drawn up for the interdisciplinary methodological construction based on a
dialogue between the human and social sciences. As final considerations, it is understood that it is
necessary to rethink the established scientific concepts and the construction of the current science to
apprehend the new demands of society that make themes for the sciences in the actuality.
Key words
Research; Methodology; Social Sciences; Interdisciplinarity.
Introdução
Este artigo trata das práticas de pesquisas interdisciplinares realizadas a partir de pesquisa
bibliográfica e de análise das produções científicas realizadas por pesquisadores oriundos de
um Programa de Pós-Graduação interdisciplinar. Objetivou-se elaborar uma proposta
metodológica que dialogue dentro das ciências humanas e sociais, e contribua para o avanço
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quantitativo e qualitativo das pesquisas interdisciplinares.
Mediante os novos arranjos sociais, reconfigurados na contemporaneidade, acredita-se que é
necessário, repensar os conceitos e a construção de ciência para apreender as novas demandas
da sociedade que se fazem temas para as ciências na pós-modernidade.
Objetiva-se, de modo específico, propor um roteiro que seja norteador para pensar a prática
interdisciplinar, no campo da pesquisa acadêmica. Acredita-se que as ciências, de modo geral,
se apropriam com maior profundidade dos objetos de pesquisa propostos na atualidade se os
abordarem pelo viés interdisciplinar. Esse fato ocorre pela interdisciplinaridade permitir uma
leitura com maior amplitude das problemáticas apresentadas.
O programa de pós-graduação (PPG) que serve de cenário pra este estudo aposta na
interdisciplinaridade para pensar a tríade Desenvolvimento, Tecnologias e Sociedade
(DTecS). Com a intenção de exemplificar a variedade da pesquisa interdisciplinar e suas
nuances apropria-se dos trabalhos realizados ou em realização, que são:
“Levantamento das potencialidades da Agricultura familiar e Agroecológica das
Comunidades Rurais atingidas pela Mineração nos municípios de Conceição do Mato Dentro,
Alvorada de Minas e Dom Joaquim”. Projeto com diálogos interdisciplinares entre
antropologia, sociologia, economia e engenharia ambiental.
“Indicativos do Desenvolvimento do Município de Itajubá (MG): investimentos públicos e
privados” e “Observatório de Desenvolvimento e Cultura”. Projetos que procuram mapear o
desenvolvimento a partir da cultura e dos investimentos públicos e privados no sul de Minas
Gerais. Participam mestrandos e alunos de graduação de diversas áreas do conhecimento. Os
projetos são intensificados por um Grupo de Estudos, Pesquisa e Extensão (GEPE) Ciências
Sociais e Desenvolvimento.
Há também projetos nas áreas de Desenvolvimento e Tecnologias, tais como: “Tecnologias
sociais e produção artesã: estudo interdisciplinar de inclusão no Mercado” e “Formação de
Engenheiros em Perspectiva de Ciência, Tecnologias e Sociedade”. Projetos elaborados por
sociólogos, designers, psicólogos, administradores e outros profissionais.
A diversidade dos projetos do PPG DTecS aponta que existe a junção de diferentes
pesquisadores oriundos das ciências humanas, sociais aplicadas e ciências exatas na busca por
respostas que a sociedade atual procura. A departamentalização das ciências, não consegue
atender as demandas de ordem social, ambiental, cultural, econômica. Logo, a elaboração de
pesquisas e de projetos que dialoguem entre saberes nos parece uma tendência na pesquisa.
Entretanto, movimentos de reconfiguração social aconteceram para que começasse a se
romper com a chamada departamentalização da ciência e começasse a se (re) pensar de modo
interdisciplinar. Por isso, na sequência apresentar-se-á a o referencial teórico que sustentou a
discussão proposta, a metodologia que foi constituída para elaboração deste artigo, uma
proposta de um roteiro metodológico para a elaboração de uma pesquisa de caráter
interdisciplinar, discussões práticas sobre práticas interdisciplinares e por fim as
considerações finaiss.
Referencial Teórico
Como advento dos ideais do Iluminismo e seu anseio por buscar na razão a emancipação do
homem e sua autonomia mediante o rompimento com o dogmatismo religioso vigente até
então e a constatação de que o questionamento e a busca por respostas movimentavam o
pensamento humano. Dentro desse panorama de progresso, John Locke; Voltaire;
Montesquieu; Rousseau e Adam Smith tecem novos pensamentos em função de reconfigurar
conceitos de Estado, economia, mercado, cidadania, burguesia e conhecimento. A partir do
uso da razão e da proliferação do conhecimento, a humanidade começa a se organizar na
construção do conhecimento e de tecnologias, fundamentando a ciência moderna.
Em Um discurso sobre as ciências, Boaventura de Sousa Santos apresenta o paradigma
dominante de ciência estabelecido com a modernidade, em seguida, apresenta condições de
crise de tal paradigma, para então expor um paradigma emergente. O autor, no contexto dos
anos 1980, aponta caminhos para um período de transição no campo científico.
Paradigma dominante refere-se à concepção de ciência advinda da revolução científica do
século XVI, que teve como marco o heliocentrismo (SANTOS, 2008), consolidado nos
séculos seguintes, estabelece-se como um modelo global de racionalidade. As ciências
naturais estabelecem suas metodologias mediante a capacidade de quantificar o mundo, torna-
se irrelevante para a produção científica aquilo que não é quantificável.
Do ponto de vista da intencionalidade, este paradigma de ciência se associa pela capacidade
de dominar e transformar a realidade em detrimento ao desejo de compreendê-la (SANTOS,
2008).
Naquele contexto, estudo e a construção do conhecimento se faziam interdisciplinares e,
posteriormente, se fizeram disciplinares.
Diversos pensadores da história da humanidade construíam seus conhecimentos no bojo de
inúmeras sustentações teóricas, como por exemplo: os filósofos gregos eram também
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matemáticos e balizavam com a biologia, a astronomia e a física. Entre os pais da sociologia
não foi diferente, os escritos de Karl Marx (2006) perpassam os limites da filosofia, da
sociologia, da história, da economia, do direito. Max Weber (2010) e Émile Durkheim (1977),
superavam as fronteiras da disciplinaridade e já trabalhavam com conceitos e com
construções interdisciplinares. A propósito, a própria gênese da sociologia ocorre por meio de
áreas distintas (VILA NOVA, 1985).
Com o advento do século XIX, essa estrutura se modifica, sob a égide do positivismo ocorre a
sistemática divisão das disciplinas por campos principais do saber obedecendo a um rigor
metodológico que demarcou nitidamente os procedimentos de análise e observação dos
objetos de estudo. Vila Nova (1985) indica que o positivismo estabelece critérios rigorosos
para a abordagem científica procurando métodos semelhantes aos de ciências como a
matemática, a física e a biologia até mesmo nas ciências humanas.
A divisão das ciências por conteúdos e as formas disciplinares começa a se alastrar e rompem
com as visões sistêmicas de pesquisadores por todo o globo. O meio acadêmico
departamentalizou-se e especializou-se em áreas do conhecimento, nas quais o diálogo e a
troca de saberes entre pesquisadores se tornaram cada vez mais raros e rasos.
Mediante às novas configurações da sociedade na pós-modernidade, faz-se novamente
necessário pensar-se de maneira interdisciplinar, uma vez que, muitas questões da atualidade
como problemas hídricos, a bioética, a degradação ambiental e os inúmeros problemas de
ordem social são questões que não tiveram soluções em campos exclusivos do saber. Assim os
objetos de pesquisa da atualidade, exigem ser investigados com as contribuições das diversas
ciências na busca por respostas.
Para Santos (2008, p. 57) o paradigma de ciência da verdade absoluta está em crise por
elementos teóricos e sociais agravados pelo que o autor chama de industrialização da ciência:
Elementos dessa crise são percebidos na natureza dos objetos, que, cada vez mais “são
constituídos por anéis que se entrecruzam em teias complexas” (SANTOS, 2008, p. 56). Essa
complexidade se potencializa em função das mudanças sociais apresentadas acima.
Implica em pensar outros modos de fazer ciência que [re] pensem o lugar do sujeito humano.
Em que a ciência não mais se paute pelo controle da natureza, mas pela sua capacidade de
agregar elementos para emancipação do humano.
Essa prerrogativa concorda com Pimenta (2015) que problematiza a eficácia do saber
tecnocientífico em responder aos anseios humanos de modo local e global. Para tanto, o autor
aposta em um desenvolvimento que se aproxime da cultura popular, capaz de minimizar as
mazelas sociais advindas da prática científica estabelecida.
Emerge um outro paradigma que rompe com a lógica binária de mundo entre ciência e senso
comum, vivo e inanimado, natural e artificial1. O paradigma emergente, inverte a lógica
durkheimeana, os fenômenos sociais não mais são vistos como naturais, mas os fenômenos
naturais passam a ser apreendidos como produtos de relações sociais (SANTOS, 2008).
Boaventura de Sousa Santos (2007) diz que não há motivos para a humanidade acreditar no
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Latour (2012) não dissocia o não-humano do humano na constituição das relações sociais.
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saber científico como superior ao senso comum, ao saber esotérico ou religioso. O que ocorre
é uma clara distinção entre sujeito e objeto capaz de efetivar um conhecimento que domine a
natureza.
O autor, no contexto da produção de sua obra em fins dos anos 1980, não fala em
interdisciplinaridade, mas deixa claro que há uma mudança de concepção de mundo, ainda
que não capturada, mesmo nos dias atuais. Mediante essa mudança justifica-se a aposta na
interdisciplinaridade e em sua capacidade de ampliar o olhar do pesquisador. Um
conhecimento que não mais separa sujeito e objeto, mas que permite a confluência de ambos
para apropriação do real.
Metodologia
Considerações Finais
Na busca pela resposta da pergunta que norteou este trabalho, evidenciou-se que se faz
necessário repensar os conceitos e a construção de ciência para apreender as novas demandas
da sociedade que se fazem temas para as ciências na atualidade. Quando a ciência começou a
ser construída, o pensamento interdisciplinar se fez presente, mas ao passar das épocas, esse
conceito perdeu lugar para a disciplinaridade e a chamada departamentalização da ciência.
Para se efetivar a interdisciplinaridade, faz se necessário buscar implicâncias e
contradições do objeto, sair da zona de conforto disciplinar no esforço de capturar dinâmicas e
flutuações que permeiam o real.
Com os novos arranjos sociais reconfigurados pelas transformações ocorridas no globo
após as grandes revoluções históricas da humanidade, as ciências nos vieses interdisciplinares
mostram-se como importantes ferramentas de construção e de problematização na busca por
respostas e pela construção de novos conhecimentos.
Há de se estimular uma nova tendência interdisciplinar na academia, mas que depende
de sinergia entre pesquisadores, institutos, universidades, agências de fomento e outros atores
envolvidos com esta dinâmica para que funcione e execute a pesquisa e o ensino de maneira
que consiga atuar e desvendar as complexidades da atual sociedade.
Os encaminhamentos aqui propostos para a construção metodológica não são
obrigatórios para quem inicia a pesquisa no viés interdisciplinar, mas podem auxiliar na
construção desse novo pensamento na academia e fomentam a construção de pesquisas na
área.
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Referências
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SANTOS, 2007. A Globalização e as Ciências Sociais. São Paulo: Cortez Editora, 2007.
VILA NOVA, Sebastião. Introdução à Sociologia. São Paulo: Atlas, 1985.
WEBER, Max. Conceitos sociológicos fundamentais. Castelo Branco: Covilhã, 2010.
Agradecimentos
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