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MEMORIAL ACADÊMICO:
a trajetória de uma professora universitária
Belo Horizonte
Universidade Federal de Minas Gerais
2019
ANDRÉA MARIA DUARTE VARGAS
MEMORIAL ACADÊMICO:
a trajetória de uma professora universitária
Belo Horizonte
Universidade Federal de Minas Gerais
2019
Dedico esse Memorial:
Ao Augusto,
meu marido, companheiro dedicado;
Aos alunos de graduação e pós-graduação que muito me ensinaram, pois como bem
dizia Paulo Freire: “não há docência sem discência, pois, quem ensina aprende ao
ensinar e quem aprende ensina ao aprender”;
À minha irmã Adriana Maria Cancela Duarte por compartilhar do meu processo de
construção desse Memorial, com uma leitura cuidadosa do texto.
Ninguém caminha sem aprender a caminhar,
sem aprender a fazer o caminho caminhando, refazendo e
retocando o sonho pelo qual se ps a caminhar.
Paulo Freire
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 6
2 O PRINCÍPIO ................................................................................................................ 8
7 A EXTENSÃO ............................................................................................................. 53
8 A ADMINISTRAÇÃO .................................................................................................. 59
Referências ................................................................................................................... 72
6
1 INTRODUÇÃO
7
2 O PRINCÍPIO
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Sou a mais velha de cinco filhas. Meu pai, Paulo, e minha mãe, Conceição,
casaram-se em Ubá, MG, mas eu nasci foi na capital Belo Horizonte, onde moravam
meus avós por parte de pai. Logo após o meu nascimento, viemos para a capital
porque meu pai fora vítima de uma doença grave, tuberculose, e o tratamento à época
incluía cirurgia e isolamento em casa de saúde, o que nos obrigou a morar com meus
avós durante quase um ano.
Em Belo Horizonte, ela não criou outro colégio, mas um Curso de Admissão,
necessário para os alunos que terminavam o quarto ano do Ensino Primário e queriam
ingressar nos ótimos colégios públicos existentes à época, disputando uma vaga para o
Curso Ginasial. Mais uma vez foi muito bem-sucedida.
Comecei minha vida escolar no Colégio Imaculada Conceição, onde fiz o Curso
Primário, escola religiosa tradicional de Belo Horizonte. Minha mãe havia estudado no
Colégio Sacré-Coeur de Marie, em Ubá, e queria que minha educação seguisse na
mesma linha. No momento da matrícula, a Madre Prefeita perguntou à minha mãe se
eu já sabia ler porque naquela escola as crianças aprendiam aos 6 anos, na pré-escola.
Minha mãe respondeu que sim. Eu havia cursado uma escola infantil antes, mas ela
precisou me alfabetizar em 20 dias. Lembro que tinha aulas de manhã e à tarde com
minha mãe e que consegui aprender a ler a tempo, embora com bastante dificuldade.
Com a chegada de mais quatro filhas, o orçamento ficou bastante apertado. Meu
pai era fiscal do IAPC (depois INSS), tinha um salário modesto e, mesmo com a ajuda
da minha mãe como professora, não era fácil pagar escola privada para todas as filhas.
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Como àquela época ela já conhecia bem o ensino das escolas públicas em Belo
Horizonte, o qual considerava muito bom, me preparou para a seleção e fui aprovada
no Instituto de Educação de Minas Gerais (IEMG), onde permaneci até o final do Curso
Normal.
O período da faculdade foi sem dúvida um dos momentos mais ricos da minha
vida. Foi uma fase de descobertas, de certa liberdade vivida intensamente. Entrei em
1973, com apenas 18 anos, no Instituto de Ciências Biológicas (ICB), que ainda
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Com o tempo fui percebendo o pouco impacto do meu trabalho na saúde bucal
das crianças. No início de cada ano, atendia primeiramente as crianças de 7 anos que
tinham acabado de ingressar na escola e, depois, as demais, por faixa etária. No ano
seguinte, quando chamava aquelas que haviam sido atendidas no ano anterior, a
maioria estava novamente com cárie dentária e com a higiene bucal muito deficiente,
ou seja, a educação em saúde que eu realizava não tinha resultado na prática.
Comecei a questionar com a coordenação de saúde bucal sobre o não tratamento dos
dentes decíduos e, depois de algum tempo, foi permitida a restauração da face distal
dos segundos molares decíduos, acreditando que esse procedimento impediria a cárie
na face mesial do primeiro molar permanente. O conhecimento de Cariologia naquela
época era muito pequeno; a fluoretação da água de abastecimento público de Belo
Horizonte já havia iniciado, ainda que de forma gradual; os dentifrícios ainda não eram
fluoretados; o CPOD (índice de experiência de cárie dentária) das crianças, portanto,
era muito elevado.
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Esse curso lato sensu era modular, coordenado pelo Professor Eugênio Vilaça
Mendes, e as disciplinas eram completamente diferentes de tudo que havia estudado
até então: Teoria do Conhecimento, Economia, Sociologia, Políticas de Saúde no
Brasil, Odontologia Preventiva, Epidemiologia, Estágio de Campo, Políticas
Odontológicas no Brasil, Administração de Serviços Odontológicos, Estudo de
Problemas Brasileiros, Sistemas Comparados de Saúde Bucal. Fui aluna dos
professores Jorge Cordón (Universidade de Brasília, UnB), Maria da Conceição Brant
(PUC-MG), Helena Heloísa Paixão e Badeia Marcos (UFMG), além do próprio Eugênio
Vilaça. Professores que ajudaram a descobrir minha vocação para a saúde pública e,
principalmente, a compreender o mundo de um modo diferente, bem mais realista.
Foi providencial ter iniciado a carreira docente no Ensino Superior em 1983, pois
havia me casado em 1981 e minha primeira filha nascido em 1982, o que propiciou um
tempo fundamental para minha primeira experiência com a maternidade.
Esse trabalho de dissertação foi desafiador por várias razões. Era o meu primeiro
trabalho de pesquisa de peso e as muitas dificuldades na sua realização, me fizeram
estudar muito sobre ensino na área de Saúde, de Odontologia e as novas propostas
que estavam sendo discutidas no Ministério da Educação e da Saúde.
publicamos um artigo na Revista Ciência & Saúde Coletiva, o qual já teve até o
momento 113 citações, segundo o Google Scholar (GS). Esse estudo, sobre o qual
falarei mais adiante, foi considerado muito importante para a compreensão dos
problemas vividos pelos adultos brasileiros submetidos à exodontia dentária como
último recurso quando sofriam dores de dente, uma vez que não tinham acesso ao
tratamento endodôntico. Como consequência, o edentulismo causava outra
necessidade, a prótese dentária, que também não era ofertada pela rede pública. Hoje,
mesmo com a Política Nacional de Saúde Bucal prevendo a oferta de prótese, ainda
permanece na maior parte dos municípios do país a mesma condição de difícil acesso.
Poucas prefeituras conseguiram implantar os Laboratórios Regionais de Prótese,
criados pelo Brasil Sorridente em 2004, ou estabelecer convênios para realizá-las.
Talvez por essa razão nosso estudo ainda seja bastante atual e muito consultado.
4 A CARREIRA DOCENTE
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A minha inserção na Clínica foi de extrema importância para uma professora que
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iniciava suas atividades. Sem dúvida, foi um dos aprendizados mais importantes em
minha formação como docente e como cidadã. Vislumbrar um caminho possível para a
implantação de atividades e ações mais adequadas e justas para a crueza daquela
realidade tornava aquela experiência densa, complexa, porém muito prazerosa e
motivadora. A convivência naquela comunidade me fez crescer como educadora e
socialmente, uma vez que situações muito diversas da minha rotina me faziam refletir o
tempo todo sobre os verdadeiros valores da vida e o significado de ser docente naquele
contexto.
É importante lembrar ainda que essa Clínica suscitou nos professores do OSP a
necessidade da qualificação docente, principalmente na área clínica. Nesse sentido, o
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Ainda nesse período (1984-1987), fui convidada pelo professor Marcos Werneck
para ser subchefe do OSP junto com ele. Não tinha experiência suficiente para esse
cargo, mas fui incentivada pelos demais professores a aceitá-lo. Foi muito importante
começar ainda cedo a experiência na administração acadêmica e ir compreendendo
devagar o funcionamento da universidade. Comecei a frequentar eventualmente as
reuniões de Congregação e a me interessar pelas questões que permeavam todas as
áreas na Faculdade. Ao término desse mandato, me candidatei e fui eleita
representante (1989-1991) dos professores auxiliares na Congregação, com o intuito de
continuar participando das decisões maiores da Faculdade.
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Com o novo currículo, novas disciplinas foram criadas, o que foi outro grande
desafio para o OSP. A principal proposta de mudança se concentrou num eixo de
complexidade crescente que criava, do 4º ao 8º período, as Clínicas Integradas de
Atenção Primária I, II, III e V (intramuros) e a IV (extramuros, na Barragem Santa Lúcia).
No 8º período criou-se também o Estágio Supervisionado em Odontologia, com prática
em Unidades Básicas de Saúde da Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte,
trabalho clínico compartilhado com as equipes de saúde bucal. Todas essas disciplinas
tinham caráter interdepartamental com professores do quadro já existente na FOUFMG.
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A proposta nova fazia uma hierarquização das disciplinas tal como no modelo proposto
pelo SUS – Atenção Primária, Secundária e Terciária. Nesse sentido, um dos
elementos estruturais importantes foi a articulação do ensino de graduação com um
sistema de atenção à saúde organizado por níveis de referência, ou seja, clínicas que
acolhem o paciente e orientam o cuidado à saúde de acordo com suas necessidades,
sendo eliminada a triagem do paciente segundo as necessidades das disciplinas, como
acontecia no currículo anterior. O aluno tem, então, condição de considerar o paciente
na sua totalidade e, assim, compreender melhor os determinantes sociais da saúde. A
abordagem passa a ser desde o diagnóstico e tratamento até a manutenção preventiva.
Implantar a CIAP I foi muito difícil. Para cumprir a carga horária teórica e prática
foi necessário que a Congregação da Faculdade estabelecesse um mínimo de 15 horas
de aula frente aluno para todos os professores com regime de 40 horas. Outra decisão
foi que todos os docentes de todos os departamentos, para completarem as 15 horas,
seriam incluídos nas CIAP, pois se tratava de novas disciplinas e não seria possível,
naquele momento, abrir vagas para novos professores.
Isso solucionou em parte o problema, mas terminou por criar novos. Vários
professores do Departamento de Clínica, Patologia e Cirurgia Odontológica (CPC)
foram lotados nas CIAP, onde seriam executados procedimentos diversos, como
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Além dessa questão dos docentes nas aulas práticas, os alunos da CIAP I se
encontravam no 4º período, portanto, não haviam tido nenhuma experiência clínica,
somente conteúdos de restaurações plásticas realizados em manequim. Isso acarretou
um conteúdo teórico denso (90 horas) impossível de ser totalmente contemplado antes
de o aluno ir para as aulas práticas. Logo, a primeira providência foi estabelecer que o
público-alvo dessa Clínica seria o adolescente, que, pelo menos teoricamente, tinha
necessidades menos acumuladas e menos complexas do que um adulto.
vezes era impossível ter um cronograma coerente, com conteúdos sequenciais. Essa
etapa era sempre muito estressante e demandava muita calma e paciência para ser
resolvida.
Outra iniciativa importante da CIAP I foi propiciar aos alunos visitas às Unidades
Básicas de Saúde que encaminhavam os pacientes adolescentes para tratamento na
Faculdade, dentro do convênio com o SUS-BH. Essa visita tinha como objetivo fazer os
alunos compreender o contexto de vida dos seus pacientes, para melhor entender o
processo saúde-doença, e assim estabelecer um planejamento coerente para cada um
deles.
A CIAP IV, clínica extramuros, continuou com o trabalho que já realizava, porém,
a disciplina de CIAP V precisou ser criada e implantada. Auxiliei a professora Maria
Elisa de Souza e Silva (Departamento de Odontologia Restauradora, ODR) nessa
empreitada. Nessa disciplina, os alunos prestavam atendimento clínico a pacientes
adultos com maiores necessidades e faziam a “manutenção preventiva” de todos os
pacientes da Atenção Primária da Faculdade.
busca de um caminho semelhante para todas. Nesse sentido, foram criados diversos
protocolos: diagnóstico e decisão de tratamento da cárie dentária, diagnóstico e
tratamento da doença periodontal na Atenção Primária, planejamento do tratamento
dos pacientes, entre muitos outros. Foi um momento muito rico de integração dos
diversos conteúdos e dos professores. Acredito ter sido a fase de mais integração dos
departamentos que já vivemos na Faculdade.
FOUFMG. Podemos citar, por exemplo, professor Ênio Vilaça (UFMG), professor Mauro
Henrique Abreu (UFMG), professor Luís Cota (UFMG), professora Tarcília Aparecida da
Silva (UFMG) e professora Santuza Mendonça (Centro Universitário Newton Paiva). Os
alunos eram estimulados também a publicarem artigos de seus trabalhos, o que de fato
ocorreu em muitos casos. Posso citar, por exemplo, o meu bolsista PIBIC Gustavo
Assis de Paula, que publicou o artigo intitulado “Avaliação de metodologia de higiene
bucal”. Outra aluna, Ana Carmelina Freitas Goulart, bolsista PAD, ganhou o Prêmio
Kolynos, concurso que premiava o melhor trabalho de Iniciação Científica do ano na
Faculdade com um consultório odontológico, com o trabalho intitulado “Percepção dos
deficientes visuais sobre saúde Bucal”. Mariana Ruas, monitora de graduação orientada
por mim, também recebeu esse prêmio. Alguns alunos monitores de disciplinas também
foram convidados a participar desse grupo e muitos desenvolveram excelentes
trabalhos.
Não posso deixar de realçar aqui o muito que aprendi com as professoras
Helena Paixão e Isabela Pordeus a partir da formação desse grupo de pesquisa. Foi ele
que me estimulou a fazer o doutorado na área de Epidemiologia na Escola de
Veterinária da UFMG, conforme mencionei no capítulo anterior sobre minha formação
acadêmica.
E posso afirmar, com toda certeza, que minha vida acadêmica mudou
completamente após o doutoramento, pois passei a me envolver como docente na pós-
graduação stricto sensu da Faculdade, primeiramente no mestrado e depois no
doutorado, na área de Saúde Coletiva.
seguida e, desde seu início, participo das disciplinas obrigatórias Pesquisa em Saúde
Coletiva I e II. A primeira, que também coordeno, apresenta conteúdo sobre
metodologia qualitativa e a segunda, sobre estudos epidemiológicos. Em ambas as
disciplinas, conto com a parceria da professora Efigênia Ferreira e Ferreira.
e Preventiva pela segunda vez, sendo a chefe, nessa ocasião, a professora Elza Maria
Araújo Conceição. Permaneci um mandato, até 2007. Professora Elza sempre foi
proativa na solução de problemas e conseguiu implementar no OSP um ambiente
acolhedor e organizado. Foi muito bom participar dessa gestão, que me preparou para
o desafio que viria logo em seguida na minha vida acadêmica: assumir a vice-diretoria
da Faculdade.
A disciplina de Ações Coletivas III, que também coordeno, tem como conteúdo a
promoção de saúde em idosos institucionalizados. Sua parte teórica é realizada pela
Plataforma Moodle, que apresenta textos para leitura, estudos dirigidos, fóruns de
discussão, local para postagens de políticas e programas para a terceira idade. A parte
prática é realizada em Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPI), entidades
filantrópicas que mantêm convênio com a Prefeitura de Belo Horizonte. Os alunos têm
um primeiro momento de reconhecimento do campo de trabalho e diagnóstico, realizam
um planejamento das atividades, discutem com a coordenação da ILPI sobre a
proposta e, por fim, realizam pelo menos três atividades coletivas com os idosos. Tais
atividades não necessariamente são em relação à saúde bucal, embora esta também
possa ser abordada. Essa disciplina é do 10º período do curso e, em minha opinião,
mal situada, pois alunos estão quase se formando e, portanto, mais preocupados com
questões relacionadas à formatura, disciplina de Internato Rural e Emergência, clínicas.
No entanto, como se trata de um público que eles ainda não tiveram contato durante o
curso, ao final, todos têm uma ótima avaliação da disciplina, com relatos muito
interessantes das atividades em um seminário final.
A disciplina de TCC II, 6º período, funciona quase que totalmente a distância, via
plataforma Moodle. O objetivo é que o aluno construa o projeto de pesquisa do seu
TCC. A supervisão do orientador é importante, fundamental, mas quem acompanha
todo o processo são os professores tutores. A disciplina conta com pelo menos dois
momentos presenciais e, ao final, os alunos precisam apresentar seus projetos para
uma banca de professores. Fiquei nessa disciplina também até 2016.
Um dos principais problemas era que a maioria do corpo docente não tinha tido
experiência anterior com a pós-graduação stricto sensu, sobretudo em relação às suas
normas e exigências, como a necessidade de publicação em periódicos indexados.
Nesse sentido, fizemos a proposta de designar comissões para a solução de alguns
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desses problemas. Assim, cada dois ou três professores ficaram responsáveis por um
dos itens.
A primeira linha tem a ver com a área do meu doutorado, Epidemiologia, e inclui
o estudo sobre as doenças bucais e distribuição nas populações e seus determinantes
sociais. Meu estudo de doutorado, Políticas Públicas e qualidade de vida: um estudo
epidemiológico sobre a perda dentária, utilizou-se de metodologia qualitativa sobre a
percepção da perda dentária, tema muito relevante que possibilitou uma publicação na
Revista Ciência & Saúde Coletiva que, como já destaquei, teve 113 citações desde
2005, segundo o Google Scholar (GS).
Este estudo foi realizado numa época não muito distante, em que o serviço
público oferecido para a saúde bucal nos municípios se restringia à Atenção Primária,
para a faixa etária até 14 anos e gestantes. Os demais, quando tinham necessidades
que incluíam tratamento endodôntico ou periodontal, precisavam procurar o serviço
privado, não acessível para a grande maioria. Isso acarretava quase sempre a
exodontia de elementos que poderiam ser conservados, causando um edentulismo
precoce. Como ainda não havia o programa Brasil Sorridente (2004), que trouxe a
possibilidade da oferta à prótese nos serviços, os pacientes precisavam procurar
também pelo serviço privado para a reabilitação. Muitos permaneciam desdentados e,
consequentemente, com problemas na convivência social, na busca de trabalho e
também funcionais (mastigação).
fluorose dentária elaborada por mães e jovens acometidos, e Thalita Tyrsa de Almeida
Santa Rosa, doutoranda que coorientei na pesquisa Tratamento restaurador estético e
qualidade de vida de pacientes com fluorose grave na Região Norte de Minas Gerais:
um estudo longitudinal. O projeto foi muito importante porque levantou que em 22
cidades do norte de Minas Gerais, onde há seca constante, muitas cisternas foram
abertas, inclusive pelo poder público, e a água não foi examinada para o teor de flúor.
Isso resultou em fluorose endêmica grave na região, com deformidades dentárias
extensas. Não houve, também, tentativa de restauração dos elementos dentais pelo
serviço público, causando graves problemas para aquela população. O grupo da
Geologia iniciava o trabalho colhendo material das águas profundas, enquanto o da
Odontologia examinava as crianças dessas áreas. Ao final, uma proposta de
restauração de dentes anteriores foi realizada e a avaliação mostrou que o êxito foi
total. Esse trabalho está sendo monitorado até os dias de hoje.
Outro projeto que considero muito relevante dentro dessa primeira linha de
pesquisa é o “Violência e saúde no idoso”, em parceria com o grupo de pesquisa
Violência e Saúde da Faculdade de Medicina da UFMG, tendo um aluno de doutorado
meu envolvido, Paulo Henrique Maia. O objetivo desse estudo transversal realizado na
cidade de Betim foi analisar a situação de violência do idoso e relacioná-lo com saúde e
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Quero chamar a atenção também para os estudos que tenho realizado com
idosos, especialmente aqueles que se encontram em Instituições de Longa
Permanência para Idosos (ILPI). Temos avaliado de diversas maneiras as próprias ILPI,
assim como a saúde bucal dos idosos. Um aluno de mestrado profissional, Bruno Luís
Carvalho, avaliou as próteses desses idosos e a sua higiene, em sua pesquisa ‘A
prótese dentária em idosos em instituições de longa permanência’. Os resultados
mostraram que as próteses, em geral, são muito antigas, com diversos problemas de
adaptação, e a higiene é mal realizada, causando problemas na mucosa oral. Esse
mesmo aluno está agora cursando doutorado e irá aplicar uma matriz de avaliação de
qualidade das ILPI, construída por outra aluna do mestrado profissional, Aletea Ferreira
Prado de Figueiredo, que cooriento juntamente com a professora Raquel Conceição
Ferreira, em todas as ILPI de Belo Horizonte. Estes estudos com idosos receberam
recursos da Fapemig, advindos do Edital Universal em 2017, no qual fui contemplada.
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Não posso deixar de citar ainda o estudo de Alex Herval, meu aluno de
doutorado, que está realizando uma intervenção com gestantes primíparas de
Uberlândia, MG, onde as atividades de educação são realizadas por pares, com outras
mães ou avós da comunidade, treinadas e qualificadas por ele. A hipótese é que o
aconselhamento sobre atitudes com o bebê vindo de pessoas mais próximas seja mais
eficiente do que a realizada pelos profissionais da UBS. Para avaliar, ele está usando
um questionário de letramento em saúde antes e após a intervenção.
conseguido fazer tudo isso e tenho grande apreço e reconhecimento por todas.
Nos últimos anos, o OSP conseguiu ampliar seu corpo docente, recebendo
vagas de expansão do quadro, tendo em vista as atividades e a produção de seus
professores. Percebe-se que está havendo uma consolidação da pesquisa no
Departamento e que o mestrado profissional foi a grande mola propulsora, apontando o
acerto do OSP na sua criação.
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6 A PRODUÇÃO CIENTÍFICA
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- Ageing, Gender and Quality of life (AGEQOL) study: factors associated with
good quality of life in older Brazilian community-dwelling adults, publicado em
2014 na revista Quality of Life Outcomes, trata-se de um estudo realizado pela
aluna Ana Cristina Viana Campos, a qual coorientei, junto com a professora
Efigênia Ferreira e Ferreira, e que realizou doutorado sanduíche no Chile com a
professora Celina Albala. Este artigo já foi citado 45 vezes (GS);
- Use of public oral health services by the adult population: a multilevel analysis,
artigo produzido no doutorado da minha orientanda Rafaela Silveira Pinho,
publicado na revista Plos One, 2016, com 7 citações (GS);
Além dos artigos, alguns manuais e capítulos também fazem parte da minha produção,
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A produção técnica é também muito importante, uma vez que sou coordenadora e
professora do Mestrado Profissional em Saúde Pública. Posso destacar as seguintes
publicações nessa área:
7 A EXTENSÃO
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O OSP sempre teve uma vocação para a Extensão em razão dos seus
conteúdos, e isso é notório, uma vez que tivemos dois professores pró-reitores da
UFMG: professor Renato Quintino e professora Efigênia Ferreira e Ferreira. Ao entrar
para a universidade, já percebia essa tendência do Departamento, embora, naquela
época, o CENEX (Centro de Extensão) da Faculdade ainda fosse muito incipiente,
responsável quase somente por cursos de atualização. Mais tarde, o CENEX assumiu o
protagonismo das ações, cresceu muito e, não à toa, hoje é modelo na UFMG.
8 A ADMINISTRAÇÃO
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Isso tudo foi possível por meio de um projeto submetido ao Pró-Saúde, programa
do Ministério da Saúde, no qual a Faculdade foi contemplada e recebeu financiamento
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Durante esse processo verificamos, também, que os alunos não anotavam todos
os procedimentos que realizavam nas clínicas e foi aí que sentimos a necessidade de
informatizar o CASEU. Ganhamos os computadores (Pró-Saúde) e encomendamos o
programa necessário. Além disso, conversamos com todos os alunos, turma por turma,
explicando a necessidade de cooperação deles. Ao final de seis meses, já tínhamos um
resultado bem melhor. Ainda assim, percebia-se que havia pouco envolvimento de
alguns professores, principalmente das clínicas especializadas, que se preocupavam
muito com que o aluno fizesse o procedimento correto, mas não com o preenchimento
completo das fichas clínicas e com a anotação dos procedimentos realizados.
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Com mais de 50 membros, todos podiam manifestar sobre todos os assuntos colocados
em pauta. Isso tornava as reuniões muito difíceis porque muitas vezes as pessoas
pediam a palavra apenas para repetir o que outras já tinham falado. Assim, as reuniões
se estendiam por até cinco horas, às vezes mais. Mesmo havendo tempo para a
manifestação de todos, muitos não obedeciam às regras, principalmente os
professores, que, de modo geral, gostam muito de falar. Portanto, a pauta quase
sempre não se cumpria e muita coisa que precisava ser resolvida rapidamente ficava
para o próximo encontro. O sentimento de tempo perdido era enorme. A falta de
objetividade dos professores me incomodou o tempo todo. Mas, não posso negar, vivi
alguns momentos muito importantes para a UFMG nesse Conselho, por exemplo,
quando se decidiu adotar cotas para o ingresso de alunos que se declarassem negros
quando do exame de vestibular. Nilma Lino Gomes, professora da FaE, fez uma
exposição belíssima e contundente sobre a questão dos pobres brasileiros e mostrou
que, entre estes, os negros são os que têm uma situação pior. Foi uma discussão
intensa e emocionante que me fez compreender melhor a importância do Conselho
Universitário.
Logo depois de adotar cotas para negros que estudaram em escolas públicas, a
UFMG começou a discutir a entrada especial de estudantes indígenas a pedido do
Ministério da Educação. As lideranças indígenas solicitavam vagas para os cursos nas
áreas da Saúde, Educação e Direito. As unidades deveriam apreciar o projeto e definir
nas Congregações se aceitariam os alunos. Para a reunião da Congregação,
convidamos a professora responsável pelo projeto para expor a questão e, em seguida,
abrimos a discussão. Foi preciso defender a proposta de forma vigorosa, o que não nos
furtamos de fazer, e, somente depois de muito argumentar, conseguimos mudar o rumo
da discussão para uma postura mais favorável dos professores, que, a meu ver, tinham
uma visão muito estreita dessa iniciativa. Estavam preocupados com o nível dos alunos,
se conseguiriam acompanhar o curso, eram contrários à entrada com critérios especiais
sem o vestibular tradicional e outras questões que eu já considerava menos
importantes. Ao final, conseguimos aprovar a entrada de dois indígenas por semestre, o
que ocorre ainda nos dias de hoje, alguns inclusive já se graduaram. A experiência tem
sido interessante para a Faculdade, que tomou conhecimento desse universo
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anteriormente ignorado, mas difícil para os indígenas que moram longe de suas
famílias, têm dificuldade de adaptação na cidade grande, precisam estudar muito para
conseguir acompanhar as disciplinas e muitas vezes as repetem várias vezes. A
convivência com os colegas também é difícil, algumas vezes são excluídos. Nesse
sentido, a nossa diretoria criou a Comissão de Acompanhamento dos Estudantes
Indígenas (já relatada) para buscar amenizar as questões que se apresentavam, que
incluíam ainda problemas com matrícula, compra de instrumental odontológico, aulas
de reforço, entre muitas outras.
Por tudo, embora incrivelmente difícil e estressante, considero que esse tempo
na diretoria só me fez crescer como profissional, professora e pessoalmente. Meu
conhecimento da universidade ampliou muito. Passei a conhecer melhor os caminhos
da gestão pública, como as diversas unidades acadêmicas solucionavam seus
problemas, muitas vezes comuns. Passei a valorizar, enfim, a importância de participar
dos cargos administrativos, contribuindo para as questões coletivas.
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9 CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Creio que este Memorial destaca o compromisso com a educação nos meus
longos 35 anos de magistério. No decorrer da minha carreira profissional pude exercer
praticamente todas as atividades que se esperam de um professor de nível superior,
quais sejam docência, pesquisa e extensão, além de contribuir com a gestão
universitária.
relações foram sempre pautadas pelo respeito, pela cooperação e pela amizade,
malgrado as diferenças.
Isto posto, creio que alcancei o objetivo do Memorial Acadêmico e percebo que
também dei maior sentido à minha carreira acadêmica. Sinto-me gratificada e feliz ao
encerrar esse processo, pois, após “revivenciar” minha trajetória, tenho certeza de que
pude contribuir muito para a sociedade com o meu trabalho na Faculdade de
Odontologia.
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REFERÊNCIAS
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