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Soluções • Caderno Poetas contemporâneos

Como se faz o poema” / “Chuva” (pp. 6-7)


Leitura | Compreensão
1.1. Em “Como se faz o poema”, a arte poética é apresentada como um ato simples e sem requintes
nem fórmulas (vv. 2-3), metaforicamente identificado com o ato de apanhar e de cuidar de uma flor (vv.
3-4). No poema “Chuva”, a poesia é vista como um reflexo do mundo exterior e a sua concretização
corresponde a uma ação natural, como outras apresentadas na composição, decorrente da chuva (vv.
9-13 e 15-18).

“Convívio” (p. 8)
Leitura | Compreensão
1. Contribuem para o carácter narrativo do poema a breve história do quotidiano apresentada (ação), a
existência de personagens (o sujeito poético e a “mulher da caixa”, v. 1), a localização temporal (“num
fim de tarde”, v. 6) e espacial (o estabelecimento comercial, o “café”, v. 7, e a “rua”, v. 8). Junta-se a
estes elementos o verso longo utilizado na construção da composição, que lhe confere um tom
prosaico.
2. O sujeito poético, em solidão e curiosidade, encontra-se num café e vê (v. 7), do outro lado da rua,
num estabelecimento comercial, a “mulher da caixa”, que descreve, concentrada no seu trabalho (“faz
contas de cabeça”, v. 2) e fechada sobre si mesma (“talvez não olhe para / fora para que o seu olhar
não se cruze com o de / alguém como eu”, vv. 15-17).
3. O “eu” poético sente-se diferente das restantes pessoas que enchem o “café” por considerar que
está verdadeiramente ocupado (“olho para a neve / e para a mulher da caixa, e […] vou fazendo contas
na cabeça dela”, vv. 21-23), ao contrário dos outros que se sentam, em silêncio, e fingem ler o jornal
“para justificar / não estarem a fazer nada” (vv. 20-21).
Gramática
1. Oração subordinada substantiva completiva com a função sintática de sujeito.
“Relendo Camões” (p. 9)
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1. A modalidade de intertextualidade é a alusão.
1.1. Trate-se da alusão ao soneto de Camões “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades” e a essa
temática explorada pelo poeta renascentista, de que esta composição, com o mesmo tema – mudança
– pretende ser uma continuação (“Vejo ainda coisas por dizer”, v. 1).
2. As frases transmitem a ideia de que a mudança é contínua.
3. A conjunção adversativa “mas”, no início do verso 5, marca a oposição relativamente ao expresso na
frase anterior. O sujeito poético, depois de referir a possibilidade de se poder ser o que se quiser, se o
tempo o permitir (vv. 3-4), estabelece uma ideia que se lhe opõe: isto não acontecerá se não souber
efetuar as transformação necessárias através do “desejo” (v. 6).
4. O amor será a única razão que poderá impedir a mudança.
Gramática
1. Oração subordinada substantiva relativa.
2.1. Valor de probabilidade.

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2.2. Coesão referencial.
2.3. “se o tempo o deixar” – Modificador.

“Imagem do mundo” (p. 10)


Escrita
1. Texto pessoal, respeitando as marcas do género.

Jorge de Sena
“Para o aniversário do poeta” (p. 12)
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1. (D). A imortalidade do poeta (vv. 1-3).
2. A apóstrofe ao “Poeta” e o uso da 2.ª pessoa conferem ao texto um tom coloquial, que instaura a
proximidade e a intimidade entre o sujeito poético e o destinatário das suas palavras, poeta, como ele
próprio.
3. Presente: “Não passam… os anos sobre ti” (v. 1). Futuro: “viverás longe daqui” (v. 3); “deixarás
sinais” (v. 4); “te encontrar’s” (v. 6).
4. “No tempo”, o poeta terá uma outra vida, longe do mundo real conhecido; “no espaço”, na realidade
em que se move, deixará sinais da sua presença, deixará a sua poesia e o rasto da sua memória.
5. Eufemismo. Os versos remetem para o futuro do poeta, referindo a morte através de expressões que
a suavizam: “campos silenciosos” e “nas ondas dos trigais”.
6. O último verso remete para a dimensão única do poeta, diferente, pela imortalidade, dos outros
homens.
Gramática
1.1. (B). 1.2. (D). 1.3. (A).
“Os trabalhos e os dias” (p. 14)
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1. O tema da composição é a arte poética ou a relação do poeta com a sua produção artística e com o
mundo.
2. Com base na comparação, a primeira estrofe constitui uma afirmação da arte poética e do ofício
poético. A mesa de trabalho do poeta adquire uma condição de universalidade partilhada e a escrita é
aproximada da respiração permanente do amor e da vida.
3. O “espanto” do sujeito poético advém do reconhecimento das potencialidades da escrita, da poesia
(“Na mínima coisa que sou, pôde a poesia ser hábito”, v. 7), na sua influência sobre o mundo, ainda
que as suas palavras tenham já sido ditas, tenham já outras concretizações poéticas anteriores.
4. Metáfora. O sujeito poético encontra-se preso ao seu ofício poético e à comunhão com os homens.
5. “principiei a escrever no princípio do mundo” (v. 13) – testemunho e ação universal; “desenhei uma
rena para caçar melhor” (v. 14) – forma de facilitar a ação da poesia; “falo da verdade, essa iguaria
rara” (v. 15) – sinceridade do poeta, relacionada com a função utilitária da ação poética.
6. No último verso, em articulação com a verdade reclamada no anterior, o sujeito poético aponta para
a sua própria aprendizagem, numa ação de reciprocidade, em função da relação que estabelece entre

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a sua poesia e o mundo (“como se a mesa fosse o mundo inteiro”, v. 1), numa visão da poesia
enquanto conhecimento e experiência e enquanto transmissão de ambos.
Gramática
1. a. Sujeito. b. Modificador restritivo do nome. c. Modificador apositivo do nome.
“Os paraísos artificiais” (p. 15)
Leitura | Compreensão
1.1. O texto desenvolve-se com base na referência ao que não existe na “terra” do sujeito poético, em
confronto com o que existe (“não há terra, há ruas”, v. 1; “não há árvores nem flores”, v. 4; “As flores
[…] mudam ao mês”, v. 5; “não há cânticos, / mas só canários de 3.º andar e papagaios de 5.º”, vv. 7-
8).
2. A anáfora (“Na minha terra”, vv. 1, 4, 10), reforçada pela repetição do constituinte “A minha terra” (vv.
13 e 14), intensifica a identificação do sujeito poético com o seu lugar de origem, pelo uso do deítico
pessoal (“minha”), deixando transparecer nas suas afirmações uma intencionalidade crítica muito
significativa.
3.1. O conector “porém” marca uma oposição relativamente ao que anteriormente foi expresso. Depois
da afirmação do verso anterior, “E a música do vento é frio nos pardieiros” (v. 9), o sujeito poético
parece negar, ironicamente, a existência de pardieiros na sua terra, apontando-os a locais distantes
(“Pérsia” e “China”) ou “inefáveis”.
3.2. O adjetivo “inefável” significa “que não se pode exprimir por palavras; deslumbrante, delicioso,
encantador”. Parece existir nesta repetição um jogo de palavras entre a ideia do que não pode ser dito
por não haver palavras para o exprimir, pelo seu carácter positivo, e a ideia do que não pode ser dito
por não ser permitido dizer, pelo contexto político repressivo da ditadura.
4. A organização do poema em torno da inexistência e da existência, da negação e da afirmação, do
que se diz e do que pode ser dito constrói no poema o “paraíso artificial” que é a “terra” do sujeito
poético.
“Humanidade” (p. 16)
Leitura | Compreensão
1. Uma “tarde calma e fria” (v. 1) com “nuvens quase nada rubras” (v. 3) e “névoa” (v. 4), ao cair da
noite que “queima tão depressa” (v. 8) a “verdura fugitiva” (v. 7).
1.1. As sensações representadas são tácteis (“tarde […] fria”, v. 1) e visuais (“olhando as nuvens quase
rubras / e a névoa”, vv. 3-4; “e olhando uma verdura fugitiva”, v. 7).
2.1. Depois de um conjunto de versos de descrição do ambiente, marcada pelas sensações do sujeito
poético, o verso 9 inicia a afirmação repetida do esquecimento (“esqueço-me”) e da menção às
realidades esquecidas. Porém, quem esquece, objetivamente, não se lembra ou não consciencializa o
objeto do esquecimento. Este ato corresponde exatamente ao seu contrário, corresponde a um ato de
memória.
3. Os aspetos esquecidos pelo sujeito poético, a “gente” (v. 9), a “esperança” (v. 12), os “homens” (v.
14), que a renovam, “ouvir cheirar a Terra” (v. 16) e a vida, representam a sua visão da humanidade ou
a sua humanidade.
4. a. Metáfora. Nos versos, refere-se o “fumo da vida”, aquilo que se liberta da combustão da vida
humana “que trabalha e teima” e que ascende ao céu, que atinge a sublimação, ao contrário da
“névoa” que, por não ser resultado da vida, apenas é “consentida pelos montes”. b. Sinestesia. A
mistura de sensações (“ouvir cheirar”), na sua afirmação de esquecimento que é, simultaneamente,
memória, reforça a ligação do sujeito poético à Terra e às sensações que nele desperta. c. Anáfora. A

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repetição da forma verbal na primeira pessoa do singular reforça a aparente negação memorial do
sujeito poético.
5. A última frase, “E anoitece”, corresponde a uma conclusão do poema e do esvaziamento memorial
do sujeito poético. A noite “que queima tão depressa” (v. 8) a “verdura fugitiva” (v. 7) parece queimar
também a memória do “eu” poético.

“Ode para o futuro” (p. 17)

Leitura | Compreensão
1. O poema organiza-se em três partes. Nas duas primeiras estrofes, o sujeito poético aponta para o
futuro, eventualmente após o seu desaparecimento, momento em que os seus interlocutores falarão do
seu tempo como de um “sonho” passado (vv. 1 e 8-9), marcado por características positivas (vv. 2-7). A
segunda parte, que se inicia com a conjunção coordenativa copulativa “E” (v. 10) e ocupa a terceira
estrofe, apresenta os aspetos mais negativos do tempo em que vive (vv. 10-17), que suscitarão uma
mera “angústia melancólica” (v. 17) no futuro, tempo em que, com alguma indiferença face ao passado,
se desejará uma “idade de oiro” (v. 18). O momento final, que corresponde ao dístico com que termina
a composição, retoma, no verso 20, o verso inicial – “falareis de nós como de um sonho” – num fechar
de ciclo que recupera a ideia de que, no futuro, o tempo anterior adquirirá uma dimensão onírica e será
entrevisto, na sua complexidade, quase como se nunca tivesse existido como existiu.
2. A composição inicia-se e termina com a comparação: “Falareis de nós como de um sonho”, v. 1;
“falareis de nós – de nós! – como de um sonho”, v. 20. O sujeito poético reforça o facto de, no futuro, o
seu tempo vir a ser objeto de análise (“Falareis de nós…”).
3. Face à lembrança do passado disfórico, a “idade de oiro” representa e sugere um tempo diferente,
áureo e próspero.
4. O título do poema aponta para uma composição poética, a ode, cultivada, segundo os modelos
clássicos, desde o Renascimento, que se caracteriza pela eloquência, pela solenidade e pela elevação
de estilo. Ao retomar o género, o poeta recupera uma forma poética da tradição literária para o
tratamento da relação futura dos seus interlocutores com a sua memória.
“Cabeça Grande” (p. 18)
Escrita
1. Texto pessoal, respeitando as marcas do género.

Alexandre O’Neill
“Albertina” ou “O inseto-insulto” … (pp. 20-21)
Leitura | Compreensão
1. O título do poema está relacionado com o assunto desenvolvido: a criação poética e a inspiração. No
“quotidiano” do poeta, a sua fonte de inspiração, a sua musa é a mosca “Albertina” (v. 12), “O inseto-
insulto” (v. 13) que o atormenta.
2. O poeta apresenta-se, no início do poema, em solidão e em espera, numa descrição humorística e
desconstrutiva (vv. 2 a 7), e inseguro relativamente à sua ação (vv. 9-11). E é no debate com a
inspiração que “A mosca Albertina” surge e a composição poética se desenvolve.
3. O poema representa uma arte poética invulgar, uma vez que o ato de criação poética é
aparentemente banalizado e vulgarizado, quer pela atitude do poeta quer pela forma como encara a
inspiração – “A mosca Albertina”, “um inseto-insulto”.

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“Bom e expressivo” (p. 22)
Leitura | Compreensão
1. O poema pode ser dividido em duas partes. Na primeira, dos versos 1 a 17, o sujeito poético sugere
aquilo que a poesia não deve ser: algo apenas “bonito” (v. 4), com recurso excessivo a jogos formais,
como as “rimas” (v. 5). Na segunda parte, introduzida pelo conector “Mas” (v. 18), o ”eu” lírico torna o
seu discurso menos radical e admite o recurso à rima, já que “a regra é não haver regra” (v. 20), “a não
ser a de cada um” (v. 21), na construção poética. A conclusão do texto, expressa essencialmente nos
dois últimos versos, anuncia aquilo que o poeta deve procurar alcançar, isto é, o poema “bom e
expressivo” (v. 24), sugerindo que a beleza estilística e formal não deve sobrepor-se à expressividade
da mensagem.
2. Através da metáfora e da ironia presentes no verso 7 (“são o pão de ló dos tolos”), o sujeito poético
critica os que apenas valorizam um poema em função da presença de rima. A personificação, mais
uma vez associada à ironia, em “Vai-me a essas rimas […] / e torce-lhes o pescoço.” (vv. 5 e 8),
intensifica o repúdio do sujeito poético face ao constrangimento formal que a rima constitui e à sua
assunção enquanto critério determinante da qualidade de um poema.
3. O poema é constituído por seis quadras de versos que seguem a tradição literária portuguesa ao
nível da métrica, pois são heptassilábicos (redondilha maior). Em termos de rima, ainda que alguns
versos coincidam nos sons finais, eles são essencialmente soltos ou brancos, não se desenvolvendo
um esquema rimático fixo e regular.

“Homem” (p. 23)


Leitura | Compreensão
1. As palavras são adjetivos.
1.1. Os adjetivos permitem caracterizar o Homem (ser humano), objeto de análise neste texto.
2. Trata-se de um texto de carácter lírico, uma vez que o assunto do poema é apresentado de acordo
com o ponto de vista subjetivo do seu autor e a sua leitura permite também interpretações distintas e
pessoais.
2.1. Este poema não apresenta as marcas habituais da poesia, pois não se encontra organizado em
versos e estrofes e não apresenta rima.
3. Resposta pessoal.
“Guichê / 1” (p. 24)
Leitura | Compreensão
1. A ironia nos seis primeiros versos resulta do facto de o sujeito poético assumir que prefere a
ineficácia dos funcionários públicos a ter a expectativa de que o sistema funcione.
1.1. O facto de o sujeito poético aceitar esta situação faz com que ele sinta o desconforto próprio de
quem tem de estar muitas horas em pé para ser atendido. (v. 7).
2. A verificar-se a hipótese levantada pelo sujeito poético, e face ao insólito da situação de ser
imediatamente atendido, ele apenas conseguiria resmungar e não produzir um discurso coerente, pois
já está habituado a aceitar os incómodos da espera. Subentende-se que, caso as coisas funcionassem,
isso causaria o seu descontentamento. Daí a razão para reclamar.
3. As referências à “paciência” e à “doçura” necessárias face ao “burocrata” que “destrabalha” ironizam
sobre a forma lenta como cumpre as suas obrigações.

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4. Deve começar por se observar o “globo que pende do teto” (v. 19), seguidamente olhar a “mosca
dos tinteiros” (v. 21), depois atentar no “calendário mural” (v. 23) afixado numa parede e, finalmente,
examinar o “calendário perpétuo parado um mês atrás” (v. 26), pendurado noutra parede.
5. A anáfora e o paralelismo revelam, ironicamente, a forma pouco dedicada com que os burocratas se
envolvem nas tarefas do seu quotidiano.
6. Resposta pessoal, salientando a ideia de que os “burocratas” só trabalham sob (aparente) ameaça.

Gramática
1.1. (C). 1.2. (B). 1.3. (B).
2. “o mantenedor do calendário em dia” (v. 29).
“O Macaco (Valsa lisboeta)” (p. 26)
Escrita
1. Texto pessoal, respeitando as marcas do género.

António Ramos Rosa


“Poema” (p. 29)
Leitura | Compreensão
1. Os adjetivos da primeira estrofe encontram-se no grau superlativo relativo de superioridade (“As
palavras mais nuas / as mais tristes. / As palavras mais pobres”) e remetem para o grau superior de
pureza, de simplicidade e para o sentimento máximo da poesia que o sujeito poético procura.
2. Após a apresentação das palavras poéticas, da primeira estrofe, o sujeito poético questiona-se sobre
qual será a “alegria” e o “outro dia” que elas desejam (“sonham”), ou seja, em que poema quererão
figurar, e a quem transmitem o seu verdadeiro brilho.
3. A poesia é apresentada como a arte de procurar o lugar certo para as palavras mais puras ( “as
palavras nuas que o silêncio veste”, v. 12), numa aspiração da perfeição poética, metaforicamente
representada na última estrofe: a poesia enquanto “alegria nova” (v. 14), “a multidão dos pássaros
escondidos / a densidade das folhas, o silêncio / e um céu azul e fresco” (vv. 18-20).
4. O título do poema assume-se como a síntese absoluta da realidade cuja constituição o sujeito
poético descreve ao longo do poema.
Gramática
1. Oração subordinada adjetiva relativa restritiva.

“Todo aquele que abre um livro” (p. 30)


Leitura | Compreensão
1. O livro é apresentado numa dimensão sublime, etérea (“nuvem”, l. 1; “que jamais […] se dissipa”, v.
14), de perfeição absorvente (“redondo como uma serpente enrolada”, v. 7) e vibrante de vida
(“formado de fragmentos onde lateja o sangue de um pulso”, v. 8).
2. Com a caracterização do livro através do adjetivo “redondo” (v. 7), o sujeito poético parece querer
transmitir uma ideia de perfeição, de plenitude e, com a comparação com “uma serpente enrolada” (v.

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7), de sabedoria, de renovação ou de eternidade – algumas das simbologias mais positivas da
serpente. Os versos 8 a 10 abordam a formação do livro, atribuindo aos seus fragmentos uma vida
intrínseca (“onde lateja o sangue”) cuja origem é anterior ao próprio autor (“já não é de um autor que
nunca o foi”, v. 9) e que corresponde a um ritmo de nascimento constante (“será sempre o ritmo do que
está a nascer”, v. 10).
3. No verso 22, o sujeito poético representa a palavra poética na sua ambivalência de ação, vibrante ou
suave; no verso 29, define a ação poética, pura e imprecisa, um “movimento ingénuo sonâmbulo e
incerto”, na procura da palavra, “o alvo puro” (v. 28).

“O funcionário cansado” (p. 31)


Leitura | Compreensão
1. A repetição da expressão “num quarto só” intensifica os sentimentos de solidão, de isolamento e de
opressão do sujeito poético. Na primeira parte do texto, a expressão assume uma função mais intensa
(“num quarto só num quarto só”, v. 7), sendo retomada no último verso, marcando definitivamente, com
grande destaque, a solidão do “eu” poético.
2. No verso 17, o sujeito poético refere a represália que sofreu por parte do “chefe” por não estar
concentrado no seu trabalho – viu valor debitado da sua “conta de empregado”. O “eu” poético
representa o seu dilema de vida, enquanto “funcionário” e enquanto poeta, demonstrando o seu
desconforto na primeira função quotidiana (“Sou um funcionário apagado / um funcionário triste”, vv.
10-11; “a minha alma não acompanha a minha mão”, v. 12; “Sou um funcionário cansado”, v. 18) e a
sobreposição que a segunda impõe (“a minha alma não dança com os números / tento escondê-la
envergonhado”, v. 14-15; “o chefe apanhou-me com o olho lírico”, v. 16; “Porque me sinto
irremediavelmente perdido no meu cansaço”, v. 20).
3. Com a metáfora do verso 1 – “A noite trocou-me os sonhos e as mãos” – é atribuída à noite uma
ação direta que provoca confusão no sujeito poético, uma desordem entre o seu interior e a ação
poética. Através da hipérbole do verso 27 – “todas as noites do mundo uma só noite comprida” – a
“noite comprida” de solidão e sofrimento do sujeito poético surge ampliada na associação a “todas as
noite do mundo”, intensificando-se, desta forma, os sentimentos do “eu” poético. A composição inicia-
se com a ação metafórica da noite, comprovando-se os seus efeitos de forma mais intensa no final.

“Há uma chama que queima” (pp. 32-33)


Leitura | Compreensão
1. Esta “chama” simboliza um fogo de vida, que arde positivamente “no peito dos amantes” (v. 2) ou
“esmorece […] nos olhos apagados” (v. 3) dos desistentes, dos que “não sabem despedir-se de um
mundo em que brilharam” (v. 4).
2. Na definição de mundo, o sujeito poético identifica-o com “um rumor redondo” para uns (conotação
positiva) e com “um obscuro rumor” para outros (conotação negativa). Na definição, salienta-se a ação
do “rumor” e destaca-se, antiteticamente, a perfeição (“redondo”) e a dimensão sombria (“obscuro”).
3. A primeira concretização do conector (v. 7) introduz um conjunto de reflexões que descrevem o
mundo eufórico, enquanto “rumor redondo” (v. 5), em contraste com “obscuro rumor” (v. 6). A segunda
concretização veicula um contraste disfórico, apresentando “o mundo para outros”, em especificações
do mundo “obscuro rumor” anteriormente referenciado.

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4. a. Antítese. A oposição entre os adjetivos “inteiro” / “redondo” e “estilhaçado” evidencia a dimensão
contrastiva do “mundo”, entre a perfeição e a imperfeição. b. Comparação e metáfora, numa relação de
aproximação da tonalidade do “mundo” – “tão escuro” – a “um pássaro de lama”, um elemento com
conotação negativa.
5. A última frase do texto, no mesmo tom sentencioso, crítico e implicado que se desenvolve na
composição, classifica o mundo de “irrevogável”, definitivo, e definitivamente perdido para os que
ascenderam demasiado alto (“subiram as suas escadas solares”) e se agitam num violento leito de
morte (“sobre um violento leito negro”).
Gramática
1.1. (A). 1.2. (A). 1.3. (C).
2. “Esses já beijaram a lua” – Oração subordinante e coordenada. “quando não era negra” – Oração
subordinada adverbial temporal. “e vogaram em preguiçosos barcos sobre o ouro das ondas” – Oração
coordenada copulativa.
3. “solares”, “violento” e “negro”.

“Este poema é absolutamente desnecessário” (p. 34)


“O meu braço estende-se”
Escrita
1. Texto pessoal, respeitando as marcas do género.

Herberto Helder
“Não toques nos objetos imediatos” (pp. 36-37)
“Laranjas instantâneas”
Leitura | Compreensão
1.1. No primeiro poema, o sujeito poético alerta o leitor para o sofrimento provocado pelos “objetos
imediatos” (v. 1), que queimam, “são loucos” (v. 4), assustadores. Até o seu nome e o facto de se
pronunciarem provoca sofrimento, “A boca fica em chaga” (v. 9). A perspetiva do segundo poema é
distinta, remetendo para a utilidade poética do real (v. 2), apontando as potencialidades da sua
intelectualização, para a imagem mental provocada pelo real.
2.1. O poema remete para uma arte poética de intelectualização do real, não constituindo este,
contudo, o desencadear da ação poética. São as imagens mentais que são verdadeiramente
“Operatórias” (v. 8) e “Enriquecem o ofício” poético.
2.2. O adjetivo “ininterruptas” aponta para a mutabilidade e persistência das imagens mentais, por
oposição à inoperabilidade física dos objetos, que existem imutáveis e sem efeito poético.
2.3. Gradação. Do enriquecimento reiterado das imagens mentais, o sujeito poético evolui para a ideia
de devastação e sofrimento que elas provocam, enquanto “incêndio / quarto a quarto da alma” (vv. 10-
11).

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“O Poema – I” (pp. 38-39)
Leitura | Compreensão
1. O poema cresce, de forma insegura, em desordem, no interior do corpo do sujeito poético (“na
confusão da carne”, v. 2).
1.1. O poema nasce ainda sem palavras, assumindo-se em agitação feroz e estética ainda indefinida,
num movimento comparado ao do sangue, sustento de vida, no interior do ser.
2.1. Se a primeira estrofe remete para o interior do sujeito poético e para o surgimento do poema, a
segunda estrofe aponta para a existência do exterior (“Fora”, vv. 6, 9), para o mundo, positivamente
conotado (“a esplêndida violência / ou os bagos de uva onde nascem / as raízes minúsculas do sol” , vv.
6-8; “os corpos genuínos e inalteráveis”, v. 9; “a grande paz exterior das coisas”, v. 11).
3. Animismo / metáfora. No seguimento da referência à “grande paz exterior das coisas” (v. 11), surge-
nos o animismo apaziguado das folhas que repousam, que sustentam o silêncio (metáfora), numa
imagem de serenidade.
4. Depois da descrição eufórica do mundo exterior, na “hora teatral da posse” (v. 13), o poema cresce e
absorve tudo, assumindo nele os elementos de uma nova existência. E é agora indestrutível e invasor.
5. A anáfora da conjunção coordenativa copulativa “e”, aumentando o ritmo da composição, intensifica
a intenção comunicativa da invasão concretizada pelo poema.
6. O último verso funciona como síntese do assunto desenvolvido. O poema, que cresce “na confusão
da carne” (v. 2), desenvolve-se por si e absorve tudo para uma nova existência, construindo-se contra o
poeta (“a carne”) e contra o mundo e a sua existência temporal (“o tempo”).
7. O poema, composto por cinco estrofes (uma quintilha, duas oitavas e dois monósticos) não
apresenta regularidade métrica ou rimática.
Gramática
1. a. V. b. F – Valor modal de probabilidade. c. F – Sujeito simples; d. V. e. F – Campo lexical de
“mundo”. f. V. g. F – Frase simples que integra um verbo transitivo direto. h. V. i. F – Liga elementos
coordenados. j. V. k. F – Coesão lexical (por repetição).
2.1. Derivação não afixal.

“As musas cegas – VII” (pp. 40-42)


Leitura | Compreensão
1. O sujeito poético identifica-se metaforicamente com uma casa (“desta própria casa que eu sou”, vv.
4-5), a cuja porta bate uma “criança”, a pulsação poética do seu interior que vai sendo referenciada ao
longo da composição.
2. a. A passagem remete para a capacidade de comunicação da “criança”, da poesia inocente e pura
que pulsa em “finas raízes” no corpo do sujeito poético, invadindo-o. b. A recordação da criança dorme
sobre as águas imensas da obscuridade do interior do sujeito poético, sobre o seu lado mais sombrio.
c. Os versos parecem apontar para os momentos de violência do surgimento poético da criança, que
provoca sofrimento no sujeito poético. d. O verso parece dar a entender a iminência comunicativa da
criança, através das palavras do sujeito poético. e. Os versos indiciam o efeito sufocante das
recordações da criança que o “eu” foi e cuja presença recorda.

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3.1. A quinta estrofe inicia-se com a conjunção subordinativa condicional “se”, que entretanto se repete,
introduzindo a hipótese de a “criança” adormecer, de desaparecer. O sujeito poético vai condicionando
a sua existência perante esta situação hipotética.
4. A repetição do imperativo “escuta” parece ser uma forma de o sujeito poético recentrar a sua própria
reflexão ou de conferir um valor didático ao seu poema, lembrando a importância do que diz a um
possível interlocutor.

“hoje, que eu estava conforme o dia fundo” (p. 43)


“já não tenho mão com que escreva”
Leitura | Compreensão
1. O tema das composições é a poesia e o seu valor para o sujeito poético.
2. No primeiro poema, o sujeito poético mostra-se desalentado (“caí abaixo de mim mesmo”, v. 3) com
a sua própria poesia, que caracteriza como trabalho árido (“sáfara safra”, v. 5). No segundo texto, o
“eu” poético lamenta a falta de inspiração (“pois se me fundiu a alma”, v. 2), mostrando-se incapaz de a
encontrar (“noite atrás da luz”, v. 4). Resta-lhe apenas “tanta hora somada a nada” (v. 9), numa visão
claramente negativa da sua produção poética.
3. a. A intertextualidade com “Autopsicografia” serve ao sujeito poético para referenciar a “dor escrita” e
a dor “lida”, negando-lhes validade (“serve para nada”) e qualquer préstimo em termos de
sentimentalidade.
b. O sujeito poético parece apelar a si próprio para que a dor a que se refere o verso, o sofrimento
criativo e criado, não venha a corresponder a algo determinado por uma qualquer regra ou convenção,
perdendo, assim, a sua essência.

“Para o leitor ler de/vagar” (pp. 44-45)


Leitura | Compreensão
1. O título, pela construção “de/vagar”, permite a dupla interpretação: para o leitor ler devagar,
lentamente, ou para o leitor ler no vagar dos seus tempos livres. A composição poética desenvolve-se
em torno do “leitor” e da forma como o sujeito poético o vê, enquanto recetor da sua poesia e na
relação com a sua poesia, bem como ele próprio perspetiva a sua arte poética.
2. O ponto final tem, na composição, uma utilização que não respeita, muitas vezes, as convenções
determinadas para o seu uso, o que provoca um imediato estranhamento. Pode, em primeiro lugar,
destacar-se a intenção de estabelecer pausas para promover a leitura “de/vagar” enunciada no título.
Porém, estas pausas provocam também o destaque das palavras ou grupos isolados, numa
desvinculação da estruturação sintática que, não afetando de forma determinante a semântica textual,
enriquece a sua expressividade.
3. “ardentescura” (v. 5). A candeia, metáfora da poesia, é caracterizada como amarela por fora, isto é,
brilhante naquilo que se vê, “ardentescura”, ardente e escura, no seu interior. Este neologismo faz a
amálgama dos dois adjetivos, atribuindo à essência criativa da poesia, de forma una, as dimensões de
sofrimento/pulsação (ardente) e de sombra/fechamento (escura).
“pedríssima” (v. 12). Para caracterizar a palavra “pedra”, usada pelo sujeito poético para a ela se
comparar no seu fechamento, é utilizado o mesmo nome, estranhamente flexionado como adjetivo com
um sufixo do grau superlativo absoluto sintético. A expressividade resulta do estranhamento,
reforçando as características de dureza e de fechamento – hermetismo – do sujeito poético e/ou da sua
poesia.

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“luminos-idade” (vv. 6-7). A translineação efetuada desta forma permite a interpretação da palavra
“luminos-idade”, associada a “candeia” (vv. 4 e 6), como luminosa idade, tempo luminoso “em meio de
ilusão” poética.
4. O sujeito poético invoca o “Leitor”, o recetor do seu ato poético, o criador último de sentidos, para se
desvendar e para o alertar para a sua forma de arte.
[Será interessante referir que este poema, no conjunto publicado em 1962 na obra “Lugar”, surge logo
no início, depois de uma composição com o título “Aos amigos”.]

“Um espelho em frente de um espelho” (p. 46)


“Trabalha naquilo antigo” / “O olhar é um pensamento”
Escrita
1. Texto pessoal, respeitando as marcas do género.

Ruy Belo
“Cólofon ou epitáfio” (p. 48)
Leitura | Compreensão
1. O título, com a palavra “Cólofon”, remete para uma inscrição final, usada nos manuscritos medievais,
que fornecia referência sobre o autor, sobre a obra, transcrição, impressão, lugar e data da sua feitura
(etimologicamente significa ‘remate’) e, com a palavra “epitáfio”, para uma inscrição tumular que
corresponde a um elogio fúnebre. A composição poética parece ser efetivamente uma nota final ou um
elogio fúnebre escrito pelo próprio poeta. Inicia-se com uma referência à passagem do tempo e à sua
utilização pelo poeta a “polir o seu poema / a melhor coisa que fez” (vv. 4-5). Centrando-se depois em
si (“ele próprio coisa feita”, v. 6), caracteriza-se genericamente de forma condicional e irónica (“Não
seria mau rapaz / quem tão ao comprido jaz”, vv. 8-9). A composição termina com uma das expressões
recorrentes da literatura popular, que remete para um tempo passado indeterminado, mas muito
distante (“era uma vez”, v. 10).

“Génese e desenvolvimento do poema” (p. 49)


Leitura | Compreensão
1. A aliteração sugere as “vozes”.
2. As vozes “de quem fala” (v. 2), lembrando a “infância” (v. 1), “o sol” sobre a água (v. 3), o som do
“vento” (v. 4), “a velha fortaleza” (v. 5), “a vista da baía” (v. 5), “a maré cheia” (v. 6), “a tarde” (v. 6), “as
nuvens” (v. 6), “o azul” (v. 6), as memórias do sujeito poético (v. 7), “a luz” (v. 12), “a hora” (v. 12), “as
férias” (v. 12), “o domingo” (v. 12), “o cruzeiro de pedra” (v. 13), “o largo” (v. 13) e “o automóvel” (v. 13).
No fundo, as vivências e lembranças do sujeito poético e o ambiente que o circunda constituem
motivos de poetização.
3. Os versos remetem para o poder que a escrita poética possui de captar o real.
4. Segundo o sujeito poético, mais relevante do que a vivência é a forma como a consegue registar
poeticamente.
5. As expressões colocadas entre aspas sintetizam a perceção que o sujeito poético tem do meio que o
envolve e que exemplificam as “únicas palavras” (v. 15) que o “fixam” (v. 16).

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6. O título anuncia o assunto do poema, que começa por referir os motivos inspiradores do poema, a
sua origem (génese), e que descreve, em seguida, a forma como ele se desenvolve.

“Esta rua é alegre” (p. 50)


Leitura | Compreensão
1. Nos versos 1 a 9, o sujeito poético ironiza com o convencionalismo das palavras, jogando com o
valor do adjetivo “alegre”.
2. O advérbio estabelece uma ideia de oposição face ao que foi dito anteriormente, introduzindo no
texto um novo momento em que o sujeito poético reflete sobre as relações entre as fontes de
inspiração e a sua captação subjetiva no “poema” (v. 17).
3. O advérbio remete para a afirmação do sujeito poético segundo a qual aproveita o que sente “para
dizer qualquer coisa” (v. 11), salientando a dimensão emotiva associada à construção do poema.
4. A interrogação retórica interrompe a divagação subjetiva do “eu” sobre a “vida” (v. 15) e o “pensar-se
sobre ela” (v. 16) na poesia, recuperando o início do poema e a (aparente) descrição objetiva da “rua
de são bento em vila do conde” (v. 2). Introduz, pois, um reposicionamento do foco poético na
realidade.
5. Segundo o sujeito poético, a vida inspira a poesia (vv. 11 e 15) e esta permite a reflexão sobre
aquela, ainda que, por vezes, “como condição indispensável do poema”, a atraiçoe (v. 17), não a
reproduza de forma exata.
Gramática
1. “Eu” – sujeito; “sou alegre” – predicado; “alegre” – predicativo do sujeito.
2. Oração subordinada adjetiva relativa restritiva.

“Exercício” (p. 51)


Leitura | Compreensão
1. O tema é a vida e o quotidiano do sujeito poético.
2. O sujeito poético, no seu espaço, de “olhar perdido” (v. 3) no movimento da roupa que vê pendurada
em qualquer janela, reflete sobre a sua vida: os sentimentos contraditórios (“tristezas alegrias”, v. 5), a
indecisão (“esta vida indecisa de maresias”, v. 7), a impassibilidade (“impassível ao vão vaivém
humano”, v. 14), a indefinição ou a errância (“ando eu perdido de ano em ano”, v. 15) e a salvação que
reencontra na poesia (“regresso então à versificação / e encontro nos papéis o meu segundo mar”, vv.
19-20).
3. a. Antítese. Reforça o estado de espírito contraditório do sujeito poético. b. Metáfora. O sujeito
poético identifica-se com o monumento, centrando-se na “fachada / impassível”, demonstrando assim a
perspetiva fria e dura em relação ao movimento humano que existe à sua volta.
4. No verso 8, na invocação à vida, esta é caracterizada como “ameaçada”, sem perspetiva segura,
considerando que a grande esperança do sujeito poético “é o café”. No verso 16, a caracterização
evolui significativamente para a assunção da ausência de valor (“noves fora nada”).
5. A última estrofe, enquanto conclusão do poema, corresponde a uma pacificação, à afirmação da
salvação do sujeito poético, encontrada na poesia.

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“Algumas proposições com pássaros e árvores que o poeta remata com uma referência ao
coração” (p. 52)
Leitura | Compreensão
1. O título, muito longo, corresponde a uma síntese, quase irónica, do conteúdo da composição, que é,
efetivamente, constituída por “proposições com pássaros e árvores” até ao verso 16 e que inclui, no
verso 17, “uma referência ao coração”.
2. a. A anáfora de “Os pássaros” foca a atenção nestes animais, demonstrando a sua centralidade
semântica na construção do poema. b. A comparação parece querer atribuir características de vida e
movimento às folhas que caem das árvores e poisam no chão.
3. A ironia destes versos está na sugestão de utilização de uma forma de dizer rebuscada (v. 10), mas
que o sujeito poético rejeita por se lhe assemelhar “complicada” (v. 12) e que atribui “ao romancista” (v.
11), pois entende que “não se dá bem na poesia” (v. 12). Sugere, assim, a simplicidade da linguagem
poética.
4. As interrogações retóricas finais remetem para uma reflexão sobre o real, para um questionamento
sobre a sua origem.
Gramática
1. Coesão lexical (repetição de “árvores” e “pássaros”); coesão frásica (concordâncias e complementos
exigidos pelos verbos – “Os pássaros nascem na ponta das árvores”); coesão interfrásica
(subordinação – “Os pássaros começam onde as árvores acabam”); coesão temporal (uso correlativo
de tempos verbais – formas no presente do indicativo – “nascem”, “vejo”, “dão”).
2. “Gostaria de dizer” – oração subordinante; “que os pássaros emanam das árvores” – oração
subordinada substantiva completiva; “mas deixo essa forma de dizer ao romancista” – oração
coordenada adversativa.

“Peregrino e hóspede sobre a terra” (p. 53)

Leitura | Compreensão
1. O título do poema anuncia o carácter peregrino do sujeito poético, confirmado pela ideia de que não
possui apenas um país, mas que pertence aos locais onde está bem e onde “num momento tudo” tem
(v. 3). Confirmando a ideia de que só é português por ter nascido em Portugal e de que pertence aos
sítios onde se vai estabelecendo (vv. 29-30), o adjetivo “hóspede” é utilizado no título para o apresentar
como mero frequentador da Terra toda, por onde deambula e onde, em certos locais, se fixa
temporariamente.
2. Resposta pessoal, com destaque para o contraste entre as ambições do sujeito poético e a
pequenez (física? moral?) do país em que nasceu.
3. É possível identificar no texto os seguintes recursos expressivos:
– a anáfora, nos versos 2 e 3, que contribui para a apresentação do “único país” (v. 1) concebido pelo
sujeito poético;
– a enumeração (“O malmequer a erva o pessegueiro em flor”, v. 9), que associa o “país”, tal como
preconizado pelo “eu”, ao espaço natural e às suas características;
– a antítese, usada, por um lado, no verso 16, para destacar o carácter imaterial da palavra “país” face
ao concretismo das realidades que, afinal, o devem constituir, e, por outro, nos versos 17-18, para,
através da alusão à amizades conquistadas e perdidas, salientar a instabilidade e a itinerância de quem
se sente “peregrino e hóspede sobre a terra”.

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“Uma vez que já tudo se perdeu” (p. 54)
Escrita
1. Texto pessoal, respeitando as marcas do género.

Manuel Alegre
“O Poeta” (pp. 56-57)
Leitura | Compreensão
1. A interrogação retórica funciona como conclusão do sujeito poético sobre a definição de poeta que
apresentou nos versos anteriores: aquele que, tendo aprendido o “preço”, o custo da sua arte, está em
sofrimento, com “os pulsos abertos”, deles escorrendo “sangue puro”, a pura poesia que alimenta.
2. O interlocutor do sujeito poético, o “Vós” a quem se dirige, corresponde a uma entidade coletiva
repressora, à qual o “eu” afirma o poder do poeta e da poesia, sobre o qual essa entidade não pode
agir (“Vós não podeis mais nada”, vv. 6, 23, 30; “Nada podeis”, v. 12). Trata-se de uma entidade de
“cárceres” (v. 8, 28), “leis” (v. 10), “máscaras” (v. 10), “palavras cheias de fantasmas” (v. 11) e
“tribunais” (v. 20), que impõe o medo.
3. A repetição da expressão “Vós não podeis”, ao longo da composição, intensifica a posição de força
moral e de coragem assumida pelo “ele” a quem se refere o sujeito poético, “um homem que sorriu aos
tambores noturnos / dos vossos cárceres depois cantou / de pé no seu poema” (vv. 7-9), por oposição
aos outros, sintetizado no pronome “vós”, que, apesar do poder físico efetivo que detém, o vê
repetidamente negado.
3.1. O verso reforça a impotência repressiva sobre o homem que já está despojado de tudo aquilo que
lhe poderiam tirar, através de uma metáfora que demonstra que o seu poder está naquilo que lhe não
podem tirar: o canto.
4. O retrato do poeta corresponde à do lutador incansável contra a ditadura, pela força da sua poesia,
das suas palavras e das suas ideias.

“As palavras” (p. 58)


Leitura | Compreensão
1. Através da anáfora, associada ao paralelismo sintático, nos versos 1 e 2, sugere-se a frequência dos
maus-tratos de que são vítimas as “palavras”, que, contudo, como a anáfora dos versos 3 e 4 realça,
resistem a esses ataques. Por meio da personificação, as “palavras” são apresentadas como tendo
vida própria, sendo “perseguidas” (v. 1), “violadas” (v. 2), não sabendo cantar “ajoelhadas” (v. 3), e não
se rendendo “mesmo se feridas” (v. 4). Esta personificação remete para a força (por vezes, mesmo de
conotação política) da palavra poética.
2. A dimensão metafórica da segunda estrofe intensifica o sentido da estrofe anterior, reforçando a
ideia de que as palavras são a única forma de combate, que, apesar de proibidas e vencidas,
continuam a ferir, pela sua essência.
3. No primeiro terceto, o sujeito poético, através da intertextualidade com a poesia de Camões
(“Endechas a Bárbora escrava”) refere o seu cativeiro, a sua prisão, no período da ditadura, motivada
pelo uso da palavra (“Palavras por quem eu já fui cativo”), que o poder político queria “escrava”,
submissa e sem voz.

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4. O último terceto marca uma posição final do sujeito poético relativamente ao que foi expresso:
apesar de tudo poder ser levado, serão as palavras a possibilitar a integridade.
5. A composição poética é um soneto (duas quadras e dois tercetos). Os versos decassilábicos
apresentam rima interpolada e emparelhada nas quadras e cruzada nos tercetos, segundo o esquema
rimático: a b b a / a b b a / c b c / d b d.
Gramática
1. Orações subordinadas adjetivas relativas restritivas, com função sintática de modificador restritivo do
nome.
2. Pronome relativo.

“Balada dos Aflitos” (p. 59)


Leitura | Compreensão
1. Os destinatários das palavras do sujeito poético são os seus compatriotas, que apelida de “Irmãos”.
São caracterizados como “desamparados” (v. 1), desorientados, sem luz para os guiar (“a luz que nos
guiava já não guia”, v. 2), estando numa situação difícil (“que passais um mau bocado”, v. 7), sem
capacidade para sonhar (“não tendes sequer a fantasia / de sonhar outro tempo e outro lado”, vv. 8-9),
considerados sem valia (“sem valor acrescentado”, v. 15) e a quem tudo se recusa (“a quem é
recusado”, v. 17). São ainda caracterizados – incluindo-se nestas palavras também o sujeito poético –
como “proscritos” (v. 21), “perdidos e cercados” (v. 22).
2. O sujeito poético condiciona, neste verso, a oportunidade da poesia, uma vez que os seus
interlocutores passam por grandes dificuldades e precisariam antes de alimento (“gostaria de vos dar
outros recados / como pão e vinho”, vv. 5-6) e não conseguem encontrar forma de as ultrapassar, nem
através do sonho (“não tendes sequer a fantasia / de sonhar outro tempo e outro lado”, vv. 8-9).
3. No texto poético, são claramente criticadas as difíceis condições em que vivem os cidadãos e a
indiferença que o poder manifesta em relação às condições da sua existência, obcecado que está com
a dimensão económica e afastado da necessária visão social.
4. A poetização do real efetuada pelo sujeito poético articula, com fina ironia, a linguagem economicista
do poder político (“mercados”, vv. 3 e 24; “mais-valia”, v. 6; “tudo se avalia”, v. 14; “valor acrescentado”,
v.15) e a linguagem do domínio religioso, mais ligada ao sentimento popular (“Talvez Deus esteja a ser
crucificado”, v. 13; “rogai por nós Senhora da Agonia”, v. 16; “Rogai por nós Senhora dos Aflitos”, v.
19). Este cruzamento concretiza a relação de forças incomparável entre o poder e a fé destes “Irmãos
humanos tão desamparados” (v. 1).
5. O título remete para a concretização poética (balada) do seu conteúdo semântico – uma composição
que apresenta a aflição das pessoas, uma aflição que tem de se socorrer do divino e da poesia, como
tentativas de superação de um contexto de dificuldades económicas às quais a economia não dá
resposta.

“Crónica de Abril (Segundo Fernão Lopes)” (pp. 60-61)


Leitura | Compreensão
1.1. Ao longo do poema, cruzam-se os relatos do assassinato do Conde de Andeiro por D. João,
Mestre de Avis, e a aclamação deste, através da intertextualidade (citação ou alusão) com a Crónica
de D. João I, de Fernão Lopes, e do golpe militar que esteve na base da revolução de 25 de Abril de
1974, por meio de passagens discursivas relativas a esse acontecimento. Ambos os relatos se

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concretizam em progressão cronológica, interligando-se e fundindo-se as vozes poético-narrativas até
ao clímax.
1.2. Os dois acontecimentos descritos remetem para momentos de afirmação da independência e da
liberdade nacional e de manifestação da consciência coletiva na defesa do bem comum.

“D. Sebastião” (p. 62)


Leitura | Compreensão
1. “D. Sebastião” corresponde à metáfora da força que em nós pulsa e que nos impele à procura da
utopia essencial da nossa existência.
2. Os versos 15 e 16 parecem assumir como identitárias as características da personalidade mitificada
do “rei perdido”, D. Sebastião, pelo “excesso de saudade e ânsia”.
3. O rei representa, no poema, o sonho e a esperança de o alcançar, numa luta e espera permanentes,
num caminho sempre inacabado.
4. O verso 17 relaciona-se com os versos do poema “D. Sebastião, Rei de Portugal” (Mensagem,
Fernando Pessoa) “Por isso onde o areal está / Ficou meu ser que houve, não o que há”, numa
perspetiva de continuação da mitificação – “um ser ainda não ser ou já ter sido”. O verso 20 contém
uma referência intertextual a Frei Luís de Sousa de Almeida Garrett e a palavras do Romeiro (D. João
de Portugal), na peça – “E quando alguém voltar Ninguém Ninguém” – no entendimento de que o
surgimento de algo ou de alguém, que prenuncia o atingir do objetivo, corresponderá a um “não
chegar”, ficando ainda dentro de nós esta ânsia.

“Poemarma” (pp. 63-64)


Escrita
1. Texto pessoal, respeitando as marcas do género.

Luiza Neto Jorge


“O Poema (II)” / “O Poema Ensina a Cair” / “Eu, artífice” (pp. 66-67)
Leitura | Compreensão
1. Em “O Poema (II)”, o sujeito poético enuncia uma arte poética de minúcia objetiva e intensa (“digo na
maneira / mais crua e mais / intensa”, v. 3-5), procurando a sua perfeição orgânica (“medir o poema /
pela medida inteira”, vv. 6-7; “o poema em milímetro / de madeira”, vv. 8-9). Após a ação do poeta,
ganha o poema a sua própria autonomia. “O Poema Ensina a Cair” assume uma perspetiva didática
relativamente à ação do poeta e da poesia (“O poema ensina a cair / sobre vários solos”, vv. 1-2).
Os efeitos poderão ser rápidos e repentinos (“perder o chão repentino sob os pés”, v. 3) ou mais lentos
(“queda vinda / da lenta volúpia de cair”, vv. 8-9), e o sujeito poético não deixa de reclamar para si algo
de reconhecimento pela sua arte poética (“ou especialmente a nós uma homenagem / póstuma”, vv.
13-14). “Eu, artífice” aponta, logo a partir do título, para um conceção de poeta de ação laboriosa na
arte da palavra (“atento agora ao traço / corrijo o mais da matéria”, vv. 1-2). O poeta “ergue” a sua arte
“do poço / onde flutua” (vv. 3-4) – o seu íntimo – e vai desprendendo o seu “brilho” (v. 5) na palavra
poética que nasce dentro de si.

“Recanto 2” (p. 68)

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Leitura | Compreensão
1. O tema da composição é a vida.
1.1. Segundo o sujeito poético, viver coincide com a ação de “ver” (v. 1), que inclui sonhar, atribuindo,
desta forma, uma dimensão extremamente sensorial à vida.
2. Para confirmação da ideia expressa na primeira estrofe, o sujeito poético apresenta o exemplo do
“comércio de viver” (v. 5), das transações, das trocas existentes na vida, que transporta para o “papel”
(v. 10), para a poesia.
3.1. Além da ação de “ver” da primeira estrofe, viver inclui também “andar percorrer voar” (v. 11), num
“sentido ambulatório” que complementa aquela dimensão sensorial.
4. Gradação. A noção de “viver” enunciada no primeiro verso da composição evolui, no verso 11,
através da apresentação das ações de “andar percorrer voar”, perspetivando percursos de progressiva
libertação que culminam na sublimação do voar “com os braços” (v. 12).
Gramática
1. Complemento oblíquo.
2. Apócope, síncope e sonorização.

“Acordar na rua do mundo” (p. 69)


Leitura | Compreensão
1. O tema é o mundo contemporâneo do sujeito poético.
2. Sensações auditivas – “passos soltos da gente que saiu […] / no meu quarto cai o som” (vv. 1-3);
“soa o sino sólido das horas” (v. 6); “sirenes e buzinas” (v. 15); “Estragou-se o alarme / da joalharia”
(vv. 16-17); “o alarme não para” (v. 20); sensações visuais – “depois / a luz” (vv. 3-4); “no meu quarto
cai o pó” (v. 7); “um cano rebentou junto ao passeio” (v. 8); “um pombo morto foi na enxurrada / junto
com as folhas dum jornal já lido” (vv. 9-10); “os lençóis na corda / abanam os prédios” (vv. 17-18); “o
azul dos azulejos” (v. 19), “e duma varanda um pingo cai / de um vaso salpicando o fato do bancário”
(vv. 23-24).
3. a. Aliteração. A repetição de sons sibilantes intensifica o efeito causado pelo som do sino no sujeito
poético. b. Hipérbole. O efeito visual dos lençóis que abanam nas cordas é transmitido pelo sujeito
poético como tendo ação sobre os prédios visíveis.
4. Apresentando uma situação quotidiana, numa madrugada, o sujeito poético perspetiva o real dando-
lhe uma dimensão crítica considerável, que pode verificar-se em algumas passagens: “ninguém sabe o
que vai / por esse mundo” (vv. 4-5) – desconhecimento do que acontece à nossa volta, porque temos
fechada “no ovo do sono a nossa gema” (v. 14); “ainda ninguém via satélite / sabe ao certo o que
aconteceu”, vv. 15-16 ou “não veio via satélite a querida imagem” (v. 21) – importância dada ao
visionamento das coisas através da televisão, apesar de elas poderem estar bem visíveis à nossa
frente, como acontece com os eventos apresentados no poema.

“Endecha dos mais novos” (p. 70)


Leitura | Compreensão
1. O tom do poema corresponde ao que no título se enuncia, considerando que endecha é um poema
lírico, geralmente melancólico. E este sentimento é evidenciado pelo sujeito poético relativamente aos
“mais novos”, à geração mais jovem.

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1.1. A melancolia e a tristeza do sujeito poético, sugeridas no título, decorrem dos sentimentos e
atitudes “dos mais novos, apresentados, na primeira pessoa, ao longo do poema.
2. Podemos considerar no poema três partes, que correspondem à divisão estrófica:
1.ª estrofe – apresentação geral dos sentimentos dos “mais novos”, a “descompasso” (v. 2) com os da
Terra, distantes da oposição à guerra e, simultaneamente, pouco apostados na paz, ou seja, num
posicionamento de quase indiferença em relação ao que se passa à sua volta;
2.ª estrofe – referenciação de exemplos que concretizam as ideias da estrofe anterior; “Compêndios
de nojo” (v. 5) e “atas de festa” (v. 5) são para os “mais novos” “escrita tremida” (v. 6), cuja leitura e
inteligibilidade se torna difícil, não aceitando, contudo, que quem sabe (“doutores”, v. 7) lhes diga o que
lhes custa ouvir (“o que purga e o que molesta”);
3.ª estrofe – definição do momento único, passado, em que os “mais novos” estiveram em harmonia
com a “voz do sangue” (v. 9), com o sentimento íntimo da humanidade, que corresponde ao momento
em que estavam no ventre de suas mães; perdida a inocência, a pureza, naufragaram, sendo apenas
“corpos de delito” (v. 12), “almas de refém” (v. 12), presas a algo a “descompasso” “com a Terra” (v. 2).
3. a. Antítese. A oposição entre “guerra” e “paz”, associada à oposição “ripostar” e “apostar”, intensifica
o posicionamento passivo “dos mais novos”. b. Metáfora. A “voz do sangue” remete para o sentimento
íntimo, de ligação intensa e profunda.
4. A composição, construída na primeira pessoa do plural, coloca na voz “dos mais novos” um conjunto
de sentimentos e atitudes negativos, como a indiferença (1.ª estrofe), o desconhecimento e a
arrogância (2.ª estrofe) e a perda da ligação à pureza (3.ª estrofe).
5. En / quan / to o / no / sso / co / ra /ção / vo / raz / ba / te a / des / com / pa / sso / com / o / da / Te
Versos decassilábicos.
6. Todas as estrofes apresentam rima interpolada entre o primeiro e o quarto versos e emparelhada
entre o segundo e o terceiro.

“Natureza morta com Bernardo Soares” (p. 71)


Escrita
1. Texto pessoal, respeitando as marcas do género.

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