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A pandemia provoca aumento nos

níveis de endividamento dos países


da região e coloca em perigo a
reconstrução sustentável e com
igualdade
Em um novo relatório especial COVID-19, a CEPAL propõe cinco
medidas de política para enfrentar os desafios colocados pela Agenda
de financiamento para o desenvolvimento no curto, médio e longo
prazo.
11 DE MARÇO DE 2021|COMUNICADO DE IMPRENSA

  

A pandemia da doença pelo coronavírus (COVID-19) tem ampliado as


brechas estruturais dos países da região, ao mesmo tempo em que
amplia suas necessidades financeiras para enfrentar a emergência e gera
um aumento dos níveis de endividamento que coloca em perigo a
recuperação e a capacidade dos países para uma reconstrução
sustentável e com igualdade, afirmou hoje a Comissão Econômica para a
América Latina e o Caribe (CEPAL).

Durante uma reunião virtual com os países da América Latina e do Caribe


membros da CEPAL, a Secretária-Executiva da Comissão regional das
Nações Unidas, Alicia Bárcena, apresentou o Relatório especial COVID-19
Nº10 da instituição, intitulado: Financiamento para o desenvolvimento na
era da pandemia da COVID-19 e após: Prioridades da América Latina e
do Caribe na Agenda de política mundial em matéria de financiamento
para o desenvolvimento, que propõe cinco medidas de política para
enfrentar os desafios propostos pela Agenda de financiamento para o
desenvolvimento no curto, médio e longo prazo, e enfatiza iniciativas que
poderiam ser realizadas para construir um futuro melhor.

“Em todos os países da região, sem exceção, a situação fiscal se


deteriorou e o nível de endividamento do governo geral aumentou, e
espera-se que esse endividamento aumente de 68,9% para 79,3% do PIB
entre 2019 e 2020 no âmbito regional, o que torna América Latina e
Caribe na região mais endividada do mundo em desenvolvimento e
aquela que tem o maior serviço de dívida externa em relação às
exportações de bens e serviços (57%)”, afirmou Alicia Bárcena durante a
apresentação do documento.

A Secretária Bárcena acrescentou que a brecha de financiamento do


setor público é agravada pela necessidade de apoiar a balança de
pagamentos, sobretudo nas menores economias da região, devido às
interrupções na cadeia de abastecimento e na diminuição das
exportações, em particular da exportação de serviços (turismo). De 2019
a 2020, o déficit em conta corrente passou de 1,4% para 4,5% do PIB no
Istmo Centro-Americano e de 4,8% para 17,2% do PIB no Caribe. Além
disso, haverá uma queda significativa do investimento estrangeiro direto
na região, que ficará entre 45% e 55%, aproximadamente, no mesmo
período.

O relatório indica que as necessidades globais de financiamento dos


países em desenvolvimento chegam a 2,5 trilhões, o que supera a
capacidade de empréstimo do Fundo Monetário Internacional (FMI). No
caso de nossa região, o FMI disponibilizou para 21 países da América
latina e do Caribe a maior parte de seus empréstimos de emergência
relacionados à COVID-19. Em janeiro de 2021, esta instituição destinou
cerca de 66,5 bilhões de dólares para a América Latina e o Caribe, o que
representava 63% do desembolso total (US$ 106 bilhões) que destinou
para 85 economias em desenvolvimento.

Os dados disponíveis dos países da América Latina e do Caribe indicam


que o financiamento que o FMI ofereceu no âmbito de seus programas
Instrumento de Financiamento Rápido e Serviço de Crédito Rápido só
cobriram 32,3% e 23,1% em média, respectivamente, das necessidades
de financiamento internas e externas que os países tinham em 2020. Isso
equivalia a 0,8% e 2,1% do PIB, e a 6,5% e 8,0% das reservas
internacionais, respectivamente.

Entretanto, esses instrumentos financeiros não beneficiam todos os


países por igual. Aqueles com sólidos fundamentos econômicos, como
Chile, Colômbia e Peru, podem ter acesso ao financiamento sem limites
de cotas. No entanto, essa não é uma opção que esteja disponível para a
maioria dos países, particularmente para os pequenos Estados insulares
do Caribe.
O relatório afirma que, no atual contexto da pandemia, a Agenda de
financiamento para o desenvolvimento apresenta dois desafios inter-
relacionados. No curto prazo, deve-se favorecer a expansão do gasto
público e prestar uma atenção especial aos grupos vulneráveis, em
particular aos segmentos de baixa renda e aos idosos. Além disso, as
políticas de financiamento para o desenvolvimento no curto prazo
também são necessárias para compensar os efeitos prejudiciais que as
políticas de contenção – baseadas no distanciamento físico e no
isolamento voluntário – têm sobre a atividade econômica, o tecido e a
estrutura produtiva, e o emprego.

Isso significa sustentar o consumo das pessoas e das famílias, para o


qual é necessário adotar medidas excepcionais transitórias de
manutenção da renda, como uma renda básica temporária garantida pelo
Estado.

A médio e longo prazo, à medida que a prioridade das políticas passe a


ser construir um futuro melhor, no lugar de lidar com a urgência, o
programa de financiamento para o desenvolvimento deve promover uma
orientação política anticíclica que tenha por objetivo aumentar o emprego
e a manter um crescimento adequado. Nesse contexto, a ampliação dos
gastos públicos de capital e os desembolsos destinados à
transformação produtiva e o esverdeamento da economia são
fundamentais para impulsionar o trabalho de recuperação.

O relatório Prioridades da América Latina e do Caribe na Agenda de


política mundial em matéria de financiamento para o desenvolvimento
propõe cinco medidas de política para enfrentar ambos desafios.

Uma primeira medida de política consiste na ampliação e redistribuição


da liquidez a partir dos países desenvolvidos para os países em
desenvolvimento por meio de uma emissão massiva de Direitos
Especiais de Saque (SDRs, na sigla em inglês) do Fundo Monetário
Internacional (FMI). Uma emissão e alocação hipotética de 500 bilhões
de novos SDRs representaria US$ 56 bilhões de reservas internacionais
adicionais para as economias da América Latina e do Caribe.

A redistribuição da liquidez, também pode ser realizada por meio de


fundos multilaterais, como o Fundo de Alívio à Economia COVID-19
(FACE) proposto pelo Governo da Costa Rica. O FACE seria financiado
com recursos das economias desenvolvidas canalizados por meio dos
bancos multilaterais de desenvolvimento e constaria de US$ 516 bilhões
(3% do PIB dos países de renda baixa e média ou 0,7% do PIB dos países
desenvolvidos).

Uma segunda medida de política se concentra no fortalecimento da


cooperação regional, aumentando a capacidade de empréstimo e
resposta das instituições financeiras regionais, sub-regionais e nacionais,
e estreitando seus vínculos com os bancos multilaterais de
desenvolvimento. Também, é necessário fomentar a cooperação e a
coordenação entre os bancos de desenvolvimento regionais, sub-
regionais e nacionais. Os bancos nacionais de desenvolvimento têm sido
atores-chave na provisão de financiamento, comprometendo o
equivalente a US$ 93 bilhões de apoio financeiro contra a COVID-19.

Uma terceira medida de política consiste no acesso a um maior


financiamento que deve ser complementado com impulso por uma
reforma institucional da arquitetura da dívida multilateral, que inclua a
criação de um mecanismo internacional de reestruturação da dívida
soberana e de uma agência multilateral de qualificação creditícia. A
Iniciativa de Suspensão do Serviço da Dívida (DSSI) do Grupo dos Vinte
(G20), também deve ampliar seu alcance, para incluir todas as partes
interessadas (ou seja, o setor privado e as instituições multilaterais) e
aos países vulneráveis de renda média, e deve se estender além de 2021.

Uma quarta medida de política consiste em proporcionar aos países um


conjunto de instrumentos inovadores destinados a aumentar a
capacidade de reembolso da dívida e evitar o endividamento excessivo.
Os instrumentos inovadores vinculam a capacidade de reembolso dos
países à sua exposição e vulnerabilidade às catástrofes naturais (como
no caso das cláusulas sobre furacões) ou aos altos e baixos do ciclo
econômico (como títulos de contingência vinculados à renda ou ao
Estado).

Como quinta medida de política, propõe-se integrar medidas de liquidez e


de redução da dívida a uma estratégia de financiamento para o
desenvolvimento voltada para construir um futuro melhor. A crise atual
deve ser aproveitada não somente como uma oportunidade para
repensar a agenda de financiamento para o desenvolvimento dos países
de renda média, mas também como uma ocasião para alcançar um
amplo consenso social e político que permita implementar reformas
ambiciosas com a finalidade de empreender um processo de
reconstrução sustentável e igualitário.

Da mesma forma, os esforços de recuperação devem se concentrar em


fomentar a resiliência.  O Fundo de Resiliência do Caribe se dedicará a
atrair financiamento em grande escala e de baixo custo para destiná-lo a
investir em setores verdes, reduzindo a dívida mediante a troca desta por
adaptação ao clima, e apoiando o investimento em projetos que
promovam a resiliência. Além de atrair financiamento em condições
favoráveis e outras fontes de financiamento, o Fundo de Resiliência do
Caribe seria financiado por meio de uma redução da dívida que
representa 12,2% do total da dívida pública dos Pequenos Estados
Insulares em Desenvolvimento (PEID) do Caribe, que chega a apenas
US$7 bilhões.

O documento destaca que a orientação das políticas dos países da


América Latina e do Caribe, também é fundamental para a construção de
um futuro melhor.

“A margem para aplicar políticas pode ser aumentada se são eliminadas


a elusão e a evasão fiscais e o peso da tributação recair sobre os tributos
diretos e sobre a propriedade e o patrimônio. O gasto público, também
deve ser reorientado para a criação de empregos e para as atividades
que sejam transformadoras e ambientalmente sustentáveis. Para isso,
em tal gasto, devem ser priorizados o investimento público, a renda
básica, a proteção social universal, o apoio às pequenas e médias
empresas (PMEs), a inclusão digital e o desenvolvimento de tecnologias
verdes”, conclui.

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