Você está na página 1de 6

Planejamento e Território

ensaios sobre a desigualdade

O trabalho busca retratar as políticas de desenvolvimento regional e suas trajetórias,


através do método de comparações e dividindo em dois períodos: de 1950 a 1980, e de
1980 até hoje.

POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL NO LARGO


PERÍODO EXPANSIVO DO PÓS-GUERRA

Lenine estudando a situação da Rússia no fim do século XIX, percebeu que o capitalismo
se desenvolvia de forma desigual, tendo forma intensa no "centro" e extensa na sua
periferia: assim se estrutura a indústria.

Observa-se essa mesma lógica no que tange ao espaço, como ocorreu no decorrer do
capitalismo nas três primeiras décadas do século XX, quando ocorria a concentração em
Londres simultaneamente ao empobrecimento de áreas industriais antigas. Sob a ótica
desses desequilíbrios espaciais, os autores progressistas do pós-guerra questionam os
modelos de equilíbrio neoclássico. Enquanto a maior parte dos países encontram-se
apoiando a teoria dos polos de desenvolvimento, os países anglo-saxões se deitaram sobre
a teoria de base-exportação.

POLOS DE DESENVOLVIMENTO: UMA ESTRATÉGIA

Desenvolvida por Perroux, a teoria dos polos de desenvolvimento deleita-se na busca da


compreensão da concentração industrial em sua dimensão espacial, no momento da
segunda revolução industrial que foi caracterizada pela indústria pesada. Outro objetivo da
teoria é apontar bases para o direcionamento de políticas de desenvolvimento regional nos
termos daquele padrão.

Perroux afirma que o desenvolvimento é desequilibrado, havendo uma dependência das


unidades econômicas onde grandes empresas exercem dominação sobre outras. Essa
dominação tem efeitos de difusão sobre um grupo maior e favorece desenvolvimento de
inovações, as quais darão origem a novas indústrias. Parafraseando Perroux "O
crescimento não aparece em toda parte ao mesmo tempo; ele se manifesta em pontos ou
polos de crescimento, com intensidade variáveis; difunde-se por diversos canais e com
efeitos terminais variáveis pelo conjunto da economia".

Definição do Polo de crescimento: Indústria motriz com elevado dinamismo, refletido nas
altas taxas de crescimento e que têm influência de impulsão sobre uma certa quantidade de
indústrias ou empresas.
As inovações têm um papel central, as quais, sendo bem difundidas, marcam a atmosfera
de uma marca; sendo assim, a indústria motriz não é a mesma em todas as épocas. No
século XX a indústria-chave foi a indústria da energia.

Segundo Perroux, toda estrutura articulada tem indústrias que constituem pontos
privilegiados de aplicação de força ou dinamismo de crescimento. Essas indústrias foram
denominadas de "indústrias industrializantes" por Destanne de Bernis, visto que contribuem
decisivamente no desenvolvimento.

A DIMENSÃO GEOGRÁFICA

Perroux considera o polo como resultante do efeito de certas indústrias motrizes, e a essa
dimensão industrial o autor atribui também a dimensão espacial, pois admite que um
aglomerado urbano importante também pode ter essa característica. Nesse caso,
aumentam: necessidades de habitação, transporte, serviços, e as rendas elevam-se,
surgem empreendedores e mão de obra qualificadas.
Esse cenário, para Perroux, difere do que é visto no meio agrícola.
O autor, no entanto, observa que o Polo pode ser levado ao declínio devido à diversos
fatores como mudanças técnicas, questões políticas, mudanças de correntes de
transportes.
Esses processos são de responsabilidade do Estado, o qual deve administrar e planejar, no
intuito de diminuir seus impactos.

INSTRUMENTO DE POLÍTICA

Perroux diz “A noção de polo de desenvolvimento só tem valor no momento em que se


torna um instrumento de análise rigorosa e instrumento de uma política”.

Na metade da década de 50, o governo francês adotou uma política que descentralizasse a
indústria, que desestimulava a implantação de novas empresas na metrópole e estimulava
em regiões “periféricas”. Contudo, acabou tendo uma dispersão de recursos devido ao mal
planejamento. Em 1958, Perroux criticou essa política, a favor de concentrar os meios nos
centros escolhidos. A partir de 1963, a política francesa adotou a teoria da polarização, a
qual acabou sendo adotada em escala quase planetária. Na França, essa política também
teve dimensão urbana, com a estratégia das “Metrópoles de Equilíbrio”, que foi
desenvolvida para diminuir a concentração na região-capital na estrutura urbana francesa.
Com essa estratégia, foram escolhidas oito aglomerações urbanas que receberam grandes
investimentos em infra-estrutura.

A EXPERIÊNCIA BRASILEIRA
O Brasil é um claro exemplo de desenvolvimento desigual, é um país de dimensões
continentais muito diverso e conta com uma história de difícil ocupação no seu território, e
uma industrialização retardatária e, por muito tempo, restringida.

A partir do fim da década de 1940, começou um intenso debate sobre o atraso econômico
das regiões periféricas, o que resultou em uma grande produção de conhecimento sobre o
Nordeste e a Amazônia. Foram diversos estudos sobre, por exemplo, os recursos naturais,
papel do planejamento para desenvolver a região, sobre os desequilíbrios regionais e
potencialidades. O principal estudo foi feito por Celso Furtado, chamado Relatório GTND,
que faz um diagnóstico da economia nordestina.

A partir destes estudos, foi criada a Superintendência do Desenvolvimento Econômico do


Nordeste - Sudene em 1959, a qual tornou o planejamento regional no Brasil mais
significativo. Seu foco maior era a industrialização, mas ainda abrangeu várias outras
atividades e setores; foi alvo de críticas relacionadas às questões agrárias, mas ainda foi
muito inovadora quando comparada à antiga administração pública brasileira. Após 1964
com o golpe dos militares, os quais mantiveram a Sudene, a prioridade total foi dada à
industrialização, com a política de incentivos fiscais e financeiros e aos investimentos pré-
industriais, e é com essa ótica que devemos observar a Superintendência do
Desenvolvimento da Amazônia - Sudam em 1967.

Na primeira década da Sudene, houveram diversos investimentos industriais na região,


principalmente em Salvador, Recife e Fortaleza. Na primeira metade de 70, foi adotada a
estratégia de desenvolvimento polarizado no Nordeste e, depois, nas outras regiões
periféricas. A princípio, a teoria dos pólos de desenvolvimento não convergiam com as de
Cepal e Furtado. A estratégia original da Sudene era a integração do Nordeste, pois, para
Furtado, era necessário primeiro integrar a região nordestina e só depois haver a integração
com o Centro-Sul. Enquanto isso, a teoria dos pólos tem uma integração muito forte entre
os centros regionais e a região mais desenvolvida.

A possibilidade de aplicar essa teoria no Brasil só foi analisada a partir do Ipea, órgão do
ministério do planejamento, junto com o IBGE, nos anos de 1965/66. Esse estudo foi feito
com base na metodologia empregada na França e resultou no Plano Decenal realizado em
1967.

O I Plano Nacional de Desenvolvimento - PNID tem como medidas: expandir o mercado


interno e descentralizar a produção; o meio encontrado para o alcance dessas metas doi a
criação de polos regionais no Sul, Nordeste, Planalto Central e Amazônia, que
complementaria o grande polo São Paulo-Rio-Belo Horizonte.

O II PNID consagrou em definitivo a estratégia de polos, investindo ainda mais na


industrialização e substituindo importações. Outros investimentos também foram feitos nas
áreas de infraestrutura e exploração de recursos naturais. Em São Paulo, houve maior
proteção do meio ambiente e medidas restritivas do crescimento industrial na metrópole. O
resultado disso foi a desconcentração industrial de São Paulo em 1970/1980.
POLÍTICAS REGIONAIS NAS ÚLTIMAS DUAS DÉCADAS
Nos países de Centro:
A crise econômica mundial (que ocorreu depois do primeiro choque do petróleo e a
desregulação monetária), teve reflexos nas economias regionais. As crises da siderurgia e
da indústria pesada influenciaram a política dos pólos industriais e, ao mesmo tempo, houve
muita pressão a favor da descentralização do poder. As políticas de desenvolvimento
começaram a ser questionadas e, nesse contexto, começou a surgir um ideal que admitia
que os condicionantes do desenvolvimento partiam das bases locais.
A crise repercutiu principalmente nos Estados Unidos e na Europa, onde
predominavam indústrias pesadas, e teve como consequências o desemprego em massa e
diminuição demográfica em cidades importantes. Concomitantemente a isso, haviam
regiões industriais prósperas que apresentavam características diferentes, o que
demonstrava novas possibilidades de desenvolvimento. Ao observarem, notaram que o
sustento dessa prosperidade era a força local, o que deu origem ao desenvolvimento
endógeno, que também tinha como outra base a descentralização política.
Assim, as questões dos desequilíbrios espaciais ganhou força, e para entendê-lo,
será diferenciado o aspecto político e o econômico-tecnológico:
Aspecto político
A partir do final dos anos 1960, houveram manifestações contrárias ao poder
do Estado-Nação, o que fazia parte do ideário das revoltas que o epicentro
foi a França em 1968. Nesse cenário, houve um aumento de pressão contra
o poder central pelas forças locais. Em 1982, depois de De Gaulle já ter
tentado em 1969, finalmente foi aprovada a lei Deferre, a qual transformaaa
as regiões em coletividades territoriais da mesma natureza que as comunas
e os departamentos.
Na Italia, a regionalização foi concluída em 1972 e, na Espanha, concluída
em 1979.
O desenvolvimento from below (a partir de baixo) foi imediatamente aceito
em oposição ao up down (de cima para baixo)..
A União Europeia tinha uma política de apoio às regiões, instituiu a regiãao
como “unidade territorial de base” e implanta o FEDER, que tem o papel de
financia a política regional.
Aspecto Econômico-tecnológico
Na década de 1970, o objetivo do pós guerra (desconcentração das
atividades produtivas) começou a se tornar possível por duas razões:
Políticas governamentais específicas e movimento do capital. O que
possibilitou isso foram as transformações na economia das comunicações e
na informática, que permitiram o capital se soltar do espaço e tempo. A partir
dessa década, aumentou muito o número de áreas para essa produção e,
principalmente, para a geração de conhecimento através de instituições de
ensino dirigidas à inovação, sendo estas chamadas de espaços inovadores.
Sendo assim, a ciencia e a tecnologia voltadas para a inovação são papeis
centrais no desenvolvimento from below (a partir de baixo) ou endógeno. Isso
porquê o progresso técnico contribui de forma direta com o crescimento
econômico.
Questões do presente
O desenvolvimento “a partir de baixo” gerou grandes expectativas no começo da
década de 80. Aydalot, autor, diz que o desenvolvimento endógeno traz a ideia de
uma economia flexível e adaptativa. Na prática, as regiões estabeleceram políticas
próprias para atrair novos empreendimentos e passaram investir em atividades de
maior valor agregado, assim, multiplicaram-se os centros científicos e tecnológicos.
Contudo, a competitividade não foi deixada de lado, e ao passo que uma cidade
estava vencendo, outra estava perdendo. Por isso, no caso da França, nos anos de
1993 e 1994, o governo promoveu um debate sobre a política de organização do
território, buscando uma coesão social através de um novo “pacto republicano”. Em
1995 e 1999 foram aprovadas leis sobre o ordenamento territorial e que introduziram
novos recortes espaciais para o planejamento do território.

No Brasil:
Os trinta anos gloriosos do pós-guerra foram bem sustentados pelo Estado
keynesiano, em que a industrialização brasileira teve um apoio crucial do Estado, e por isso
o planejamento desempenhou no país um papel ímpar se comparado com outros países de
terceiro mundo. Furtado, no seu livro A fantasia organizada mostra que no governo Vargas
houve uma ação que foi crucial para a sobrevivência da Cepal, que defendia a
industrialização como saída econômica e caminho de afirmação nacional para os países da
América Latina, e o emprego do planejamento. Esses estiveram na agenda do Estado
brasileiro até o início do decênio de 80.
No plano regional, as regiões-problema foram destaque. A grosso modo, pode-se
dizer que o Brasil se baseou em grandes unidades produtivas e na intervenção do Estado
central até 1980, e a partir de então, começou a haver um declínio da experiência brasileira.
Os aspectos mais relevantes de tal são:
a) Questão do Estado: O desmonte do estado keynesiano que começou lento
em meados dos anos 80, foi acelerando. Para encontrar saídas para a
acumulação, houveram pressões externas que se combinaram com
interesses dos capitais internos. Nesse meio tempo, extinguiram o ministério
do interior, duas superintendências e a Serse. A Sudam e a Sudene por
pouco não foram extintas, mas sarney manteve um completo descaso com a
Sudene e o Nordeste.
b) Outro ponto é o da constituição de 1988, que instituiu diversas medidas
descentralizadoras, atribuindo para os planos estadual e municipal o
planejamento sem nenhum recurso que os preparasse para tal
responsabilidade. Ocasionou em uma corrida desenfreada, assim como visto
em outros países (França, por exemplo), gerando a chamada “guerra fiscal”,
onde propostas eram feitas para atrair novos investidores a qualquer custo.
c) Por último, Fernando Henrique Cardoso ensaiou retornar ao tratamento da
questão regional. Introduziu o Orçamento plurianual em 1996/99, projeto que
buscava integrar as regiões brasileiras na área de transportes. Tal projeto
deveria consolidar os chamados eixos de desenvolvimento, para uma
intervenção mais coordenada e menos dispersa. A nova política faz uma
tábula rasa das macrorregiões, mas não faz uma nova regionalização do
país. Eram ao todo 9 eixos, visavam reduzir as disparidades regionais, mas,
no fundo, destinavam maiores parcelas para áreas mais favorecidas do país.
Outra crítica a essa política é pelo fato de estar mais voltada para a
exportação do que para o mercado interno.

Você também pode gostar