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Grupo Essere Aula 1

SER
 Transcrito do Livro Nada de Atuação, Por Favor! De Eric Morris
SOBRE SER
Atuar é a arte de criar uma realidade genuína no palco. Seja Não importa que material
seja, a pergunta fundamental do ator é: Qual é a realidade e como posso fazê-la real
para mim? Neste tipo de treinamento o ator se descobre por inteiro, tanto no palco
quanto fora dele, já que os exercícios deste livro exigem, repetidamente, uma integração
entre viver e atuar. É uma maneira de viver, não apenas outra forma de trabalho.
Nos primeiros anos eu ensinei atuação ao pé-da-letra. Fui fiel às técnicas derivadas de
Stanislawski e minha abordagem para criar realidades no palco cercava a memória
sensitiva e afetiva, a escolha de deveres, etc. Durante este período, foi crescendo em
mim a consciência de que alguns atores conseguiam usar o método muito bem, e outros,
também talentosos, não conseguiam usá-lo: não funcionava para eles. Mesmo para os
atores que o usavam muito bem, sobravam enormes áreas inatingíveis e seu trabalho
acabava por parecer clínico e acadêmico. Fiquei frustrado. Comecei a duvidar do
“Método” como abordagem total, passei a acreditar nas palavras pessimistas de Mestres
de Atuação, que diziam que só dois por cento dos atores, são capazes de usar o
“Método”, e até em meu próprio trabalho como ator, me senti frustrado, decepcionado
com os resultados que estava conseguindo. Foi neste momento que comecei a me fazer
alguns questionamentos, tais como o que fazer para a mesma técnica funcionar para
todos. Ninguém é igual. Todos têm medos diferentes, diferentes inibições, uma escala
de preocupações diversas e certamente, formações também diversas. Por que os atores
têm medo de falar de si mesmos, de forma pessoal? Por que os professores de
interpretação se intimidam ao discutir os elementos pessoais na atuação? Por que todos
guardam tantos segredos?

Acabei concluindo que, enquanto houver apenas murmúrios quanto ao uso de sua vida
pessoal e ao aprofundamento em suas próprias emoções, poucos atores terão coragem
de fazê-lo e a maior parte dos professores não terá sequer consciência da necessidade
deste tipo de busca. Não se ensina um homem a correr se ele não tiver pernas. Não se
pode ensinar alguém a atuar, se ele não estiver conectado ao seu eu interior. Comecei a
desenvolver uma abordagem da atuação que embarcava em uma busca da
personalidade e levava ao uso desta mesma personalidade no palco. Ao redor desta
abordagem, apareceu um completo sistema de trabalho que incluía algumas das práticas
do “Método”, mas estas práticas, agora, se tornavam realmente aplicáveis porque
emanavam diretamente de um núcleo pessoal. Descobri que, uma das razões pelas quais
muitos artistas não conseguiam usar o sistema de Stanislawski, era por causa da
separação entre técnica e realidade pessoal. Como pode funcionar um sistema criado
para ser um trabalho pessoal, com atores que não são pessoais e nem sequer sabem
o que sentem?
Inventei exercícios que exigiam que os atores buscassem e expressassem seus próprios
pontos de vista sobre tudo. Centenas de exercícios evoluíram a partir do trabalho com
atores que estavam lutando contra problemas pessoais. Alguns destes exercícios foram
batizados em homenagem a esses atores para quem eles foram criados, apesar de, mais
tarde, terem funcionado para outros. Nasceram as Rodas. Exigi que os atores se
“encontrassem” nos Exercícios de Relutância, em Torrente de Honestidade da
Consciência, em Reconstrução do Ego e outros Exercícios de Roda (descreveremos
todos estes exercícios mais tarde). Encorajei-os a serem extremamente pessoais uns com
os outros, a exorcizar suas vidas sociais impostas, para experimentar o “Momento da
Verdade”, sem se importar com conseqüências imaginárias.
No começo foi uma desordem: as pessoas se ofendiam, saíam das aulas, se
arrebentavam e gritavam, ficavam histéricas. Mas começou a acontecer com aqueles
atores algo importante que jamais havia acontecido antes em seus trabalhos: um tipo de
realidade visceral tomou o lugar de suas preocupações com sua aparência, com o som
de sua voz ou como a cena deveria fluir. Comecei a ver pessoas de verdade em cena,
como eram antes de estar atuando. As pessoas estavam começando a SER! A princípio
apenas em breves momentos aqui e ali, mas a diferença entre SER e ATUAR era
brilhantemente óbvia para todos nós. Uma vez que estes atores haviam experimentado
este momento de SER, seus apetites haviam sido estimulados a querer mais. Tanto os
atores, quanto o público se viram insatisfeitos com menos do que a verdade.
Em minhas aulas, incitei cada ator a fazer primeiro a coisa mais difícil, pois então todos
os problemas menos difíceis se extinguiriam com um golpe cruel. Por exemplo, uma
moça veio à aula, tensa, possivelmente com uma formação de escola paroquial,
querendo atuar desesperadamente, mas paralisada com sua preocupação em ser boa
moça. O primeiro exercício que eu lhe daria deveria ser um “Vulgaridade”, ou talvez,
“Sensualidade”, ou até um “Anti-social”. Se fosse Vulgaridade, eu pediria a ela que se
levantasse diante de toda a classe e fosse rude, baixa, colocasse a mão no nariz,
cutucasse as orelhas, arrotasse, praguejasse e colocasse a mão na virilha. Todas estas
coisas poderiam ser opressivamente difíceis para ela fazer. Mas, ainda que ela fizesse
apenas uma parte disso, o gelo seria quebrado: a classe aceitaria e a encorajaria e assim,
a atmosfera seria permissiva, apoiando sua consciência de ter o direito de fazer aquelas
coisas e tudo estaria correto. Depois deste único exercício, a atriz estaria liberta de todo
um aglomerado de maneirismos sociais que se postariam entre ela e seus verdadeiros
sentimentos.
Os resultados destes “Exercícios-terapia” foram impressionantes. O que persistiu como
um problema para o aluno em meus primeiros cinco anos como professor, foi atenuado
e em alguns meses, desapareceu. A resolução de problemas como este nos permitiu
chegar mais fundo na vida rica que jaz sob a pele. No processo de se descobrirem, os
atores tomavam consciência não apenas do que sentiam numa base de momento-a-
momento, aqui e agora, mas também da trilha de coisas que os afetaram durante toda a
sua vida. Agora, eles já não estavam usando apenas as escolhas sensoriais que soavam
bem e eram usáveis em cena. As escolhas sensoriais se tornaram mais pessoais,
particulares e comoventes. Estávamos começando a tocar o núcleo da personalidade
individual. Uma realidade mais pessoal e excitante começou a existir no palco, na
moldura de uma cena, não consistentemente de primeira, porém com cada vez mais
trabalho contínuo. Durante as aulas, eu sempre deixei para os atores uma dica, um
“Docinho”, que contém uma declaração, um pensamento ou um conceito criado para
atingir algo específico ou inspirar o ator a pensar em uma área de perícia ou em uma
preocupação pessoal. Algumas vezes, uma simples dica de poucas palavras pode tomar
o lugar de uma crítica longa e zerar tudo perante a visão superior de todo o problema.
Docinho (DICA):

NADA DE ATUAR, POR FAVOR!


Preciso definir, a esta altura, o que eu quero dizer com a expressão SER. Não é uma
palavra que escolhi acidentalmente. Surgiu para mim do trabalho com atores que
estavam tentando conseguir um estado de vida no palco que fosse o mais completo, o
mais verdadeiro e o mais total. Este estado comumente acontecia quando eles chegavam
mais perto do que eles realmente sentiam e mais longe de sua atuação usual. Quando
estavam mais perto de seus verdadeiros sentimentos, seu comportamento no palco
incluía todo tipo de vida, colorido infinito, distrações, interrupções e mudanças de
emoções imprevisíveis. Até as emoções identificáveis – raiva, ódio, amor, medo –
tinham mais facetas quando vinham deste tipo de realidade. Quando um ator tenta
conseguir uma emoção particular em uma cena, o que freqüentemente ocorre, sua
representação daquela emoção acaba rasa e unidimensional. Eu me refiro a este
fenômeno como uma interpretação “no nariz”. Ela acontece porque o ator está
preocupado com entregar o resultado “no nariz”, logo, conseqüentemente, a emoção não
contém todos os elementos de onde ela veio, as origens, os ímpetos que causaram esta
emoção em primeiríssimo lugar. Quando o ator está funcionando a partir de um estado
do SER, tudo o que ele sente está incluído na vida que está sendo expressa e então, a
emoção resultante contém tudo de sua própria verdade pessoal e realidade.
Ao fazer comentários sobre o trabalho de um ator, dizendo a ele, ou ela, que a ação
estava mais plena ou crível, invariavelmente o que eu ouvia era a resposta: Eric, eu não
fiz nada! Estava somente sendo eu mesmo! E as exigências do teatro? Ironicamente, a
cada vez que o ator se aproximava mais do estado de SER, ficava muito mais teatral,
encontrando as necessidades do material em um nível muito mais complexo e
imaginativo, porque mais tipos de vida, mais sutilezas da realidade estavam
acontecendo. O excitante sobre alcançar o SER, com sucesso, no palco ou frente à
câmera, é que o resultado aparece como um farol na escuridão da noite. O ator traz para
seu trabalho a inegável singularidade de si mesmo e o trabalho adquire uma qualidade
pessoal que tem um tecido que não se compara a ninguém ou a nada mais. É
imprevisível para o ator: é tão cheio de inspiração e surpresas que eliminam
expectativas convencionais. Tem o sentimento fresco de “um momento” que faz o
público crer que está acontecendo aqui e agora pela primeira vez, porque, em um certo
sentido, isto é verdade.
A perícia não foi criada para ser um laboratório de envolvimento esotérico, mas uma
abordagem aplicável para alcançar a vida mais excitante possível. Em última análise, se
não produzir resultados, é só filosofia de bom tom.
SER é um estado que você trabalha para alcançar. Para SER, você precisa descobrir o
que sente, e expressá-lo totalmente. Deixe que cada impulso o leve a outro sem edição
intelectual, incluindo toda a vida que está acontecendo – com interrupções,
interferências e distrações. Estes elementos todos devem ser incluídos no
comportamento. Não faça mais nem menos do que o que sente. SER é o único lugar a
partir de onde você pode criar uma realidade orgânica.
Docinho:
ANTES DE ATUAR, É PRECISO SER

O exercício de SER, seja sozinho ou em grupo, muda a cada vez por causa do
verdadeiro estado de SER de cada ator. As coisas que ele faz para evitar SER são
únicas. O sucesso do exercício, depende da perícia do professor, ou diretor. O exercício
de SER pode se tornar uma ferramenta de manipulação da mente, nas mãos de um
diretor ou professor que não compreenda totalmente ou não que não tenha
experimentado isso consigo mesmo. Cabe a mim ser responsável por manipulá-los
conscientemente, por presumir suas reações e levá-los a certas áreas. Preciso reconhecer
a diferença entre manipulação criativa e manipulação destrutiva. As motivações do
professor e sua percepção de saber o que dizer e quando dizer, são fatores cruciais e
fazem toda a diferença.

A Perícia para atuar é a arte de SER e existem muitas técnicas e centenas de exercícios
para ajudá-lo a realizar este estado! Eu espero que nas próximos aulas, você seja capaz
de aprender e usar estes exercícios e incluí-los em sua própria abordagem. Não se trata
de algo que acontece da noite para o dia. É preciso praticar diariamente. Você precisa
achar um sistema que funcione para você. E isso vai acontecer por experimentação, com
você olhando ao seu redor, indo a professores diferentes e testando as técnicas consigo
mesmo.

A maior parte dos atores aprende a atuar imitando outros atores. Quando chega a hora
em que você já passou quinze ou vinte anos observando atores em uma tela ou no palco,
você já adquiriu um repertório inconsciente completo de maneirismos e coisas a fazer.
Estas imitações o desviam de descobrir quem você é e qual é a sua contribuição. Você é
tão individual quanto suas impressões digitais e a sua individualidade é o que você tem
para contribuir. Você não é apenas a melhor coisa que tem; é a única coisa que tem! É
preciso cuidado para fazer uma ótima interpretação de si mesmo e não uma má
versão de outro qualquer!

Infelizmente, entre atores e atrizes, há um estigma contra trabalho duro. Alguns se


agarram ao mito que podem sobreviver apenas de seu talento sem conhecer sua perícia –
o engano da imortalidade teatral. Outros acreditam que estudar seu ofício pode
realmente estragar seu talento por interferir com seus “instintos naturais”. Outros
dependem precariamente de Pés de Coelhos, fazer o Sinal da Cruz antes de entrar no
palco, jamais assobiar nos camarins, doses de Vitamina B-12, estimulantes, calmantes e
maconha ou qualquer outra coisa. Tudo isso pode fazer você se sentir bem, mas
nenhuma vai ajudá-lo a atuar.

O ator precisa tomar uma posição em algum lugar. Ele precisa decidir em que nível de
criatividade ele quer funcionar e então usar seu tempo a custo de sucesso, se for o caso,
encarar o ridículo. Ele deve encontrar e aplicar uma prática até que a transforme em um
hábito e que lhe seja absolutamente fidedigna. A maior parte dos exercícios que
veremos se tornaram técnicas vitais para terapia da atuação.

Problemas de atuação são quase sempre problemas de vida!


Se você tem alguma dificuldade em expor algum aspecto de si mesmo fora do palco,
terá ainda mais dificuldade em expô-lo no palco. Freqüentemente, um problema de
atuação não pode ser resolvido sem mudar algo na vida do ator.

As pessoas vêm para a profissão de atores, mutiladas por todos os tabus da nossa
sociedade, regras impostas por pais, amigos, escolas e religiões. Todas estas restrições
são anti-SER. “Crianças são para ver, não para ouvir...Não responda...Pare de sonhar
acordado, é perda de tempo...Seja bonzinho...Homem não chora...Moça boa não faz
isso...” E milhares de outras instruções que corroem insidiosamente sua liberdade.
Como ator, você precisa passar a maior parte de seu tempo em um processo de
treinamento, descobrindo e liberando a si mesmo!

O que é que nos impede de SER? As conseqüências. O medo do ridículo. Rejeição.


Violação da nossa “imagem”. Longevidade e posição (“Eu venho atuando por tanto
tempo, que deveria ser capaz de fazer melhor do que estou fazendo agora, assim preciso
promover a imagem que sou melhor que realmente sou”.). Idade (“Sou velho demais
para este troço experimental”). O medo de errar é paralizante!

Vagamente definido o talento é a capacidade de ser afetado por um número enorme


de coisas e expressar imaginativamente a complexidade de tudo o que se sente.

Mas, por causa das pressões sociais, nós, como atores, aprendemos a aceitar apenas os
elementos positivos de nosso talento e a recusar os elementos negativos. E você não
deve fazer isso. Como um instrumento de criatividade, você não pode dizer “Isto está
certo e está tudo bem para mim, sentir e expor aquilo. Mas, esta outra coisa não está
certa e não é bom para mim expor aquilo”. Você não pode fazer isso porque o que
acontece é que você dá um curto-circuito em seu instrumento. Se você se senta e diz a si
mesmo “Eu não vou mostrar a ninguém o que está acontecendo por baixo”, está pondo
uma tampa em tudo o que faz. Uma expressão conduz à outra e no instante em que cessa
qualquer impulso, o fluxo do seu SER também cessa. A maior parte dos atores está em
apuros no exato momento em que começam. O conceito inteiro de SER – SER ANTES
DE FAZER – SER ANTES DE ATUAR – é baseado em reconhecer, admitir, aceitar e
expressar tudo o que você sente.

Muitos pensam nas emoções como negativas ou positivas. Eles põem um julgamento de
valor em emoções Ótimas e Péssimas, sentimentos Bons e Maus. Eu não creio que
exista nada de negativo ou positivo em tudo o que se sente. Em audições, a maior parte
dos atores escolhe materiais altamente explosivos, através dos quais possam demonstrar
seu potencial. Pouquíssimos atores escolhem cenas simples. A razão para isso é a
concepção errônea que emoções fortes são mais importantes. Eu sou um ser humano
sensível, vulnerável e muito volúvel. Estes são os elementos positivos do meu talento.
As mesmas coisas que me fazem sensível, vulnerável e volúvel, também me deixam
inseguro, ansioso, deprimido, tenso e hostil. Os mesmos elementos que me afetam
positivamente também me afetam negativamente. Então, eu chego ao escritório do
produtor, e ele está compondo o elenco para um filme. Eu digo a ele “eu sou um
instrumento sensível, vulnerável e volúvel, mas também sou deprimido, inseguro e
ansioso? Não, eu não posso dizer isso a ele. Eu não quero que ele veja a minha
depressão e o meu medo. Então eu os escondo. E, no minuto em que eu escondo algo,
suprimo qualquer coisa, escondo tudo. E daí, não funciono.
Sendo assim, ao contrário disso, o que é que eu faço? Eu entro, me sento e ao invés de
“Oba! Que tempo lindo está fazendo hoje e como estava pesado o trânsito enquanto eu
vinha do interior”, o produtor vai me perguntar: Como vai? Eu deveria dizer “Bem eu
estou um pouco tenso porque não tenho trabalhado por um longo tempo e gostaria de
pegar este trabalho, mas tenho até medo de lhe dizer isso, porque você pode pensar que
eu sou inseguro para fazer o papel, mesmo que você me contrate. Mas, para mostrar
quem realmente eu sou, e assim você possa ver o meu talento, eu preciso começar a
partir de como estou me sentindo neste momento”.

Com esta abordagem, você pode espantar cinqüenta por cento de seus possíveis
empregadores, mas, os outros cinqüenta por cento, os amantes da verdade, vão
responder afirmativamente a você porque, fora das entrevistas quase sempre mentirosas,
você terá criado um momento significativo. Neste sentido, os estropiados poderão ser os
corredores de longa distância, vencedores de verdade. Se você expõe suas limitações e
deixa com que as pessoas as vejam não precisa mais escondê-las. Você está
funcionando em um nível de realidade e a partir de um nível de realidade em que pode
ser criativo. Uma vez que estabeleceu o seu estado de SER e está funcionando em
termos do que É, está pronto para lidar com a intenção do autor e as obrigações do
material. Você encontrará e executará uma escolha para lhe trazer o estado de vida que
o material exige. Em outras palavras, você parte de seu estado de SER existente para o
estado de SER exigido pelo material.

Docinho:

SE VOCÊ COMEÇA COM UM QUADRO NEGRO VAZIO,


PODE ESCREVER QUALQUER COISA SOBRE ELE.

Diferentes Estados De Ser


Docinho:

A FORMA COMO VOCÊ TRABALHA NO MUNDO,


É COMO TRABALHA NO PALCO.

Quando você atinge um estado de SER - o que significa SER e estar, neste exato
momento, aqui e agora - incluindo tudo o que está acontecendo com você, então, está
preparado para atuar. O que se quer dizer, com a palavra “atuar”, é ir do seu estado
presente de SER, para o estado de SER, que o material exige. Por exemplo, seu estado
presente de SER é: “Estou meio relaxado agora, meio deprimido e pesado, olhando pela
janela, cansado e um pouco desanimado”, mas a obrigação emocional do seu material
precisa ser um estado de excitação e alegria, quase eufórico. O personagem na peça,
acaba de ser premiado com algo, ou conseguiu alguma coisa pela qual se sente muito
exaltado. Assim, você precisa encontrar um caminho para ir deste estado de SER em
que está, para aquele estado de SER. Algumas vezes, as exigências emocionais de seu
material são totalmente opostas ao que você está sentindo, o que lhe dá uma enorme
obrigação. Muitos atores falham porque tentam pular daqui, para lá, em um único
passo. Você pode precisar caminhar através de passos intermediários, com o fim de ir da
depressão até a alegria.

Usando os estímulos disponíveis ao seu redor, ou trabalhando por escolhas imaginárias,


você tentará encontrar caminhos para se tornar menos deprimido e de alguma forma,
mais feliz. Você deve olhar para coisas que o façam se sentir melhor no espaço, ou na
sala onde estiver. Deve criar uma certa pessoa ali, que o faria muito feliz. Uma vez que
consiga um estado interino, de menos depressão e mais felicidade, já está pronto para
influenciar este estado interino, com mais escolhas, e trabalhar em direção a um estado
de alegria. Progressivamente, você encoraja um estado de SER a abrir caminho para
outro. Algumas vezes, o estado de SER com o qual começa é tão poderoso, e tem tanto
poder sobre você, que é muito difícil afetá-lo. Nestas vezes você vai avaliar o quanto é
importante conhecer seu instrumento cuidadosamente, para ter um grande repertório de
escolhas, e a habilidade de usá-los para chegar onde quer ir. Esta habilidade só chegará
com trabalho duro, e prática diária.

Quando você realmente esta SENDO, um estado leva para o próximo e o influencia
como várias cores diferentes correndo juntas, e se misturando, até que o próximo estado
de SER, se torna a cor dominante. Vimos atores que “pintam por números”, que estão
gargalhando em um momento, de repente, cessa a gargalhada e aparece a raiva.
Chamamos isto de técnica impositiva, um sintoma do ator anti-realidade. Na vida real,
um momento leva ao outro e se mistura com o próximo. E você vê as sutilezas
emocionais da mudança. Isto não acontece, a não ser que você esteja SENDO. Você
precisa começar da totalidade do estado de SER, porque não pode criar nenhuma vida
no palco, ou satisfazer qualquer obrigação, até que tenha vida acontecendo. Você não
pode criar vida, da ausência dela.

Há um processo natural de responder à vida. O processo de estímulo-efeito-resposta-


expressão. Primeiro você vê, escuta, experimenta, cheira e toca algo. Este é o estímulo.
Ele causa algum efeito em você. Seu instrumento responde a este efeito. E então você
exprime aquela resposta. O processo inteiro acontece em micro-segundos e acontece
mais e mais. Isso quer dizer que é igual á própria vida, que é SER. Se você está
funcionando a partir de um estado de SER, este processo natural continua sem
interferências. SER provoca estímulo-efeito-resposta-expressão, estímulo-efeito-
resposta-expressão, estímulo-efeito-resposta-expressão.

O ator que premedita seu comportamento, dá curto-circuito no processo em qualquer


lugar na linha de desenvolvimento. Ele está tão aplicado em executar um plano de
preparo da cena, que os estímulos podem nem sequer atingi-lo. Ou, o estímulo pode
chegar a ele, mas ele está tão compromissado com seus conceitos intelectuais, que ele
deixa de ser afetado pelo estímulo. Se ele está ocupado, estimulando um efeito, como
pode ser realmente afetado? Ou, ele é afetado por algo que acontece no palco – seu
parceiro bate em seu rosto pela primeira vez, mas ele não se permite responder, porque
ele está impondo um comportamento que sente que deveria estar presente na cena. Ele
dá curto-circuito no processo natural de vida, porque não inclui sua resposta a uma
pancada no rosto. Se sua resposta é exclusiva e premeditada, como ele pode responder
com o que ele realmente sente? Ao invés de seguir com a resposta orgânica, sua
expressão fica prostituída pelo que ele acha que o personagem deveria dizer, ou fazer.
Desta forma, uma única negativa arma uma reação em cadeia de negações, até que a
ausência de realidade fica epidêmica.

Quando o ator dá curtos-circuitos no processo natural presumindo comportamentos,


impondo atitudes, “atuando”, ele cria o que se chama de “divisões”, em seu
instrumento. Há todos os tipos de divisões – divisões vocais, divisões emocionais,
físicas e intelectuais, ou quaisquer combinações destas. O estado de SER elimina a
possibilidade de divisões, ou que as divisões ocorram. SER, conserta as divisões.

Mesmo que um ator chegue ao estado de SER e funcione organicamente, podem


acontecer limitações tanto no terreno impressivo quanto no terreno expressivo, que ele
necessita trabalhar, para manter seus estados de SER mais plenos e mais coloridos. Por
exemplo, atores tímidos e quietos, sempre são extremamente imaginativos e
sentimentais, mas incapazes de expressar coisa alguma. No reverso da moeda, existe o
tão chamado extrovertido, o exibicionista que parece inundado de expressões, mas que
pode não ser tão consciente, ou sensível. Este tipo de ator precisa de ajuda no terreno
impressivo, exercícios que lidem com sua vulnerabilidade.

Quaisquer que sejam os problemas do ator (E todos os temos em todas as etapas de


desenvolvimento.), SER é o ponto zero. Implícito em SER, está a inclusão de todos os
seus impulsos, incluindo-se todos os seus problemas, assim como as cores infinitas de
seu Arco-Íris emocional. A negação de até mesmo um tom sutil de SER, diminui a sua
contribuição total como artista. Os próximos exercícios têm mais que um propósito, são
bons para você começar, porque foram criados especificamente para ajudá-lo a SER.
EXERCÍCIOS PARA SER
1. INVENTÁRIO PESSOAL I
Este é um monólogo em Torrente-de-Consciência, que você deve fazer de forma semi-
audível, para que possa se escutar falando, mas ninguém mais possa ouvi-lo. Você se
pergunta “Como eu me sinto? E então, você expressa seus sentimentos, e continua a
fazer a pergunta. Faça por um período mínimo de dois minutos ou por um período longo
de dez minutos, e tantas vezes por dia quanto puder, com todo o conforto. Você pode
fazê-lo no supermercado, no seu carro, no restaurante, esperando por um amigo, em
qualquer lugar, de verdade. Enquanto o exercício está sendo feito, muitas coisas vão
interferir, interromper, desviar sua atenção para longe do processo. Inclua esta coisas
verbalmente em seu monólogo. Por exemplo: “Como eu me sinto? Acabo de limpar a
garganta para fazer este exercício. Eu me sinto obrigado a fazê-lo. Respirando fundo.
Como eu me sinto? Estou procurando alguma coisa para me segurar. Meus olhos estão
percorrendo a sala. Eu estou um pouco ansioso, um pouco tenso no peito. Estou
escutando uma mosca zumbindo na janela. Como eu me sinto? Eu me sinto excitado
com o trabalho que peguei hoje. E me sinto com medo por causa disso também,
começando a trabalhar nisso. Como eu me sinto? Eu me sinto – Ih! – travado. Eu não
sei muito bem como eu me sinto agora. Eu me sinto ansioso por não saber como eu me
sinto. É assim que eu me sinto. Eu me sinto ansioso! Tomando outra respiração
profunda. Eu sinto que meu estômago está inflado. Eu gostaria de perder peso. Eu me
sinto um pouco mais em contato com o que eu sinto. Um pouco menos ansioso. Estou
sentindo um pouco de excitação crescendo...eu me pergunto, de onde isto esta vindo?
Como eu me sinto? Eu me sinto melhor, etc., etc.”. O Inventário pessoal, se praticado
regularmente, põe você em contato com o que você está sentindo, e o treina para
exprimir tudo que está acontecendo momento-a-momento. Nem toda expressão é
verbal: Ela pode ser somente vocal, como um soluço, ou um grunhido. Ela alivia a
tensão e encoraja um estado de SER.

2. SER, Para UMA PESSOA SÓ


Este é um bom exercício para fazer, em seguida ao Inventário Pessoal. Não há
necessidade de continuar como processo semi-audível de se perguntar como se sente.
Simplesmente SEJA! Deixe, e permita que tudo o que você sente, se expresse
vocalmente, verbalmente e fisicamente. Admita, e inclua todos os impedimentos que
aparecerem pelo caminho para continuar realmente com tudo que seja. Se, por exemplo,
você começar a julgar a propriedade dos seus impulsos e começar a interferir com a
expressão de qualquer grupo de sentimentos, então você deve incluir seu julgamento,
seguido de qualquer impulso que seja. A coisa impressionante sobre este processo, é
que cada expressão abre o caminho para a próxima, e a próxima, depois desta. O fluxo
de realidade se torna comovente. Faça o exercício sentado, de pé, deitado, ou como
quiser. Simplesmente, se permita sentir e expressar qualquer coisa que esteja
acontecendo. Tente encontrar a sua lacuna pessoal entre obrigação e impulso.
Permita-se fazer o que sente, e não o que pensa que deveria fazer.
3. INVENTÁRIO PESSOAL II
O exercício de Inventário Pessoal que já descrevemos, é um dos melhores caminhos
para ficar consciente do que acontece dentro de você. Faça muitas vezes ao dia. Adquira
o hábito de descobrir o que você sente a qualquer momento. Faça o Inventário de como
você é afetado pelos objetos em sua volta, sejam eles animados ou inanimados. Como
dissemos antes, você faz o exercício de forma audível, ou semi-audível, se perguntando
“Como eu me sinto?”. Você pode acrescentar a pergunta “Como eu me sinto a respeito
disso? ”

Depois de se perguntar “Como eu me sinto?”, e responder à pergunta, sua próxima


questão deve ser “Eu estou exprimindo o que eu sinto? E se não estiver, “Porque não
estou?”. Está é uma pergunta importante para acrescentar, por que impede o exercício
de se tornar uma ginástica cerebral. Ele transforma o exercício em uma vigorosa
experiência de aprendizado para você. Se a sua resposta for “Não, eu não estou
exprimindo o que eu sinto.”. então se pergunte “O que eu posso fazer para me
exprimir?”, “Como posso me ajudar a expressar meus sentimentos com perspectiva das
suas conseqüências?” Por exemplo: “Eu sinto vontade de dar um soco no nariz dele.
“Bem, isto traz conseqüências para o bem-estar de mais alguém, além de mim, é claro”.
Quando as conseqüências são muito grandes, você admite a sua vontade de socar o nariz
daquela pessoa, mas faz também, uma escolha consciente de não fazê-lo. O elemento de
escolha não é tão sufocante quanto o elemento da supressão, sufocar o impulso de um
todo e escondê-lo de sua consciência.

Quando você se pergunta: “Eu estou exprimindo como me sinto? E se não estiver, por
que não?” O “PORQUE” é a palavra mais importante. O “PORQUE” vai abrir você
para o reconhecimento das coisas que o impedem de ser você mesmo. “Porque tenho
medo do que eles vão pensar de mim”. Se esta resposta continuar aparecendo, você
precisa lidar com ela, como a constatação de um problema. “Porque eu não quero que os
outros pensem que eu quero que eles pensem que eu sou menos que realmente sou”.
Uma vez que você descobriu a razão real para o seu “PORQUE”, então tente expressar
tanto quanto possa. Você tem o direito a exercer todas as suas emoções. Ninguém, em
lugar nenhum, em nenhuma posição, tem o direito de negar o que você sente. Você tem
o direito à soma total de tudo o que você é. E não é sempre ótimo. Não é sempre bom,
ou social, ou polido, ou preocupado com os outros. Algumas vezes você é amoroso,
generoso, e ama alguém que não é amoroso e generoso, e se decepciona. Você tem
direito a esta decepção assim como a pessoa tem o direito de não amá-lo.

No momento em que você impõe, ou aceita regras para o que você deve sentir, estas
regras se transportam para o palco, ou para a câmera. Elas se transportam porque são
as regras e condições com as quais você vive. Isso não quer dizer que você deveria se
tornar um animal, bater na cabeça dos outros e roubar nos supermercados. Não é isso,
de jeito nenhum, o que queremos dizer. Há um certo nível de moralidade, no qual as
pessoas vivem. Mas, todas as pessoas têm a licença para serem elas mesmas, e
acreditamos que nós, atores, temos uma licença especial, por que nossos sentimentos
são o nosso estoque de produtos para o mercado.
LIÇÃO DE CASA!!!

4. Eu Sou (Estou), Eu Quero, Eu Preciso, Eu Me Sinto


(Sinto) Rapidíssimo!
Em voz alta, do tipo Torrente-de-Consciência, mas muito rapidamente, para que você
não tenha a chance de refletir ou premeditar o que vai dizer. O propósito é surpreender
você mesmo com o que surgir. Comece cada frase com uma das quatro afirmações, não
obrigatoriamente nesta ordem. Por exemplo: “Eu quero fazer este exercício... Eu sou
tenso... Eu preciso ser bom... Eu preciso ser visto... Eu me sinto consciente de mim
mesmo... Eu sinto os meus dedos... Eu preciso de dinheiro... Eu sou o que sou... Eu me
sinto tolo... Eu quero rir... Eu estou rindo... Eu preciso de amor... Eu sou feliz... Eu
quero saber o que eu quero... Eu me sinto pleno... Eu preciso de espaço... Eu estou
fugindo das coisas...!” O exercício é feito propositalmente para sintonizar seus impulsos
com o formato “Eu sou ou eu estou, eu quero, eu preciso, eu sinto ou eu me sinto”.
Quando você responde à frase específica de “autoquestionamento”, sua consciência da
realidade, a cada momento fica mais clara. O elemento importante é a impulsividade da
sua resposta. Se você levar um instante para pensar sobre a resposta, você pode estar
apenas preenchendo o vazio com o seu pensamento condicionado ao invés de seu
verdadeiro sentimento. É importante dizer que, se você tiver “um branco”, diga a
primeira coisa que lhe vier à cabeça, não importa quão sem lógica, ou sem sentido ela
possa parecer. Você pode repetir: Eu sou, Eu estou, Eu quero, Eu preciso, Eu sinto ou
Eu me sinto, muitas vezes, mas tenha coragem de ir e voltar entre as quatro afirmações.
Bagunce!

5. O Que Eu Quero? Lentamente!


O propósito deste exercício é descobrir o que você quer aqui e agora, mas em um
sentido mais amplo! O exercício é diferente de Eu sou, Eu quero, Eu preciso, Eu sinto,
porque não é feito impulsivamente. A razão aqui é descobrir o que é a vida que está em
uma camada mais profunda (Por ex: O que eu quero em um sentido mais completo?). A
ênfase é sobre uma visão superior, de sentido mais intelectual e filosófico do que você
quer em sua vida. É preciso começar por um nível de aqui-e-agora para encorajar um
fluxo mais livre e evitar que seja precipitado. A maneira de fazer é como se fosse um
Inventário Pessoal, mas com a pergunta ‘O que eu quero?”, ao invés de ”Como eu me
sinto?”. Por exemplo: O que eu quero? Eu quero descobrir o que eu quero. O que eu
quero? Eu quero ser mais feliz do que sou. Eu quero trabalhar mais. Eu quero ser bom.
Eu quero que as pessoas me respeitem. O que eu quero? Eu quero não me incomodar
com estas coisas. Eu quero ter sucesso. Se você quiser, pode incluir este exercício em
Inventário Pessoal, ao invés de fazê-lo separadamente.

A intenção do “Método” é o alcance de uma realidade orgânica no palco. Toda a


realidade no palco é ostensivamente criada a partir da vida interior do ator, de suas
próprias experiências de vida. O “Método”, e suas técnicas inerentes, são estruturados
para este fim; entretanto, o sistema não diz ao ator como isto é alcançado. Como todas
as pessoas são diferentes e têm problemas que são únicos para elas mesmas, como pode
qualquer sistema “formularizado” funcionar da mesma forma para todos? A resposta é:
Não pode! Eis porque o “Método” não é integralmente usado e respeitado. A busca, o
processo de descobrir você mesmo e alcançar um estado de SER – por assim dizer, UM
ESTADO DE SERMOS NÓS MESMOS, TOTALMENTE – é o que este livro oferece
ao ator. SER é a fundação primária e básica para um processo criativo. Uma vez que o
ator chegue à realidade de sua fundação, a verdade, a sua verdade, neste momento e
neste lugar, ele está pronto para efetivar esta verdade e mudar para qualquer coisa que
seu material exija. SER não é um estado que você alcança imediatamente, é um modo
de vida que se desenvolve a partir de trabalho duro e muita experimentação. Além de
exigir ingredientes como talento e compromisso, é preciso que você tenha CORAGEM.
Você precisa desejar fazer escolhas. E algumas vezes, sofrer as conseqüências de suas
ações, para perseguir sua individualidade e fazer sua “Declaração na Vida” e “No
Palco”. Lembre-se que ninguém colaborou com nada que fosse duradouro no mundo
sem correr riscos e passar por ressentimentos e controvérsias, por parte das pessoas a
seu redor. Viver e atuar são quase sempre colocados em separado e não deveriam ser.
Os exercícios neste livro são especificamente construídos para se tornarem as suas
ferramentas, para construir uma ponte sobre o vazio entre você e seu trabalho. O
espantoso impacto de SER completamente no palco é arrepiante para todo o público.
Quando você alcança o SER, cada pedaço de você sabe! O sentimento é inconfundível.

Se você usar o trabalho prescrito aqui, praticar estes exercícios diariamente e fizer desta
abordagem parte de sua vida, irá experimentar este estado mágico de SER. Os
resultados com este trabalho são cheios de recompensas e maravilhosas surpresas.

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