Primeiramente se estamos perante concurso de normas e havendo concurso
de normas, há normas que são parecidas em benefício de outras. Se no final tivermos uma norma então é por essa razão que o agente vai ser responsabilizado. O agente não é punido cumulativamente. Mas podemos chegar ao final com 2 ou mais normas, isto se o concurso tiver bem feito, e aí estamos no concurso de crimes. Aqui o agente é punido cumulativamente. Há várias normas para a resolução de uma situação de facto, mas apenas uma se aplica. Há um concurso aparente ou falso concurso. No concurso de crimes há várias normas que são colocadas à resolução daquele caso e todas se aplicam (cumulativamente). Contrariamente aqui, estamos perante um verdadeiro concurso. O artigo 131º CP está a punir a ação de matar e o resultado morte. Podemos ter uma ação de matar sem morte, e podemos ter morte sem ação de matar. EXEMPLO: tentativa de homicídio. Na ação de matar estão incluídas as ofensas à integridade física. Quando se pune o homicídio, já se puniu, na ação de matar a violência utilizada para provocar a morte. Porque se fossemos punir pelo 131º e pelo 143º CP estávamos a punir duas vezes pelo mesmo (ne bis in idem - proibição da dupla incriminação), ninguém pode ser julgado e condenado mais do que uma vez pelo mesmo facto. Ou seja, estávamos a punir cumulativamente pelas ofensas. Neste caso, o agente seria punido pelo 131º CP porque o que consta do 143º CP está incluído no 131º CP. Concurso de normas: Relação de especialidade relação de sobreposição. Há aqui uma relação de especialidade porque ao punirmos por C, também estamos a punir por A. Porque a norma geral está contida na especial. EXEMPLO: artigo 131º (geral) artigo 132º (especial). EXEMPLO: no caso do artigo 132º alínea a) CP estávamos a punir pelo 131º (homicídio) e ainda punir pelo 132º por ser o pai. Ou seja, estávamos a punir duplamente quando o artigo 132º já inclui o 131º com o acréscimo. Neste caso, em face da relação de especialidade o 131º “cai”, porque a norma especial derroga a geral.Geralmente ao nível do concurso de normas, de uma forma ou de outra, um dos critérios é ir buscar a norma que prevê a pena mais grave. Isto porque, a norma mais grave engloba mais coisaa. Seja nas relações de subsidiariedade, seja nas de consumação, mas não nas de especialidade. Isto porque, nestas aplicamos sempre a norma especial que, por vezes, contém uma pena menos grave que a norma geral EXEMPLO: art 131º e 133º aplica-se sempre a norma especial, nas relações de especialidade. Numa relação de especialidade confrontámos as normas, verificamos se uma é inteiramente consumida pela outra e se lhe acrescentava alguma coisa. Se sim, estamos no âmbito de uma relação de especialidade e aplicamos a norma especial. Se a norma não estiver contida inteiramente então não há relação de especialidade. Relação de subsidiariedade neste caso, há uma relação de interceção. Duas normas que tem uma parte não comum à outra, mas ambas tem uma parte comum às duas normas. Se a parcela que podemos punir, cabe na parte de A e de B, então significa que está preenchida a norma A e a norma B. E se podemos em concurso efetivo então estamos a punir duas vezes pelo mesmo comportamento. O problema coloca-se quando o facto se situa na zona de interseção. E se se enquadra nessa zona, significa que o resto facto dá por preenchidas duas normas e neste caso há concurso de normas, logo não podemos punir, cumulativamente, pelas 2 normas. Ao nível da subsidiariedade temos: Lei primária, estabelece a pena mais grave; Lei subsidiária, estabelece a pena menos grave Neste caso, a lei primária derroga a lei subsidiária. O problema é identificar a relação de subsidiariedade. Temos de ver qual a norma que tem a pena mais grave e é essa que aplicamos. Existem dois tipos de subsidiariedade: Explicita (ou expressa) –prevista na EXEMPLO: 375º/379º/150º nº2/ 292º CP), o próprio legislador diz que o agente é punido com esta pena, se pena mais grave lhe não couber. Implícita – não está prevista na lei. É preciso usar raciocínios, interpretar judicialmente. EXEMPLO: A mata um lince ibérico propriedade de B A preenche a norma do artigo 212º na parte do critério de dano, mata uma coisa que é propriedade alheia, mas ao mesmo tempo preenche o art 272º por destruir exemplares protegidos. Neste caso, o mesmo comportamento surge no espaço comum, logo há relação de subsidiariedade, no caso, implícita porque o legislador não se refere a ela expressamente. Outro caso é a relação de subsidiariamente entre as ofensas corporais graves do artigo 144º/1 CP e a mutilação genital feminina, artigo 144º-A. A mutilação genital feminina pode revestir, segundo a OMS, quatro modalidade. Durante muito tempo discutiu-se a relação destes artigos porque parecia que a mutilação genital feminina já se encontrava no artigo 144º CP. Mas afinal, o que faz o artigo 144º-A? No fundo, o que temos neste artigo, é uma ofensa à integridade física grave que tem de ser praticada por uma certa e determinada forma, que é a mutilação genital feminina. Todas as formas ditas pela OMS levam, necessariamente ou eventualmente a problemas de procriação, mas essencialmente a problemas de função sexual. Temos aqui uma relação de especialidade porque todo o art 144º pelo menos nesta alínea está np 144º-A. E o 144º-A acrescenta alguma coisa, que é o modus faciendi, ou seja, no caso do 144º-A prejudica-se a função de procriação e de fruição sexual da mulher através da própria mutilação. A questão é que a mutilação genital feminina existe (e é isso que faz com que estejamos a colocar ao nível da subsidiariedade), EXEMPLO, ao nível da excisão ela persiste e é punível mesmo que em concreto não se verifique as situações da alínea a) do 144º CP. Portanto, isso permite que possa haver uma relação de subsidiariedade entre a mutilação genital feminina e as ofensas graves. Por outras palavras, há ofensas à integridade física grave que não só a mutilação genital feminina. Pode haver mutilação genital feminina não acompanhadas de ofensa à integridade física grave e aí estamos fora do concurso se subsidiariedade. Se houver mutilação genital feminina, através de várias modalidades previstas no 144º-A acompanhadas da privação da fruição sexual, de causar doença particular, afetar capacidade de procriação então estamos no domínio da subsidiariedade e aí aplicamos aquela que prevê a pena mais grave. No caso aplicamos a mutilação genital feminina por ser a que reforça o ilícito que está em causa. Por ser a mesma pena levanta críticas quanto à autonomização da mutilação genital feminina. EXEMPLO: 375º “…se a pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal” subsidiariedade explicita/expressa Artigo 292º CP “…se pena mais grave..”, mas se o condutou atropelar uma pessoa e a matar, ainda que negligentemente passamos para o 137º CP . significa que ele não pode ser punido cumulativamente porque a ação de matar é ele estar bêbado. Passando a ser punido pela pena mais grave artigo 137º CP. Relação de consunção A relação que existe entre estas normas é de mera justaposição. As normas estão lado a lado, uma em relação à outra sem se sobreporem. No máximo dos máximos podem chegar à mera tangência, pode se tocar apenas, mas nunca levar à sobreposição, isto porque se tivermos na sobreposição parcial estamos na subsidiariedade e se tivermos uma sobreposição total estamos na especialidade. Estas são situações em que nenhum A é B e nenhum B é A, o comportamento ou cai na norma A ou na norma B. A mesma ação pode ser um fim em si mesmo ou pode ser apenas um meio para atingir um outro fim EXEMPLO: ofensa à integridade física dou um soco em alguém. O soco que dei pode ser um fim em si mesmo, mas aquele soco pode ser o primeiro de vários socos que acabarão quando a pessoa estiver morta; EXEMPLO: A dá uma facada no B, essa agressão pode ser um fim em si mesmo porque A resolveu vingar se de B, ou então aquela facada é um ato instrumental, um meio para provocar a morte. Importa desde logo saber o que o agente pretende com aquela ação, por isso é que há determinadas situações em que é apenas uma forma, um meio e outras em que é um fim em si mesmo. Se A é um fim em si mesmo, o problema fica resolvido. O problema é se A é um meio para atingir B e se A é um meio absoluto/necessário, indispensável e incontrolável para atingir B, então o legislador quando manda punir A, manda punir o resultado de A e o percurso ou a forma pela qual chegámos a B. Significa isto que neste caso quando o legislador determina a punição de A está a punir o resultado na medida em que foi instrumental para chegar ao B é o exemplo das ofensas à integridade física. Quando o legislador pune o homicídio (matar outra pessoa), está a punir se a morte de uma pessoa mas não só, porque se a pessoa morre com os relâmpagos ou tremor de terra ninguém é punido, quando se pune o homicídio de uma pessoa, portanto, quando punimos o homicídio punimos a ação de matar (ação que levou à morte), mais o resultado morte. Nestas situações, apesar de haver uma justaposição entre as normas, a verdade é que a norma B está a integrar em si a norma A, na medida em que era instrumental, portanto, a punibilidade de B corresponde em si à punibilidade de A. Temos assim, a relação entre as normas instrumento (aquelas que ele se serve para conseguir obter o resultado previsto na norma jurídica) as normas fim (aquelas que tende a conduta do agente). Nas relações de consunção devemos punir sempre pela norma que prevê a pena mais grave. Geralmente a norma que prevê a pena mais grave é a norma fim porque a norma fim contém em si a norma instrumento mais alguma coisa. Mas nem sempre é assim pois existem casos em que a norma instrumento prevê uma pena mais grave do que aquela que existe na norma fim. EXEMPLO: Burla e falsificação de documentos A falsifica documentos para através dos documentos falsos obter um benefício que ele sabe que não tem direito, a norma fim é a burla, a norma instrumento é a falsificação. Neste caso, a pena de falsificação é mais grave do que a burla, como a regra é a que prevê a pena mais grave que se aplica, então se a pena mais grave estiver na norma fim falamos de consumação pura; se a pena mais grave estiver na norma instrumento é a norma instrumento que se aplica e estamos perante uma consunção impura. Conclusão Num momento em que aparecer várias normas a concurso (2 ou mais normas) temos de combinar as normas e passá-las pelo curso das relações que vimos (subsidiariedade, especialidade, consunção). Norma A e norma B o Existe entre elas uma relação de ESPECIALIDADE? Se sim, problema resolvido. Aplicamos a especial. o Se não, vamos ver se existe de SUBSIDIARIEDADE? Se sim, aplicamos a norma que prevê a pena mais grave. o Se não, vamos ver se existe de CONSUNÇÃO? Se uma é instrumento de outra. Se sim, vamos ver a que prevê a pena mais grave. De for a norma fim, estamos perante uma consunção pura; se for a norma instrumental, estamos perante uma consunção impura. Se chegarmos à conclusão de que também não há uma relação de consunção então estamos perante um concurso de crimes (e não de normas), sendo o agente punido cumulativamente por ambas as normas. Aqui não estamos a violar o “ne bis in idem”. Concurso de crimes Os concursos de crimes acontecem quando, esgotadas as possibilidades do concurso de normas, continuamos com mais do que uma norma. Assim, há várias normas a concorrer para a resolução do caso, todas elas são necessárias para a sua correta configuração jurídica e, portanto, todas elas se aplicam. Há um verdadeiro concurso de crimes. Determinação da pena temos de ver qual a pena abstratamente aplicável para o crime. Depois temos de determinar 71º 72º vão determinar circunstancias que deponham contra o favor do agente. Ao fixar a pena, o Tribunal tem de pensar na questão da culpa do agente (grau de censura de conduta e de reprovação social) e das exigências de prevenção (prevenção especial e prevenção geral positivas). No final o agente sera punido por uma única pena 77º. Se for apenas um crime está resolvido. Se for vários crimes é pelo somatório das penas individuais (cumulo material). Quando este somatório ultrapasse os 25 anos (cumulo jurídico) o juiz “conta” pelo limite dos 25 anos. Em seguida, obtida a pena, o tribunal vai pegar e ter atenção à ressocialização e à culpa. Pressupostos da teoria da infração penal: 1º ação O direito penal é o dos comportamentos humanos, e, como tal, a acção é o primeiro pressuposto da responsabilidade criminal, e exige um comportamento humano e voluntário. No direito civil, a vontade de acção significa a vontade de executar determinado comportamento, e é em si absolutamente neutra. Contrariamente, a vontade de declaração pressupõe que, além de ter a vontade de acção, tenha a consciência e a vontade e de estar a emitir uma determinada declaração negocial (246º CC). Na coacção física, nem sequer há vontade de acção. Na falta de consciência da declaração, há vontade de acção, mas não há vontade de declaração. Fala-se ainda da vontade funcional, que é a vontade, através de uma acção e uma declaração, de querer produzir determinados efeitos jurídicos (ex. negócios simulados). Por sua vez, quando se fala em acção no direito penal, o que se está a exigir e que o comportamento em causa seja acompanhado dessa vontade de praticar determinado comportamento, sem considerar a vontade de acção, de declaração, nem funcional. Assim, a acção relevante para o direito penal tem de ser uma acção acompanhada de vontade de acção; ou seja, apenas revelam para o direito penal os comportamentos voluntários (dominados ou domináveis pela vontade) – actio libera in causa (acções livres na causa). Estas acções são aqueles comportamentos que não domináveis no momento em que aconteceram, contudo, o agente é responsável de culposamente se ter colocado na incapacidade de os dominar (ex. um agulheiro da estação de comboio que adormece e provoca um acidente por não ter realizado a sua função não é responsável pelo que aconteceu naquele momento, mas é responsabilizado pelo facto de ter havido um momento em que ele pode decidir se se deixava adormecer ou não). Apenas o Homem é susceptível de vontade ou falta dela, não podendo falar da vontade dos animais no sentido jurídico, uma vez que o direito é única e exclusivamente para as pessoas já que estas são as únicas que têm personalidade jurídica. Desta forma as exigências das acções penalmente relevantes são:- ser uma acção humana;- ser uma acção voluntária (dominado ou dominável pela vontade). Entram no conceito de não acção do direito penal tudo aquilo que não forem comportamentos humanos e voluntários (dominado ou dominável). Nestes casos, as acções não serão penalmente relevantes. Factos não humanos: actos de animais ou efeito das forças na natureza (ex. rajada de vento forte empurra alguém contra um objecto, assim danificando-o; aquaplano que causa um acidente de um automóvel que está em perfeitas condições de condução e respeita código da estrada, …);Factos não voluntários: Vis absoluta (coação absoluta), coacção física, força irresistível, actos reflexos ou actos em curto circuito (estímulos que, por um instinto de sobrevivência, fazem reagir de forma automática). Esta acção pode ser um comportamento por acção ou um comportamento por omissão. No direito penal punem-se as acções e as omissões (486º CC). No caso das omissões, podemos ser responsabilizados por ter deixado morrer alguém, quando podíamos ter evitado essa morte. Todos estamos proibidos de matar, e se o fizermos, somos responsabilizados criminalmente; mas quanto à obrigação de não deixar morrer, só alguns estão obrigados a que isso não aconteça (10º). - Numa praia, uma criança que se encontra a afogar-se, as únicas pessoas que têm dever jurídico que pessoalmente os obrigue a evitar que a criança morra são o nadador-salvador ou os pais (ou aqueles a quem os pais tenham transmitido essa obrigação - pais do amigo, babysitter, professor, …). As restantes pessoas que estão a assistir na praia podem eventualmente ser acusados por omissão de auxílio (200º), mas não o serão pelo crime de homicídio.Em suma, no direito penal a acção é decomponível em acção e omissão, no entanto os termos da responsabilidade penal são diversos consoante estamos perante uma acção ou um a omissão. Em relação ainda às omissões, no direito penal analisa-se ainda o exaurimento do tipo ou a consumação do crime, onde a questão se relaciona em saber quando é que o crime por omissão se encontra consumado. Assim, temos as:Omissões puras ou próprias: quando o agente é punido pela omissão de um comportamento, independentemente das consequências que daí advenham (200º). Aqui está em questão o facto de alguém poder prestar auxílio a outrem numa situação de calamidade, acidente, … e não o fazer. Existe um dever geral de auxílio (e não o dever que pessoalmente obriga aquela pessoa ao auxílio, como nas omissões impuras). Ex. um médico que tem o vizinho que lhe bate à porta e pede socorrer a sua esposa, mas o médico pede para esperar. Quando finalmente chega para prestar auxílio, a doente já está no hospital a ser socorrida. Este médico terá de ser responsabilizado, mesmo que a vizinha saia incólume desta situação ou morra (284º). Omissões impuras ou impróprias: a consumação do crime exige que daquela omissão advenha um determinado resultado (10º/2). Se nestes casos o resultado não acontecer, podemos estar perante uma tentativa. Tipicidade Este requisito existe para verificar se, perante a responsabilidade criminal, aquela acção humana e voluntária que foi individualizada ao nível do conceito da acção seja uma das que estão declaradas numa norma penal – princípio da legalidade penal e princípio da precedência da lei (nullum crimen sine lege, nullum poena sine lege, 29º CRP e 1º CP). Ou seja, há uma demonstração de que um comportamento individual e concreto que foi individualizado ao nível da acção está previsto numa norma penal geral e abstracta, havendo, assim, a garantia do funcionamento do princípio da legalidade penal. A tipicidade divide-se entre a tipicidade objectiva e a tipicidade subjectiva, conforme definido pela teoria dos finalistas. Isto significa que a descrição geral e abstracta do hipotético comportamento social é uma descrição feita objectivamente e subjectivamente. Assim, para que a tipicidade se verifique, a acção humana e voluntária terá de ser simultaneamente objectiva e subjectivamente típica. Quando se fala em tipo, refere-sce ao tipo de crime, que se distingue em três configurações: Tipo em sentido amplo: quando é uma acção típica, lícita, culposa e punível; ou seja, corresponde ao comportamento punível. Uma acção só é típica quando esse comportamento for punível. Tipo em sentido intermédio: a conduta do agente é típica quando for uma acção típica, lícita e culposa; ou seja, é típica por lei e declarada punível por lei, mas que pode em concreto não ser punível porque, por exemplo, prescreveu a responsabilidade criminal. Tipo em sentido restrito: corresponde ao conceito da acção típica ou da mera correspondência entre o comportamento individual e concreto do agente e do comportamento geral e abstracto da norma. Por defeito, quando se fala no conceito de tipo, fala-se do conceito de tipo em sentido restrito. Tipicidade objetiva Na tipicidade objectiva encontramos a descrição objectiva da conduta do agente, desconsiderando a sua motivação, vontade, capacidade ou reconhecimento de representação, … atendendo apenas àquilo que o agente fez e as consequências do seu comportamento. Classificação dicotómica dos tipos quanto aos seus elementos constitutivos 1ª Quanto à qualidade do agente: Nesta matéria, os crimes podem ser comuns e específicos; os específicos podem ainda ser específicos próprios ou específicos impróprios. Este critério tem em atenção aqueles que podem cometer aquele crime. Ex: comparar o 200º com o 284º. Em ambos os casos alguém está a não auxiliar outra pessoa que se encontra numa situação de perigo; a diferença é que no 200º essa pessoa é qualquer pessoa, é um “quem”, no 284º esse alguém é o médico. Significa que existem crimes que podem ser praticados por qualquer pessoa e crimes que só podem ser praticados por pessoas dotadas de determinadas ou investidas em determinadas funções; Ex: 372º, 373º só podem ser cometidos por aqueles que tem a qualidade de funcionário (386º quem é o funcionário); 370º o advogado ou o solicitador. 2ª Relação entre a conduta e o evento (resultado): Importa aqui distinguir duas categorias de crimes, os crimes de resultado e os crimes de mera atividade. Os crimes de mera atividade ou crimes formais são aqueles que para estarem consumados basta que o agente pratique uma ação, independentemente dos resultados que daí advenham; os crimes de resultado são aqueles que só estão consumados quando o agente praticar uma determinada ação e dessa determinada ação advier como sua consequência um determinado resultado. Atenção, os crimes só estão consumados quando dessa ação advier um determinado resultado e não que o agente só é punido quando dessa ação advier um resultado. Isso é diferente, no caso do homicídio, o crime de homicídio só está consumado quando a vítima morrer, mas o autor pode ser punido mesmo que a vítima não morra a título de tentativa. Não é isso que está aqui em discussão e sim consumação. Quando é que se dá a consumação e o que é necessário para a consumação? Ou seja, a consumação basta-se pela prática de uma ação ou a consumação exige que dessa ação advenha um determinado resultado, uma determinada consequência ou um determinado evento? Esta distinção é importante, desde logo, porque os crimes de resultado são os únicos que admitem a punibilidade da tentativa; uma outra consequência é que apenas os crimes de resultado, para efeitos do artigo 10º admitem a equiparação das omissões às ações. Significa que quando o crime é um crime de mera atividade ou exista a prática daquela ação e o agente é punido, ou, se não existe, por aquele crime não é punido. Quando o crime exige um certo resultado é punida não apenas a ação que produz o resultado como a omissão da ação que se tivesse sido praticada impediria o resultado de acontecer. 3º Estrutura do comportamento (ação típica): Aqui temos crimes por ação e crimes por omissão. Já os debatemos quando estudamos o conceito de ação. Em alguns casos o legislador pune a ação quando impõe que não façamos e há casos em que pune a omissão quando impõe que façamos. Se o legislador está a punir o facere é porque nos impunha um non facere. Se o crime é um crime por omissão significa que o legislador está a punir um non facere e se ele pune o non facere significa que nos impunha uma obrigação de facere. Ex: 131º ele pune a ação de matar porque impunha que não matássemos. 4º Grau de lesão do bem jurídico: Crimes de dano e crimes de perigo. Está em causa saber se a estrutura típica e o comportamento típico exigem que o bem jurídico seja danificado ou destruído (dano) ou se se basta pela mera colocação em perigo (perigo) desse mesmo bem jurídico. Não confundir este critério com o 2º, não tem a ver. Podemos ter crimes de mera atividade que são crimes de dano e podemos ter crimes de resultado que são crimes de perigo. Há crimes que só estão consumados ou cuja conduta típica exige uma efetiva destruição do próprio bem jurídico – Ex: crime de homicídio; há outros crimes cujos comportamentos não implicam um dano, mas em que o legislador se basta porque esses bens jurídicos sejam constituídos numa situação de perigo – Ex: 138º Exposição ou abandono (2 crimes diferentes, crime de exposição ou crime de abandono). Enquanto que o crime de homicídio para estar consumado exige a verificação do dano morte, no artigo 138º para estar consumado basta- se que alguém coloque outra pessoa, expondo-a ou abandonando-a a uma situação de perigo mesmo que ela venha a ser resgatada e nada lhe venha a acontecer. Ex: 291º Basta a produção de um perigo, não exige que se atropele alguém. Exige que a condução seja perigosa e esse perigo tem de acontecer. É um crime de perigo e de resultado. 5º Modo de formação: Temos os crimes de forma livre e os crimes de forma vinculada. Os crimes de forma livre são aqueles que a ação típica pode ser qualquer uma desde que consiga produzir o resultado. Ex: homicídio. Para que seja punido pelo homicídio tem de matar de uma forma capaz de provocar a morte (esfaqueamento, tiro, afogamento, asfixia, etc.). Os crimes de forma vinculada são aqueles em que os crimes só são punidos se praticados de determinada forma. 6º Modo da perfeição: Temos os crimes consumados e os crimes tentados. Os crimes consumados são aqueles em que a previsão típica se preenche na sua totalidade. Os crimes tentados são aqueles em que a ação típica é praticada, mas ela por causa independente da nossa vontade não produz o resultado e ficamos pela tentativa. 7º Momento da consumação: Crimes instantâneos, crimes duradouros e crimes continuados. Os crimes instantâneos são aqueles que se consumam num determinado lapso de tempo. Ex. homicídio. Quando é que se consuma o homicídio? No momento da morte. Os crimes duradouros são aqueles em que a ação de consumação é suscetível de se protelar no tempo. Ex. Sequestro. Este crime começa com o início da privação da liberdade e termina quando a vítima é devolvida à liberdade. Significa que no crime de sequestro o momento da consumação pode ser 1, 2, 20 anos. É o tempo que durar a privação da liberdade. O crime continuado está previsto no artigo 30º e como já vimos é uma ficção jurídica porque se traduz na combinação de várias parcelas individuais que o legislador tratará como um só crime. Dano vs resultado Tendencialmente (mas não necessariamente assim) os crimes de resultado são crimes de dano e os crimes de perigo são crimes de mera atividade. Por exemplo, crimes de dano que são, simultaneamente, crimes de resultado, como o homicídio. Este é de resultado porque além da ação praticada pelo agente, que é típica, exige-se que dessa ação advenha um resultado típico que é a morte. É necessário que além da ação de matar haja a produção do resultado que é a morte. Por sua vez, esse resultado exigido pelo tipo é um dano e não apenas um perigo. É um dano do bem jurídico vida e não apenas uma colocação em perigo do próprio bem jurídico. Dano vs mera atividade Há situações em que determinados crimes podem ser crimes de dano e apenas crimes de mera atividade. Ex: 190º violação de domicílio – é de mera atividade porque está consumado com a simples entrada no domicílio; e de dano porque se o bem jurídico é a privacidade do nosso domicílio a entrada nela sem consentimento implica uma lesão desse mesmo bem jurídico. Perigo vs resultado Situações em que o crime pode ser de resultado e apenas de perigo, Ex: 289º Condução perigosa, o crime só está consumado quando à ação típica do agente se seguir a produção do resultado que é o efetivo perigo. Também no 291º. Os crimes de perigo concreto são, por natureza, crimes de perigo e crimes de resultado Perigo vs mera atividade Casos em que o legislador pune a possibilidade de perigo, não sendo exigido que aquele perigo produza um resultado. Ex: 292º basta conduzir com 1.2 g/l. Um crime não poder ser ao mesmo tempo de dano e perigo nem de mera atividade e resultado. A resolve assaltar a casa de B. Já no seu interior é surpreendido pelo proprietário, que tenta detê-lo. Para poder pôr-se em fuga, A agride B, com um ferro na cabeça. B sobrevive depois de 3 meses de incapacidade para o trabalho (baixa médica). A conseguiu furtar duas valiosas salvas de prata que ulteriormente lhe foram apreendidas e devolvidas a B. a) Quais as normas aplicáveis aos crimes praticados? 190º - Violação de domicílio ou perturbação da vida privada: 190º/1;190º/3; 203º + 22º - Tentativa de furto simples: 203º/2 – tentativa é punível, excepção ao 23º/1;203º - Furto simples consumado; 204º + 22º - Tentativa de furto qualificado: 204º/1, al. a) + 22º 204º/1, al. f) + 22º 204º – Furto qualificado consumado: 204º/1, al. a); 204º/1, al. f); 210º/1 + 22º - Tentativa de roubo: 210º/1 – Roubo consumado: 210º/2, als. a) e b) + 22º - Tentativa de roubo qualificado: 210º/2, als. a) e b) – Roubo qualificado consumado; 143º/1 Ofensa à integridade física simples; Não há tentativa de ofensa à integridade física simples porque o 143º não o prevê expressamente e também porque a pena é até igual a três anos, inferior ao estabelecido no 23º. 144º, al. b) + 22º - Tentativa de ofensa à integridade física grave; 144º, al. b) - Ofensa à integridade física grave consumado; 131º + 22º - Tentativa de homicídio simples;132º, al. g) + 22º - Tentativa de homicídio qualificado; b) Resolva o concurso de normas. Para resolver o concurso de normas, teremos de analisar as relações entre as mesmas de forma a perceber quais as normas que deverão ser mantidas ou descartadas. Desta forma, temos que: 190º/1 vs 190º/3: relação de especialidade, onde 190º/1 é a norma geral e 190º/3 é a norma especial. Neste tipo de relações, a pena a aplicar é sempre a da norma especial. 203º + 22º vs 203º: estamos perante uma relação de consunção, onde o crime consumado do 203º (norma fim) consome o crime tentado do 203º + 22º (norma instrumento). Portanto, há uma consunção pura onde a norma fim prevê uma pena mais grave do que a norma instrumento. 204º/1, als. a) e f) + 22º vs 204º/1 als. a) e f): mais uma vez, estamos perante uma relação de consunção, onde o crime consumado do 204º/1, als a) e f) (norma fim) consome o crime tentado do 204º/1, als a) e f) + 22º (norma instrumento). Portanto, há uma consunção pura onde a norma fim prevê uma pena mais grave do que a norma instrumento. 203º vs 204º/1, als a) e f): há uma relação de especialidade, onde o 204º/1, als a) a f) é a norma especial e o 203º a norma geral. Desta forma, a norma especial derroga a norma geral – 204º/1, als a) e f). 204º/1, als a) e f) vs 190º/3: existe aqui uma relação de consunção, onde a violação de domicílio foi instrumental para o furto que aconteceu, significando que o 204º/1, als. a) e f) consome o 190º/3 numa consunção pura. 210º/1 + 22º vs 210º/1: estamos perante uma relação de consunção, onde o crime consumado do 210º/1 (norma fim) consome o crime tentado do 210º/1 + 22º (norma instrumento). Portanto, há uma consunção pura onde a norma fim prevê uma pena mais grave do que a norma instrumento. 210º/2, als. a) e b) + 22º vs 210º/2, als. a) e b): estamos perante uma relação de consunção, onde o crime consumado do 210º/2, als. a) e b) (norma fim) consome o crime tentado do 210º/2, als. a) e b) + 22º (norma instrumento). Portanto, há uma consunção pura onde a norma fim prevê uma pena mais grave do que a norma instrumento. 210º/1 vs 210º/2, als. a) e b): há uma relação de especialidade, onde o 210º/2, als. a) e b) é a norma especial e o 210º/1 a norma geral. Desta forma, a norma especial derroga a norma geral – 210º/2, als a) e b). 210º/2, als. a) e b) vs 204º/1, als. a) e f): no 204º/1, als. a) e f) estamos a punir uma subtração, o furto, o facto do furto ter sido de valor elevado e o facto de esta Acão ter sido efetuada entrando ilegitimamente na habitação de uma pessoa. Pelo 210º/2, al. b) considera-se que todo o ilícito do furto está contido já no ilícito do roubo. Desta forma, pode ser discutível estarmos perante uma relação de subsidiariedade e uma relação de consunção. A ser uma relação de subsidiariedade, terá uma relação de subsidiariedade implícita dado que o legislador não a refere expressamente. Considera-se, de facto, haver uma relação de subsidiariedade implícita e não uma de consunção, uma vez que, conforme analisado, existe uma clara sobreposição entre o furto qualificado e o roubo qualificado, continuando a haver situações de roubo que não são furto, nomeadamente as em que não há subtracção, mas constrangimento à entrega. Da mesma forma que há situações de furto que não são roubo (subtracção e recurso à violência). A solução neste caso passa por aplicar a norma mais grave, que se consubstancia no 210º/2, als a) e b). 144º, al. b) + 22º vs 144º, al. b): estamos perante uma relação de consunção, onde o crime consumado do 144º, al. b) (norma fim) consome o crime tentado do 144º, al. b) + 22º (norma instrumento). Portanto, há uma consunção pura onde a norma fim prevê uma pena mais grave do que a norma instrumento. 143º/1 vs 144º, al. b): há uma relação de especialidade, onde o 144º, al. b) é a norma especial e o 143º/1 a norma geral. Desta forma, a norma especial derroga a norma geral – 144º, al. b). 131º + 22º vs 132º, al. g) + 22º: havendo dolo eventual de homicídio, há uma tentativa de homicídio simples (14º/3 e 131º + 22º). No entanto, como se verídica uma relação de especialidade entre o 131º + 22º e o 132º, al. g) + 22º, este prefere à norma geral do 131º + 22º. Sobram então três normas nesta fase: - relativamente à violação da propriedade, um crime de roubo qualificado consumado (210º/2, als. a) e b)), - um crime de ofensa à integridade física grave consumado (144º, al. b)),- um crime de homicídio qualificado tentado (132º, al. g) + 22º). Analisando estes três crimes, teremos de descartar o crime do 144º, al. b), uma vez que este já está a ser punido no 210º/2 no que se refere à violência do roubo, estando também a ser punido como ato de execução na tentativa de homicídio (132º, al. g) + 22º). Portanto, seja de uma forma ou de outra, o 144º, al. b) é consumido, verificando-se uma relação de consunção pura. Quanto às normas remanescentes, na verdade verifica-se uma sobreposição no que respeita à violência física. Ao verificar o que está a ser punido no 210º/2, als. a) e b) e o que está a ser punido na tentativa do 132º, ainda existe uma zona de sobreposição que é o referente à parte das ofensas à integridade física. No entanto, não é possível afastar nenhuma destas normas sob pena de a decisão que viermos a aplicar não abranger todo o ilícito praticado. Teremos de optar entre o punir cumulativamente pelas duas normas e em abstrato punirmos duas vezes pela violência física, ou então punir apenas por uma das normas e, nesse caso seria pelo 132, al. g) + 22º, deixando de punir a ofensa à propriedade em que se traduziu em roubo. Netses casos, vamos optar pela primeira solução, dado que, ao punir apenas pelo 132º, al. g) + 22, a parte da violação da propriedade fica absolutamente impune. Mas optando pela primeira opção, não temos de obrigatoriamente punir duplamente as ofensas à integridade física, porque ao nível da determinação da medida concreta da pena, o tribunal pode entrar em linha de consideração com esse fator e, apesar de em abstrato punir pelos dois crimes, resolver esse problema ao nível da determinação da medida concreta da pena. Em conclusão, neste caso considera-se que, acabado o concurso de normas, as duas normas finais não se encontram entre si em nenhuma das relações em concurso, resultando num concurso de crimes. c) Resolva o concurso de crimes. Para resolver o concurso de crimes, deve-se calcular a pena para as normas resultantes do concurso de normas, sendo: Crime de roubo qualificado consumado (210º/2, als. a) e b): A pena abstratamente aplicável a este crime é de prisão de três a quinze anos. Para tal, teremos de recorrer ao 71º, de forma a utilizar os critérios aí definidos pelo legislador. Existe, neste caso, uma falta de matéria, desconhecendo-se, por exemplo os antecedentes criminais, sua personalidade, seu carácter, … (124º/1 e 128º/2 CPP). Ou seja, num processo penal, a prova não abrange apenas os factos constitutivos do crime, como também abrange as condições de punibilidade ou de não punibilidade (124º/1, 2.ª parte CPP), as circunstância relevantes para a determinação da pena (124º/1, 3.ª parte CPP), as circunstâncias relativas à personalidade do agente e ao seu carácter (28º/2, parte intermédia e parte final CPP) e as condições pessoais do agente e a sua condição económica (71º/2, al. d) CP). O caso prático penas refere que as salvas de prata foram devolvidas a B após a sua apreensão, o que indicia que não foi por vontade própria que foram devolvidas. Se o tivesse sido, seria tido em conta favoravelmente ao arguido como forma de lhe atenuar a pena concretamente aplicável, o que significa que, ao devolver voluntariamente, já se teria iniciado o processo de ressocialização. Também se terá de ter em consideração o 72º, que confere uma atenuação especial (ou até um possível agravamento) da pena face às circunstâncias enunciadas nas alíneas do /2. Percebe-se, assim, que o momento da sentença é muito mais do que a mera subsunção dos factos à norma, havendo muitos elementos a considerar de forma a adequar a pena ao arguido. De qualquer forma, e face à informação de que se dispõe, considera-se que seria adequada uma sentença de sete anos e meio de prisão para este agente, considerando que preencheu as duas alíneas do 210º/2. Crime de homicídio qualificado tentado (132º, al. g) + 22º): A pena abstractamente aplicável a este crime é de prisão de doze a vinte e cinco anos. É, contudo, necessário aplicar-lhe o 23º/2 e 73º/1, als. a) e b), passando, assim a uma pena de prisão de dois anos e cinco meses e dezasseis anos e sete meses (aproximadamente).Repetem-se aqui os problemas decorrentes da falta de matéria de facto analisadas supra. Contudo, e com a informação que temos, há uma circunstância que funciona a favor do agente que é o dolo eventual de homicídio, é verdade que a ofensa foi uma ofensa significativa (pancada na cabeça com um ferro que levou B a uma baixa médica durante três meses), não utilizou uma arma de fogo nem um método especialmente perigoso (arma branca e afins), o golpe foi na cabeça e poderia eventualmente ter sido noutra parte do corpo, … Considerando estes elementos a favor e contra, estimar-se-ia uma pena de prisão de aproximadamente 10 anos. Desta forma, o agente ficaria com uma pena de 17 anos e meio de prisão (cúmulo material). No que se refere ao cúmulo jurídico, a partir daqui o tribunal vai voltar a analisar esta pena, verificando de situações sobrepostas, uma vez que as necessidades de penas para efeitos de ressocialização exigidas não se somam no tempo; ou seja, se o agente estiver ressocializado para o primeiro crime, também o estará (pelo menos parcialmente) para o segundo, não variando na razão direta do número de crimes praticados. Naturalmente, o juiz depois de ter considerado os 7,5 anos para o primeiro crime e 10 anos para o segundo crime, irá transformar essa pena em cerca de 12 anos de prisão efectiva (esta pena não admite nenhuma pena substitutiva).