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Resumo
Este trabalho tem por objetivo elucidar etecer uma análise reflexiva acerca da oposição entre a
pedagogia das aparências e a pedagogia científica, categoriaspresentes na obra
bachelardiana, e com isso contribuir para os estudos epistemológicos da política educativa.
Para tal, valemo-nos de um estudo bibliográfico de ordem analítica, ancorado em obras de
Bachelard e alguns comentadores. Conforme os textos analisados, podemos afirmar que
Bachelard desenvolve uma reflexão muito diversificada sobre a ciência. Posiciona-se
criticamente frente às concepções continuístas da história da ciência, mostrando que o
progresso não se dá por continuidade linear e sim por rupturas.O conceito de ruptura presente
na obra bachelardiana implica afastar do processo investigativo a influência do senso comum,
evitando formas de pensamento que orientam práticas científicas centradas nos enfoques
estritamente racionalistas positivistas. Assim, Bachelard propõe uma pedagogia do
pensamento complexo, reafirmando a necessidade de sempre reler o simples sob o múltiplo e
a partir de uma visão de complexidade.Dessa forma, ao contrapormos a pedagogia das
aparências com a pedagogia científica na perspectiva bachelardiana, objetivamos indicar
elementos produtivos para os estudos epistemológicos da política educativa,
poiscompreendemos que a pedagogia científica de Bachelard coloca-se como suporte para que a
prática docente seja exercida com clareza, com lucidez e com o devido amparo teórico-científico.
Além disso, a partir dessa postura investigativa, acreditamos que o docente possa desenvolver sua
visão de mundo, de ser humano, dos processos de ensino-aprendizagem de modo integrado e
integrador e, assim, aumentar as possibilidades de atingir uma educação verdadeiramente
transformadora, papel intransferível da política educacional.
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PhD (Bolsista Capes) pela Universidad Autónoma del Estado de México (UAEMéx), Doutor em Educação
(UFRGS), Mestre em Filosofia do Conhecimento (Pucrs), Especialista em Epistemologia das Ciências Sociais
(UPF) e Graduado em Filosofia (UPF/RS/Brasil). Professor Titular III da Universidade de Passo Fundo (UPF)
onde atua no Curso de Filosofia, no Mestrado e Doutorado em Educação da Universidade de Passo
Fundo/RS/Brasil. E-mail: altairfavero@gmail.com
2
Mestrando do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade de Passo Fundo (Bolsista Capes), na
linha de pesquisa Políticas Educacionais. Especialista em Estratégias de Aprendizagem (FABE) e Graduado em
Letras (UPF). E-mail: evandroconsalter@gmail.com
ISSN 2176-1396
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Introdução
Ensinar não é uma função monótona.O trabalho dos professores, como bem descreve
Giroux (2001), enquanto trabalho intelectual,deve desenvolver um conhecimento sobre o
ensino que reconheça e questione sua natureza socialmente construída e o modo pelo qual se
relaciona com a ordem social. Além disso, deve proporcionar uma leitura de análises e
possibilidades transformadoras implícitas no contexto social das aulas e do ensino. Deve estar
contextualizado social e historicamente.
Um discurso isolado de sua contextualização tende a transformar-se em um discurso
de opinião. Um discurso de opinião, por sua vez, não passará de um discurso
superficial.Bachelard (2001) é pontual em relação a essa postura pedagógica. Para ele, a
opinião pensa mal, pois se atem a um “olhar de superfície”. Ao designar os objetos pela sua
utilidade, coíbe-se de os conhecer. Dessa forma, a opinião coloca-se diante do
professor/pesquisador como o primeiro obstáculo a ser superado, pois conduz à construção de
um conhecimento falso, alicerçado em respostas e não em perguntas.
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Chega uma altura em que o espírito gostamais daquilo que confirma o seu saber do
quedaquilo que o contradiz, prefere as respostas às perguntas. [...] É esse orisco de o
professor ensinar sempre as respostascertas. Na pedagogia científica, o erro seinstrui
a partir de uma dinâmica pedagógicaque coloque o conhecimento em
permanenteestado de crise, criando sempre a necessidadede retificar-se.
(BACHELARD, 2001 p. 167).
Coisa de seu dogmatismo, imóvel na sua primeira abstração, fixada para sempre nos
êxitos escolares da juventude, repetindo ano após ano o seu saber, impondo suas
demonstrações, voltada para o interesse dedutivo, sustentáculo tão cômodo da
autoridade, ensinando seu empregado como fazia Descartes, ou dando aula a
qualquer burguês como faz o professor concursado. (BACHELARD, 1996, p. 12).
Não menos importante está o terceiro interesse registrado por Bachelard, o que
classifica como a alma com dificuldade de abstrair e de chegar à quintessência ou também
como um conhecimento pré-científico.
A pedagogia científica
[...] cabe ao professor adotar uma postura de diálogo permanente com seus alunos e
questionar constantemente o conhecimento já adquirido, como forma de superação
dos obstáculos existentes. A ruptura com o já cristalizado se faz necessária para a
construção de um conhecimento novo. Educar-se não consiste na aquisição de
conhecimentos novos, num processo de acúmulo, mas de um saber sempre novo,
com um olhar crítico, dinâmico e reflexivo. O sujeito cognoscente não é um
receptáculo do conhecimento já produzido e que é requentado na sala de
aula.(KUIAVA; RÉGNIER, 2012, p.07).
formas atuais do espírito científico, ou seja, um conhecimento em que sua atividade racional e
técnica se dá a partir da reflexão entre a dialética do racional e o do experimental.
O conceito de formação presente na pedagogia científica de Bachelardcompreende
professor e aluno como eternos aprendizes. A formação é, portanto, um processo contínuo que
se faz e refaz com um espírito lúcido e inovador. O contexto histórico é sempre um pretexto
para ser superado, um obstáculo epistemológico à formação do conhecimento. Nesse sentido,
a epistemologia de Bachelard, explica Fonseca (2008), tem, pois,uma consequência na forma
de produzir ciênciae na construção epistemológica centrada naideia do conhecimento
construído historicamente e reconstruído a partir de retificações permanentes.
De acordo com Fonseca (2008, p.369), “todas essas questões constituem umsuporte
para as discussões metodológicas e parauma prática científica aberta, crítica e reflexiva no
campo da pedagogia e da formação docente”.Kuiava e Régnier (2012, p.08), consideram que,
dessa forma,a pedagogia científica de Bachelard“deve proporcionar ao educando uma crítica de
sua postura no mundo, de seus preconceitos e opiniões, assim como os saberes que estão
constituindo a sua vida”. Do mesmo modo, os autores entendem que a formação do professor
deve ir em direção de que ele também precisa ser auxiliado a tomar consciência dos pressupostos
epistemológicos que fundamentam a sua ação.
Dessa forma, compreende-se que a pedagogia científica de Bachelard coloca-se como
suporte para que a prática docente seja exercida com clareza, com lucidez e com o devido amparo
teórico-científico. Que o docente possa desenvolver sua visão de mundo, de ser humano, dos
processos de ensino-aprendizagem de modo integrado e integradore, assim, aumentar as
possibilidades de atingir uma educação verdadeiramente transformadora, papel intransferível da
política educacional.
Considerações Finais
Após a análise das duas categorias presentes na obra de Bachelard, a pedagogia das
aparências e a pedagogia científica, podemos tecer algumas considerações provisórias.
Concordamos com Fonseca (2008, p.363) quando afirma que a transformação da prática
docente implicaem mudança de concepção do própriotrabalho pedagógico, o qual, segundo a
autora, é muitas vezes “conservador,centrado em relações autoritárias, na reproduçãoe
manutenção do conhecimento acrítico edeslocado da realidade e em métodos positivistas-
racionalistas”. Nas palavras do próprio Bachelard(1996, p.24), “o educador não tem o senso
do fracasso justamente porque se acha um mestre”.
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REFERÊNCIAS
FREIRE, Paulo. Educação como pratica da liberdade. 14.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
2011.
MORAES, Maria Célia Marcondes. Recuo da Teoria. In: MORAES, Maria Célia Marcondes
(org.) Iluminismo às avessas: produção de conhecimento e políticas educacionais. Rio de
Janeiro: DP&A, 2003, p.151-167.