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Aprofundando em Ações Constitucionais

José Roberto Mello Porto


Danniel Adriano
Sumário
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 3

MANDADO DE SEGURANÇA ................................................................................................. 5

NATUREZA JURÍDICA ........................................................................................................................ 5


FUNDAMENTO NORMATIVO .............................................................................................................. 5
CABIMENTO ................................................................................................................................... 6
Direito líquido e certo ............................................................................................................ 6
Ato de autoridade ................................................................................................................. 8
Prazo.................................................................................................................................... 11
ESPÉCIES ..................................................................................................................................... 14
DESISTÊNCIA ................................................................................................................................ 15

AÇÃO DECLARATÓRIA DE INCONSTITUCIONALIDADE (ADI).................................................. 17

CONCEITO ................................................................................................................................... 17
CABIMENTO ................................................................................................................................. 17
Parâmetro de controle ........................................................................................................ 17
Objeto de controle............................................................................................................... 19

MANDADO DE INJUNÇÃO .................................................................................................. 25

NATUREZA JURÍDICA ...................................................................................................................... 25


FUNDAMENTO NORMATIVO ............................................................................................................ 25
CABIMENTO ................................................................................................................................. 26
DECISÃO E COISA JULGADA .............................................................................................................. 28
Evolução jurisprudencial ..................................................................................................... 29
Previsão legal ...................................................................................................................... 32

AÇÃO DECLARATÓRIA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO (ADO) ......................... 38

CONCEITO ................................................................................................................................... 38
NATUREZA JURÍDICA ...................................................................................................................... 38
CABIMENTO ................................................................................................................................. 38
Parâmetro ........................................................................................................................... 38
Objeto .................................................................................................................................. 39
ADO X MANDADO DE INJUNÇÃO ...................................................................................................... 42

RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL........................................................................................ 44

NATUREZA JURÍDICA ...................................................................................................................... 44


FUNDAMENTO NORMATIVO ............................................................................................................ 47

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CABIMENTO ................................................................................................................................. 48
Hipóteses ............................................................................................................................. 48
Prazo.................................................................................................................................... 56

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Introdução

Embora a Constituição não seja um diploma primordialmente processual,


decorrem dela instrumentos aptos a tutelar direitos trazidos pelo constituinte. A
esses instrumentos dá-se o nome de ações constitucionais.
As ações constitucionais são um gênero, do qual são espécies: as ações
coletivas, os remédios constitucionais, as ações do controle concentrado de
constitucionalidade e a reclamação.
Ação coletiva é o meio jurisdicional de solução coletiva de conflitos. Em
verdade, cuida-se do instrumento pelo qual se busca, junto ao Poder Judiciário,
uma tutela coletiva. São ações coletivas a ação civil pública (ACP), a ação
popular (AP), o mandado de segurança coletivo (MS coletivo), o mandado de
injunção coletivo (MI coletivo) e o habeas corpus coletivo (HC coletivo).
Observação: Não trataremos especificamente, na presente obra, da ação de
improbidade administrativa. Isso porque a ação de improbidade é uma espécie
de ação civil pública. Ao analisarmos este assunto, fizemos as observações
que julgamos pertinentes sobre a ação de improbidade.

Observação: O MS coletivo e o MI coletivo são, também, espécies de


remédios constitucionais. Além deles, recentemente, o STF admitiu o
cabimento de HC coletivo. Essas ações, por serem simultaneamente ações
coletivas e remédios constitucionais, foram abordadas quando dentro dos
respectivos remédios constitucionais.

Os remédios constitucionais, por sua vez, são os meios de defesa,


jurisdicionais ou não, dos direitos fundamentais. Embora a expressão seja
criticada por alguns autores (Manoel Gonçalves Ferreira Filho) e celebrada por
outros (André Ramos Tavares), é ampla a sua utilização pelos doutrinadores
brasileiros.
Observação: Muitos autores limitam a expressão “remédios constitucionais”
aos meios jurisdicionais de defesa dos direitos individuais, incluindo em seu

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rol tão somente os habeas corpus, o habeas data, o mandado de segurança,
o mandado de injunção e a ação popular.
Adotamos, contudo, um conceito amplo de remédios constitucionais, de modo
a incluir também o direito de petição, que é um meio não jurisdicional de defesa
dos direitos individuais.

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Mandado de segurança
Natureza jurídica
O mandado de segurança é o remédio constitucional voltado à proteção
de direitos líquidos e certos, quando não couber outro remédio específico,
notadamente o habeas corpus ou o habeas data.
Assim, o mandado de segurança possui um caráter subsidiário em

relação ao habeas corpus e o habeas data: se o direito líquido e certo

vilipendiado for tutelável por meio desses outros dois remédios constitucionais,

não será cabível o mandado de segurança.

Como o assunto foi cobrado em prova: Na prova para ingresso na carreira


de Procurador do Estado/SC (2018), a Banca Examinadora considerou errada
alternativa que assim dispunha: “Conceder-se-á mandado de segurança para
proteger direito líquido e certo, amparado ou não por habeas corpus ou habeas
data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade
pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder
Público”. O erro encontra-se no “amparado”, pois o mandado de segurança
não será cabível quando o direito líquido e certo for amparado por habeas
corpus ou habeas data.

Fundamento normativo
O MS é estatuído pela Constituição Federal (art. 5º, LXIX e LXX) e pela
Lei do Mandado de Segurança – LMS (Lei 12.016/09).
O que dizem a lei e a Constituição?
LMS, Art. 1º Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e
certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou
com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver
justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam
quais forem as funções que exerça.
§ 1º Equiparam-se às autoridades, para os efeitos desta Lei, os representantes ou
órgãos de partidos políticos e os administradores de entidades autárquicas, bem

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como os dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas naturais no exercício de
atribuições do poder público, somente no que disser respeito a essas atribuições.
§ 2º Não cabe mandado de segurança contra os atos de gestão comercial praticados
pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de
concessionárias de serviço público.
§ 3º Quando o direito ameaçado ou violado couber a várias pessoas, qualquer delas
poderá requerer o mandado de segurança.

CF, Art. 5º LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido
e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela
ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no
exercício de atribuições do Poder Público.
Art. 5º, LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:
a) partido político com representação no Congresso Nacional;
b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e
em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus
membros ou associados.

Cabimento
Podem-se sintetizar os requisitos de cabimento do mandado de
segurança da seguinte forma:
a) Um direito líquido e certo de uma coletividade – compreendido
sob a ótica processual, ou seja, como aquele provado
independentemente de instrução probatória dentro do processo;
b) Ameaçado ou violado por ato abusivo ou ilegal;
c) De autoridade pública ou agente revestido de atribuição pública.
Direito líquido e certo
Para bem compreender o que é o mandado de segurança, bem como
quais são as suas hipóteses de cabimento, é preciso, inicialmente, delimitar o
que é “direito líquido e certo”.
Hely Lopes de Meirelles conceitua o direito líquido e certo como sendo
aquele que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua
extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração (direito líquido e
certo sob a ótica material).

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O brilhante autor paulista, todavia, faz uma arguta observação que é
replicada por toda a doutrina brasileira. Na verdade, o que é líquido e certo não
é o direito, uma vez que, a rigor, todo direito seria líquido e certo, mas sim as
alegações de fato feitas pelo autor.
Desse modo, a exigência de “direito líquido e certo” feita pelo constituinte
e pelo legislador infraconstitucional é cumprida quando o autor do mandamus
produza, junto à petição inicial, prova pré-constituída que comprove os fatos nela
alegados (direito líquido e certo sob a ótica processual).
É por isso que, como veremos a seguir, não há que se falar em dilação
probatória no mandado de segurança, pois é ônus do impetrante produzir todas
as provas em um único momento processual: o registro ou distribuição da petição
inicial.
Embora haja alguma divergência em doutrina acerca da natureza da
prova apta a demonstrar a liquidez e certeza das alegações de fato do
impetrante, o único tipo de prova admitido no mandado de segurança é a prova
documental¸ que é aquela prova composta por um objeto que representa um
fato.
Discute-se se a prova documentada – aquela que nasce em outro
processo como testemunhal ou pericial, por exemplo, e é trazida, como
documento, para a ação de mandado de segurança – deve ser admitida:
1) Primeira corrente (Leonardo Cunha): não se admite, assim, a prova
documentada, que é aquela prova que não é documental, mas foi
reduzida a termo, para fins de admissibilidade do mandado de
segurança;
2) Segunda corrente: a prova documentada, sendo documental no
processo de mandado de segurança, pode ser juntada à inicial e
admitida para comprovar o direito líquido e certo.
A ausência de prova pré-constituída acarreta a extinção sem resolução
do mérito, posto que não foi preenchido um dos pressupostos de cabimento do
writ.
Ainda sobre o direito líquido e certo, algumas derradeiras observações
devem ser feitas.

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A primeira é que a exigência de prova pré-constituída para que a via do
mandado de segurança seja admissível não se confunde com a complexidade
da matéria (súmula 625 do Supremo Tribunal Federal).
Como entende a jurisprudência?
Súmula 625 do STF: Controvérsia sobre matéria de direito não impede a concessão
da segurança.

A segunda observação é que, ainda que o impetrante não comprove, no


registro ou distribuição da petição inicial, a matéria fática alegada, esses fatos
poderão se tornar incontroversos se a autoridade apontada como coatora, em
suas informações, não os controverter. Nessa hipótese, o mandado de
segurança deverá ser admitido, ainda que não tenha havido a produção de prova
documental no momento oportuno.
Ato de autoridade
A CF dispõe que não são todos os casos de violação ou ameaça a direito
líquido e certo que estão amparados pelo mandado de segurança, mas somente
aqueles que forem praticados por autoridade pública ou agente de pessoa
jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.
Considera-se autoridade pública todo aquele que, integrando os quadros
da Administração Pública, está investido de poder de decisão, podendo editar
atos administrativos decisórios.
Para fins de cabimento do mandado de segurança, equiparam-se às
autoridades, os representantes ou órgãos de partidos políticos e os
administradores de entidades autárquicas, bem como os dirigentes de pessoas
jurídicas ou as pessoas naturais no exercício de atribuições do poder público,
somente no que disser respeito a essas atribuições (artigo 1º, §1º da Lei n.º
12.019/16).
A rigor, o mandado de segurança é cabível contra ato ilegal ou em abuso
de poder de qualquer autoridade. Há, contudo, algumas hipóteses que
precisam ser analisadas mais detidamente, seja porque a própria lei as excluiu
expressamente, seja porque são limítrofes e podem gerar certa dúvida:
a) Atos praticados por administradores de empresas públicas,
sociedades de economia mista e de concessionárias de

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serviço público: não cabe mandado de segurança contra os atos
de gestão comercial (natureza privada).
• Entretanto, a Constituição Federal dá um tratamento
diferenciado às empresas públicas e sociedades de
economia mista, aplicando-lhes, expressamente,
algumas regras de direito público (licitação para contratar
bens e serviços relativos à atividade-meio e realização de
concurso público para a seleção de sua mão-de-obra), de
natureza pública, consequentemente, cabível o
mandado de segurança para impugná-los (súmula 333 do
STJ).
Como entende a jurisprudência?
Súmula 333 do STJ: Cabe mandado de segurança contra ato praticado em licitação
promovida por sociedade e economia mista ou empresa pública.
b) Ato do qual caiba recurso administrativo: não se concederá o
mandado de segurança quando se tratar de ato do qual caiba
recurso administrativo com efeito suspensivo, independentemente
de caução.
• Na verdade, para a doutrina e a jurisprudência, o que não
se aceita é a impetração de mandado de segurança
quando efetivamente o recurso administrativo com efeito
suspensivo tenha sido interposto, pois o ato não poderá
produzir qualquer efeito e, consequentemente, nenhuma
ameaça ou lesão ao direito do impetrante.
c) Decisão judicial: não se concederá o mandado de segurança
quando o ato impugnado for decisão judicial da qual caiba recurso
com efeito suspensivo ou que já tenha transitado em julgado.
• Assim, é cabível o mandamus, desde que não haja
previsão, em nosso sistema processual, de recurso
adequado e eficaz para combater a decisão. Quando o
relator conceder efeito suspensivo ope iudicis, por
exemplo, o MS não terá vez.

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d) Decisão judicial transitada em julgado: não cabe mandado de
segurança contra decisão judicial com trânsito em julgado, ou seja,
como sucedâneo de ação rescisória (súmula 268 do STF).
• A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, todavia,
já decidiu que o mandado de segurança deverá ser
apreciado independentemente de superveniente trânsito
em julgado, não podendo ser invocada a sua perda de
objeto.

Como entende a jurisprudência?


Súmula 268 do STF: Não cabe mandado de segurança contra decisão judicial com
trânsito em julgado.

STJ: É incabível mandado de segurança contra decisão judicial transitada em julgado,


incidindo, portanto, o teor do art. 5º, inciso III, da Lei n. 12.016/2009 e da Súmula n.
268/STF. Precedentes. No entanto, sendo a impetração do mandado de segurança
anterior ao trânsito em julgado da decisão questionada, mesmo que venha a
acontecer, posteriormente, não poderá ser invocado o seu não cabimento ou a sua
perda de objeto, mas preenchidas as demais exigências jurídico-processuais, deverá
ter seu mérito apreciado.(STJ, EDcl no MS 22.157/DF, Rel. Ministro Herman
Benjamin, Rel. P/ Acórdão Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado em
14/03/2019)

e) Lei em tese: não cabe MS para impugnar lei em tese (súmula 266
do STF).
• Isso não se confunde com a impetração do mandamus
para atacar atos legislativos, ou seja, os atos praticados
por parlamentares na elaboração da lei (Hely Lopes
Meirelles).

Como entende a jurisprudência?


Súmula 266 do STF: Não cabe mandado de segurança contra lei em tese.

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f) Omissões de autoridade pública: a ilegalidade ou o abuso de
poder pode ocorrer por meio de uma omissão perpetrada pela
autoridade pública, hipótese em que será cabível o mandado de
segurança.
g) Ato disciplinar: com o advento da atual Lei do Mandado de
Segurança, é indiscutível o cabimento.
• Observação: a antiga lei de mandado de segurança (Lei
n.º 1.533/51) vedada expressamente a utilização do
mandado de segurança para atacar atos disciplinares,
salvo quando praticados por autoridade incompetente ou
com inobservância de formalidade essencial.

Como o assunto foi cobrado em concurso?


Na prova para ingresso na carreira de Promotor de Justiça/MG (2018), foi
considerada incorreta a seguinte afirmação: “Conceder-se-á mandado de
segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas
corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder,
qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de
sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem
as funções que exerça, incluídos os administradores de empresas públicas,
de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público, nos
atos de gestão comercial”. De fato, como estudamos, não cabe mandado de
segurança contra atos de gestão comercial praticados por administradores de
empresas públicas, sociedades de economia mista e concessionárias de
serviços públicos.

Prazo
O artigo 23 da Lei n.º 12.019/16, repetindo o teor do artigo 18 da Lei n.º
1.533/51, prevê que o direito de requerer mandado de segurança extinguir-se-á
decorridos 120 (cento e vinte) dias, contados da ciência, pelo interessado, do
ato impugnado.
Cuida-se de prazo de natureza decadencial, e não prescricional, razão
pela qual, uma vez iniciado, não há que se falar em interrupção ou suspensão

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de seu decurso. O STJ, no entanto, reconhece a possibilidade da prorrogação
deste prazo, desde que o seu termo final caia em dia que não haja expediente
forense.
Como entende a jurisprudência?
O prazo para a impetração do mandado de segurança (art. 18 da Lei nº 1.533/51) tem
início no primeiro dia útil após a ciência do ato impugnado. Outrossim, caso o marco final
recaia em um feriado forense, prorroga-se o prazo para o primeiro dia útil seguinte.
Precedentes do STJ e do STF. O plantão judiciário constitui figura concebida para permitir o
exame durante os feriados e recessos forenses das medidas de caráter urgente, ou seja,
possibilitar o acesso ao Poder Judiciário ininterruptamente para salvaguardar o direito daquele
que se vê na iminência de sofrer grave prejuízo em decorrência de situações que reclamam
provimento jurisdicional imediato. O termo final do prazo para impetração do mandado de
segurança não se enquadra nesse conceito de emergência, sendo igualmente certo que, caso
se albergasse a tese contraposta, o funcionamento contínuo do Poder Judiciário acabaria, na
verdade, prejudicando aquele que tivesse interesse na impetração de um writ, pois, ainda que
não houvesse urgência no pleito, o prazo para o ajuizamento acabaria por ser reduzido em
virtude do plantão. A impetração do mandado de segurança observou o disposto no art. 18 da
Lei nº 1.533/51, não havendo que se cogitar de decadência, daí porque os autos devem
retornar à Corte de origem para que dê prosseguimento ao feito, sendo induvidoso que a
causa não está madura para pronto julgamento na medida em que sequer foram prestadas
informações pela autoridade coatora. (RMS 22.573/MS, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda
Turma, julgado em 09/02/2010)

Havia celeuma doutrinária sobre a constitucionalidade ou não deste


prazo:
1) Primeira corrente: o prazo é inconstitucional, porque não é dado
ao legislador infraconstitucional limitar o cabimento de garantia
constitucionalmente assegura.
2) Segunda corrente (súmula 632 do STF): a previsão é
constitucional, porque razoável.
Como entende a jurisprudência?
Súmula 632 do STF: É constitucional lei que fixa o prazo de decadência para a
impetração do mandado de segurança

Quanto ao início do prazo, deve-se observar que:


a) No mandado de segurança repressivo, se inicia quando o ato a
ser impugnado se torna operante e exequível, ou seja, quando a
ofensa à esfera jurídica do impetrante se concretiza.
• A interposição de recurso administrativo com efeito suspensivo
impede que o ato produza seus efeitos, de modo que o prazo
só começa a ser contado da intimação do seu resultado final.

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• O simples pedido de reconsideração administrativo não inibe
ou interrompe o prazo de cento e vinte dias, entendimento esse
sumulado pelo Supremo Tribunal Federal (Enunciado n.º 430
da Súmula do STF).
Como entende a jurisprudência?
Súmula 430 do STF: Pedido de reconsideração na via administrativa não interrompe
o prazo para o mandado de segurança.

b) No mandado de segurança preventivo, em que há tão somente


uma ameaça ao direito, a ofensa se concretiza quando o ato se
perfectibiliza, mas ainda não foi executado.
c) No caso de omissão, duas situações devem ser distinguidas, de
acordo com o STF:
• Caso haja um prazo legal estabelecido para que a autoridade
pratique o ato, o prazo do mandado de segurança inicia-se a
partir do seu termo final.
Como entende a jurisprudência?
Esgotado o prazo legal para a prática do ato omissivo pela autoridade impetrada
(Regimento Interno do Senado Federal, art. 118, b) começa a correr o prazo de cento e vinte
dias, para impetrar mandado de segurança, o qual se esgotou antes da impetração.
Decadência verificada. Mandado de segurança não conhecido. (MS 23126, Relator(a): Min.
Ilmar Galvão, Tribunal Pleno, julgado em 30/09/1998).

• Se estivermos diante de um ato omissivo continuado, não há


que se falar em prazo de impetração, pois a ofensa se renova
dia a dia.
Como entende a jurisprudência?
A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que, em se tratando de relação
jurídica de caráter continuado, o prazo para impetrar mandado de segurança renova-se a cada
omissão da Administração Pública. Tratando-se de ato comissivo, o prazo de 120 dias para a
impetração conta-se a partir do momento em que consumado. (MS 26733 AgR, Relator(a):
Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, julgado em 05/11/2007).

Como o assunto foi cobrado em concurso?


Na prova para ingresso na carreira de Juiz de Direito do TJ/AL (2019), foi
considerada incorreta a seguinte afirmativa: “Quanto ao remédio constitucional
mandado de segurança, o pedido de reconsideração na esfera administrativa

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interrompe o prazo decadencial para sua impetração”. De fato, como
estudamos, o STF possui entendimento sumulado em sentido contrário.

Espécies
O mandado de segurança pode ser dividido, tomando por base o
momento em que se tutela o direito líquido e certo, em preventivo e repressivo:
a) O mandado de segurança será preventivo sempre que o ato ilegal
ou abusivo esteja em vias de ser praticado, mas ainda não o foi,
para evitar a lesão de direito, que se encontra somente ameaçado,
desde que de maneira concreta, não se admitindo o manejo para
coibir ameaça em tese de direito, pois faltaria interesse de agir por
parte do impetrante.
b) O mandado de segurança repressivo, por sua vez, é aquele em
que o direito já foi violado e tem por objetivo corrigir tal situação.
Assim, concretizada a lesão ao “direito líquido e certo”, fala-se em
manado de segurança repressivo, e não mais preventivo.
O mandado de segurança pode também ser dividido, caso o critério
adotado seja a titularidade do direito líquido e certo que se supõe ameaçado ou
violado, em individual e coletivo.
Caso o direito seja de titularidade de apenas do indivíduo, teremos o
mandado de segurança individual. Por outro lado, caso o direito invocado seja
transindividual, o mandado de segurança será coletivo.
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, inciso LXX, e a Lei n.º
12.019/16, em seus artigos 21 e 22, trataram, ainda que de forma tímida, do
mandado de segurança coletivo.
Analisando-se esses dispositivos, surgem uma relevante questão, que se
refere a que tipo de direitos transindividuais podem ser objeto do mandado
de segurança coletivo. A lei, nos incisos do parágrafo único do artigo 21, limitou
o cabimento aos direitos individuais homogêneos e aos direitos coletivos. A
doutrina discute a persistência dessa previsão:

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1) Primeira corrente (Hely Lopes Meirelles): os direitos difusos não
podem ser objeto do mandado se segurança coletivo, por inexistir
direito líquido e certo do impetrante;
2) Segunda corrente (Aluisio Mendes, Hermes Zaneti, Rodolfo
Mancuso): o MS é cabível para tutelar direitos difusos, sendo
inconstitucional a vedação legal, em desacordo com a autorização
geral da Constituição.

O STF possui pontuais decisões ventilando a possibilidade do manejo do


mandado de segurança também para a tutela de direitos difusos. Inclusive,
recentemente, em decisão monocrática, o Min. Gilmar Mendes externou esse
entendimento (RE 193382, Rel. Min. Carlos Velloso, Tribunal Pleno, julgado em
28/06/1996, e MS 34070 MC, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 18/03/2016).
Igualmente, existe decisão do STJ autorizando que o Ministério Público
ajuíze qualquer ação para a tutela de direitos difusos, inclusive o mandado de
segurança coletivo.
Como entende a jurisprudência?
STJ: O novel art. 129, III, da Constituição Federal habilitou o Ministério Público à
promoção de qualquer espécie de ação na defesa de direitos difusos e coletivos não
se limitando à ação de reparação de danos. Hodiernamente, após a constatação da
importância e dos inconvenientes da legitimação isolada do cidadão, não há mais
lugar para o veto da legitimatio ad causam do MP para a Ação Popular, a Ação Civil
Pública ou o Mandado de Segurança coletivo. Em conseqüência, legitima-se o
Parquet a toda e qualquer demanda que vise à defesa dos interesses difusos e
coletivos, sob o ângulo material ou imaterial. Deveras, o Ministério Público está
legitimado a defender os interesses transindividuais, quais sejam os difusos, os
coletivos e os individuais homogêneos. (STJ, REsp 700.206/MG, Rel. Ministro Luiz
Fux, Primeira Turma, julgado em 09/03/2010)

Desistência
O STF, em julgamento com repercussão geral, fixou o entendimento de
que o impetrante pode desistir da ação mandamental a qualquer tempo antes

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do trânsito em julgado, independentemente da anuência da autoridade
coatora.
Como entende a jurisprudência?
“É lícito ao impetrante desistir da ação de mandado de segurança,
independentemente de aquiescência da autoridade apontada como coatora ou da entidade
estatal interessada ou, ainda, quando for o caso, dos litisconsortes passivos necessários” (MS
26.890-AgR/DF, Pleno, Ministro Celso de Mello, DJe de 23.10.2009), “a qualquer momento
antes do término do julgamento” (MS 24.584-AgR/DF, Pleno, Ministro Ricardo Lewandowski,
DJe de 20.6.2008), “mesmo após eventual sentença concessiva do ‘writ’ constitucional, (…)
não se aplicando, em tal hipótese, a norma inscrita no art. 267, § 4º, do CPC” (RE 255.837-
AgR/PR, 2ª Turma, Ministro Celso de Mello, DJe de 27.11.2009). Jurisprudência desta
Suprema Corte reiterada em repercussão geral (Tema 530 - Desistência em mandado de
segurança, sem aquiescência da parte contrária, após prolação de sentença de mérito, ainda
que favorável ao impetrante). (STF, RE 669367, Relator(a): Min. Luiz Fux, Relator(A) P/
Acórdão: Min. Rosa Weber, Tribunal Pleno, julgado em 02/05/2013).

Desse modo, mesmo após a prolação de sentença de mérito, é possível


que impetrante desista o mandamus, desde que antes do trânsito em julgado.
Como assunto foi cobrado em concurso?
Esse entendimento do STF tem sido objeto de frequente cobrança em provas
de concurso público. A título de exemplo, na prova para ingresso na carreira
de Juiz de Direito do TJ/AM (2016), foi considerada incorreta a seguinte frase:
“Não se admite que o impetrante desista da ação de mandado de segurança
sem aquiescência da autoridade apontada como coatora ou da entidade
estatal interessada, após prolação de sentença de mérito”.

No mandado de segurança coletivo, estende-se o tratamento da ação


civil pública, exigindo-se, doutrinariamente, que sejam intimados os
colegitimados para que assumam a ação, salvo se manifestamente infundada.

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Ação declaratória de inconstitucionalidade (ADI)
Conceito
A ação direta de inconstitucionalidade, também conhecida como ação
genérica, é a principal ação do controle concentrado.
Cuida-se da ação constitucional que tem por finalidade a defesa da
ordem constitucional, possibilitando a verificação de compatibilidade entre as
normas constitucionais e os atos normativos primários.

Cabimento
Parâmetro de controle
A ADI tem por parâmetro todas as normas constitucionais, expressas
ou implícitas, constantes da parte permanente ou transitória.
Assim, servem de parâmetro de controle na ADI:
a) As normas constitucionais, expressas ou implícitas,
constantes do corpo permanente da Constituição, não
importando se originárias ou fruto de emenda à constituição;
b) As normas previstas no ADCT, desde que não tenham tido sua
eficácia exaurida;
c) Os tratados de direitos humanos aprovados pelo
procedimento de emenda constitucional (artigo 5º, §3º da
Constituição Federal);

Observação: Tratados internacionais, ainda que sobre


direitos humanos, que não forem aprovados pelo
procedimento de emenda constitucional não podem ser
usados como parâmetro em sede de controle de
constitucionalidade1.
O preâmbulo, conforme entendimento predominante, tem caráter
meramente interpretativo, não fazendo parte do bloco de constitucionalidade
e não servindo de parâmetro de controle.

1 STF, Tribunal Pleno, ADI 2.030/SC, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 9.8.2017 (Informativo
n.º 872).

17
Aprofundando em Ações Constitucionais
José Roberto Mello Porto
Danniel Adriano
É comum, em doutrina, a afirmação de que a norma constitucional
deve estar em vigor para que possa servir de parâmetro de controle em ADI. Tal
assertiva baseia-se em antigo entendimento do STF, que já foi superado.
Na verdade, desde 2010, com o julgamento da ADI n.º 2.158/PR, o
STF passou a adotar o entendimento de que a revogação ou alteração da
norma constitucional que serve de parâmetro de controle da ADI não acarreta a
sua extinção.
Qual é o entendimento da Supremo Tribunal Federal?
“Ação Direta de Inconstitucionalidade. AMB. Lei nº 12.398/98-Paraná. Decreto
estadual nº 721/99. Edição da EC nº 41/03. Substancial alteração do
parâmetro de controle. Não ocorrência de prejuízo. Superação da
jurisprudência da Corte acerca da matéria. Contribuição dos inativos.
Inconstitucionalidade sob a EC nº 20/98. Precedentes. 1. Em nosso
ordenamento jurídico, não se admite a figura da constitucionalidade
superveniente. Mais relevante do que a atualidade do parâmetro de controle é
a constatação de que a inconstitucionalidade persiste e é atual, ainda que se
refira a dispositivos da Constituição Federal que não se encontram mais em
vigor. Caso contrário, ficaria sensivelmente enfraquecida a própria regra que
proíbe a convalidação (...)” (STF, Tribunal Pleno, ADI 2.158/PR, Rel. Min. Dias
Toffoli, j. 15.9.2010).

Servem como parâmetro de Não servem como parâmetro de


controle controle
• Normas constitucionais • Preâmbulo
expressas ou implícitas do • Tratados que não foram
corpo permanente da CF aprovados pelo procedimento
• Normas do ADCT do artigo 5º, §3º, da CF
• Tratados de direitos humanos
aprovados pelo procedimento
do artigo 5º, §3º, da CF

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Aprofundando em Ações Constitucionais
José Roberto Mello Porto
Danniel Adriano
Objeto de controle

O objeto de controle em uma ação direta de inconstitucionalidade


genérica, segundo o artigo 102, inciso I, alínea “a” da CF/88, é lei ou ato
normativo federal ou estadual.
A Constituição de 1988, ao colocar como objeto da ação direta de
inconstitucionalidade as leis e atos normativos quis, com isso, referir-se aos atos
primários, ou seja, aos atos que haurem a sua validade diretamente da
Constituição.
Os atos secundários, que não se fundamentam diretamente na
Constituição, mas, antes em outro ato normativo, não serão objeto de controle
de constitucionalidade, mas sim de controle de legalidade – deverão ser
confrontados com a lei ou ato normativo primário que lhes dão fundamento
imediato de validade.
No mais, o artigo 102, inciso I, alínea “a” da CF/88 fala em lei e atos
normativos.
Quanto aos atos, não há dúvida de que, para ser objeto de uma ADI,
deverão ser revestidos de indiscutível conteúdo normativo, ou seja, dotados de
generalidade e abstração. Não é possível, assim, o ajuizamento de ação direta
de inconstitucionalidade contra ato de efeitos concretos.
Em relação às leis, embora o STF, em um primeiro momento, exigisse
que também as leis veiculassem norma genérica e abstrata para ser objeto de
ADI, entende atualmente que qualquer lei, genérica ou específica, abstrata ou
concreta, pode ser objeto de ADI.
Veja a progressão do entendimento do STF sobre o tema:
1) Primeiro momento: STF exigia que a lei veiculasse norma
genérica e abstrata para que pudesse ser objeto de ADI. Caso a
lei tratasse de medidas materialmente administrativas, com
objeto determinado e destinatários certos, não seria conhecida
a ação genérica ajuizada para impugná-la em face da
Constituição (ADI n.º 767);
2) Segundo momento: o STF mitigou a rigidez de seu
entendimento, passando a admitir o controle abstrato de

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Aprofundando em Ações Constitucionais
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Danniel Adriano
constitucionalidade de leis de efeitos concretos em
situações excecionais ou desde que presentes doses
reduzidas de abstração (ADIs n.º 2.381 e 2.925);
3) Terceiro momento (hoje): STF abandonou de vez a linha
restritiva, passando a entender que o adjetivo “normativo” só se
aplica aos atos, sendo possível o controle abstrato de
qualquer tipo de lei, inclusive aqueles que veiculem atos de
efeitos concretos (ADI n.º 4.048).
Qual é o entendimento da Supremo Tribunal Federal?
“(...) II. CONTROLE ABSTRATO DE CONSTITUCIONALIDADE DE NORMAS
ORÇAMENTÁRIAS. REVISÃO DE JURISPRUDÊNCIA. O Supremo Tribunal
Federal deve exercer sua função precípua de fiscalização da
constitucionalidade das leis e dos atos normativos quando houver um tema ou
uma controvérsia constitucional suscitada em abstrato, independente do
caráter geral ou específico, concreto ou abstrato de seu objeto. Possibilidade
de submissão das normas orçamentárias ao controle abstrato de
constitucionalidade (...)” (STF, Tribunal Pleno, ADI-MC 4.048/DF, Rel. Min.
Gilmar Mendes, j. 14.5.2008).

No mais, a lei ou ato normativo objeto de controle deverá ter sido


editado posteriormente à promulgação da Constituição Federal e ainda
estar em vigor.
Com efeito, o STF entende que não é cabível ADI contra lei ou ato
normativo já revogado ou cuja eficácia já tenha se exaurido. Caso a
revogação ou a perda da eficácia do ato contestado ocorrer no curso do
processo, a ADI ficará prejudicada, salvo se:
1) Ficar demonstrado que houve “fraude processual”;
2) O conteúdo do ato impugnado for repetido em essência em outro
diploma legislativo;
3) O julgamento do mérito da ADI pelo STF houver iniciado ou
finalizado, sem que tenha havido a comunicação prévia de que houve a
revogação da norma atacada.

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Aprofundando em Ações Constitucionais
José Roberto Mello Porto
Danniel Adriano
Qual é o entendimento da Supremo Tribunal Federal?
“CONTROLE DA CONSTITUCIONALIDADE. EMBARGOS DE
DECLARAÇÃO. REVOGAÇÃO DA NORMA OBJETO DA AÇÃO DIRETA.
COMUNICAÇÃO APÓS O JULGAMENTO DO MÉRITO.
DESPROVIMENTO.1. Há jurisprudência consolidada no Supremo Tribunal
Federal no sentido de que a revogação da norma cuja constitucionalidade é
questionada por meio de ação direta enseja a perda superveniente do objeto
da ação. Nesse sentido: ADI 709, Rel. Min. Paulo Brossard, DJ, 20.05.1994;
ADI 1442, Rel. Min. Celso de Mello, DJ, 29.04.2005; ADI 4620-AgR, Rel. Min.
Dias Toffoli, Dje, 01.08.2012. 2. Excepcionam-se desse entendimento os
casos em que há indícios de fraude à jurisdição da Corte, como, a título de
ilustração, quando a norma é revogada com o propósito de evitar a declaração
da sua inconstitucionalidade. Nessa linha: ADI 3306, Rel. Min. Gilmar Mendes,
DJe, 07.06.2011. 3. Excepcionam-se, ainda, as ações diretas que tenham por
objeto leis de eficácia temporária, quando: (i) houve impugnação em tempo
adequado, (ii) a ação foi incluída em pauta e (iii) seu julgamento foi iniciado
antes do exaurimento da eficácia. Nesse sentido: ADI 5287, Rel. Min. Luiz Fux,
Dje, 12.09.2016; ADI 4.426, Rel. Min. Dias Toffoli, Dje, 17.05.2011; ADI
3.146/DF, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ, 19.12.2006. 4. Com maior razão, a
prejudicialidade da ação direta também deve ser afastada nas ações cujo
mérito já foi decidido, em especial se a revogação da lei só veio a ser arguida
posteriormente, em sede de embargos de declaração. Nessa última hipótese,
é preciso não apenas impossibilitar a fraude à jurisdição da Corte e minimizar
os ônus decorrentes da demora na prestação da tutela jurisdicional, mas
igualmente preservar o trabalho já efetuado pelo Tribunal, bem como evitar
que a constatação da efetiva violação à ordem constitucional se torne inócua.
5. Embargos de declaração desprovidos” (STF, Tribunal Pleno, ADI 951
ED/SC, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 27.10.2016).

Feitas essas observações, podem ser objeto de ADI:

a) Emendas à Constituição;

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Aprofundando em Ações Constitucionais
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Danniel Adriano
Observação 1: Por se tratar de manifestação do poder
constituinte derivado reformador, o parâmetro de controle das
ECs é diverso dos demais atos normativos. A edição de ECs
está limitada formal, material e circunstancialmente (artigo
60 da CF/88), sendo esses limites o parâmetro de controle das
emendas.
Observação 2: As normas constitucionais originárias não
podem ser objeto de ação direta de inconstitucionalidade,
pois não se submetem ao controle de constitucionalidade como
um todo (STF, Tribunal Pleno, RE 543.974/MG, Rel. Min. Eros
Grau, j. 26.03.2009).
b) Leis complementares e leis ordinárias;
c) Leis delegadas;
Observação: Além do controle via ADI, há previsão no artigo
49, inciso V da CF/88 de controle político repressivo, com a
possibilidade de sustação da lei delegada caso ela ultrapasse
os limites da delegação.
d) Medidas provisórias;
e) Decretos legislativos e resoluções legislativas;
Observação: Não se pode confundir decreto legislativo com
decreto regulamentar. Este é ato normativo secundário,
expedido pelo Chefe do Poder Executivo com a finalidade de
pormenorizar as disposições gerais e abstratas da lei,
viabilizando sua aplicação em casos específicos. Aquele é ato
normativo de competência exclusiva do Poder Legislativo, com
eficácia análoga a de uma lei.
f) Tratados internacionais;
Observação: No caso dos tratados internacionais de direitos
humanos introduzidos pelo procedimento do artigo 5º, §3º, da
CF/88, o parâmetro de controle será tão somente os limites
impostos no artigo 60 da CF/88 ao poder constituinte derivado
reformador.
g) Decretos autônomos;

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Aprofundando em Ações Constitucionais
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Danniel Adriano
h) Resoluções do CNJ e do CNMP;
i) Legislação estadual;
j) Legislação distrital, quando editada no âmbito de
competência estadual;

Qual é o entendimento da Supremo Tribunal Federal?


Enunciado n.º 642 da Súmula do Supremo Tribunal Federal: “Não cabe
ação direta de inconstitucionalidade de lei do Distrito Federal derivada da sua
competência legislativa municipal”.

k) Regimento interno de Tribunal;


l) Resolução do Tribunal Superior Eleitoral;

Como o assunto foi cobrado em concurso?


PGR – Procurador da República (2017)
Assinale a alternativa incorreta:
a) Lei distrital editada no exercício de competência municipal não é
passível de controle abstrato de constitucionalidade no âmbito do STF.
b) É possível, em sede de controle abstrato de constitucionalidade, a
invalidade de uma norma que se extrai, a contrario sensu, de um texto
legal, mas que não está contida em qualquer fragmento linguístico.
c) Nas chamadas “sentenças aditivas de princípio” ou “sentenças
delegação”, a Suprema Corte, em decisões no controle abstrato de
constitucionalidade, exorta o legislador a agir, delineando as diretrizes
que deve seguir.
d) A coisa julgada, em controle abstrato de constitucionalidade, significa
que a decisão permanecerá eficaz sobre hipóteses idênticas, salvo se
o STF adotar nova compreensão sobre o tema ou o Legislativo vier a
editar lei em sentido contrário ao entendimento adotado naquela
decisão.
Gabarito: A. Essa afirmativa está incorreta porque os atos municipais não
podem ser objeto de ADI, mas sujeitam-se a controle concentrado de
constitucionalidade via ADPF.

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Aprofundando em Ações Constitucionais
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Não podem ser objeto de controle via ADI:
a) Normas constitucionais originárias;
b) Atos normativos secundários;
c) Leis anteriores à Constituição;
d) Lei municipal;
e) Proposta de emenda constitucional ou projeto de lei;
f) Enunciado de Súmula;
g) Sentenças normativas;
h) Convenções coletivas de trabalho;
i) Respostas do Tribunal Superior Eleitoral.

Como o assunto foi cobrado em concurso?


VUNESP – TJ/MT – Juiz de Direito (2018)
Assinale a alternativa que aponta um tipo de ato ou espécie normativa que,
como regra, é passível de controle abstrato de constitucionalidade:
a) Regimentos Internos dos Tribunais;
b) Decreto regulamentar não autônomo do Chefe do Executivo;
c) Súmula vinculante;
d) Normas constitucionais originárias;
e) Resolução que autoriza processo contra o Presidente da República.
Gabarito: A.

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Aprofundando em Ações Constitucionais
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Mandado de injunção
Natureza jurídica
O mandado de injunção é o remédio constitucional que tem por
finalidade por finalidade suprir eventuais omissões do Poder Público que
obstaculizem o exercício de um direito ou de uma garantia previstos na
Constituição, para sanar a crise de inefetividade das normas constitucionais,
principalmente aquelas que conferiam direitos.
Durante a Constituinte de 1987 e 1988, uma das preocupações que
permeou os debates foi com a efetiva garantia do generoso rol de direitos
fundamentais que estava ali sendo construído, já que, durante toda a nossa
história, sempre houve um altíssimo grau de insinceridade normativa, de
modo que direitos eram previstos nas Constituições, mas não eram observados
no mundo dos fatos.

Fundamento normativo
Embora alguns autores apontem que o mandado injunção deite raízes
remotamente no instituto inglês da equity, e mais proximamente no writ of
injunction do direito norte-americano, ou, ainda, no Direito Português, a verdade
é que se trata de instrumento sem exato paralelo no Direito Comparado.
A morada do mandado de injunção é o artigo 5º, inciso LXXI da CF/88.
O que diz a Constituição?
Art. 5º LXXI - conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma
regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das
prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e

Esse dispositivo, conforme decidido pelo STF ao analisar questão de


ordem no MI 107/DF, é autoaplicável, não dependendo da edição de norma
jurídica para que o mandado de injunção seja utilizado.
Como entende a jurisprudência?
Mandado de injunção. Questão de ordem sobre sua auto-aplicabilidade, ou não. Em
face dos textos da constituição federal relativos ao mandado de injunção, e ele ação outorgada
ao titular de direito, garantia ou prerrogativa a que alude o artigo 5., LXXI, dos quais o exercício
esta inviabilizado pela falta de norma regulamentadora, e ação que visa a obter do poder
Judiciário a declaração de inconstitucionalidade dessa omissão se estiver caracterizada a
mora em regulamentar por parte do poder, órgão, entidade ou autoridade de que ela dependa,
com a finalidade de que se lhe de ciência dessa declaração, para que adote as providencias

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Aprofundando em Ações Constitucionais
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Danniel Adriano
necessárias, à semelhança do que ocorre com a ação direta de inconstitucionalidade por
omissão (artigo 103, par-2., da carta magna), e de que se determine, se se tratar de direito
constitucional oponível contra o estado, a suspensão dos processos judiciais ou
administrativos de que possa advir para o impetrante dano que não ocorreria se não houvesse
a omissão inconstitucional. Assim fixada a natureza desse mandado, e ele, no âmbito da
competência desta corte - que esta devidamente definida pelo artigo 102, i, 'q' -, auto-
executavel, uma vez que, para ser utilizado, não depende de norma jurídica que o
regulamente, inclusive quanto ao procedimento, aplicável que lhe e analogicamente o
procedimento do mandado de segurança, no que couber. Questão de ordem que se resolve
no sentido da auto-aplicabilidade do mandado de injunção, nos termos do voto do relator. (MI-
QO 107, Rel. Min. Moreira Alves, julgado em 23/11/1989, publicado em 21/09/1990, Tribunal
Pleno)

Todavia, recentemente, atendendo aos anseios da doutrina, foi editada a


Lei n.º 13.300/16 com a finalidade de disciplinar o processo e julgamento do
mandado de injunção individual e coletivo, trazendo importantes novidades.

Cabimento
Para que o mandado de injunção seja cabível, é necessário que estejam
presentes dois requisitos:
a) A existência de norma constitucional de eficácia limitada que
verse sobre direitos, liberdades e prerrogativas
constitucionais;
• Dessa forma, não é admissível mandado de injunção para

conferir efetividade às normas de eficácia plena e

aplicabilidade imediata.

• Apesar da dicção constitucional, prevalece em doutrina que

pode ser tutelado todo e qualquer direito fundamental, seja

ele individual, coletivo, difuso ou social (Dirley da Cunha Jr).

b) A inviabilização do exercício desse direito, liberdade ou


prerrogativa constitucional por seu titular em virtude da ausência
de norma regulamentadora.
• A esse respeito, a doutrina tem entendido que a omissão não
se limita à edição de leis ordinárias e complementares,
devendo-se abranger toda e qualquer providência

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Aprofundando em Ações Constitucionais
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regulamentadora para tornar efetiva a norma constitucional
(José Afonso da Silva).
O que dizem a lei e a Constituição?
LMI, Art. 2º Conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta total ou parcial
de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades
constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à
cidadania.
Parágrafo único. Considera-se parcial a regulamentação quando forem insuficientes
as normas editadas pelo órgão legislador competente.

Art. 12 Parágrafo único. Os direitos, as liberdades e as prerrogativas protegidos por


mandado de injunção coletivo são os pertencentes, indistintamente, a uma
coletividade indeterminada de pessoas ou determinada por grupo, classe ou
categoria.

CF, Art. 5º LXXI - conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma
regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e
das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania.

Como esse assunto foi cobrado em concurso?


(FGV – 2019 – DPE/RJ – Técnico Superior Jurídico) Joana estava impossibilitada
de fruir determinado direito constitucional em razão da ausência de norma
regulamentadora, que deveria ter sido editada pelo Congresso Nacional. Esse estado
de mora legislativa vinha sendo reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal nos
últimos cinco anos, em diversos mandados de injunção anteriores, tendo o Congresso
Nacional descumprido sistematicamente o prazo fixado para que a mora fosse
sanada.
Considerando a sistemática estabelecida pela ordem jurídica, em especial pela Lei nº
13.300/2016, a injunção requerida por Joana deve ser:
a) indeferida, considerando a inexistência de interesse processual, pois a mora
legislativa já fora reconhecida;
b) deferida, para determinar prazo razoável para que o impetrado promova a edição
da norma regulamentadora;
c) deferida, para que o impetrado tome ciência da mora legislativa e adote as
providências necessárias à sua superação;

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Aprofundando em Ações Constitucionais
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Danniel Adriano
d) indeferida, pois a existência de mandados de injunção anteriores denota o caráter
coletivo da temática, o que impede a atuação isolada de Joana;
e) deferida, para estabelecer o modo como se dará o exercício do direito ou as
condições em que o interessado pode promover ação própria visando a exercê-lo.
A alternativa E foi considerada correta.

Por fim, faz-se necessário destacar que a omissão inconstitucional

em regulamentar direito, liberdade ou prerrogativa constitucional pode ser:

a) Na omissão total, a inércia estatal é absoluta, inexistindo

qualquer norma regulamentadora;

b) Na omissão parcial, a norma editada pelo órgão competente

é insuficiente, não disciplinando por inteiro a questão classe.

Como o assunto foi cobrado em concurso?

Na prova para ingresso na carreira de Juiz de Direito do TJ/AC (2019), foi considerada
incorreta a seguinte proposição: “Não será cabível o mandado de injunção quando
houver regulamentação da matéria por normas editadas pelo órgão legislador
competente, ainda que insuficientes”. De fato, como estudamos, se a norma
regulamentadora não disciplinar por completo o direito, haverá omissão parcial,
abrindo-se a via do mandado de injunção.

Decisão e coisa julgada


Existem três posições teóricas a respeito dos efeitos da decisão
proferida em um mandado de injunção:
a) Posição não concretista: a decisão tem o condão apenas de
decretar a mora do Poder, órgão ou autoridade com atribuição
para editar a norma regulamentadora, com declaração da
inconstitucionalidade da omissão e notificação do órgão
competente para a adoção das providências cabíveis. O
fundamento é o princípio da separação dos poderes (artigo 2º da
CF), que impediria o Poder Judiciário de editar uma norma
regulamentadora.

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Aprofundando em Ações Constitucionais
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Danniel Adriano
b) Posição concretista intermediária: concedida a ordem, o Poder
Judiciário deve, primeiro, comunicar o Poder, órgão ou autoridade
omisso, concedendo prazo para que a norma regulamentadora
seja editada. Transcorrido o prazo sem que a omissão seja
sanada, o Poder Judiciário asseguraria o exercício direito, criando
a norma regulamentadora para o caso concreto.
c) Posição concretista direta: reconhecendo o Poder Judiciário
que há mora na edição da norma regulamentadora, deve garantir
de plano o imediato exercício do direito, da liberdade ou da
prerrogativa que está sendo obstaculizado por ausência de
regulamentação, criando a norma regulamentadora para o caso
concreto.

Para aqueles que adotam a posição concretista, há ainda divergência


sobre os limites subjetivos da decisão que regulamenta o direito, liberdade ou
prerrogativa.
a) Posição concretista individual: a decisão teria efeitos inter
partes, assegurando, portanto, o exercício do direito apenas
para o impetrante do mandado de injunção.
b) Posição concretista geral: os efeitos da decisão seriam erga
omnes, ou seja, o direito passaria a ser assegurado a todos, e
não somente ao impetrante.
Evolução jurisprudencial
Na jurisprudência do STF, a adoção das posições passou por uma
evolução cronológica que pode ser assim resumida:
a) Primeiro momento: o STF tradicionalmente adotava a posição
não concretista (Tribunal Pleno, MI 107-3, Rel. Min. Moreira
Alves, julgado em 31/10/1990).
• Tal solução, no entanto, foi alvo de duras críticas por parte da
doutrina, que apontava que a adoção da posição não
concretista, embora tecnicamente parecesse perfeita,
esvaziaria por completo o novo remédio constitucional, tanto

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Aprofundando em Ações Constitucionais
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Danniel Adriano
que as decisões em mandado de injunção acabaram não tendo
nenhuma eficácia prática.
b) Segundo momento: aumento do grau de concretude, com o STF
permitindo soluções outras, embora continuasse a adotar a
posição não concretista.
No julgamento do MI 283, ficou decidido que, em caso de
persistência da mora do Congresso Nacional, a parte prejudicada
pela não edição do ato normativo poderia ajuizar uma ação de
reparação por perdas e danos.
No caso do MI 232-1/RJ, o STF adotou, excepcionalmente, a
posição concretista intermediária individual.
Como entendia o Supremo Tribunal Federal?
Mandado de injunção. - Legitimidade ativa da requerente para impetrar mandado de
injunção por falta de regulamentação do disposto no par. 7. do artigo 195 da
Constituição Federal. - Ocorrência, no caso, em face do disposto no artigo 59 do
ADCT, de mora, por parte do Congresso, na regulamentação daquele preceito
constitucional. Mandado de injunção conhecido, em parte, e, nessa parte, deferido
para declarar-se o estado de mora em que se encontra o Congresso Nacional, a fim
de que, no prazo de seis meses, adote ele as providencias legislativas que se impõem
para o cumprimento da obrigação de legislar decorrente do artigo 195, par. 7., da
Constituição, sob pena de, vencido esse prazo sem que essa obrigação se
cumpra, passar o requerente a gozar da imunidade requerida. (MI 232, Relator(a):
Min. Moreira Alves, Tribunal Pleno, julgado em 02/08/1991)

c) Terceiro momento: adoção da posição concretista direta


individual, deferindo à impetrante, servidora pública, a
aposentadoria especial, mesmo não tendo sido editada lei
complementar que regulamentasse o disposto no artigo 40, §4º da
CF/88.
Como entendia o Supremo Tribunal Federal?
Conforme disposto no inciso LXXI do artigo 5º da Constituição Federal, conceder-se-
á mandado de injunção quando necessário ao exercício dos direitos e liberdades
constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à
cidadania. Há ação mandamental e não simplesmente declaratória de omissão.

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Aprofundando em Ações Constitucionais
José Roberto Mello Porto
Danniel Adriano
A carga de declaração não é objeto da impetração, mas premissa da ordem a
ser formalizada. (...) Tratando-se de processo subjetivo, a decisão possui
eficácia considerada a relação jurídica nele revelada. (...)Inexistente a disciplina
específica da aposentadoria especial do servidor, impõe-se a adoção, via
pronunciamento judicial, daquela própria aos trabalhadores em geral - artigo 57,
§ 1º, da Lei nº 8.213/91. (MI 721, Relator(a): Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno,
julgado em 30/08/2007)

d) Quarto momento: adoção da posição concretista direta geral,


menos de dois meses após, no julgamento conjunto dos MIs 670,
708 e 712, concedendo a ordem para reiterar a declaração do
estado de mora do Congresso Nacional por não editar norma que
regulamentasse o direito de greve dos servidores públicos e, em
razão da omissão sistemática e recorrente, o Supremo determinou
a aplicação genérica, no que coubesse, da Lei n.º 7.783/89, que
regulamenta o direito de greve para os trabalhadores particulares.
Qual é a posição do Supremo Tribunal Federal?
No julgamento do MI no 107/DF, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 21.9.1990, o Plenário do
STF consolidou entendimento que conferiu ao mandado de injunção os seguintes
elementos operacionais: i) os direitos constitucionalmente garantidos por meio de
mandado de injunção apresentam-se como direitos à expedição de um ato normativo,
os quais, via de regra, não poderiam ser diretamente satisfeitos por meio de
provimento jurisdicional do STF; ii) a decisão judicial que declara a existência de uma
omissão inconstitucional constata, igualmente, a mora do órgão ou poder legiferante,
insta-o a editar a norma requerida; iii) a omissão inconstitucional tanto pode referir-se
a uma omissão total do legislador quanto a uma omissão parcial; iv) a decisão
proferida em sede do controle abstrato de normas acerca da existência, ou não, de
omissão é dotada de eficácia erga omnes, e não apresenta diferença significativa em
relação a atos decisórios proferidos no contexto de mandado de injunção; iv) o STF
possui competência constitucional para, na ação de mandado de injunção, determinar
a suspensão de processos administrativos ou judiciais, com o intuito de assegurar ao
interessado a possibilidade de ser contemplado por norma mais benéfica, ou que lhe
assegure o direito constitucional invocado; v) por fim, esse plexo de poderes
institucionais legitima que o STF determine a edição de outras medidas que garantam

31
Aprofundando em Ações Constitucionais
José Roberto Mello Porto
Danniel Adriano
a posição do impetrante até a oportuna expedição de normas pelo legislador. (...)
Apesar dos avanços proporcionados por essa construção jurisprudencial inicial, o STF
flexibilizou a interpretação constitucional primeiramente fixada para conferir uma
compreensão mais abrangente à garantia fundamental do mandado de injunção. A
partir de uma série de precedentes, o Tribunal passou a admitir soluções "normativas"
para a decisão judicial como alternativa legítima de tornar a proteção judicial efetiva
(CF, art. 5o, XXXV). Precedentes: MI no 283, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ
14.11.1991; MI no 232/RJ, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 27.3.1992; MI nº 284, Rel. Min.
Marco Aurélio, Red. para o acórdão Min. Celso de Mello, DJ 26.6.1992; MI no 543/DF,
Rel. Min. Octavio Gallotti, DJ 24.5.2002; MI no 679/DF, Rel. Min. Celso de Mello, DJ
17.12.2002; e MI no 562/DF, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 20.6.2003. Em razão da
evolução jurisprudencial sobre o tema da interpretação da omissão legislativa
do direito de greve dos servidores públicos civis e em respeito aos ditames de
segurança jurídica, fixa-se o prazo de 60 (sessenta) dias para que o Congresso
Nacional legisle sobre a matéria. (...) Mandado de injunção conhecido e, no
mérito, deferido para, nos termos acima especificados, determinar a aplicação
das Leis nos 7.701/1988 e 7.783/1989 aos conflitos e às ações judiciais que
envolvam a interpretação do direito de greve dos servidores públicos civis. (MI
670, Relator: Min. Maurício Corrêa, Relator P/ Acórdão: Min. Gilmar Mendes, Tribunal
Pleno, julgado em 25/10/2007)

Previsão legal
Com a edição da Lei do Mandado de Injunção (lei 13.300/16), a questão
dos efeitos da decisão que concede a ordem em mandado de injunção foi,
finalmente, positivada em nosso ordenamento jurídico.
O que diz a lei?
Art. 8º Reconhecido o estado de mora legislativa, será deferida a injunção para:
I - determinar prazo razoável para que o impetrado promova a edição da norma
regulamentadora;
II - estabelecer as condições em que se dará o exercício dos direitos, das liberdades ou das
prerrogativas reclamados ou, se for o caso, as condições em que poderá o interessado
promover ação própria visando a exercê-los, caso não seja suprida a mora legislativa no
prazo determinado.

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Aprofundando em Ações Constitucionais
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Danniel Adriano
Parágrafo único. Será dispensada a determinação a que se refere o inciso I do caput quando
comprovado que o impetrado deixou de atender, em mandado de injunção anterior, ao prazo
estabelecido para a edição da norma.

Art. 9º A decisão terá eficácia subjetiva limitada às partes e produzirá efeitos até o advento
da norma regulamentadora.
§ 1º Poderá ser conferida eficácia ultra partes ou erga omnes à decisão, quando isso for
inerente ou indispensável ao exercício do direito, da liberdade ou da prerrogativa objeto da
impetração.
§ 2º Transitada em julgado a decisão, seus efeitos poderão ser estendidos aos casos
análogos por decisão monocrática do relator.
§ 3º O indeferimento do pedido por insuficiência de prova não impede a renovação da
impetração fundada em outros elementos probatórios.

A lei consigna que, reconhecido o estado de mora legislativa, será


deferida a injunção para:
a) determinar prazo razoável para que o impetrado promova a
edição da norma regulamentadora; e
b) estabelecer as condições em que se dará o exercício dos
direitos, das liberdades ou das prerrogativas reclamados ou, se for
o caso, as condições em que poderá o interessado promover ação
própria visando a exercê-los, caso não seja suprida a mora
legislativa no prazo determinado.
Assim, o legislador pátrio adotou, como regra, a posição concretista
intermediária, pois o Poder Judiciário, após reconhecida a mora, deverá fixar
prazo para que o impetrado regulamente o direito, liberdade ou prerrogativa e,
somente após findo o prazo, poderá estabelecer as condições para o seu
exercício efetivo.
No entanto, o comando prevê uma exceção, em que o Judiciário deverá
imediatamente regulamentar ele próprio o direito, quando ficar comprovado que
o impetrado deixou de deixou de atender, em mandado de injunção anterior,
ao prazo estabelecido para a edição da norma. Aqui, será adotada a posição
concretista imediata.

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Aprofundando em Ações Constitucionais
José Roberto Mello Porto
Danniel Adriano
No tocante aos efeitos subjetivos, a LMI dispõe que a decisão terá
eficácia subjetiva limitada às partes e produzirá efeitos até o advento da norma
regulamentadora (posição concretista individual).
Contudo, poderá ser conferida eficácia ultra partes ou erga omnes à
decisão, quando isso for inerente ou indispensável ao exercício do direito, da
liberdade ou da prerrogativa objeto da impetração (posição concretista geral).
A lei também prevê que, transitada em julgado a decisão, seus efeitos
poderão ser estendidos aos casos análogos por decisão monocrática do relator,
em interessante preocupação com a isonomia extraprocessual.

Como o assunto foi cobrado em concurso?

As questões envolvendo mandado de injunção gravitam, majoritariamente, em torno


dos efeitos da decisão nele proferida. Na prova para ingresso na carreira de Defensor
Público/PR (2017), foi considerada incorreta a seguinte afirmação: “A lei que o
regulamenta, em contrariedade à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, não
permite a extensão dos efeitos da decisão para além das partes, já que se trata de
processo constitucional subjetivo que visa assegurar o exercício de direitos do
impetrante”. Como estudamos, o artigo 9º da Lei n.º 13.300/06 confere efeitos erga
omnes à decisão no mandado de injunção se isso for inerente ou indispensável ao
exercício do direito, da liberdade ou da prerrogativa objeto da impetração.

No mandado de injunção coletivo, com a edição da legislação própria,


optou-se por adotar, como regra, a posição concretista intermediária coletiva.
Mesmo na impetração individual, como visto, após o trânsito em julgado,
poderá haver extensão dos efeitos aos casos análogos, ampliando a extensão
subjetiva em prol da isonomia.
O que diz a lei?
LMI: Art. 13. No mandado de injunção coletivo, a sentença fará coisa julgada
limitadamente às pessoas integrantes da coletividade, do grupo, da classe ou da
categoria substituídos pelo impetrante, sem prejuízo do disposto nos §§ 1º e 2º do art.
9º.

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Aprofundando em Ações Constitucionais
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Danniel Adriano
Art. 9º § 2º Transitada em julgado a decisão, seus efeitos poderão ser estendidos aos
casos análogos por decisão monocrática do relator.

Como esse assunto foi cobrado em concurso?


(CESPE – 2018 – PGE-PE – Procurador do Estado) De acordo com lei que
disciplina o mandado de injunção, uma vez transitada em julgado a decisão
final, o relator poderá, monocraticamente, estender seus efeitos a casos
análogos.
A alternativa foi considerada correta.

(VUNESP – 2019 – Câmara de Piracicaba – Advogado) Determinada


categoria de servidores públicos ajuizou mandado de injunção para obtenção
de um direito constitucional em razão da falta da respectiva norma
regulamentadora, obtendo decisão favorável para usufruir desse direito.
Assim, considerando o que dispõe o direito brasileiro a respeito desse instituto,
é correto afirmar que
a) a decisão judicial terá eficácia subjetiva limitada às partes e produzirá efeitos
até eventual edição da norma regulamentadora, ainda que a aplicação da
norma lhe seja mais favorável.
b) sem prejuízo dos efeitos já produzidos, a decisão poderá ser revista, a
pedido de qualquer interessado, quando sobrevierem relevantes modificações
das circunstâncias de fato ou de direito.
c) transitada em julgado a decisão, seus efeitos não mais poderão ser
estendidos aos casos análogos por decisão monocrática do relator.
d) se, eventualmente, a norma regulamentadora for editada antes da decisão,
não ficará prejudicada a impetração, devendo o processo ter regular
prosseguimento com resolução de mérito.
e) a decisão terá eficácia ultra partes ou erga omnes e produzirá efeitos que
prevalecerão sobre a norma regulamentadora.
A alternativa B foi considerada correta.

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Aprofundando em Ações Constitucionais
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Danniel Adriano
Quanto aos efeitos temporais da decisão, a LMI trouxe uma interessante
novidade: a possibilidade de ação revisional da decisão proferida em mandado
de injunção.
Sobrevindo relevantes modificações das circunstâncias de fato ou de
direito, a decisão poderá ser revista, a pedido de qualquer interessado, não
havendo prejuízo dos efeitos já produzidos anteriormente. Essa ação observará,
no que couber, o procedimento estabelecido na própria Lei n.º 13.300/16.
O que diz a lei?
LMI: Art. 10. Sem prejuízo dos efeitos já produzidos, a decisão poderá ser revista, a
pedido de qualquer interessado, quando sobrevierem relevantes modificações das
circunstâncias de fato ou de direito.
Parágrafo único. A ação de revisão observará, no que couber, o procedimento
estabelecido nesta Lei.

Outro aspecto importante é o da norma regulamentadora legislativa


superveniente. Nessa sucessão temporal entre a norma criada pelo Judiciário
e a superveniente norma legislativa, a nova norma produzirá efeitos ex nunc em
relação aos beneficiados por decisão transitada em julgado – apenas para o
futuro, portanto.
A exceção fica por conta de a aplicação da norma editada lhes ser mais
favorável, hipótese em que será imediatamente aplicada, retroagindo.
Por outro lado, caso a norma regulamentadora seja editada antes da
decisão, o processo deverá ser extinto sem resolução do mérito, em virtude da
perda do interesse de agir superveniente.
O que diz a lei?
LMI: Art. 11. A norma regulamentadora superveniente produzirá efeitos ex nunc
em relação aos beneficiados por decisão transitada em julgado, salvo se a aplicação
da norma editada lhes for mais favorável.
Parágrafo único. Estará prejudicada a impetração se a norma regulamentadora for
editada antes da decisão, caso em que o processo será extinto sem resolução de
mérito.

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Como o assunto foi cobrado em concurso?

Na prova para ingresso na carreira de Promotor de Justiça/PR (2016), foi

considerada incorreta a seguinte assertiva: “A norma regulamentadora

superveniente produzirá efeitos ex nunc em relação aos beneficiados por

decisão transitada em julgado proferida em mandado de injunção, salvo se a

aplicação das regras da decisão judicial lhes for mais favorável”. A alternativa

é cópia quase exata do disposto no artigo 11, caput, da Lei n.º 13.300/16, mas

troca, na parte final, “norma editada lhes for mais favorável” por “decisão

judicial lhes for mais favorável”, razão pela qual está errada.

No mandado de injunção, existe a possibilidade de repropositura da


demanda julgada improcedente por insuficiência de provas, no caso de direitos
difusos ou coletivos – coisa julgada secundum eventum probationis, ou seja,
condicionada ao grau de prova obtido no processo. Essa nova ação, quando na
modalidade coletiva, pode ser intentada por qualquer dos legitimados, inclusive
por aquele que moveu a primeira demanda. Aplica-se aqui o já dito sobre a ação
civil pública.
O que diz a lei?
LMI, Art. 9º § 3º O indeferimento do pedido por insuficiência de prova não impede a
renovação da impetração fundada em outros elementos probatórios.

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Ação declaratória de inconstitucionalidade por omissão
(ADO)
Conceito
A ação declaratória de inconstitucionalidade por omissão (ADO) é a
ação do controle concentrado de constitucionalidade que tem por finalidade dar
plena eficácia às normas constitucionais que dependem da edição de um
ato normativo infraconstitucional.
Com efeito, não é somente por meio de um agir que a Constituição
pode ser violada, mas também por uma omissão. Quando algum dos três
Poderes deixa de fazer algo que a Constituição impõe, há um grave abalo à
ordem jurídica constitucional.

Natureza jurídica
A ADO tem natureza jurídica de ação do controle concentrado-
principal de constitucionalidade.
Ela, assim como a ADI e a ADC, é veiculada por um processo
objetivo, pois não há propriamente um conflito de interesses concreto a ser
resolvido, mas sim a verificação de compatibilidade entre um não agir e a
Constituição.

Cabimento
Parâmetro
O parâmetro de controle da ADO é mais restrito do que aquele das
ADI e ADC, abarcando somente as normas constitucionais de eficácia
limitada, ou seja, as normas que dependam da edição de norma
infraconstitucional para que sejam plenamente eficazes.
As normas de eficácia plena e as normas de eficácia contida, por não
dependerem de complemento para que sejam aplicáveis, não poderão servir de
parâmetro de controle em ADO.

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Servem como Não servem


parâmetro de como parâmetro
controle de controle

Normas Normas
constitucionais de constitucionais de
eficácia limitada eficácia plena

Normas
constitucionais de
eficácia contida

Objeto
O objeto da ADO é a omissão normativa inconstitucional, ou seja,
o descumprimento de um dever de legislar imposto pela norma Constitucional.
Com efeito, o deixar de fazer inconstitucional pode ser perpetrado por
qualquer dos três Poderes, em qualquer das três funções. Todavia, para ser
objeto de uma ADO, essa omissão tem que ter cunho normativo. O STF,
corroborando essa assertiva, não conhece de ADO que vise à prática de um ato
administrativo concreto.
A omissão normativa, embora mais afeta ao Poder Legislativo,
também pode ocorrer no âmbito do Poder Executivo, quando se deixa de editar
atos normativos secundários gerais, tais quais decretos e resoluções, e no
âmbito do Poder Judiciário, ao deixar de regulamentar questão que deveria ter
sido prevista em seu Regimento Interno.
A omissão inconstitucional pode ser:
a. Total: É a omissão que ocorre quando a abstenção em legislar
é integral;
b. Parcial: É a omissão que ocorre nos casos em que o legislador
atua, mas de forma incompleta ou deficiente.
Atenção!

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Danniel Adriano
Na omissão parcial, como há uma atuação do legislador,
ainda que deficitária, o STF possui entendimento de que é
cabível tanto a ADI quanto a ADO. Nessa hipótese há,
portanto, fungibilidade entre elas.
Apesar de a Suprema Corte admitir a impugnação da
omissão parcial via ADI, é importante ter em mente que a
declaração de inconstitucionalidade da norma incompleta
pode não ser a técnica adequada para solucionar o problema,
principalmente nos casos em que há violação do princípio da
isonomia.
Aqui, duas situações devem ser distinguidas.
Na primeira, o legislador edita propositalmente um ato
normativo que contemple somente alguns grupos ou
situações (exclusão explícita). Nessa hipótese, a
declaração de inconstitucionalidade da norma por violação do
princípio da igualdade, com a sua consequente retirada do
ordenamento jurídico, mostra-se adequada.
Na segunda, o legislador contempla somente alguns grupos
ou situações, esquecendo-se de outros, por não ter apreciado
corretamente a realidade fática subjacente (incompletude
normativa). Neste segundo caso, declarar inconstitucional a
norma, retirando-a do ordenamento jurídico, agravaria ainda
mais a omissão inconstitucional. Por essa razão, a
declaração de inconstitucionalidade por omissão, apelando
ao legislador que edite norma mais ampla, é a técnica que
mais bem soluciona o problema.

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Total
Omissão
inconstitucional
Parcial

Questão interessante e assaz relevante é saber em que momento


ocorre a omissão inconstitucional.
Isso porque, para falarmos em uma omissão inconstitucional, é
indispensável que o não agir do legislador seja cotejado com o fator tempo, ou
seja, deve-se perquirir qual o lapso temporal dentro do qual o legislador deveria
e poderia editar o ato normativo integrador da norma constitucional limitada.
Quando a própria norma constitucional estipula um prazo, essa
análise é simples, configurando-se a omissão legislativa com o fim do prazo sem
que o ato normativo tenha sido editado.
Quando não houver prazo expressamente previsto, deverá ser feito
um juízo de razoabilidade, em que se avalia qual o tempo razoável para que a
medida legislativa fosse tomada, sob pena de se configurar a omissão injusta.
O STF, embora já tenha entendido de forma diversa no passado,
entende que ainda que esteja em tramitação projeto de lei para regulamentar a
norma constitucional de eficácia limitada, a ADO não deve ser extinta, devendo
prosseguir o seu curso.
Por outro lado, se a norma constitucional que não tinha sido
regulamentada for revogada, a ADO deverá ser extinta por perda superveniente
do objeto, uma vez que a omissão inconstitucional deixou de existir.
Atenção!

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No julgamento conjunto do MI n.º 4733 e da ADO n.º 26, o STF reconheceu
que a não edição de lei criminalizando a homofobia é uma omissão
inconstitucional. Consignou-se, nessa oportunidade, que o artigo 5º, XLI da
CF/88, ao afirmar que a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos
direitos e liberdades fundamentais, traz um dever específico de legislar.
Ademais, as práticas “homotransfóbicas” podem ser enquadradas como
espécie de racismo social, o que atrai a incidência do artigo 5º, XLII da CF/88.
Para sanar tal omissão, além de notificar o Congresso Nacional, determinou-
se a aplicação prospectiva e analógica da Lei n.º 7.716/89, que prevê o crime
de racismo.

ADO x mandado de injunção


A CF/88, em razão do histórico de inefetividade das promessas
constitucionais em nosso país, deu um especial tratamento à omissão
inconstitucional. Buscando reverter esse quadro e dar efetividade às suas
disposições, criou dois instrumentos aptos a resolver a problemática de inércia
na edição de ato normativo regulamentador de norma constitucional de eficácia
limitada: a ADO e o mandado de injunção.
Embora possuam a mesma finalidade, esses institutos possuem
nítidas diferenças entre si. São elas:
a) A ADO é uma ação do controle principal e abstrato de
constitucionalidade, ao passo que o mandado de injunção é um
remédio constitucional.
b) A finalidade da ADO é concretizar a norma constitucional, garantindo-
se a efetividade da Constituição. O mandado de injunção, por sua vez,
também busca dar concretude ao texto constitucional, mas isso serve
apenas como um meio para que se torne viável o exercício de direitos
fundamentais. Trata-se, portanto, de garantia individual.
c) A ADO somente é cabível após transcorrido o prazo previsto na
Constituição para que a norma regulamentadora seja editada ou,
quando o Texto Maior for silente, após transcorrido lapso temporal

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Aprofundando em Ações Constitucionais
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Danniel Adriano
razoável. O mandado de injunção, por outro lado, não depende de
nenhum prazo para ser impetrado.
d) A legitimidade ativa para o ajuizamento de ADO está adstrita aos
legitimados previstos no artigo 103 da CF/88, enquanto que o
mandado de injunção pode ser impetrado por qualquer pessoa que
titularize o direito fundamental que está sendo obstaculizado pela não
edição da norma regulamentadora.
e) A competência para julgamento de ADO está concentrada no STF –
ou, no caso da ADO estadual, no Tribunal de Justiça. Já em relação
ao mandado de injunção, a Constituição de 1988 prevê que vários
órgãos judiciais terão competência para julgá-lo, a depender do ente
que descumpriu seu dever de legislar.
f) A decisão definitiva em uma ADO que tenha por objeto a inércia na
edição de ato normativo primário pelo Poder Legislativo declarará a
mora legislativa e notificará o Congresso Nacional. Já no mandado de
injunção, o Poder Judiciário concederá um prazo para que a omissão
seja suprida e, caso esse comando não seja obedecido, editará norma
que permita o exercício do direito fundamental obstaculizado, até a
edição de lei regulamentadora (artigo 8º da Lei n.º 13.300/16).
g) Os efeitos subjetivos da decisão definitiva em ADO são erga omnes,
como sói ocorrer em processos objetivos. No mandado de injunção,
os efeitos são, em regra, inter partes, somente sendo erga omnes ou
ultra partes quando isso for inerente ou indispensável ao exercício do
direito, da liberdade ou da prerrogativa objeto da impetração (artigo 9º,
caput e §1º da Lei n.º 13.300/16).
Em razão dessas diferenças entre os dois institutos constitucionais, o
STF possui entendimento no sentido de que não há fungibilidade entre a ADO
e o mandado de injunção.

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Aprofundando em Ações Constitucionais
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Danniel Adriano
Reclamação constitucional
Natureza jurídica
A reclamação possui, atualmente mais do que nunca, a natureza jurídica
de ação constitucional.
No entanto, existiu, por anos, enorme divergência acerca da natureza da
reclamação, podendo-se apontar as seguintes posições – algumas das quais
ainda mantidas, apesar do atual contorno dado pelo Código Fux:
1) Primeira corrente (Vinicius Lemos, Alcides de Mendonça Lima,
Min. Amaral Santos): a reclamação é um recurso (ou sucedâneo
recursal).
2) Segunda corrente (Egas Moniz de Aragão): a reclamação é um
incidente processual.
3) Terceira corrente (Orozimbo Nonato): a reclamação é um
remédio incomum.
4) Quarta corrente (José Frederico Marques): a reclamação é uma
medida de Direito Processual Constitucional.
5) Quinta corrente (Min. Djaci Falcão): a reclamação é uma medida
processual de caráter excepcional.
6) Sexta corrente: a reclamação é uma espécie de correição parcial,
possuindo natureza administrativa disciplinar.
7) Sétima corrente (Pedro Lenza): a reclamação é um instrumento
de caráter mandamental e natureza constitucional.
8) Oitava corrente (Ada Grinover): a reclamação é uma simples
postulação perante o órgão que proferiu a decisão, buscando seu
cumprimento.
9) Nona corrente: a reclamação é um exercício do direito
constitucional de petição.
10) Décima corrente (Luiz Fux, Pontes de Miranda, Fredie Didier,
Leonardo Carneiro da Cunha, Antônio Gaio Jr, Humberto Dalla,
Marcelo Navarro Ribeiro Dantas, Rennan Thamay, Daniel Neves,
José Miguel Garcia Medina, Teresa Arruda Alvim): a reclamação é
uma ação, porque:

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Aprofundando em Ações Constitucionais
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Danniel Adriano
i. Depende de provocação dos legitimados;
ii. Possui natureza jurisdicional e contenciosa;
iii. Não corre na mesma relação processual em que o ato
atacado foi praticado;
iv. Não está elencada em lei federal como recurso;
v. Não há prazo fixado em lei para sua apresentação;
vi. Não tem como objetivo a reforma ou anulação de decisão,
mas a cassação ou preservação da competência;
vii. É ação de competência originária dos tribunais (como
enuncia a Constituição);
viii. Independe de sucumbência (é possível que o vencedor
queria, por exemplo, fazer cumprir a decisão que o
beneficiou);
ix. Independe de anterior processo judicial (podendo decorrer
de um ato administrativo, por exemplo);
x. Possui os elementos constitutivos da ação: parte, causa de
pedir e pedido;
xi. Exige o preenchimento das condições da ação e dos
pressupostos processuais;
xii. Exige o recolhimento de custas.
De todo modo, a reclamação também funciona, salvo para os que a
consideram um recurso, como sucedâneo recursal, pois ataca decisões
judiciais, apesar de não ser recurso.
Na jurisprudência, o STF, reconhecendo a multiplicidade de posições,
concluiu, em um primeiro momento, que a reclamação é uma manifestação do
direito constitucional de petição (art. 5º, XXXIV), tendo antes o reputado um
instrumento de extração constitucional.
Uma consequência dessa visão era a permissão de previsão do
cabimento da reclamação em Constituições dos Estados, para os tribunais de
justiça.
Como entendia a jurisprudência?
A reclamação, qualquer que seja a qualificação que se lhe de - Ação (Pontes de
Miranda, "Comentarios ao Código de Processo Civil", tomo V/384, Forense), recurso

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ou sucedaneo recursal (Moacyr Amaral Santos, RTJ 56/546-548; Alcides de
Mendonca Lima, "O Poder Judiciario e a Nova Constituição", p. 80, 1989, Aide),
remedio incomum (Orozimbo Nonato, "apud" Cordeiro de Mello, "O processo no
Supremo Tribunal Federal", vol. 1/280), incidente processual (Moniz de Aragao, "A
Correição Parcial", p. 110, 1969), medida de Direito Processual Constitucional
(Jose Frederico Marques, " Manual de Direito Processual Civil", vol 3., 2. parte,
p. 199, item n. 653, 9. ed., 1987, Saraiva) ou medida processual de caráter
excepcional (Min. Djaci Falcao, RTJ 112/518-522) - configura, modernamente,
instrumento de extração constitucional, inobstante a origem pretoriana de sua
criação (RTJ 112/504), destinado a viabilizar, na concretização de sua dupla função
de ordem político-jurídica, a preservação da competência e a garantia da
autoridade das decisões do Supremo Tribunal Federal (CF, art. 102, I, "l") e do
Superior Tribunal de Justiça (CF, art. 105, I, "f"). (Rcl 336, Relator(a): Celso de Mello,
Tribunal Pleno, julgado em 19/12/1990)

A natureza jurídica da reclamação não é a de um recurso, de uma ação e nem de um


incidente processual. Situa-se ela no âmbito do direito constitucional de petição
previsto no artigo 5º, inciso XXXIV da Constituição Federal. (ADI 2212, Relator(a):
Ellen Gracie, Tribunal Pleno, julgado em 02/10/2003)

Com o advento do Código de Processo Civil de 2015, porém, o STF


passou a reconhecer a natureza de ação da medida e, do mesmo modo, o STJ.
Como entende a jurisprudência?
Com a vigência do Código de Processo Civil de 2015, consolidou-se o entendimento
doutrinário e jurisprudencial no sentido de que o instituto da reclamação possui
natureza de ação, de índole constitucional, e não de recurso ou incidente processual.
(STJ, EDcl na Rcl 33.747/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, julgado
em 12/12/2018)

Em razão disso, a doutrina (Fredie Didier, Leonardo Cunha, Daniel Neves)


aponta as seguintes consequências – ainda que algumas suscitem divergência
(analisadas à frente):
a) Formação de coisa julgada material;
b) Cabimento de tutela provisória;
c) Exigência de capacidade postulatória;

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Aprofundando em Ações Constitucionais
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d) Pagamento de custas e condenação em honorários;
e) Preenchimento dos requisitos da petição inicial.

A título de observação, vale mencionar que o Código de Processo Penal


Militar menciona a reclamação para o Superior Tribunal Militar, dentro do capítulo
que trata dos recursos, o que leva parte da doutrina (Fredie Didier e Leonardo
Cunha) a considerar que, excepcionalmente nesse caso, a natureza jurídica seja
recursal.

Fundamento normativo
O histórico normativo da reclamação passa, em linhas gerais, pelas
seguintes etapas:
i) Ausência de previsão: inicialmente, o Supremo Tribunal Federal
admitia a reclamação com base na teoria dos poderes implícitos,
necessário para dar efetividade ao poder explícito de julgar;
ii) Previsão no Regimento Interno do STF de 1957: incorporação a
nível regimental.
• Observação: com o advento da Constituição de 1967, as
disposições regimentais passaram a ter força de lei federal.
iii) Constituição Federal de 1988: previsão expressa do cabimento
da reclamação para preservar a competência e a autoridade das
decisões do STF e do STJ.
O que diz a Constituição?
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da
Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: l) a reclamação para
a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões.
Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: I - processar e julgar,
originariamente: f) a reclamação para a preservação de sua competência e garantia
da autoridade de suas decisões.
iv) Lei 8.038/90: trata do procedimento da reclamação, junto com os
demais processos que tramitam nos tribunais de cúpula.
v) EC n.º 45/04: cria a súmula vinculante e prevê o cabimento de
reclamação em caso de descumprimento, mesmo que
administrativo.

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Aprofundando em Ações Constitucionais
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Danniel Adriano
• Observação: a lei 11.417/2006 trata do cabimento da
reclamação pelo descumprimento de enunciado de súmula
vinculante.
vi) CPC/15: trata da reclamação amplamente, trazendo cabimento,
legitimados, procedimento, pela primeira vez em um código.
Observação: o CPC/15 revogou a lei 8.038/90, na parte que tratava da
reclamação, mas não o fez em relação à lei 11.417/06.

Cabimento
Hipóteses
Partindo da Constituição Federal e do Código de Processo Civil, pode-se
organizar as hipóteses típicas e taxativas de cabimento da reclamação da
seguinte maneira:
1. Preservação de competência de tribunal;
2. Garantia da autoridade de decisão de tribunal, onde se incluem:
2.1. Ofensa a súmula vinculante;
2.2. Ofensa a decisão em controle concentrado de
constitucionalidade;
2.3. Ofensa a precedente fixado em:
2.3.1. Incidente de resolução de demandas repetitivas;
2.3.2. Incidente de assunção de competência;
2.3.3. Recurso extraordinário com repercussão geral;
2.3.4. Recurso extraordinária ou recurso especial
repetitivos.

O que dizem a Constituição e a lei?


Constituição Federal; Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal,
precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar,
originariamente: l) a reclamação para a preservação de sua competência e garantia
da autoridade de suas decisões.

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Art. 103-A § 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula
aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal
Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a
decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a
aplicação da súmula, conforme o caso.
Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: I - processar e julgar,
originariamente: f) a reclamação para a preservação de sua competência e garantia
da autoridade de suas decisões.
Art. 111-A § 3º Compete ao Tribunal Superior do Trabalho processar e julgar,
originariamente, a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da
autoridade de suas decisões.

CPC: Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para:
I - preservar a competência do tribunal;
II - garantir a autoridade das decisões do tribunal;
III – garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do
Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;
IV – garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de
resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de
competência;
§ 5º É inadmissível a reclamação:
II – proposta para garantir a observância de acórdão de recurso extraordinário com
repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos
extraordinário ou especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias
ordinárias.

Preservação da competência
Quanto à hipótese de preservação de competência, podemos citar o
caso de um juiz que realiza juízo de admissibilidade de apelação, impedindo o
envio do recurso ao tribunal (enunciado 208 do Fórum Permanente de
Processualistas Civis) ou que suspende uma ação em razão do ajuizamento de
ação rescisória.
Do mesmo modo, quando uma autoridade administrativa pratica ato
privativo de um tribunal (exemplo: instauração de inquérito para investigar
deputado federal, por autoridade que não o STF).

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Garantia da autoridade
O Código destaca como hipótese autônoma e genérica de cabimento a
garantia da autoridade do tribunal. Posteriormente, se desdobra essa previsão
em outras específicas, para que sejam observados os precedentes judiciais.
Independente de haver uma decisão vinculante para todos, porém, pode
caber a reclamação, buscando que se observe a autoridade do tribunal por uma
decisão proferida no próprio processo. Por exemplo, pode ser que o juiz
indefira um pedido de tutela provisória, o tribunal, em agravo de instrumento,
reforme a decisão, mas o juiz se negue a cumpri-la.
Garantia de observância de precedentes e súmula vinculante
Certas decisões, porém, constituindo precedentes judiciais (em um
sentido amplo, ou seja, por obrigar o Judiciário e, quanto ao controle de
constitucionalidade, os outros poderes), autorizam o cabimento de reclamação,
para que sejam efetivamente seguidos.
Por conta disso, a reclamação funciona como um instrumento concreto
para garantir sua observância, completando a previsão mais genérica do Código
Fux.
O que diz a lei?
CPC: Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:
I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de
constitucionalidade;
II - os enunciados de súmula vinculante;
III - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de
demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial
repetitivos;
IV - os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria
constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional;
V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.

Súmula vinculante
Quanto à hipótese de ofensa a súmula vinculante (do STF, obviamente),
cabe recordar o tratamento legal específico, na lei 11.417/06.
O que diz a lei?

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Lei 11.417/06: Art. 7º Da decisão judicial ou do ato administrativo que contrariar
enunciado de súmula vinculante, negar-lhe vigência ou aplicá-lo indevidamente
caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal, sem prejuízo dos recursos ou
outros meios admissíveis de impugnação.
§ 1º Contra omissão ou ato da administração pública, o uso da reclamação só será
admitido após esgotamento das vias administrativas.
§ 2º Ao julgar procedente a reclamação, o Supremo Tribunal Federal anulará o ato
administrativo ou cassará a decisão judicial impugnada, determinando que outra seja
proferida com ou sem aplicação da súmula, conforme o caso.
O cabimento contra atos administrativos (por ação ou omissão), aqui, é
explícito, com a peculiaridade de se exigir o esgotamento prévio da via
administrativa. Discute-se a constitucionalidade do comando:
1) Primeira corrente: a norma é inconstitucional, por violar a
inafastabilidade jurisdicional (art. 5º, XXXV, da CF), exigindo o
curso administrativo forçado, previsto mais amplamente na CF/67,
mas, na CF/88, apenas para a justiça desportiva (art. 217, §1º).
2) Segunda corrente (Daniel Neves, Gilmar Mendes): a norma é
constitucional, não havendo ofensa ao princípio da inafastabilidade
da jurisdição, porque a vida judicial permanece aberta através de
outras medidas (ação pelo procedimento comum, mandado de
segurança) e porque, na prática, haveria uma substituição da
multidão de recursos extraordinários por uma multidão de
reclamações.
3) Terceira corrente (Fredie Didier, Leonardo Cunha): a norma é, em
tese, constitucional. In concreto, porém, poderia ser afastada, em
controle difuso, se presente interesse de agir, demonstrando o
reclamante a razão pela qual não pode aguardar o encerramento
do trâmite administrativo.
Controle concentrado de constitucionalidade
No tocante às decisões proferidas em ações de controle concentrado
de constitucionalidade, importa sublinhar que o cabimento da reclamação em
razão de sua inobservância já era tranquilo, antes do CPC/15, dentro da noção
de “garantir a autoridade” dos tribunais.

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Duas observações são relevantes, aqui.
A primeira é a questão da fração da decisão que vincula a todos - se
apenas o dispositivo ou se também os fundamentos (transcendência dos motivos
determinantes), como analisado no estudo do controle de constitucionalidade.
A segunda é a possibilidade de utilização da reclamação para a revisão
do entendimento. De acordo com o Supremo Tribunal Federal, é possível que,
no exame de uma reclamação, o tribunal reanalise a matéria jurídica decidida no
controle concentrado e conclua em sentido diverso, desde que haja significativa
mudança das circunstâncias fáticas ou da percepção jurídica, como destacado
pelo Min. Gilmar Mendes.
A conclusão não é pacífica, sequer na corte: o Min. Teori Zavascki se
posicionou em sentido oposto, enxergando que a reclamação, nesse caso, teria
natureza rescisória e que de duas uma: ou o tribunal julgava procedente a
reclamação e fazia cumprir o entendimento, ou julgava a improcedente. Isso
porque o juízo, nessa via, é apenas da autoridade do decidido.
Como entende a jurisprudência?
Reclamação como instrumento de (re)interpretação da decisão proferida em controle
de constitucionalidade abstrato. Preliminarmente, arguido o prejuízo da reclamação,
em virtude do prévio julgamento dos recursos extraordinários 580.963 e 567.985, o
Tribunal, por maioria de votos, conheceu da reclamação. O STF, no exercício da
competência geral de fiscalizar a compatibilidade formal e material de qualquer ato
normativo com a Constituição, pode declarar a inconstitucionalidade, incidentalmente,
de normas tidas como fundamento da decisão ou do ato que é impugnado na
reclamação. Isso decorre da própria competência atribuída ao STF para exercer o
denominado controle difuso da constitucionalidade das leis e dos atos normativos. A
oportunidade de reapreciação das decisões tomadas em sede de controle abstrato
de normas tende a surgir com mais naturalidade e de forma mais recorrente no âmbito
das reclamações. É no juízo hermenêutico típico da reclamação – no “balançar
de olhos” entre objeto e parâmetro da reclamação – que surgirá com maior
nitidez a oportunidade para evolução interpretativa no controle de
constitucionalidade. Com base na alegação de afronta a determinada decisão
do STF, o Tribunal poderá reapreciar e redefinir o conteúdo e o alcance de sua
própria decisão. E, inclusive, poderá ir além, superando total ou parcialmente a
decisão-parâmetro da reclamação, se entender que, em virtude de evolução

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hermenêutica, tal decisão não se coaduna mais com a interpretação atual da
Constituição. Reclamação constitucional julgada improcedente. (Rcl 4374,
Relator(a): Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013)

Precedentes (IRDR, IAC, RE e Resp repetitivos e RE com repercussão geral)


Se houver tese jurídica previamente fixada em um IRDR (incidente de
resolução de demandas repetitivas), IAC (incidente de assunção de
competência), recurso extraordinário ou recurso especial repetitivos ou em
um recurso extraordinário com repercussão geral, não observada por
julgador a ela obrigado, será cabível a reclamação.
Com a modificação operada pela lei 13.256/16, ainda na vacatio do
CPC/15, o regramento acerca dos recursos repetitivos e do recurso
extraordinária com repercussão geral ficou um pouco confuso.
O primeiro ponto relevante é o próprio cabimento da reclamação. Apesar
de retirada a hipótese do rol do caput, o §5º, II, a contrario sensu, esclarece o
cabimento, de acordo com ampla doutrina.
O que diz a lei?
Redação originária: Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do
Ministério Público para:
III - garantir a observância de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle
concentrado de constitucionalidade;
IV - garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de precedente
proferido em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de
competência.

§ 5º É inadmissível a reclamação proposta após o trânsito em julgado da decisão.

Redação atual: Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério


Público para:
III – garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do
Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;
IV – garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de
resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência.

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§ 5º É inadmissível a reclamação:
I – proposta após o trânsito em julgado da decisão reclamada;
II – proposta para garantir a observância de acórdão de recurso extraordinário com
repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos
extraordinário ou especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias
ordinárias.

O entendimento que prevalece, doutrinariamente, é o do cabimento,


portanto, após o esgotamento das instâncias ordinárias – ou seja, no mesmo
momento em que caberia o recurso especial ou o recurso extraordinário.
A justificativa para a modificação é bastante prática e estrutural: os
tribunais superiores não teriam condições de receber milhares de reclamações
contra atos de juízos de primeiro grau, cabendo aos tribunais locais fiscalizarem
a aplicação desses precedentes.
O Supremo Tribunal Federal, inclusive, vem seguindo tal linha, admitindo
reclamações após a interposição de todos os recursos ordinários.
Como entende a jurisprudência?
A erronia na observância de pronunciamento do Supremo formalizado, em recurso
extraordinário, sob o ângulo da repercussão geral, enseja, esgotada a jurisdição na
origem considerado o julgamento de agravo, o acesso ao Supremo mediante a
reclamação. (Rcl 26874 AgR, Relator: Min. Marco Aurélio, Primeira Turma, julgado
em 12/11/2019)

A reclamação constitucional com fundamento na erronia de aplicação de


entendimento do STF firmado de acordo com a sistemática da repercussão geral
admite como objeto tão somente decisão judicial proferida no exercício da
competência conferida à Corte de origem quanto à apreciação de recurso
extraordinário pelo Código de Processo Civil, sob pena de se subverter o instituto e
tornar inócua a inovação normativa introduzida pela EC nº 45/04. Precedente
plenário. (Rcl 20892 AgR, Relator: Min. Dias Toffoli, Segunda Turma, julgado em
15/03/2016)

O Superior Tribunal de Justiça, no entanto, em debatido julgamento,


decidiu não ser cabível reclamação para controle da aplicação de precedente

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firmado em recurso especial repetitivo, mesmo que esgotadas as instâncias
ordinárias.
A decisão, bastante criticada pela doutrina – sobretudo, por desconsiderar
uma evidente interpretação no sentido do cabimento a partir da negativa de
cabimento somente antes de utilizados todos os recursos no tribunal local -,
também se fundamenta em argumentos de administração judiciária e mesmo do
próprio papel do STJ, enquanto Corte de Precedentes.
Como entende a jurisprudência?
Em sua redação original, o art. 988, IV, do CPC/2015 previa o cabimento de
reclamação para garantir a observância de precedente proferido em julgamento de
"casos repetitivos", os quais, conforme o disposto no art. 928 do Código, abrangem o
incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR) e os recursos especial e
extraordinário repetitivos. Todavia, ainda no período de vacatio legis do CPC/15, o
art. 988, IV, foi modificado pela Lei 13.256/2016: a anterior previsão de reclamação
para garantir a observância de precedente oriundo de "casos repetitivos" foi excluída,
passando a constar, nas hipóteses de cabimento, apenas o precedente oriundo de
IRDR, que é espécie daquele. Houve, portanto, a supressão do cabimento da
reclamação para a observância de acórdão proferido em recursos especial e
extraordinário repetitivos, em que pese a mesma Lei 13.256/2016, paradoxalmente,
tenha acrescentado um pressuposto de admissibilidade - consistente no esgotamento
das instâncias ordinárias - à hipótese que acabara de excluir.
Sob um aspecto topológico, à luz do disposto no art. 11 da LC 95/98, não há
coerência e lógica em se afirmar que o parágrafo 5º, II, do art. 988 do CPC, com a
redação dada pela Lei 13.256/2016, veicularia uma nova hipótese de cabimento da
reclamação. Estas hipóteses foram elencadas pelos incisos do caput, sendo que, por
outro lado, o parágrafo se inicia, ele próprio, anunciando que trataria de situações de
inadmissibilidade da reclamação.
De outro turno, a investigação do contexto jurídico-político em que editada a Lei
13.256/2016 revela que, dentre outras questões, a norma efetivamente visou ao fim
da reclamação dirigida ao STJ e ao STF para o controle da aplicação dos acórdãos
sobre questões repetitivas, tratando-se de opção de política judiciária para desafogar
os trabalhos nas Cortes de superposição.
Outrossim, a admissão da reclamação na hipótese em comento atenta contra a
finalidade da instituição do regime dos recursos especiais repetitivos, que

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surgiu como mecanismo de racionalização da prestação jurisdicional do STJ, perante
o fenômeno social da massificação dos litígios.
Nesse regime, o STJ se desincumbe de seu múnus constitucional definindo, por uma
vez, mediante julgamento por amostragem, a interpretação da Lei federal que deve
ser obrigatoriamente observada pelas instâncias ordinárias. Uma vez uniformizado
o direito, é dos juízes e Tribunais locais a incumbência de aplicação
individualizada da tese jurídica em cada caso concreto.
Em tal sistemática, a aplicação em concreto do precedente não está imune à
revisão, que se dá na via recursal ordinária, até eventualmente culminar no
julgamento, no âmbito do Tribunal local, do agravo interno de que trata o art. 1.030, §
2º, do CPC/15. (Rcl 36.476/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, julgado
em 05/02/2020)

Prazo
Não sendo substituta da ação rescisória, a reclamação não pode ser
ajuizada após o trânsito em julgado da decisão que enseja seu cabimento.
Esse entendimento, consagrado em súmula do STF, foi positivado no Código de
Processo de 2015.
Como entende a jurisprudência?
Súmula 724 do STF: “Não cabe reclamação quando já houver transitado em julgado
o ato judicial que se alega tenha desrespeitado decisão do Supremo Tribunal
Federal”.

Essa reclamação só é cabível se a decisão objeto dela - na hipótese, despacho que


julgou deserto agravo de instrumento contra a decisão que não admitiu recurso
extraordinário - ainda não transitou em julgado, pois a reclamação não e sucedâneo
de ação rescisória. (Rcl 365, Relator(a): Min. Moreira Alves, Tribunal Pleno, julgado
em 28/05/1992)

Decisão reclamada que declarou a prejudicialidade do recurso extraordinário em


decorrência do provimento do recurso especial pelo Superior Tribunal de Justiça.
Alegação de afronta à decisão desta corte que determinou a devolução do feito à
origem nos moldes do artigo 543-B, do Código de Processo Civil. Ato desprovido de
conteúdo decisório. Acórdão recorrido que não mais existia, por substituído, quando

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do juízo de admissibilidade do recurso extraordinário. Decisão reclamada transitada
em julgado. Súmula 734/STF. (Rcl 24810 AgR, Relator(a): Min. Luiz Fux, Primeira
Turma, julgado em 11/02/2020).

O que diz a lei?


CPC: Art. 988 § 5º É inadmissível a reclamação:
I – proposta após o trânsito em julgado da decisão reclamada.
Por conta disso, com alguma razão, há quem afirme que a reclamação
possui prazo para ajuizamento, que coincide com aquele previsto em lei para a
interposição do recurso cabível (Daniel Neves). Ou seja, no mínimo os cinco dias
para a oposição de embargos de declaração.
Por outro lado, mesmo que, antes do julgamento da reclamação,
sobrevenha o trânsito em julgado da decisão, a reclamação deverá ser
julgada, como o Código expressamente afirma.
O que diz a lei?
CPC: Art. 988 § 6º A inadmissibilidade ou o julgamento do recurso interposto contra
a decisão proferida pelo órgão reclamado não prejudica a reclamação.

Nesse sentido, aliás, o STF decide há bastante tempo (Rcl 2280, Relator
Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, julgado em 01/04/2008).

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