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A Filosofia Da Ciencia de Rubem Alves
A Filosofia Da Ciencia de Rubem Alves
Júlio Fontana*
Rubem Alves nasceu em Boa Esperança, Minas Gerais, e tem, hoje, 72 anos. Estudou música e
quis ser médico quando jovem. Entretanto acabou optando pela Teologia.1 Formado em Teolo-
gia pelo Seminário Presbiteriano de Campinas, é mestre em Teologia pelo Union Theological
Seminary, de New York, EUA, e doutor em Filosofia pelo Princeton Theological Seminary,
EUA. Formado em Psicanálise pela Sociedade Paulista de Psicanálise, é professor emérito da
Unicamp.
O senso comum e a ciência Isso é fácil de ser verificado: o que temos por sen-
so comum, hoje, já foi ciência em épocas passadas,
Rubem Alves mostra o que significam senso co- ou, como Rubem Alves diz: “Aquilo que outros ho-
mum e ciência. Essa discussão é necessária, pois ha- mens, em outras épocas, consideraram ciência sem-
verá um debate muito acirrado entre os epistemolo- pre parece ridículo séculos depois. Isso acontecerá,
gistas para saber qual dessas formas de conhecimento também, com nossa ciência.” (p. 16)
e mais complexa.
O senso comum e a ciência são expressões da
Primeiro, o autor desmitifica a ciência mostrando mesma necessidade básica, a necessidade de com-
que ela nada mais é que a hipertrofia do nosso senso preender o mundo, a fim de viver melhor e sobrevi-
comum: ver. Para aqueles que teriam a tendência de achar que
A ciência não é um órgão novo de conhecimento. Ela é o senso comum é inferior à ciência, eu só gostaria
a hipertrofia de capacidades que todos têm. Isso pode de lembrar que, por dezenas de milhares de anos, os
ser bom, mas pode ser muito perigoso. Quanto maior a seres humanos sobreviveram sem coisa alguma que
visão em profundidade, menor a visão em extensão. A se assemelhasse à nossa ciência. Depois de cerca de
tendência da especialização é conhecer cada vez mais quatro séculos, desde que surgiu com seus fundado-
de cada vez menos (p. 12).2 res, curiosamente a ciência está apresentando sérias
ameaças à nossa sobrevivência. (p. 21)
A aprendizagem da ciência é um processo de de-
senvolvimento progressivo do senso comum. Que é Que procuramos conhecer? O senso comum e
senso comum? Antes, devo informar ao leitor que a a ciência possuem mais em comum do que imagi-
expressão senso comum não foi criada pelas pessoas nam. Ambos não investigam toda a realidade, mas
de senso comum, mas por aqueles que se julgam aci- apenas aquilo que se apresenta como um problema.
ma do senso comum. Portanto senso comum é o co- Todo conhecimento começa com um problema (p.
nhecimento que não é científico e as pessoas de sen- 24). Quando não há problemas, não pensamos, só
so comum são intelectualmente inferiores, ou, como usufruímos. Como nos ensina Michael Polanyi: “[...]
muitos chamam, “leigos”. O que os cientistas talvez coisa alguma, em si mesma, se constitui como pro-
não saibam — ou melhor, eles sabem, mas fingem blema ou descoberta; ela pode ser um problema so-
que não sabem —, é que a ciência é uma metamorfo- mente se produz perplexidade e incômodo a alguém,
se do senso comum. Sem o senso comum, a ciência e será uma descoberta se aliviar alguém do peso do
não pode existir. problema.” (p. 34).
Notas
*
Aluno de Teologia da PUC-RJ. Autor de artigos e resenhas publicadas nas revistas Inclusividade, do Centro
de Estudos Anglicanos; Ciberteologia, de Paulinas Editora; e Correlatio, da Associação Paul Tillich do
Brasil.
1
Rubem Alves é, reconhecidamente, um dos precursores da teologia da libertação no Brasil. De raízes
protestantes, exerceu, a partir da década de 1980, uma evidente influência nos meios acadêmicos católicos
de linha mais progressista (SOARES, Afonso M. L. Interfaces da revelação. p. 128).
2
Todas as citações feitas neste artigo foram extraídas do livro de Rubem Alves Filosofia da ciência: introdução
ao jogo e a suas regras, 9. ed., São Paulo, Loyola, 2005. A fim de tornar o texto menos volumoso, colocarei
somente as páginas referentes às citações no próprio corpo do texto.
3
Rubem Alves desenvolve de forma deficiente esta parte do livro. O problema é gerado pela mistura de
teoria do conhecimento e teoria da ciência.
4
Na tradução brasileira de A lógica da pesquisa científica consta assim: “As hipóteses são redes: só quem
as lança colhe alguma coisa” (p. 22). Creio que a tradução de Rubem Alves esteja mais correta, pois na
própria Lógica, traduzida para a nossa língua (p. 61), Popper diz que “as teorias são redes, lançadas para
capturar aquilo que denominamos mundo”.
5
COMTE. Apud ALVES, R. Op. cit. p. 136.
6
Ver: POPPER, K. R. Conjecturas e refutações. pp. 147-160.
7
SOARES, Afonso M. L. Interfaces da revelação. p. 133.