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Resenha do Artigo Diacronias da Violência no Baixo Jaguaribe (CE): Marcas Históricas

e Geográficas

Referência bibliográfica: BEZERRA, Juscelino Eudâmidas. Diacronias da violência no


Baixo Jaguaribe (CE): Marcas Históricas e Geográficas. In: Boletim DATALUTA. Presidente
Prudente, n. 73, jan. 2014.

O artigo, Diacronias da Violência no Baixo Jaguaribe (CE): Marcas Históricas e Geográficas,


publicado em 2014 no Boletim DATALUTA, traz um recorte espacial, se voltando para os
conflitos envolvendo a questão agrária na região do Baixo Jaguaribe, Estado do Ceará.
Fazendo um mergulho na história da região, desde tempos remotos marcada por inúmeros
episódios de violência que influenciam profundamente as relações sociais estabelecidas, o
autor explora o que alguns autores chamam de “sistema de pistolagem” mostrando como em
uma região rural específica do país desde tempos remotos as relações de poder se mantém.
Para fundamentar os argumentos foi feito trabalho de campo no intuito de coletar dados e em
algumas situações textos jornalísticos foram utilizados, visando preservar a identidade de
certos indivíduos entrevistados. Juscelino Eudâmidas Bezerra é o autor do artigo, sendo
Doutor em Geografia pela Universidade Paulista – UNESP/Presidente Prudente e professor
do curso de Geografia da Universidade de Pernambuco, Campus Petrolina.

Na introdução, o autor traz a informação de que a região do Baixo Jaguaribe possui forte
presença da população indígena e que a economia pastoril foi predominante por muitos
séculos e que assim como a exploração de recursos naturais presentes na região. A partir do
século XX, através de políticas públicas que se viu na região o fortalecimento da cultura
irrigada e o estabelecimento de estruturas hídricas de maior magnitude, abrindo espaço para
o estabelecimento de empresas nacionais e transnacionais fazendo com que aquela área,
através do cultivo de frutas (sendo o cultivo de melão mais expressivo) adentrasse na lógica
da globalização. O posicionamento do autor é o de que a expansão do agro negócio está
intimamente relacionada ao aumento de práticas violentas.

O artigo é dividido então em dois tópicos antes de sua conclusão. “A gênese da violência e o
processo de modernização da pistolagem” inicia com o autor defendendo que o referencial
simbólico e identitário é um dos fatores determinantes para se definir uma região e que o
imaginário atribuído ao sertão está povoado de histórias de violência motivadas por disputas
de terra, defesa da honra, etc.

Segundo o autor, os inúmeros conflitos entre indígenas e portugueses marcam a gênese do


sertão tendo assumido grandes proporções e exigindo militarização e diversas
“reelaborações socioculturais”. BEZERRA alega no Baixo Jaguaribe não foi diferente e que a
violência como prática social passou então a vigorar com mais força a partir do momento em
que a Terra se tornou uma mercadoria. Com o aumento de contendas relacionadas a
questões fundiárias, teria surgido um cenário propício para que a imagem do pistoleiro
ganhasse destaque. Sendo o “autor material na execução do assassinato”, o pistoleiro é um
indivíduo que está a serviço de um “autor intelectual”. BEZERRA utiliza o termo “sindicato do
crime” para se referir a organização cada vez mais complexa do “sistema de pistolagem” que
em muitos casos é organizado de forma hierárquica, com mentores, intermediários,
protetores, etc.
BEZERRA alega que a expansão do Agro Negócio está relacionada ao conflito social,
expropriação e exploração de diversos povos, assim como no período em que os
portugueses exerciam de forma violenta controle contra os povos indígenas. Os alvos
passam a ser em muitos casos indivíduos que questionam e buscam alterar as estruturas
estabelecidas. O ato de os ameaçar, perseguir, muitas vezes matando-os, gera um efeito em
que a ordem se mantém, uma vez que os indivíduos inseridos nesse contexto passam a não
se manifestar.

O tópico Biografias de Resistência: Zé Maria do Tomé não só exemplifica, mais dá forças


para todos as informações trazidas pelo autor. Tendo sido um líder comunitário na região do
Baixo Jaguaribe bastante engajado em expor os diversos crimes cometidos pelas grandes
empresas instaladas na região, sendo expropriação de terras e contaminação do lençol
freático alguns deles, Zé Maria foi morto a tiros por um pistoleiro, sendo o maior empresário
da região um dos principais acusados de ser o mandante.

O autor chega a conclusão de que mesmo sendo de extrema relevância para a população
pautas levantadas por indivíduos como Zé Maria, a violência exercida por parte das grandes
empresas naquela região provocam medo na população que em muitos casos durante os
trabalhos de campo se recusaram a participar de espaços em que poderiam se organizar,
buscar soluções e a quebra das velhas estruturas. Todos estão cientes da impunidade e
ausência do estado na resolução de tais questões.

Entre as pautas do Governo Brasileiro no ano de 2021, estão inseridas uma série de
medidas que visam beneficiar e permitir a expansão do agro negócio com a estrutura que o
mesmo apresenta hoje. A grande mídia, como no caso da emissora Rede Globo (a maior do
país) com a propaganda televisiva que traz a mensagem Agro é Pop, contribui para construir
no imaginário da população brasileira uma visão pouco crítica voltada para o agro negócio. O
texto sendo de fácil leitura e permitindo a todos os indivíduos que não estão habituados ao
gênero artigo científico a sua compreensão, possui grande relevância do ponto de vista
didático e cumpre o propósito do autor ao contribuir para a reflexão a respeito da questão
agrária, não apenas da Região do Baixo Jaguaribe. Os métodos utilizados para a produção
do artigo se mostraram bastante eficazes com o trabalho de campo permitindo ao
pesquisador em muitos casos um olhar mais próximo do fenômeno.

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