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ESCOLASTICA

a)    Conceito   da   Esco1ástica


Johannes HIRSCHBERGER diz: “Por Escolástica, em sentido restrito,
entende-se a especulação filosófico-teológica que se desenvolveu nas escolas
da Idade Média propriamente dita, i. é, de Carlos Magno até a Renascença, tal
como essa especulação se apresenta, antes de tudo, na literatura
de Summae e de Quaestiones. Essas escolas foram a princípio as catedrais e
as monacais e, mais tarde, as Universidades. Num sentido algo mais largo,
designa a escolástica também o pensamento dessa época que, embora sem
empregar um método rigorosamente escolar, racional-conceptual, repousa
porém nas mesmas bases metafísicas e religiosas, como p. e., a mística. “

   Fides quaerens intellectum

A fé em busca de entendimento. Santo Anselmo era assumidamente um


pensador Agostiniano. Essa frase que para Agostinho era apenas uma grande
ideia torna-se agora um assunto tratado em particular, e constitui escola.
Anselmo escreveu: “Nem busco entender para que possa acreditar, mas
acredito que possa entender. Por isso, também, acredito que, a não ser que eu
primeiro acredite, não serei capaz de entender"). Anselmo defendia que a fé
precede a razão e que a razão pode expandir a fé.

Um historiador chamado Johannes HIRSCHBERGER escreveu o seguinte a


respeito de Anselmo:

“Os dados da fé se tornam racionais, elucidados, no ponto de vista lógico, no


seu conteúdo e no seu travamento, sistematizados de modo a poderem
deduzir-se um dos outros e, assim, entendidos mais profundamente. Este
racionalismo não desvenda os mistérios da crença, mas procura apenas, tanto
quanto possível, informar logicamente o patrimônio da fé. Pode-se por
conseguinte perguntar se Anselmo é filósofo, pois as suas premissas são afinal
sempre teses religiosas. "Não quero saber para crer, mas crer para saber",
declara ele.” (HIRSCHBERGER )
De fato toda a escolástica arrancará desse ponto de partida e, além disso,
Anselmo leva a especulação tão longe que, ao mesmo tempo, versa
problemas filosóficos. Embora sob roupagens teológicas, de fato apresenta-se
aí uma problemática filosófica.

b)    Provas anselminianas da existência de Deus


Esta problemática filosófica revela-se logo pelo problema que
desenvolveu no Proslogium, a sua prova da existência de Deus, que lhe deu
um lugar de relevo na história da filosofia. Kant deu a essa prova o nome de
ontológica, por considerar apenas a forma que lhe deram Descartes e Leibniz.
Mas o mesmo pensamento já aparece em Anselmo e o conteúdo é o seguinte:

a) O argumento. — A razão tem em si mesma a idéia de um ser maior


do qual nenhum outro pode ser pensado (id quo maius cogitari non
potest). Ora, se tal ser existisse só no pensamento, então não seria o
máximo, porque nesse caso poderíamos pensar um maior, a saber, o
que existisse não só no pensamento, mas também na realidade. Por
onde, a idéia de um ser máximo exige uma existência não só lógica,
mas também antológica.
b) Crítica- e contracrítica. — Já o monge Gaunilão tinha replicado: não é
pelo fato de eu supor idealmente existentes as Ilhas Afortunadas, que
elas existem. O mesmo dirá Kant mais tarde: a idéia de uma cousa
não implica na sua existência. Mas isso já o sabia também Anselmo:
não é por um pintor conceber uma obra, que ela já existe, dizia ele-
Por isso mantinha a sua prova da existência de Deus e respondia, no
seu escrito contra Gaunilão, que exemplo das Ilhas Afortunadas não
atinge a questão no seu âmago. Pois, a idéia de Deus é um caso
único e incomparável, porque pensamos nele como um ser que
necessariamente encerra e de toda a eternidade todas as perfeições,
ao contrário de uma ilha, que é um ser limitado. E por aí se mostra o
nervo da prova.
c) ) Momento histórico-genético da prova. — Está na expressão — "ser
que encerra em si todas as perfeições". Não é outra essa idéia senão
a idéia de Deus, de Boécio, a do sunimum onimnium bonorum
cunetaque bona intra se continens; a de Agostinho do homum omnis
boni; a idéia platônica do bem em si, ανυποθετον e ιχαλον. Isso
resulta ainda mais claro da sua outra obra, o Monologium, onde são
desenvolvidas duas provas de Deus tipicamente platônicas: a dos
graus de perfeição e da idéia do ser supremo. Anselmo não caiu na
μεταθασιζ ειζ αλλο γενοζ, mas tinha no pensamento a
idéia apriori, que todo imperfeito supõe o perfeito, anterior, em toda a
linha do ser, ao imperfeito. Ora, sendo o imperfeito uma realidade,
com maioria de razão o perfeito, do qual o imperfeito não é senão
cópia.
d) δ) Conceito de Verdade. — Se se aprofundar melhor o conceito de
verdade de Anselmo, então mais claro ficará a sua prova da
existência de Deus. Verdade significa para Anselmo a "retidão" das
essências, a qual consiste em se conformarem com o seu modelo
existente na mente divina. Está no espírito e só aí é
perceptível {ventas est rectitudo solamente perceptibis); e
precisamente quando o espírito descobre  relações  necessárias.   
Mas  se a nossa mente descobre na idéia de Deus uma conexão,
necessária entre essência e existência, então se nos., revela por isso
mesmo uma verdade primeira, pois sc3 poderemos descobrir na cópia
à verdade, por existir a verdade-modelo. Por isso não se pode dizer
com exatidão que Anselmo passa ilogicamente do mundo conceptual
para o real. Para ele não há nenhuma oposição entre o pensamento e
o ser, como na filosofia moderna. Era ainda demasiado cedo para ser
isso possível. Anselmo está todo penetrado do espírito agostiniano;
ora, para este pensador platonizante, a autêntica realidade está na
verdade e no bem primeiros, na imagem exemplar e na idéia; e disso
vive todo ser e conhecer, de modo que podemos subir para Deus de
vários lados.

e) ε) Influência. — A prova anselmiana de Deus exerceu larga influência


na alta escolástica e nos tempos modernos. Se de um lado Tomás de
Aquino a rejeita (S. Th., I, 2, 1 ad 2; S. c. g. I, 10: De ver. 10, 12),
Guilherme Altissiodorense, Alexandre Halense, Boaventura, Alberto o
Grande e Egídio Romano a aceitam. Como se vê, pensadores todos
eles de tendência platônico-agostiniana mais ou menos fortemente
acentuada, por onde podemos conhecer o caráter histórico-ge-nético
desta prova e do seu autor.

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