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Filosofia Política

Aula 05

Prof. Antonio Charles Santiago Almeida


CONVERSA INICIAL

Buscamos, neste encontro, trabalhar a teoria política, a partir do


expediente filosófico. Todavia, para melhor compreensão dessa
nossa atividade, uma leitura de Filosofia Política, dividimos o texto
em quatro partes.

Na primeira parte, vamos desenvolver a relação que existe entre


direito e filosofia. Nesse ponto, vamos explicar como alguns
temas do direito estão intimamente ligados com a filosofia, mais
precisamente com a Filosofia Política. Desse modo, nesse
momento do texto, faremos uma leitura dos livros de Platão para
trabalhar o conceito de justiça, bem como o conceito de Lei.

Posteriormente, trabalharemos com o conceito de direito natural e


direito particular, à luz da tragédia Antígona, de Sófocles. Nesse
segundo momento, trabalharemos com a seguinte temática:
Massa e Poder – uma leitura do movimento de massa. Nesse
momento do texto, comtemplaremos o conceito de massa e sua
ação na sociedade contemporânea. Para tanto, faremos
considerações em torno da Filosofia Política de Ortega y Gasset,
uma vez que este autor tem um trabalho significativo em torno
dessa temática: A Rebelião das Massas.

No terceiro momento, vamos trabalhar com o tema Educação e


Política. Nesse momento do nosso trabalho, faremos
considerações em torno da relação que existe entre educação e
política. E para tais considerações, vamos considerar o filósofo
Theodor Adorno e sua obra Educação e Emancipação.

Por último, faremos considerações em torno da Filosofia, Política


e transformação. Nesse último momento, vamos tratar da
seguinte questão: é papel da filosofia transformar o mundo?

Desse modo, temos o objetivo de refletir sobre a teoria política,


mais precisamente sobre temáticas que estão no entorno dessa
teoria política. Por isso, esperamos que você ultrapasse as leituras
que aqui estão dadas e busque a leitura dos textos aqui indicados,
pois certamente serão de grande valia para sua formação!

Acompanhe o vídeo no material on-line.

CONTEXTUALIZANDO

A discussão em torno da teoria política é bastante ampla. Fizemos


algumas considerações no sentido de assegurar um debate
mínimo em torno dessa temática à luz de uma Filosofia Política.
Desse modo, observe como os temas aqui trabalhados estão, de
certa maneira, interligados com o cotidiano.

Na sociedade presente, temos um grande debate em torno do que


é justo e injusto, sobretudo, tomando como base os movimentos
sociais. Esse debate já aconteceu no sentido de pensar o que é a
justiça. Temos uma discussão em torno dos movimentos de
massa e se, de fato, é possível assegurar que as massas
participem do processo político. É claro que, na sociedade atual,
o conceito de massa é tomado em um sentido bem marxista. E
sempre temos a discussão, é papel da filosofia transformar o
mundo? São questões que estão no itinerário da Filosofia Política
e que cobra de nós reflexões e respostas.

Nesse sentido, proponho que você resolva a seguinte questão: a


política brasileira, no seu conjunto, se caracteriza como uma
política de massa? Para responder à questão, faça uma leitura
cuidadosa do primeiro capítulo da obra A Rebelião das Massas e
analise os últimos movimentos que aconteceram em torno da vida
política, especialmente, das manifestações em torno do governo
da presidenta Dilma.

http://www.ebooksbrasil.org/adobeebook/ortega.pdf

Agora, vamos à videoaula na qual o professor Antonio Charles irá


explicar os assuntos que serão estudados neste encontro!
Acompanhe no material on-line.
PESQUISE
Tema 1: Direito e Filosofia – Um debate político

Quando pensamos na relação entre Filosofia e Direito uma série


de questões são avocadas. Primeiro, as temáticas que
circunscrevem o Direto e, depois, os autores da Filosofia que
fazem discussões que são retomadas e repensadas à luz do
Direito.

Uma das temáticas é, sem dúvida alguma, o conceito de justiça. E


essa discussão se encontra na Grécia Antiga. Já vimos que em
Platão, sobretudo, nos três primeiros livros de A República, temos
um debate em torno da justiça. Eis que Platão (1999, p. 40) usa
Sócrates para fazer a seguinte conclusão do Livro I de A
República: “porquanto, não sabendo o que é a justiça, ainda
menos saberei se é virtude ou não e se aquele que a possui é feliz
ou infeliz”. O fechamento desse livro acontece após um longo
debate em torno do que é a justiça e, mais precisamente, de sua
função entre os homens.

No livro II de A República, na continuação do debate em torno da


justiça, Glauco faz a narrativa do “Anel de Giges” (texto já
trabalhado) no intuito de pensar na justiça a partir de sua prática
na cidade. E a discussão, nesse segundo livro é, justamente, a
defesa de um contrato, isto é, de leis e sua execução.

Já no livro de As Leis, tem-se um debate em torno do legislador,


aquele que tem a responsabilidade de manusear com prudência e
com responsabilidade a Lei, pois o uso incorreto da Lei, no
entendimento de Platão, acarreta a injustiça e, nesse sentido, a
Lei perde o seu caráter de iluminação. Decerto que a noção de
Lei que Platão defende difere muito da Lei que compreendemos
hoje, pois, para este filósofo, a Lei não tem caráter de punição,
mas de orientação, em outros termos, de educação. E ainda, na
abertura desse livro (1999a, 67), As Leis, o autor faz a seguinte
indagação: “a quem atribuis, estrangeiros, a autoria de vossas
disposições legais? A um deus ou a algum homem?”

A pergunta se dá no sentido de saber de onde vem a Lei – dos


deuses ou dos homens? Essa questão perpassa toda a obra, pois
na análise da melhor das constituições, Platão intenta escrever
sobre a cidade, a segunda cidade e sua possibilidade de efetivar
a vida em comunidade; a existência de uma cidade que pode
acontecer, já que a primeira cidade, observada na obra de A
República, desenho ideal, serve para o filósofo para que possa
auxiliar os que assim desejam guiar suas vidas de forma reta e
justa. Esta é a descrição que aparece ao final do livro IX de A
República.

Com relação à discussão em torno da lei, Châtelet (1985), na obra


História das Ideias Políticas, chega à seguinte conclusão: a Lei
serve como princípio de organização política e social, concebida
como texto elaborado por um ou mais homens guiados pela
reflexão, aceita pelos que serão objeto de sua aplicação, alvo de
um respeito que não exclui modificações minuciosamente
controladas. Essa é provavelmente a invenção política mais
notória da Grécia Clássica; é ela que empresta a sua alma à
cidade, quer essa seja democrática, oligárquica ou democrática.

Nas palavras de Châtelet, o Direito, do ponto de vista de uma


Filosofia do Direito, tinha seu espaço assegurado na Grécia
Clássica, pois a cidade, na sua origem, tem sua vida pública
assegurada com a instituição da Lei, aquela que orienta, educa e
conduz o homem à vida feliz.

Outro texto emblemático para compreensão do Direito em solo


grego antigo é Antígona, parte da Trilogia Tebana de Sófocles.
Temos um debate em torno de sobre qual direito deve repousar a
verdade do rei, a onipotência do rei ou o direito constituído
universal que tem seu asseguramento nos costumes e na tradição.
Sabemos que Antígona não deveria conceder honras ao seu
irmão, Polinices, mas, mesmo assim, ela desrespeita o edito de
Creonte e concede ao seu irmão as honras de guerreiro.

Indicamos a leitura desse texto. O texto é belo e amplia a


discussão em torno do direito e da justiça. O debate que acontece
entre Creonte e Antígona é bastante encantador!

Temos, nessa tragédia de Sófocles, um debate em torno da


Filosofia do Direito: qual é a lei mais importante, a natural,
constituída pelos costumes ou a positiva, editada pelo
governante? Nas palavras de Antígona (2006, p. 219),
respondendo a Creonte, pelo descumprimento de sua ordem:

Mas Zeus não foi o arauto delas para mim, nem essas leis são
as ditadas entre os homens pela justiça, companheira de
morada dos deuses infernais; e não me pareceu que tuas
determinações tivesses força para impor aos mortais até a
obrigação de transgredir normas divinas, não escritas,
inevitáveis; não é de hoje, não é de ontem, é desde os tempos
mais remotos que elas vigem, sem que ninguém possa dizer
quando surgiram.

Observe que, nas palavras de Antígona, os costumes e a tradição


são direitos constituídos como natural/universal, já o edito de
Creonte é uma imposição, vontade pessoal que se constitui como
direito particular. Desse modo, podemos observar que, do ponto
de vista de uma Filosofia do Direito, temos um debate que
acontece lá na Antiguidade Clássica.

No período moderno, a Filosofia reconhece, do ponto de vista


político, um debate que circunscreve os contratos para o
asseguramento da sociedade, da vida pública. Os filósofos
contratualistas são Hobbes, Locke e Rousseau. Nesses autores,
temos uma Filosofia do Direito, mais precisamente, uma filosofia
dos contratos sociais e políticos. Esse debate já fizemos, mas vale
recordar a discussão para que você perceba a conexão entre
Filosofia, Política e Direito.
Com relação ao tema Direito e Filosofia – um debate político,
gostaríamos apenas de apontar como conceitos que são
trabalhados no direito já estão presentes na filosofia e como esses
conceitos são pensados à luz de uma Filosofia Política. Vimos o
conceito de justiça, de lei e de contrato. São três importantes
temas que recortam o direito e que têm bases na Filosofia.

Aproveite para ampliar sua compreensão em torno da temática.


Observe, quando possível, a filosofia do direito em Kant, a filosofia
do direito em Hegel e como os autores do direito trabalham com
esses autores, especialmente, Hans Kelsen em Teoria Pura do
Direito.

E, claro, não deixe de assistir à videoaula correspondente a este


tema. Acompanhe o vídeo no material on-line.

Tema 2: Massa e Poder: uma leitura do movimento de


massa

Quando se pensa em compreender o fenômeno “massa”,


especialmente na sociedade contemporânea, tem-se um debate
quase que inesgotável, uma vez que esse fenômeno parece
ocupar o centro da reflexão político-filosófica. Para uma definição
mais precisa, o filósofo e político Ortega y Gasset, na obra A
Rebelião das Massas (1987, p. 42), chega a dizer que o fenômeno
é visual, isto é, “as cidades estão cheias de gente. As casas cheias
de inquilino. Os hotéis, cheios de hóspedes. Os trens, cheios de
passageiros. Os cafés, cheios de consumidores. Os passeios,
cheios de transeuntes”.

Ortega y Gasset, tem um estilo bastante peculiar na forma de


escrita, pois consegue agregar, na sua escrita, um conjunto de
metáforas, com característica poética. Desse modo, na assertiva
apresentada, o autor diz que em todos os lugares, dos mais
simples aos mais complexos, estão cheios, ou seja, as massas
estão em todos os lugares.
“Seja para o bem ou para o mal, as massas avançaram. Agora,
são visíveis em todos os lugares”.

A observação orteguiana desse fenômeno contemporâneo parte


do princípio de que, na sociedade atual, as massas representam,
por meio da rebelião, o perigo, a barbárie, pois o que se assiste é
justamente a falta de singularidade: o indivíduo se tornou massa.
Nas palavras de Ortega (1987, p. 43), de repente a multidão
tornou-se visível, instalou-se nos lugares preferencias da
sociedade. Antes, se existia, passava despercebida, ocupava o
fundo do cenário social; agora antecipou-se às baterias, tornou-se
personagem principal. Já não há protagonistas: só há coro.

Pois bem, nesse entendimento orteguiano, a sociedade


contemporânea vive o seu império brutal: as massas se
rebelaram, apareceram, tonando-se personagem capital onde não
existe protagonismo, mas rebelião – rebelião das massas.

É nesse contexto que Ortega desenvolve sua Filosofia Política.


Parte do princípio de que, com o fenômeno massa e a rebelião na
sociedade presente, não há possibilidade de fazer da política um
instrumento de transformação da sociedade, pois a massa
inviabiliza qualquer projeto de nobreza, grandeza e
desenvolvimento. Devemos destacar que o conceito de nobre,
sobretudo em Ortega, se dá em razão de esforço, nobreza como
condição de espírito e nunca em função de laços sanguíneos ou
de bens materiais.

A massa, no entendimento desse autor, não pode ser pensada


como quantidade, mas como qualidade, quer dizer, a massa é do
sujeito ao seu coletivo, dessa forma, há uma compreensão
conceitual bastante peculiar e que não se pode confundir ou
relacionar com o conceito de massa que é pensado no expediente
marxista.

Massa é uma forma de pensar, de agir e de viver na sociedade,


segundo Ortega. Nas palavras desse autor (1987, p. 44) “massa é
o conjunto de pessoas não especialmente qualificadas. Portanto,
não se deve entender por massa, nem apenas, nem
principalmente as massas operárias. Massa é o homem médio”.

Para melhor compreensão desse debate, convém que façamos


uma apresentação do pensamento orteguiano. Para esse autor, a
sociedade se divide em duas categorias, a saber, massa e
minoria. Mas essa compreensão não se refere a classes sociais,
pelo contrário, refere-se a categorias tipológicas. Nas palavras de
Ortega (1987(1987, p. 44), “a sociedade é sempre uma unidade
dinâmica de dois fatores: minorias e massas”. Observe que são
fatores, não classes sociais. E devemos esclarecer que é muito
comum que autores desavisados façam uma leitura desse
expediente orteguiano enviesado com os conceitos marxistas.

Sugiro, meu caro aluno, que você faça a leitura da dissertação de


mestrado intitulada “Conceitos Políticos na obra de Ortega y
Gasset”. O autor faz um estudo minucioso de Ortega e trabalha a
diferença que existe entre o pensamento orteguiano do
pensamento marxista. Ainda, a dissertação faz distinção entre
Ortega e os autores da teoria das elites.

http://livros01.livrosgratis.com.br/cp091294.pdf

Nesse contexto de duas unidades dinâmicas, minoria e massa,


apresentada por Ortega, podemos destacar que existem tipos de
homens: na minoria temos o homem-especial e na massa temos
o homem-massa. Observe que os conceitos tipológicos de
homem, nesse contexto orteguiano, são os responsáveis, de
algum modo, pela vida política na sociedade contemporânea.

O homem-massa, na definição de Ortega, promove a barbárie,


pois este é, sem dúvida alguma, segundo o filósofo espanhol, o
animal decadente, o espectro da vida vulgar. O homem-massa,
segundo Ortega (1987, p. 14) “um homem feito de pressa,
montado sobre poucas e pobres abstrações e que, por isso, é
idêntico de um extremo ao outro da Europa”. Já “o homem especial
ou excelente está constituído por uma íntima necessidade de
apelar por si mesmo para uma norma além dele, superior a ele, a
cujo serviço se coloca espontaneamente” (1987, p. 94).

De posse desses dois tipos de homem, especial e massa, Ortega


desenvolve sua teoria política. E, nesse contexto tipológico, a
massa, do indivíduo à sua coletividade, responde pela decadência
da humanidade, uma vez que não há esforço, não há
compromisso, não há grandeza e, por isso, no entendimento
orteguiano, a massa é o conjunto que representa a vulgaridade da
cultura, o fim do espírito nobre e, como resultado último, a barbárie
na vida política.

Desse modo, a massa, na sociedade atual, opera com poderes


ilimitados, submete a cultura aos seus desejos toscos, suas
ambições materiais fazem da economia o refrão da vida fácil. Por
isso, a massa, no uso da rebelião, faz sucumbir à vida autentica,
a vida feliz. No entendimento de Ortega (1987, p. 73), “vivemos
num tempo que se sente fabulosamente capaz de realizar, mas
não se sabe o que realizar. Domina todas as coisas, mas não é
dono de si mesmo”.

A assertiva nos adverte como opera o poder das massas, o


sentimento de poder fazer qualquer coisa, mas não saber o que
fazer. Tem-se o domínio de tudo, mas não de si mesmo, pois, a
massa reina, mas sem espirito, sem grandeza, a massa, com seus
poderes ilimitados, não tem direção, apenas, nas palavras de
Ortega (1987), avança, mas avança sem destino.

Entenda melhor essa reflexão de Ortega y Gasset assistindo à


videoaula no material on-line.
Tema 3: Educação e Política

Quando se trata de política, independentemente do tempo


histórico, a Educação se faz, de alguma maneira, presente. Veja
que em A República e em As Leis, Platão, autor das obras, garante
atenção especial para a função da educação. Basta observar que
nos dois primeiros livros de As Leis a discussão se desenvolve em
torno da Educação. E assim se segue com o filósofo Aristóteles e
quase todos os autores da Filosofia Política.

Mas, em que consiste a Educação? Aqui, no sentido de um


estreitamento com a Política, promover formação para a
cidadania, a vida autêntica. Para Kant, autor já trabalhado nesse
espaço de Filosofia Política, a Educação deve auxiliar no sentido
de garantir aos homens do período moderno a passagem da
condição de menoridade para à maioridade. Segundo esse autor,
por meio da educação – base da racionalidade moderna – o
homem pode se emancipar, quer dizer, sair de sua condição
cultural de menoridade e tornar-se um sujeito maior, emancipado.

Em Ortega, leitor de Kant, a educação tem função de auxílio na


construção de uma via política de transformação do homem-
massa em homem especial. Somente, diz Ortega (1987), por meio
da educação, uma educação raciovitalista, o homem pode deixar
de ser massa para tornar-se minoria, homem-especial. Por
educação raciovitalista o autor entende uma educação capaz de
priorizar a vida como razão, razão vital.

Em Theodor Adorno, a educação deve garantir emancipação


política para evitar a barbárie. Educação é vista como condição
para fundar uma sociedade baseada numa formação plural,
política e filosófica, pois somente dessa maneira será possível a
construção de uma sociedade emancipada, livre da consciência
coisificada que, por sua vez, é fruto de uma sociedade de massa,
pautada em uma indústria da cultura que não promove
consciência verdadeira, mas uma semicultura, isto é, a
deformação da consciência do homem contemporâneo.

Quando tratamos de Educação e Política, uma espécie de


temática essencialmente filosófica, quase sempre a discussão é
organizada no sentido de partido, partido político ou de
conscientização política. Todavia, no sentido filosófico, a relação
entre Educação e Política deve ultrapassar os limites do partido
político, pois Educação é, dentre muitas coisas, a formação do
sujeito para a cidadania.

Decerto que autores da Sociologia como Durkheim e Berger, ao


tratarem da Educação fazem relação com a socialização –
educação para socialização – mas devemos considerar que, do
ponto de vista filosófico Educação corresponde, dentre muitas
coisas, a imbricação com a Política.

Desse modo, Adorno (2011) salienta que a função da educação é,


justamente, evitar a barbárie. Mas, em que consiste a barbárie?
Adorno se referia à barbárie nazista, faz uma discussão na qual,
segundo ele (2010), ou se repensa a função política da educação
ou Auschwitz vai se repetir. Nas palavras desse autor (2011, p.
119) “a exigência que Auschwitz não se repita é a primeira de
todas para a Educação”.

A Educação deve evitar a barbárie, ou seja, Educação como


formação política. Nos dias atuais, qual é a função da Educação,
do ponto de vista político? A intolerância religiosa tem crescido de
forma vertiginosa, o uso desenfreado dos recursos naturais tem
sangrado assustadoramente o planeta, a criminalização dos
movimentos sociais, a homofobia, a xenofobia etc. são discursos
que são ventilados na grande imprensa e respingam nas salas de
aula e, como se não bastasse, há uma indiferença para com essas
temáticas, pois a escola “tem outras prioridades”.

É, justamente num contexto bastante parecido que Adorno (2011),


provoca a sociedade do seu tempo, sobretudo a escola de seu
tempo, pois, segundo ele, a escola tem suas prioridades, mas é
preciso repensá-las, uma vez que a exigência capital é,
principalmente, evitar a barbárie.

Nas palavras de Adorno (2011, p. 141):

A seguir, assumindo o risco, gostaria de apresentar a minha


concepção de educação. Evidentemente não assim chamada
modelagem de pessoas a partir do seu exterior; mas também
não a mera transmissão de conhecimentos, cuja característica
de coisa morta já foi mais do que destacada, mas a produção
de uma consciência verdadeira. Isto seria inclusive da maior
importância política; sua ideia, se é permitido dizer assim, é uma
exigência política.

Segundo Adorno, para o combate da barbárie é preciso repensar


o modelo de educação. E não se pode pensar a Educação como
modelagem de pessoas. Aqui se faz sentir uma crítica ao processo
de socialização, ou seja, a compreensão sociológica de que a
Educação deve socializar o indivíduo. Isso é, na perspectiva de
adorno, modelagem de pessoas.

Além disso, a escola não pode se fechar na transmissão de


conhecimentos como uma espécie de depósito de conhecimento,
na pedagogia de Paulo Freire, uma condição de educação
bancária. No entendimento de Adorno, a escola deve promover
consciência crítica, formar para compreensão do mundo e,
consequentemente, sua transformação. Ainda, de acordo com a
assertiva apresentada, deve existir uma exigência política na
escola, o alinhamento com a política, afinal, não se pode conceber
escola sem a concepção de política, emancipação.

Para enriquecer suas reflexões, faça uma leitura do texto de


Durkheim denominado de Educação e Sociedade. Nessa obra, o
autor fala da educação e dos processos de internalização dos
contratos, bem como da autoridade moral do professor. Uma
leitura encantadora!

Também, sugerimos a obra de Paulo Freire, Pedagogia do


Oprimido, na qual o autor desenvolve a discussão de educação
bancária. E por último, o texto que se denomina “Socialização:
como ser um membro da sociedade”. O artigo é de autoria de
Peter Berger e Brigitte Berger e se encontra no livro Sociologia e
Sociedade, organizado por Marialice Mencarini e José de Souza
Martins.

A relação aqui apresentada requer de você uma compreensão


ampla em torno da imbricação que existe entre esses dois
conceitos: Educação e Política. É sabido que o conceito de
Educação, na sociedade atual, tem ligação com o mercado de
trabalho, funciona como instrumento de preparação e de
qualificação para o mercado de trabalho e, nessa perspectiva, não
há como pensar em uma relação dinâmica entre educação e
política e, certamente, esse modelo não evita a barbárie, pelo
contrário, acentua a barbárie na medida em que retira, segundo
Adorno (2011), a formação para consciência verdadeira,
compreensão do mundo como ele é.

Para além disso, a concepção de política encontra-se


estereotipada no que corresponde a partido político. Desse modo,
esperamos que consiga fazer uma leitura diferente dessa relação
entre educação e política, mais especificamente com relação a
Política fora dos limites do partido.

Acompanhe o vídeo no material on-line.

Tema 4: Filosofia, Política e transformação

É bastante conhecida a fala de Karl Marx apresentada na crítica


ao filósofo Feuerbach: “a Filosofia já pensou demais o mundo e
cabe, na sociedade presente, a transformação do mundo”.
Decerto que a citação é, quase sempre, usada fora de contexto,
pois se trata de uma crítica pontual a postura de Feuerbach,
entretanto, cabe usá-la para refletir sobre o papel da Filosofia no
mundo.

Mas, compete perguntar: é papel da filosofia transformar o


mundo? Vejamos que Comte, no Curso de Filosofia Positiva,
observava na filosofia um caráter utilitário, quer dizer, se não fosse
positiva no sentido de resolver os problemas da humanidade, não
havia sentido nesse filosofar.

Decerto que Marcuse (2004), na obra Razão e Revolução, chega


a dizer que a filosofia positiva de Comte ultrapassa os limites de
resolver os problemas da sociedade, deseja, inclusive, fazer a
defesa de uma sociedade conservadora e autoritária. Nas
palavras desse autor (2004, p. 292), “a filosofia positiva de Comte
propõe o arcabouço geral de uma teoria social que serve para
neutralizar aquelas tendências ‘negativas’ do racionalismo”.

Para Marcuse, a filosofia proposta por Comte não visava a


transformação do mundo, mas a conservação de um discurso que
se pautava na ordem e na autoridade. Ainda de acordo com essa
assertiva, essa filosofia, denominada de Sociologia Positivista
deveria eliminar o caráter negativo da Filosofia, o racionalismo. E
esse racionalismo, no entendimento de Comte, fazia-se presente
como elemento que desencadeou o espírito iluminista, ou seja,
provocou as revoluções sociais e políticas.

Desse modo, Marcuse argumenta que essa interpretação


comtiana do mundo era de conservação e, quando não, uma
mudança por dentro, quer dizer, mudar a lógica da transformação,
advinda do iluminismo, em razão de um novo ethos – a filosofia
com caráter de organização, traduzido na ordem e no progresso
da humanidade.

Sabemos que na Filosofia existe um modo de pensar a Política a


partir da qual podemos, em algum grau, esperar que aconteça a
transformação da realidade. Mas não se pode esperar da Filosofia
essa tarefa, a transformação da sociedade. Todavia, é muito
comum a expressão de que o mundo precisa de Filosofia, pois
dela se espera as grandes transformações no mundo. Seria isso
um mito?
Pois bem, na Ditadura Militar Brasileira, os militares, dentre outras
medidas, retiraram as disciplinas de Filosofia e de Sociologia dos
currículos. Era a Filosofia ou o professor de Filosofia que
incomodava os militares?

Não nos aprecemos em responder, pensemos um pouco.


Primeiro, os intelectuais estavam, de certa maneira, imbuídos na
questão política, quer dizer, eram militantes e, quando não,
simpatizantes de esquerda. Segundo, havia um estreitamento
muito grande entre a Filosofia e a Política e isso incomodava os
militares.

Ainda na esteira da questão, pensemos em Platão, filósofo que


dedica o livro VI de A República para tratar da Filosofia (mais
precisamente do filósofo-rei). E Sócrates, nesse mesmo livro,
chega a dizer que, por meio da Filosofia, a cidade florescerá. Nas
palavras de Sócrates (1999, p. 213) “eu vacilei, meu amigo, em
dizer o que digo agora. Mas a decisão está tomada e afirmo que
os melhores magistrados do Estado devem ser os filósofos”.

Observe, meu caro aluno, que existe, na história da humanidade,


um discurso pronto em torno da Filosofia, sobretudo com relação
à função dela frente ao que se denomina de transformação do
mundo. Talvez não seja da Filosofia, mas da Filosofia Política a
função da reflexão em torno dos problemas do mundo sem
qualquer pretensão de transformação do mundo.

Todavia, existem os filósofos que são conhecidos como os


“filósofos engajados”. Nesse grupo, podemos destacar o filósofo
Marx, não só por causa de sua compreensão da Filosofia como
transformação do mundo, mas pela sua militância política, que
fazia da Filosofia uma política de compreensão do mundo e sua
consequente transformação. Marx não era simplesmente um
teórico da Filosofia apesar de, no primeiro momento, desejar
lecioná-la, mas sem êxito, fazendo da filosofia um instrumento de
luta em defesa dos trabalhadores.
Podemos destacar a própria Escola de Frankfurt, onde Marx
buscava uma leitura política e renovada do marxismo e, para além
disso, buscava promover uma filosofia crítica, mais precisamente
uma teoria crítica. Temos o filósofo Ortega, pensador espanhol
que escreve em jornais de seu tempo e busca a democratização
do conteúdo filosófico nas praças de Madrid.

Voltemos à nossa questão: a Filosofia tem o papel de


transformação? Não, a Filosofia deve ser pensada como ciência,
aquela que produz saber, conhecimento que não necessariamente
deva ser utilitário, mas que aproxima o homem dessa dimensão
de amigo do conhecimento. A filosofia não precisa ser útil, ela é
espanto, é admiração. Desse modo, a Filosofia Política pode (e
deve) ofertar reflexões em torno da sociedade e,
consequentemente, da transformação da sociedade.

De posse dessa reflexão, o homem, aqui caracterizado como


filósofo pode fazer uso desse saber para transformar a realidade,
a circunstância, como bem assinalou Ortega (1967) na obra
Meditações de Quixote: “Se o homem não é capaz de transformar
a sua circunstância ele não se transforma, pois circunstância e
homem estão intimamente imbricados”.

Seria interessante que você fizesse a leitura de um texto clássico:


As duas vocações. O texto é de Max Weber, autor importante para
o debate em torno da ciência como vocação, neutralidade e
imparcialidade e Política como vocação, ação e transformação.

Vamos à videoaula? Acompanhe no material on-line.

NA PRÁTICA

Diferencie o conceito de massa e de minoria no texto de Ortega y


Gasset. E, posteriormente, estabeleça relações entre os conceitos
de menoridade e maioridade de Kant com os de homem-massa e
homem-minoria de Ortega y Gasset.
SÍNTESE

Vamos recapitular o conteúdo que discutimos neste encontro?


Assista à videoaula no material on-line.

Referências

ALMEIDA, A. C. S. Os conceitos Políticos em Ortega y Gasset.


2009. 108 f. Dissertação (mestrado em Ciências Sociais) –
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP. 2009.

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2011.

BERGER, P.; BERGER, B. Socialização: como ser um membro


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sociologia. São Paulo/Rio de Janeiro: LTC, 1977.

CHÂTELET, F. História das Ideias Políticas. Jorge Zahar Editor,


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COMTE, A. Curso de Filosofia Positiva. São Paulo: Nova


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DURKHEIM, E. Educação e Sociologia. Rio de Janeiro: Vozes,


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KANT, I. Resposta à pergunta: Que é Esclarecimento? In: Textos


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MARCUSE, H. Razão e Revolução. Hegel e o advento da teoria


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ORTEGA Y GASSET, J. A Rebelião das Massas. São Paulo:


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___________. As Leis. São Paulo: Edições Profissionais Ltda,


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WEBER, M. Ciência e política. Duas Vocações. São Paulo:


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