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Características e contexto
Nasceu o Barroco, pois, num terreno de luta, mas não menos de deslumbramento
diante da paisagem magnífica, sentimento que foi declarado pelos colonizadores desde
início. Florescendo nos longos séculos de construção de um novo e imenso país, e sendo
uma corrente estética e espiritual cuja vida está no contraste, no drama, no excesso,
talvez mesmo por isso pôde espelhar a magnitude continental da empreitada
colonizadora deixando um conjunto de obras-primas igualmente monumental. O
Barroco, então, confunde-se com, ou dá forma a, uma larga porção da identidade e do
passado nacionais; já foi chamado de a alma do Brasil. Significativa parte desta herança
em arte, tradições e arquitetura hoje é Patrimônio da Humanidade.
O Barroco no Brasil foi formado por uma complexa teia de influências européias e
locais, embora em geral coloridas pela interpretação portuguesa do estilo. É preciso
lembrar que o contexto econômico em que o Barroco se desenvolveu na colônia era
completamente diverso daquele que lhe dava origem na Europa. Aqui o ambiente era de
pobreza e escassez, com tudo ainda por fazer. Por isso o Barroco brasileiro já foi
acusado de pobreza e incompetência quando comparado com o europeu, de caráter
erudito, cortesão, sofisticado e sobretudo branco, apesar de todo ouro nas igrejas
nacionais, pois muita coisa é de execução tecnicamente tosca, feita por mão escrava ou
morena. Mas esse rosto impuro, mestiço, é que o torna único e inestimável.
Também é preciso assinalar que o barroco se enraizou no Brasil com certo atraso
em relação à Europa, e este descompasso, que se perpetuou por toda sua trajetória, por
vezes ajudou a mesclar, de forma imprevista, elementos estilísticos que se desenvolviam
localmente com outros externos mais atualizados que estavam em constante importação.
Os religiosos ativos no país, muitos deles literatos, arquitetos, pintores e escultores, e
oriundos de diversos países, contribuíram para esta complexidade trazendo sua variada
formação, que receberam em países como Espanha, Itália e França, além do próprio
Portugal. O contato com o oriente, via Portugal e as companhias navegadoras de
comércio internacional, também deixou sua marca, visível nas chinoiseries que se
encontram ocasionalmente nas decorações e nas estatuetas em marfim.
Na Europa a Igreja Católica foi, ao lado das cortes, a maior mecenas de arte neste
período. Na imensa colônia do Brasil não havia corte, a administração local era confusa
e morosa, assim um vasto espaço permanecia vago para a ação da Igreja e seus
batalhões de intrépidos, capazes e empreendedores missionários, que administravam
além dos ofícios divinos uma série de serviços civis como os registros de nascimento e
óbito, estavam na vanguarda da conquista do interior do território servindo como
pacificadores dos povos indígenas e fundando novas povoações, organizavam boa parte
do espaço urbano no litoral e dominavam o ensino e a assistência social mantendo
muitos colégios e orfanatos, hospitais e asilos. Construindo grandes templos decorados
com luxo, encomendando peças musicais para o culto e dinamizando imensamente o
ambiente cultural como um todo, e é claro ditando as regras na temática e na maneira de
representação dos personagens do Cristianismo, a Igreja centralizou a arte colonial
brasileira, com rara expressão profana notável. No Brasil, então, quase toda arte barroca
é arte religiosa. A profusão de igrejas e escassez de palácios o prova. Costa faz lembrar
ainda que o templo católico não era apenas um lugar de culto, mas era o mais
importante espaço de confraternização do povo, um centro de transmissão de valores
sociais básicos e amiúde o único local seguro na muitas vezes turbulenta vida da
colônia. Gradativamente houve um deslocamento neste equilíbrio em direção a uma
laicização, mas não chegou a se completar no período de vigência do Barroco. As
instituições leigas começaram a ter um peso maior por volta do século XVIII, com a
multiplicação de demandas e instâncias administrativas na colônia que se desenvolvia,
mas não chegaram a constituir um grande mercado para os artistas, não houve tempo. A
administração civil ganhou força com a chegada da corte portuguesa em 1808, que
transformou o perfil institucional do território, mas impediu uma continuidade do
Barroco pelo seu apoio declarado ao Neoclassicismo.
Assim como em outras partes do mundo onde existiu, o barroco foi no Brasil um
estilo movido pela inspiração religiosa, mas ao mesmo tempo de enorme ênfase na
sensorialidade e na riqueza dos materiais e formas, num acordo tácito e ambíguo entre
glória espiritual e êxtase carnal. Este pacto, quando as condições permitiram, criou
algumas obras de arte de enorme complexidade formal, que nos fazem admirar a perícia
do artesão e a inventividade do projetista - amiúde anônimos e de extrato popular. Basta
uma entrada num dos templos principais do Barroco brasileiro, seja em Minas, seja em
Salvador, para os olhos de pronto se perderem num quebra-cabeças de formas e cores,
onde as imagens dos santos são emolduradas por resplendores, cariátides, anjos,
guirlandas, colunas e entalhes em volume tal que não deixam um palmo quadrado de
espaço à vista sem intervenção decorativa, num luxo materialista onde foi gasto muito
ouro. Como disse Germain Bazin, "para o homem deste tempo, tudo é espetáculo".
Esse cenário luxuriante era parte da própria essência da catequese católica durante
o Barroco, largamente influenciada pelos preceitos jesuíticos. A retórica barroca, base
para todo o ensino, tinha um sentido cenográfico e declamatório, e se expressava cheia
de hipérboles e outras figuras de linguagem, num discurso de largo vôo e minuciosa
argumentação, às vezes até excessiva para o gosto moderno. Tal característica se
traduziu plasticamente na extrema complexidade da obra de talha e na agitada e
convoluta movimentação das formas estatuárias e arquiteturais das igrejas barrocas em
todos os países onde o estilo prosperou, pois era uma faceta básica do prolixo espírito da
época expressa visualmente, e que no Brasil se manifestou do mesmo modo, como não
poderia deixar de fazê-lo.
"a religião foi o grande princípio de unidade no Brasil. Ela impôs às diversas
raças aqui misturadas, trazendo cada uma um universo psíquico diferente, um mundo
de representações mentais básico, que facilmente se superpôs ao mundo pagão, no caso
dos índios e dos negros, através da hagiografia, tão adequada para abrir caminho ao
cristianismo aos oriundos do politeísmo".
Arquitetura
O Rococó também deu belos frutos no nordeste, na Matriz de Santo Antônio, com
esplêndida talha nos altares, e no Convento e Igreja de São Francisco em João Pessoa,
considerado por Bazin a mais perfeita dentre as construções franciscanas Rococó do
Nordeste brasileiro, embora seja uma adaptação quase literal do projeto do templo de
Cairu, 50 anos mais antigo. No Rio é notável a Igreja do Carmo.
O caso mineiro
Minas teve a peculiaridade de ser uma área de povoamento mais recente, e pôde-
se construir em estéticas mais atualizadas, no caso, o Rococó, e com mais liberdade,
uma profusão de igrejas novas, sem ter de adaptar ou reformar edificações mais antigas
já estabelecidas e ainda em uso, como era o caso no litoral, o que as torna exemplares
no que diz respeito à unidade estilística. O conjunto rococó das igrejas de Minas tem
uma importância especial tanto por sua riqueza e variedade como por ser testemunho de
uma fase bem específica na história brasileira, quando a região foi a "menina dos olhos"
da Metrópole por suas grandes jazidas de ouro e diamantes. A arquitetura barroca
mineira é interessante por se realizar geralmente em um terreno acidentado, cheio de
morros e vales, dando uma forma atraente à urbanização das cidades. Mas não é isso o
que torna o Barroco mineiro especial, já que a construção civil segue modelos formais
comuns a toda arquitetura colonial brasileira. Entretanto, o caso mineiro tem o atrativo
de constituir o primeiro núcleo no Brasil de uma sociedade eminentemente urbana. De
qualquer forma, suas características estilísticas distintivas são mais claramente
expressas na arquitetura religiosa, nas igrejas que proliferam em grande número em
todas essas cidades. Segundo Telles, a originalidade da edificação sacra mineira está em
dois elementos:
Pintura e escultura
Pintura
Escultura
O Barroco originou uma vasta produção de estatuária sacra, disseminada por todo
o litoral e em algumas regiões do interior do Brasil. Parte integral da prática religiosa, a
estatuária devocional encontrava espaço tanto no templo como no domicílio privado. As
primeiras peças barrocas do país eram de importação portuguesa, e vieram com os
missionários. Ao longo de todo o Barroco a importação de obras continuou, e muitas
das que ainda existem em igrejas e coleções museais são de procedência européia. Mas
a partir do século XVII começaram a se formar escolas conventuais locais de escultura,
compostas principalmente por religiosos franciscanos e beneditinos, mas com alguns
artesãos laicos, que trabalhavam principalmente o barro. Já os jesuítas deram
preferência à madeira. Índios reduzidos também deram sua colaboração como santeiros,
especialmente nas reduções do sul e em algumas do nordeste, e nesses casos muitas
vezes traços étnicos índios são encontrados no rosto das imagens. Criados aqui ou não,
dificilmente haveria uma casa que não possuísse ao menos algum santo de devoção
esculpido, e a estatuária se tornou um bem de largo consumo, quase onipresente, com
exemplares de grande porte até peças miniaturizadas para uso prático em viagens.
Salvador em especial tornou-se um centro exportador de estatuária para os mais
distantes pontos do país, criando uma escola regional de tanta força que não conheceu
solução continuidade senão no século XX. Outra escola nordestina importante foi a de
Pernambuco, com produção de alta qualidade mas ainda pouco estudada. A maioria das
obras que sobrevivem permanece anônima; não costumavam ser assinadas e as análises
de estilo muitas vezes não são suficientes para se determinar com precisão sua origem,
uma vez que a iconografia seguia padrões convencionados que valiam por toda parte e a
circulação de obras pelo país era grande, mas alguns nomes foram preservados pela
tradição oral ou através de recibos de pagamento de obras.
Com a sedimentação da cultura nacional por volta da metade do século XVIII e
com a multiplicação de artífices mais capazes, nota-se um crescente refinamento nas
formas e no acabamento das peças, e aparecem imagens de grande expressividade, ora
quase sempre em madeira. Entretanto, a importação de estatuária diretamente de
Portugal continuou e mesmo cresceu com o enriquecimento da colônia, uma vez que as
classes superiores preferiam exemplares mais bem acabados e de mestres mais eruditos.
Ao mesmo tempo se multiplicaram as escolas regionais, com destaque para as do Rio,
São Paulo, Maranhão, Pará, e Minas, onde a participação do negro e do mulato foi
essencial e onde se desenvolveram traços típicos regionais mais distintos que podiam
incorporar elementos estilísticos arcaizantes ou de várias escolas em sínteses ecléticas.
Aleijadinho representa o coroamento e a derradeira grande manifestação de escultura
barroca brasileira, com obra magistral espalhada na região de Ouro Preto, especialmente
as obras no Santuário do Bom Jesus de Matosinhos, em Congonhas, compondo uma
série de grandes grupos escultóricos nas capelas das estações da Via Crucis e os
célebres Doze Profetas, no adro daquela igreja. Alguns outros autores merecem nota:
Agostinho de Jesus, ativo no Rio e São Paulo, e frei Agostinho da Piedade, de Salvador,
considerados os fundadores da escultura brasileira; José Eduardo Garcia, Francisco das
Chagas, o Cabra, Félix Pereira Guimarães e Manuel Inácio da Costa, ativos em
Salvador; Francisco Xavier de Brito, atuando entre Rio e Minas, Manoel da Silva
Amorim, em Pernambuco, Bernardo da Silva, da escola maranhense, Simão da Cunha e
Mestre Valentim, no Rio de Janeiro. Na escola de Minas, Francisco Vieira Servas, José
Coelho Noronha, Felipe Vieira, Valentim Correa Paes e Bento Sabino da Boa Morte,
entre outros..
Literatura
Poesia
Prosa
Na prosa o grande expoente é o Padre António Vieira, com os seus sermões, dos
quais é notável o Sermão da Primeira Dominga da Quaresma, onde defendia os nativos
da escravidão, comparando-os aos hebreus escravizados no Egito. No mesmo tom é o
Sermão 14 do Rosário, condenando a escravidão dos africanos, comparado-a ao
calvário de Cristo. Outras peças importantes de sua oratória são o Sermão de Santo
António aos Peixes, o Sermão do Mandato, mas talvez a mais célebre seja o Sermão da
sexagésima, de 1655. Nele não apenas defende os índios, mas também e,
principalmente, ataca seus algozes, os dominicanos, por meio de hábil encadeamento de
imagens evocativas. Sua escrita era animada pelo anseio de estabelecer um império
português e católico regido pelo zelo cívico e a justiça, mas sua voz foi interpretada
como uma ameaça à ordem estabelecida, o que lhe trouxe problemas políticos e atraiu
sobre si a suspeita de heresia. Defendendo os cristãos-novos foi perseguido pela
Inquisição, que o teve preso por dois anos, além de ter-lhe cassado o direito à expressão
pública de suas idéias. Banido para o Brasil, encontrou a oposição dos colonos lusos, a
quem desagradava que falasse pelos índios. Seu estilo pode ser sentido neste fragmento:
"O trigo que semeou o pregador evangélico, diz Cristo que é a palavra de
Deus. Os espinhos, as pedras, o caminho e a terra boa em que o trigo caiu, são
os diversos corações dos homens. Os espinhos são os corações embaraçados
com cuidados, com riquezas, com delícias; e nestes afoga-se a palavra de Deus.
As pedras são os corações duros e obstinados; e nestes seca-se a palavra de
Deus, e se nasce, não cria raízes. Os caminhos são os corações inquietos e
perturbados com a passagem e tropel das coisas do Mundo, umas que vão,
outras que vêm, outras que atravessam, e todas passam; e nestes é pisada a
palavra de Deus, porque a desatendem ou a desprezam. Finalmente, a terra boa
são os corações bons ou os homens de bom coração; e nestes prende e frutifica
a palavra divina, com tanta fecundidade e abundância, que se colhe cento por
um: Et fructum fecit centuplum."
Música
Música profana
A primeira partitura vocal profana escrita no Brasil em português que perdurou foi
a Cantata Acadêmica Heroe, egregio, douto peregrino, na verdade apenas um par
recitativo + ária de um compositor anônimo, que em 1759 saudava em música
perfeitamente rococó o dignitário português José Mascarenhas Pacheco Pereira de
Mello e deplorava as dificuldades por que ele passara nesta terra. Sua autoria por vezes
é atribuída a Caetano Melo de Jesus, mestre de capela na Sé de Salvador e autor
também de uma Escola de Canto de Órgão ("canto de órgão" era entendido como canto
polifônico), em quatro volumes, que é o mais antigo e mais importante tratado de teoria
musical escrito em língua portuguesa de sua época, competindo com os de célebres
musicólogos europeus. A Cantata merece a transcrição de um trecho do seu texto por
ser também um bom exemplo da retórica típica da época:
Mídia
Ainda não havia teatros, e o local para tais representações era usualmente ao ar
livre, nas praças diante das igrejas, ou ao longo das procissões, com o auxílio de
cenários móveis instalados em cima de carros alegóricos que acompanhavam o
percurso. A encenação contava com a viva participação popular, num movimento
integrado entre atores e público, e muitas vezes se fazia uso de marionetes ou imagens
sacras de um tipo especial, as estátuas de roca, vestidas como pessoas e articuladas de
modo a poderem se adaptar à ação que se desenrolava, e onde desempenhavam um
papel evocativo fundamental.Era nessas ocasiões em que o barroco revelava toda a sua
força aglutinadora, sua energia extravasante e o poder de seu encantamento:
http://www.notapositiva.com/trab_estudantes/trab_estudantes/historia/historia_tra
b/barroco.htm
Conclusão