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de 13aldung Grien arrebata uma jovem com os afagos mais A segunda categoria de temas corresponde ao que hoje
provocantes. O teatro barroco rnultiplica as cenas de amor entendemos por mórbido. Chamamos mórbido ao gosto
nos cemirêrios c nos túmulos. Encontraremos algumas mais ou menos perverso, mas cuja perversidade não é de-
delas, analisadas em La littératurc de I'âge baroquc, de Jean clarada ou consciente, pelo espetáculo físico da morte e
Rousset". Mas bastará lembrar a mais ilustre e conhecida do sofrimento. Do século XVI ao XVIII, o corpo morto
por todos, o amor e a morte de Romeu e Julieta no tú- e nu tornou-se ao mesmo tempo objeto de curiosidade
mulo dos Capuleto. científica e de deleite mórbido. É difícil separar a ciência
No século XVIII contam-se histórias bastante seme- fria, a arte sublimada (o nu casto) e a morbidez. O cadáver
lhantes de um jovem monge que dormiu com a bela mor- é o terna complacente das lições de anatomia, objeto das
ta que velava e que, algumas vezes, estava apenas em estado pesquisas sobre as cores do início da decomposição, que
de morte aparente. Também essa união macabra arrisca-se não são horríveis ou repugnantes e sim verdes sutis e pre-
a ter sérias conscquências. ciosos para Rubens, Poussin e tantos outros.
Os exemplos que precedem pertencem ao mundo
das coisas então chamadas de "galantes". Mas o erotismo
penetra mesmo na arte religiosa, à revelia dos moralis-
tas rigorosos que eram os contrarreformadores. As duas
santas romanas de Bernini, santa Teresa e santa Ludovica
Albertoni, são representadas no momento em que estão
enlevadas pela união mística com Deus, mas seu êxtase
mortal tem toda a aparência deleitada e cruel da excitação
amorosa. Desde De Brosses, não há mais engano possível
a este respeito, por mais iludíveis que fossem, realmente,
Bernini c seus clientes ponrificais".
É preciso relacionar a esses temas erótico-macabros as
cenas de violência e de tortura que a Reforma de Trento
multiplicou com uma complacência de que os contempo-
râneos não suspeitariam, nus cuja ambiguidade hoje nos
parece flagrante, informados como estamos pela psicolo- British Museum - Londres. A lição de anatomia
gia das profundezas: são Bartolorneu escorchado vivo por do dr. Tulp, 1(,32, Rcmbrandt
carrascos atléticos e nus, santa Ágata e as virgens mártires,
das quais se "dilaceram as tetas pendentes". A literatura Sobre os túmulos onde subsistem os corpos nus, o cadá-
edificante do bom bispo Camus não hesita em colecionar VlT não é o primeiro estado da decomposição: é a imagem
mortes violentas e suplícios apavorantes dos quais - as- ,LI beleza. Os belos nus de Henrique II e de Catarina de
sim espero - procura tirar lições morais. Um dos livros Mcdicis, obra de Germain Pilon, substituíram os cadáveres
deste autor, intitulado Spectacles d'horreur, é uma coletânea ,knJ\l1postos corroídos pelos vermes.
de tenebrosas narrativas". Estes poucos exemplos bastarão As estampas de anatomia não eram reservadas apenas
para caracterizar o erotismo macabro, .1 clientela médica; eram também procuradas pelos
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