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OS ESTÁGIOS DA DEPENDÊNCIA
E INDEPENDÊNCIA RELATIVAS
22 S
OS BSTÁCIOH DA DKPKM JÈXCIA K IN'i)KI’ |-;X'])l:;,\ClA KELATIYAS
pode não estar ao alcance da sua consciência;1 sc for assim, cia não
estará cm condições dc cum prir o papel que lhe com pete rio pro
cesso de desilusão, do qual o desm am e é urn aspecto. Além de poder
odiar a sobrecarga que o bebê representa, é preciso tam bém que cia
esteja em condições de enfrentar a ira ou o ódio do bebê, provocada
pela desadaptação. Dito dc ou tro modo, “ a mãe sã ou normal c capaz
dc suscitar a ambivalência na relação com o ob jeto c de poder utili-
zá-la apropriadam ente” (19S9d, p. 114). Nas palavras de Edna
V ilctc, a mãe deve poder
{ . . . ) r e c o n h e c e r e s u p o r t a r o ó d i o d a c r ia n ç a , b e m c o m o a c e it a r
q u e s e t o r n e p a r a e la a m ã e ru im , d u r a n t e c e r t o te m p o . A c e it a r
s ig n ific a s o b r e v iv e r e o m o a m ã e fo rte , q u e c c a p a z d c c u id a r sem
t e r m a is o s r e c u r s o s d e o n ip o t ê n c ia c o m q u e c i a a t é e n t ã o inves
t id a p e la c r ia n ç a (V ile te , 2 0 0 0 , p. 1 5 8 ).
2.10
OS KH TÁlilO S DA I)K l'K .\l)É .\(;iA E INDKHCXIMÍNCIA UKL\TIV.-VS
[...) :i mãe, por ser aparentemente uma l>oa mãe, tnz pior do que
castrar o lactcntc; este último é deixado com duas alternativas: ou
ficar em permanente estado de regressão, c continuar misturado
com a mãe, ou então encenar uma rejeição completa da mãe,
mesmo uma mãe aparentemente boa ( 1960c, p. 50).
2 .1 1
A Tl-:< IKIA 1)0 AM.\IH'KH(UMICXTO 1)K li. W. W I W K X V I T
2. A transicionalidadc
232
OS lüNTÁCÜO» |)A DELnCXDÊXClA E IX D K fE X D Ê N C iA KKLVI IVAS
:?.U
TK O KIA 1M) A \ U I)l'K K C IM K .V n > l)E 1). W. W IX X IC O T T
2.11
«IS R S T .Ú iliW HA 1)E1'K\1>Í,X<:1A li IX D W K V D IÍX C U KKI A T IV A S
235
A T1CUKIA [ ) ( I A.MA1H K K U M K X T t I lili I) W . W1NNK ,(I| T
2M>
o s i ;s t á <;io s h a iik p k x d ê n c ia k l m ie p e x u k x c l v k e i .a t iv a s
6 C o m » vim os, n o C a p ítu la III, esse espaço j á existe, po ten c ialm e n te, a partir
tio Isola m en to fu n dam ental do indivíduo. Gi',, ainda, o C a p ítu lo II, Seçík) 8.
7 D eve-se d e stac ar aqui que, neste m o m en to , ainda n ã o sc p o d e usar a
ex p re ssão “o b je to in te rn o ". Ü b e b ê ain da n ã o tem u m “in t e r io r" o n de
g u a rd a r im afiens, um te rritó rio o n d e sc trava a luta en tre o q u e é co n stru
tivo e d e stru tivo na n atureza hum ana. Kssa luta. eom seu s o bjeto s in te m o s,
só p o d erá scr travada ap ó s o b e b ê a tin g ir o estatu to u n itário d o E U S O U e
c o m e ç a r a sentir-se co n c ern id o p o r seu s im p u lso s destrutivos. C f. W in n i
co tt, 19S6d, p. 105.
237
A TK O KIA 1 )0 A M .M lC R K C IM liX Tl) DK I). W. W IN X IU )'JT
23H
OS EHT.V 1I< )S ]i\ IV,;i>|^xnKXC[A K IXDKnOÍUÍÍXtXV KKLVTIVAS
O fr a c a s s o d e s t e [d o o b je t o e x t e r n o | , cm a lg u m a lu n ç ã o es s e n c ia l,
leva in d ir e t a m e n t e à m o r t e o u a u m a q u a lid a d e p e rs e o u t ó r ia do
o b je t o in te rn o . A p ó s a p e rs is t ê n c ia da in a d e q u a ç ã o ilo o b je t o
e x t e rn o , 0 o b je t o in t e r n o d e ix a d e ter s e n t id o p a ra □ bcbO e , e n t ã o
— e s o m e n t e e n t ã o — . o o b je t o t ra n s ic io n a l t a m b é m fic a sein
s e n t id o (1 9 5 3 c , p . 2 4 ).
239
A T E O R IA 1 )0 A M A n r iíE C IM IC .V IO IMí I). W . W I.Y X K : ( Y\'f
sido revisado para n edição dc 1971, e ele não tenha feito alterações
nesse ponto, entendo que “ objeto in tern o’’ , aí, refere-se a ''ob jeto
subjetivo". Os argum entos são os seguintes; prim eiro, da perspec
tiva da teoria do am adurecim ento, só se pode falar de ob jeto interno
se estiverm os nos referindo a um m oi.iento do am adurecim ento em
que já há um mundo ou realidade interna, e essa conquista só ocorre
após o alcance da identidade unitária no estágio do 10U SOU, sendo
que a transicionalidadc c anterior a este últim o. Km 1963 (19 6 5 j),
referindo-se às mais primitivas versões daquilo que Klein denominou
de “ interno” , W inn icott diz que, quando estamos nos referindo ao
início da vida,
|...] a palavra interno nfio pode ser usada no sentido dc Klein, uma
vez que o laetente ainda não estabeleceu propriamente os limites do
ego e ainda não se tornou mestre tios mecanismos mentais de
projeção e introjeção. NesAe estágio primitivo, “ interno'' só significa
pessoal, e pessoal pelo fato de o indivíduo scr uma pessoa com um
si-mesmo no processo dc ser desenvolvido (]9o5j, j>p. 168-69).
210
O S ESTÁtaoS DA 1)EI’ KN'1)KXC]A K IXDKIMCtf ÜÈNCIA R IX A T IV A S
2 11
A T K O lilA IK I AM Ai)l'|:.KC IM !;.\T() 1)K l í VV VVSWK :<>IT
[ . . . [ p a r t e d o e g o q u e não é c o r p o r a l, q u e não e s tá fu n d a d a no
p a d r ã o d e /'wiirionavidito c o r p o ra l, m a s n as Lw/K-nânciati c o r p o
2 Id
A T1ÍOK1A I X ) A M A l)U U «:lN n O N T<) DK l>. W. WfNNHJOTT
objetos podem com eçar a scr percebidos c usados com o externos. Para
tanto, 6 preciso que a mãe tenha sido capaz, desde o início, de apre
sentar o mundo ao bebe de forma compreensível e em pequenas doses,
de tal m odo que este teve a oportunidade, pela identificação primária,
de .ser o objeto (subjetivo). Depois, já no período de desadaptação, a
realidade “ mista” dos objetos transicionais — parte do bebê c parte do
mundo — leva o lactente a possuir o objeto. Durante a fase transi-
cional, ele continua a viver num mundo subjetivo, mas a onipotência
que caracteriza a ilusão básica 6 abalada e alguns pequenos aspectos
de realidade externa se imiscuem na experiência. A partir dc um certo
momento, esses dois sentidos de realidade já não bastam e a tendência
ao amadurecimento empurra o bebê na direção de um outro sentido
de realidade: o da realidade externa c compartilhada, em que ele
poderá usar os objetos vistos, agora, da perspectiva da objetividade.
Mesmo durante os estágios primitivos, vivendo num mundo total
m ente subjetivo, o bebê está sendo provido de experiências de con
tatos com objetos que, chegando a ele ao m odo tle objetos subjetivos,
são pequenas amostras da realidade externa (do ponto de vista do
observador). As experiências repetidas eom esses objetos, além de
passarem a fazer parte do bebê, pela identificação primária, vão,
gradualmente, tornando o objeto significativo, apesar dc ele ainda não
saber da existência separada deste.1- Isto aparecerá, eom toda a
clareza, por ocasião da eleição o do apego pelo objeto transiçional. Até
chegar a este ponto, estamos ainda no campo do que se chama
“ relação de objeto” , embora, nesta fase, a expressão seja imprecisa,
dado que, com os objetos subjetivos, não há propriamente relação por
ainda não haver dois entes. Daqui cm diante, o bebê poderá, se tudo
correr bem, passar da rdaçua para o uso do abjeto. Para que isto
ocorra, será necessário haver uma mudança, para o bebê, na “ natureza
do ob jeto” , isto é, uma mudança no sentido de realidade desse objeto,
o que implica a criação de um outro mundo que não o subjetivo ou o
espaço potencial. Segundo Winnicott, essa mudança constitui uma
das mais difíceis e importantes conquistas do amadurecimento, além
dc. quando falha, ser “ um dos mais cansativos de todos os primitivos
fracassos que nos chcgam para posterior reparo” (1969i, p. 175).
211
o s iú s t á u io s d a i>i-:rKM)í;.N<:iA k ixi iki-ic x u ü w ;ia k e m t i v a s
1.1 Q u an d o .se refere aos estágio s iniciais, W in n ico tt usa, m uitas vezes, o term o
“ p r o je ç ã o ’' p a r a d e sign ar a cria ç ã o , pe lo b e b e , d o o b je to ou d o m u n do. N u m
texto de 1960, p o r ex em plo , ele diz q u e o b e b ê só p o d e re c e b e r o q u e vem do
m u n d o ex te rn o se essas coisas estiverem in clu íd as “ na o n ip o tê n c ia do
laeten te e sen tid a s e o m o p ro je ç õ e s ” . N este p onto, ac resce a segu in te nota
de rodapé: “E stou u sa n d o aqui o term o ‘p r o je ç õ e s ’ em u m sen tido descritivo
e d in âm ico e não no seu sen tid o m ela p x ie o ló g ie o e o m p le to " (1 9 6 0 c , p. 46,
nota 12).
■\ T K O llIA l « ) A M A |il'K K C IM K X T() DK 1». \V W IX X IC O IT
2lfi
OS l!iSTÁ(!I< >S l>.\ lll-:i'K\l)ÉX<;l.\ IÍ1XIJE1‘ KX1>KXCL\ KKI.ATIVAS
— 17
A TK O K IA 1)0 A M A IH 'K K ( IlMK.VTl) DE 1). W. W IN N IC O TT
Note-se que 6 som ente a partir desse m om ento que tem início a
fantasia para o indivíduo,19 na m edida em que aqui se dá a separação
entre fato (a sobrevivência do ob jeto) e fantasia (a destruição do
objeto na fantasia inconsciente). Após esta aquisição do aniadurcci-
m ento, o ob jeto subjetivo estará sem pre sendo destruído na fantasia
inconsciente.
Esta conquista — que inclui a criação do sentido da realidade
externa e o alcance das capacidades para usar o ob jeto c para a
fantasia inconsciente — , é tão im portante para o am adurecim ento,
’ IS
OS ESTÁl ;iu s L>A l)K i’ ENI)KXCL\ E [N]>ICI>EN1)Ê\C1A K K IA T IY A S
c cão difícil de scr eoneeitualm ente descrita, que vale a pena, antes
dc prosseguir, examinar algumas diferenças e acréscim os que foram
sendo feitos à teoria, à m edida que o pensam ento de W innicott
evoluiu. Mesmo antes de 1968, quando ele chega à form ularão mais
acabada sobre esse tipo de agressividade — com o destrutividade
que leva à criação da externalidade e à capacidade de usar objetos
— , W inn icott já dizia que a agressividade humana “ está sem pre
ligada ao estabelecim ento de uma distinção entre o que é eu e o que
e não-eu” (1964d, p. 98). Nesse texto dc 1964, ele ainda relacionava
a agressividade ao impulso instintuai prim itivo, e não fazia refe
rência ao valor da sobrevivência do objeto. A agressividade é exer
cida pela criança, dizia ele, na form a de uma destruição m ágica, da
mesma natureza, portanto, embora no sentido contrário, da criação
mágica. Por essa m ágica infantil, o mundo pode ser aniquilado num
abrir e fechar de olhos, e recriado por m eio de um novo olhar. A des
truição prim itiva ou mágien de todos os objetos é necessária para
que o ob jeto deixe de ser parte do “ eu” para ser “ não-eu", ''deixe de
ser fen ôm en o subjetivo para passar a ser objetivamente percebido”
(1964d, p. 102; grifos meus). Dando-se tem po ao processo matura-
cional, a criança "tornar-se-á capaz de ser destrutiva c dc odiar,
agredir e gritar, ao invés de apenas aniquilar m agicam ente o mun
d o” ( ületn ). Nesta formulação, o início da conquista acontece com a
criança operando uma destruição mágica — não efetiva, portanto —
que, com o tem po, e pelo desenvolvim ento da capacidade de aceitar
que o ódio e o am or convivem , na natureza humana, transforma-se
na possibilidade real de agressão. Desta maneira, afirm a o autor, “a
agressão concreta ó uma realização positiva. Em com paração com a
destruição mágica, as idéias e os com portam ento agressivos adqui
rem valor positivo e o ód io eonverte-se num sinal de civilização"
(id e m ).
O que é novo, na form ulação de 1968, c que essa conquista se
inicia com um im/niíso real para destruir. Ou seja, o bebê, que é
ainda ineom padeeido, já está dotado dc uma nova potência muscu
lar e de m aior coordenação m otora, e precisa, para prosseguir no
am adurecim ento, expulsar os objetos subjetivos para fora do âm bito
da onipotência. lJara tanto, ele morde efetivam ente a mãe, atira com
força os objetos e já está capaz dc tratar eom brutalidade o oh jeio
transiçional. Tudo isto, ao que a mãe deve poder sobreviver, vem
acom panhado da idéia, ainda sem culpa, de ter destruído o objeiu.
2'1‘J
A T K O K IA lX )A M M )l'H t :C I M K N T < l !)!■: 1). W W IN X K X H T
250
< IS I v S T Á C I U S D.\ D IC r iiX D IC X C lA K IX U IÍI> IÍX IlK N < :i,\ K K L U I V . V Í
251
A T K O K IA I X ) A M A M K K U M E N T O D E 1). W . W I N X J U I T T
22 Cf. .Jung. 1903. C f., tíim bém , a resen h a deste livro, po r W in n ieo tt ( IW t lli).
252
o s rcsTÁr.ioí; d a d i í i *h x i >í ;.\<:i a r in d i íp k n d k x c i a k i -:i .a t i v a s
J u n g p a ss o u to d a a v id a b u s c a n d o um lu g a r p a r a g u a r d a r s u a re a li
d a d e p s íq u ic a in te rn a , p o r m a is q u e e s t a fo sse, e m v e rd a d e , u m a
t a re fa im p o ssív e l. A o s q u a t r o a n o s a d o t o u a c o m p le x a te o r ia d o
s u b t e r r â n e o d o s o n h o [ . . . ] . B a ix o u ;io s u b t e r r â n e o e e n c o n t r o u ri
v id a s u b je tiv a . A o m e s m o t e m p o , t o r n o u -s e u m a p e ss o a r e t r a íd a , o
q u e o tez p e n sar, e r r o n e a m e n t e , tra ta r-se d e u m a d e p r e s s ã o c lín ic a
(19641i. p. 369).
23 Cf. W in n ieo tt. J964h, p. 3 7 0. P ara estas afirm ações, W in n ieo tt baseo u -se
tanilicm no livro do Fordliam .sobre a o b ra dc Ju n g. Cf. M. Fordham . 1962,
(•oiifcrüiicift n" 11*).
25.1
A TKOIUA IM) A M M H !KK C I.M £M t> 1)K l>. W . W lX X IC t >'JT
25b
O S K S T A O IO S l).\ ÍJK PKXD H .V C IA K IN líliP K N H É N C IA UKJ.ATIVAS
257
A T E O K IA IK ) A\L\1H'KK< :IM K X T () DK l> W . W IN N IC t VIT
5. O estágio do coneernimento27
25S
OS K S T Á lílO S i)A IW E X D È X O tA E IX líK PU X D ÍiX » IA Ulil.ATl\ AS
2 S *>
. V m m i A DO A M A I J U í » IIMKNTO I >K l l . W W IX X ItlO T T
Q ji a n d o c a d a b e b ê c o m e ç a íi c o le t a r u m a vasta e x p e r iê n c ia tle
c o n t in u a r s e iu lo , à s u a d o c e m a n e ira , e a s e n t ir q u e e x is te m u
s i-m e s m o — u m s i-m e s m o q u e p o tlen í s e r in d e p e n d e n t e d a m ã e —
é e n c ã o q u e o s m e d o s c o m e ç a m a d o m in a r a c e n a . lísse s m e d o s s ã o
d e n a t u r e z a p rim itiv a c b a s e ia m -s e na e x p e c ta tiv a d a c r ia n ç a d e
c r u é is r e ta lia ç õ e s . A c r ia n ç a fic a e x c ita d a , c o m im p u ls o s ;i£rcs-
sivo s o u d e s t r u tiv o s q u e se m a n ife s t a m p o r m e io d e g r i t o s e
d e s e jo s tle m o rd e r, e, im e d ia t a m e n t e , o m u n d o p a r e c e r e p le t o d e
260
o s E S T Á t m s n.\ 1)K I * k x d k x c : l \ k im ík i* i:\ i> i;. x c i a íu -:i,.v rn .v s
b o c a s m o rd e n t e s , g a r r a s e d e n t e s h o s tis e to d a a s o r t e de a m e a ç a s .
A s s im , o m u n d o in fa n til s e r ia n m lu g a r a t e r r a d o r se n ã o fo sse o
papel p ro te to r da m ãe q ue, de um m o d o g e r a l, c n c o h r e e sse s
m e d o s e n o r m e s q u e p e r t e n c e m à e x p e r iê n c ia in icia l d a vida du
b e b ê . A m ã e (e n ã o e s t o u e s q u e c e n d o o p a i) a lte r a a q u a lid a d e do s
m e d o s dn c ria n ç a p e q u e n a p o r s e r u m s e r h u m a n o . G r a d u a lm e n t e ,
e la é re c o n h e c id a , p e la c r ia n ç a , c o n to u m s c r h u m a n o . A s s im , ao
invés d c u m m u n d o de r e t a lia ç õ e s m á g ic a s , a c r ia n ç a a d q u ir e u m a
m ã e q u e c o m p r e e n d e e q u e r e a g e a o s im p u ls o s da c r ia n ç a . M a s a
m ã e p o d e s c r fe rid a e fic a r z a n g a d a . Q u a n d o d i g o as c o isa s d e ste
m o d o , v o c ê s p o d e m p e r c e b e r im e d ia t a m e n t e q u e faz u m a e n o r m e
d ife r e n ç a , p a ra a c ria n ç a , se as fo rç a s r e t a lia t ó r ú is fo r e m h u m a n i
z a d a s (1 9 9 .1 c, p. 1 2 2 ).
J í.l
A TK O KIA IX ) A M A W ItK C IM K N T O l)K I! W. W IX X lU íT T
2 02
os kstâcios üa 1)i;i'í;ndk\(;ia iíindki-kndkncia ukl\tiva.s
JO.Í
A TK l )R IA IX > A.\LM )C K lil’.IMIÍN'T(> 1)K |). W. WINMK :i >TT
261
OK ESTÁtSKXS D A 1)K I'K M )K ,NCIA K I\1)K1*EN1)IÍNC]A RFJ-VTIVAS
.10 N ã o c a b e , nos lim ites deste estu do, d e te r-m e no co n c eito w in n ic ottian o de
'‘ id en tificação c ru z a d a ", q u e é a red e sc riç ão w in n ic ottian a tios m ecan ism os
dc p ro je ç ã o c im ro jc ç ã o . T ra ta -s e ,grosso modn, da ca p a c id a d e de pôr-se no
lu g a r d o o u tro , "du pen etrar, p o r m eio da im ag in aç ão , e ain da assim de
m o d o preciso, uns p e n sam en tos, nos sen tim en tos e nas esperan ças de o u tra
pessoa, e tam b é m d e p e rm itir q u e o u tra pessoa faça o m esm o c o n s ig o ”
(iOM Ol, p. 9 1 ). líssa ca p a c id a d e , q u e é um sinal du saú de, p e rte n ce a um
e s tá g io bastan te ad ia n tad o d o am a d u re c im e n to , m as sua b ase é e s ta b e le
cid a na exp eriên cia o rig in á ria d e alg u é m ter se id en tificad o co m suas neces
sidades, in com u n icáveis a nível verbal.
31 A a b o r d a g e m w in n ic ottian a so b re a co n q u ista da ca p ac id ad e p ara o c o n e e r
n im en to baseia-sc, em g ra n d e parte, na teoria klein iana da po siç ão d e p re s
siva, co n siderada, peto au to r, a g ra n d e c o n trib u iç ão de M. Klein para o
pe n sa m e n to psican alítico. A lg u m a s d iferenças, n o en tan to , devem ser a p o n
tadas. W in n ico tt não p o d e c o n c o rd a r, p o r exem plo , eo m a c o n c ep ç ão de
agressiv idad e que está envolvida n o fen ô m en o, n em eom a p re c o c id a d e eom
que, s e g u n d o W. K lein, estas co n q u istas o co rre ria m ; tam po u co eo m as
p ré-e o n d içõ es ou eo m o q u e g e r a a " d e p r e s s ã o ”: e le não p o d e ver o K dípo no
a ta q u e q u e o b e b ê faz ao seio m atern o. A lé m disto, p a ra ele, a expressão
“ po siç ão d e p ressiv a” não é in teiram e n te ad e q u a d a u m a vez que, ap esar de
Klein ter descrito o fe n ô m en o co m o u m a co n q u ista d o am a d u re c im e n to
norm al, a sua d e sign aç ão leva a p e n sar q u e os b e b ê s no rm ais en tram , ao
a tin g ir esse estágio, num estad o clín ico d e depressão.
205
A T líO K lA IX ) A M A D U R K C IM K N T O )» K I) W . W IX N IC O T T
2(,(,
OS KXTÂCIOS l)A l)EJ'liNDÈX<:i.\ li I.\DKI'KNDf;.\Cl.\ R K U V flV A S
207
A T K O K IA 1K) A M A D U K IiC IM K X T O DK l>. W . VVINXKXXIT
A criança com eça, agora, « contar com o pai para fazer a sua
parte, que consiste em p roteger a mãe dos ataques da própria
criança nos m om entos do im pulso excitado, li aqui que o ele m en to
intransigente e indestrutível do pai ajuda a criança a liberar-se para
a vida instintual e suas conseqüências. A presença de um pai forte,
interventor, que forn ece esse tipo de segurança, torna as idéias e
ações instintuais mais seguras, perm itindo à criança co rrer o risco
dc m ovim entar-se, agir e se excitar, já que o pai está por perto,
preparado para rem endar os estragos 011 para im pedir, com sua
força, que eles aconteçam (1989vt, p. 184). O pai torna-se o apoio
necessário para a busca de satisfação instintual sem m uito perigo.
Sc esse tipo dc auxílio não puder scr fornecido, devido à ausência
do pai, ou a uma depressão da mãe, a criança se tornará inibida e
perderá a capacidade para o am or excitado. Terá ele adotar, prceo-
eem en te, um autocontrole dos im pulsos antes de estar em co n d i
ções de fazê-lo sobre a base de uma força paterna que seria, g ra
dualm ente, incorporada eo m o sua. X estes casos, o c o rre inibição
da espontaneidade c do impulso, alem de um perm anente tem or de
que algum aspecto da destrutividade fuja ao con trole. ( ) resultado
pode scr uma depressão ou uma das form as da tendência a n ti
social.
Alem disto, sem essa experiência de contar eom o pai para por
lim ites no impulso instintual, a criança fica incapacitada para, um
pouco mais tarde, no estágio edípico, rivalizar com o pai, fazendo a
experiência de um confronto que c altam ente necessário para o seu
am adurecim ento. A necessidade da criança, específica para esta
etapa, é de contar com a disponibilidade c sobrevivência da mãe e
com a firm eza do pai. Isto fica sobretudo claro no estudo da
tendência anti-social, quando se nota que há dois tipos dc privação
(<deprivution ):
traição. O que nos chama a atenção nestes casos, diz o autor, " é a
necessidade aguda que a criança tem de uni pai rigoroso, severo,
que proteja a mãe quando esta c encontrada. (.) pai rigoroso, que a
criança evoca, pode ser também am oroso, mas deve ser, antes de
tudo, severo e fo rte ” (1946b, p. 1 2 2 ).v>
Durante todo o está gio do eon cern im cn to, enquanto a criança
está tentando lidar com a agressividade contida na vida instintiva,
a instintualidade está sendo integrada ju n tam en te com um cres
cente sentido das partes do corpo, forta lecen d o a personalização e
a espacialização. li aproxim adam ente neste m om ento que surge um
aspecto marcante do desenvolvim ento sexual. As excitações estão
ficando cada vez mais localizadas. Tanto a ereção fálioa quanto a
excitação do clitóris com eçam a ter im portância própria. Ate então
estas excitações podiam ocorrer, mas não tinham o caráter sexual e
dc gênero que agora adquirem; estavam. antes, associadas com a
excitação da alim entação ou da idéia da alim entação e, um pouco
depois, com as atividades excretórias. Nessas fases pre-genitais.
com o já foi assinalado anteriorm ente, em bora houvesse, no bebê,
todo o tipo dc excitação, inclusive as de caráter genital, ainda não
havia am adurecim ento suficiente para a elaboração imaginativa da
função genital.
Em algum m om ento durante a elaboração do estágio do conccr-
nim ento, provavelm ente por volta dos dois anos a criança inicia o
que W inn ieott nom eia fase cxibicionista ou dc ostentação, a mesma
que Freud denom inou dc fase fálica. Este é o m om ento, em term os
do processo de am adurecim ento — e do desenvolvim ento da iden ti
dade dc gênero e da sexualidade com o aspectos tlesse processo — .
cm que a distinção entre meninos e meninas com eça a ter sign ifi
cado. O traço central da fase cxibicionista, ou fáliea, relaeiona-sc
com a qualidade que o órgão masculino tem de ser óbvio, ao
contrário da qualidade do órgão fem inino de ser escondido. O ge-
nital masculino c, portanto, central e vistoso, com suas ereções c
sensibilizações periódicas, enquanto o genital fem inino “ é um fenô
m eno negativo” . A existência dessa etapa “ marca o divisor de águas
en tre o bebê do sexo masculino daquele do sexo fem inino” (198N,
co n sid era çã o d ia g n o stica e 110 tra ta m e n to tios vários; tipos de tendém -ia
anti-social.
A TEOK1A IK ) A M A lH 'R K C [ilE N T () 1)K I >. VV W IN N K iO IT
270
a s lís T u ü a s i u i >klh-:x i )K \(: ia r i .v i u íp k x d k .v c i a i í k i a t i v a s
27 1
A TE O R IA 1)0 A M A ltC k fô IIM líN TO 1>K R W. W IX N It » )'IT
6. O estágio cdípico
-12 N o ie -se q u e p ara referir-se às iileiuifieaçftes c|uo ms crian ças fazem uoin o
p ro u c iiito r cio m esm o sexo, W iim ie o ti usa o le rm o "liiuiiuSNexiiar’.
2 7 .Í
A T K O K lA t «> A M A lH 'U K t:iM lí»\T t) DU l>. W. W IX X IQ jT T
A c r ia n ç a m io s o m e n t e p o d e v er a m ã e tle m o d o m a is o b je t iv o , a
p a r t ir tle o n d e o p a i e s tá , m a s t a m b é m d e se n v o lv e u m a r e la ç ã o d e
.27!
O S IÍSTÁCDOS DA lilílM vXDKXlIIA K INDKPIvNDÜXCIA RKLVnV.VS
tip o a m o r o s o c o m o pa i q u e t t m ilr e ó d io e t e m o r e m r e la ç ã o à
m ãe . li p e r ig o s o v o lta r à m ã e a p a r t ir d e s s a p o s iç ã o . N o e n t a n t o ,
hou ve a lg o q u e se c o n s t r u iu g r a d u a lm e n t e . e a c r ia n ç a volta à m ãe :
n e sta r e o r ie n t a ç ã o fa m ilia r, e la vê o pai d e m o d o o b je t iv o e s e u s
s e n t im e n t o s c o n tê m ó d io e m e d o (ib id ., p. 1 0 9 ).
| [ a s e s sã o tod a foi u m a co n fu sã o e n e n h u m a d e m in h a s in t e r p r e
taç õ e s s e n i u p ara nada. O p a c ie n te estava e x a sp e ra d o . O q u e , fin al
m en te, tez lh e a lg u m b e m foi a m in h a in t e r p r e ta ç ã o d e q u e , e m b o ra
a a n á lis e p r o s s e g u is s e em to rn o d o r e la c io n a m e n t o e o m s u a esposa,
aq u i e a g o r a , n ão im p o rta o q u e tivesse s id o em o u tro s te m p o s. e!e
estava e la b o r a n d o a s u a e x a s p e r a ç ã o e m re la ç ã o à sua m ã e e sua
a b s o lu t a d e se sp e ra n ç a e m tra ta r e o m ela 1 ...]. Kle s e n tiu q u e eu
r e a lm e n t e havia t o c a d o na s it u a ç ã o , q u a n d o lhe d is s e q u e s e u r e la
c io n a m e n t o e m sua e a sa e r a tão s e m e lh a n t e ao re la c io n a m e n to
e o m sua m ã e p o r n ã o e x is tir h o m e m e, p o rta n to , ele n ã o p o d ia vir a
m im p o r q u e não a d ia n ta , não existe hom em a (fitem vã: Pura ele,
estava fo ra de questão que houvesse um pai sobre cujos joelhos se
piulesse sentar petm olhar a mãe ( 1‘X S 'A p, p. M G ).
270
OS HNTAOiOS U.\ l)K l‘ lvX l)K X i:lA K IM lK IM ÍN ilK N O lA KELATIV.Vi
Cada vez mais tem os de nos haver com o fato dc que os lares se
desfazem com m aior facilidade do que ao tem po em que W inn ieott
formulava sua teoria. Apesar disto, a teoria do am adurecim ento
pessoal continua a ser essencial para os pais que, em bora desfaçam
sua vida conjugal, querem preservar íi estabilidade e o desenvolvi
m ento em ocional de seus filhos. Não é líquido e e e rto que os filhos
sofram mais pela separação concreta, geográfica, dos pais, do que
quando estes pernumeeem sob o m esmo teto, sem uma relação
afetiva ou uma com unicação real. C om o os pais têm todo o direito
de buscar o que sentem ser m elhor para si mesmos, c im portante, de
qualquer modo, que cada um continue a fazer a sua parte no que se
refere ao seu papel ju n to à criança. Talvez seja preeiso fornecer uma
presença ainda m aior e não d e s c o r a r dos cuidados e da orientação
que os filhos necessitam. li igualm ente vital que estes recebam
alguma explicação, acessível à sua maturidade, sobre o que aecm-
TKOltLS IX ! .\,\i,\l)l RKCIM KNTO Ulv 1). 'V W IX N IC O T T
teceu, e que os pais, uüo im porta o grau dc decepção ou tle raivei que
guardem , não se ponham a denegrir a im agem parental do outro.
A vida sexual da criança chega agora à primazia da genitalidade,
Quando esta c alcançada, a fantasia já está enriquecida eom os atos
típicos, masculino e fem inino, de penetrar c ser penetrada ou de
fecundar e ser fecundada (1 C
)S8, p. 59). O fato im portante continua
a ser a ereção com o parte dc um relacionam ento, mas. agora, esta
vem associada à idéia de provocar mudanças irreversíveis no corpo
da pessoa amada.'11 A criança está capaz de experiências sexuais
genicais, eom todas as fantasias e excitações que n acompanham, e
isto configura uma nova potência, em bora a im aturidade física a
obrigue a adiar até a puberdade a capacidade de proceder ao ato
gcnital que leva potencialm ente à proeriação. Quando, bem mais
tarde, a puberdade advier, trazendo um outro patamar dc potência,
as experiências e fantasias infantis que tiverem sido realizadas nesta
fase serão de grande ajuda para essa nova condição.
Qualquer estudo acerca da instintualidade — que exige ação,
isto é, um fazer — , sobretudo no que diz respeito à fase gcnital. é
mais adequado para a descrição do masculino do que do fem in in o.15
Do lado masculino, é possível fazer uma distinção acurada entre a
fantasia da experiência fálica e a da experiência gen iial, tanto no
m enino quanto no menino-dentro-da-menina. linquauto. na fase
fálica, o desem penho do m enino está tle acordo com a sua fantasia,
na fase gcnital o desempenho mostra-se deficiente em relação à
fantasia; esta defasagem põe em questão a potência do m enino c
isto terá, eom o verem os, um significado na situação edípiea, tal
com o W innicott a redesereve. Além disto, diferentem ente da mcui-
;?7,s
OS KSTÁ C iO S 1).\ U KPK XliK XC IA lí IVI>|\l*KXl>KXt:'A KIí I.VUV AS
na, o m enino está “ com p leto” na fase fálica. enquanto, na lase geui-
tal, ele depende du fêm eu pura se completar.
Mesmo não sendo tão evidente quanto a masculina, a genitali-
dade fem inina não pode ser definida apenas em term os negativos: a
m ulher não é uni macho castrado. A inveja do pênis, viveneiada na
fase fálica. não necessariam ente se estabelece com o determ inante
da sexualidade feminina, a não ser que já haja um com ponente
masculino cindido, na menina, deslanchado anteriorm ente. Quan
do, mima m ulher adulta, esse elem ento masculino puro cin d id o1'1foi
potencializado por uma experiência penosa de inveja do pênis, na
fase exibieionista, estabelece-se uma organização defensiva que
pode ser arregim entada e posta a serviço do aspecto id eológico de
uma luta social, com o o m ovim ento feminista. Um exem plo signifi
cativo desta situação encontra-se numa carta da psicanalista c
lingüista búlgara Júlia Kristcva à ensaísta francesa Catherinc Ulé-
m ent.47 líserita num m om ento em que internava seu filho para uma
intervenção cirúrgica num hospital dc Paris, Júlia cscrcve a Oathe-
rinc dizendo que uma frase popular não lhe saía do espírito: “ Nada c
mais sagrado para uma m ulher do que a vida dc seu filho.” Após
com entar que essa frase constitui uma dessas evidências banais da
sabedoria popular, que sc im põem desde sempre, e que poderiam
prestar-se ao escárnio do tipo "qu e pena que as mulheres só saibam
ater-se às crianças” , cia cscrcve:
279
A TI-.< )!«.■', 1)1) AMAIJl UK( MMK.Ytt ) I íl-1 ! >. \Y \VI.\NI« X H T
2 NO
OS ESTÂU IO S 1)A I )i:i‘ liN l)KN C L\ E KKl.ATIVA.S
2 .S I
A T E O lílA I X ) A M A U rK K Í .IMKXIXJ l)lí D \V W JNNiCO IT
282
OS líSrAlJIOS l>.A I)K1'KN1i Í:\CI.\ !•; !\I)K1'E.\I>K\CIA |IKI_VIIVAN
283
correção do “ d e fe ito ’' não sc dá, com o cm Kreud, len do um lillio du
pai, niíis pelo reconheci metiLo da dependência do outro. W iunicod
dcscrcvc a seqüência pela qual, cm condições normais, a inveja tio
pênis c superada. Para defrontar-se cuni a superioridade do menino,
a menina imagina que vai lhe crescer um pênis. Depois, pensa que já
teve um, que lhe foi tinido eom o castigo pela excitação. Xa seqüên
cia, vem a idéia de que, já que não n tem, pode então usar um pênis
por procuração, ou seja, algum macho pode agir por ela. Ela diria:
"V ou deixar o macho me usar," Deste modo, o defeito será corrigido,
mas ela terá de reconhecer que tlepemlc do macho parit estar
completa, lí desta forma, diz W innicott, que a menina descobre o
seu “ genital verdadeiro" {1988, p. 63).
Note-se que, enquanto o "gen ital verdadeiro” rem ete à fêmea —
à noiva de véu e grinalda, do trio de m ulheres — , na linha estrita da
elaboração que pertence à fase fálica do desenvolvim ento sexual, a
verdadeira fem inilidade, incluída a genitalidade, pertence à linha do
am adurecim ento pessoal e, necessariamente, reúne a mulher-teinea
com a mãe potencial, por via da identificação da m enina com a mãe
e a linhagem de mulheres. Isto significa que, em bora o macho-den-
tro-da-fêmea esteja sem pre presente, e a inveja d o pênis seja um fato
num dado m om ento do desenvolvim ento da sexualidade, esse tipo
de resolução não dá conta da verdadeira sexualidade fem inina e. se a
identidade sexual da m ulher for consLruída sobre a problem ática da
inveja do pênis, o cam inho será precário.
A constituição da identidade sexual e as diferenças sexuais são
elaboradas, por W innicott. dentro de uma teoria da sexualidade que
pertence à teoria da instintualidade, que faz parte, por sua vez, do
processo dc amadurecimento. Numa etapa mais tardia de seu pensa
m ento, mais precisam ente em 1966, e impulsionado pelo trabalho
clínico, o autor foi levado a perceber uma outra faceta da bissexuali-
dade e a form ular os conceitos dc “ elem en to fem inino puro” e
“ elem en to masculino puro” , ambos presentes cm meninos e m eni
nas, homens e mulheres.4*' Entendo que o term o “ puros” visa exata-
47 Esta nova form ulação já foi explicitada no Capítulo III deste estudo por ser
:i m ais acabada. tam bém no que diü respeito íi questãu em pauta naijuele
momento, a constituição da identidade enquanto tal; aqui, ela vem a
propósito tle esclarecer melhor a questão da bissexualidítde, ein termos
não sexuais.
284
m onte significar tjnt-, e m b o r a estejam rclei i d o s .1 hi.s.s<-xualid.idc
presente nu indivíduo h u m a n o <j interfiram, em cada caso, 11:i eonst 1
tuição da identidade sexual, os elem entos masculino e Ic m iiiin o
puros uno são, cies m e s m o s , dc caráter instinlLUil ou sexual, n e m s a o
relativos ao ^cnero b io lóg ico do indivíduo. Além disto, p o r sua natu
reza, eles não são alvo dc repressão, podendo ocorrer, ao in vés d is to ,
dc eles estarem cindidos da personalidade total,
lisses elem entos constituem um novo m odo dc form ular as duas
m odalidades do relacionam ento objetai: a relação com objetos sub
jetivos (elem en to fem inino puro) e a relayão com objetos objetiva
m ente percebidos (elem en to masculino puro). ( ) “ elem ento fem i
nino puro” diz respeito a ser, í'i experiência dc identidade primária,
em que um é o mesmo que outro (o bebê é o ob jeto), experiência que
se dá no âm bito da ilusão dc onipotência, com objetos subjetivos. N’o
am adurecim ento normal, 0 elem ento fem inino puro é o que preside
a relação de meninas e meninos com a mãe. ( ) “ elem ento masculino
puro", que só chega posteriorm ente, 110 am adurecim ento, diz res
p e ito a ftezer, está baseado no impulso instintual e pressupõe já o
estabelecim ento dc um eu, com o identidade integrada, separado do
não-eu e do mundo, eom o realidade externa. Se tudo corre bem. o
ja z e r só surge no m om ento cru que a instintualidade está sendo in te
grada eom o parte da pessoalidade. Em suma. enquam o o elem ento
fem inino é, o elem ento masculino/as. O fazer, diz W innicott, deve
vir depois e sobre o ser,
lí apenas cm term os do elem ento masculino puro que fax senti
do a distinção entre ativo c passivo, ou seja, entre um relaciona
m ento ativo (fazer algo com o o b jeto ), ou um passivo deixar-se com
ele relacionar (deixar tjiie lhe façam ), com cada uma dessas atitudes
sendo respaldada polo impulso instintual. Deve-se, contudo, salien
tar que, em bora baseado 110 instinto — que o-\ige ação — , o fazer, do
elem en to masculino puro, não c instintual cm si mesmo.
Essa nova abordagem foi, segundo o próprio autor, dc grande enri
quecim ento para a sua compreensão tanto da bissexualidade quanto
da constituição da identidade, incluída aí a identidade sexual, pois
levou-o a explicitar um dilema essencial dos seres humanos, que já
deve scr operante em data inuito inicial, a saber, “ o conflito entre st.ro
objeto, que também tem a propriedade de ser, c, por contraste, uma
confmittitção com o objeto, que envolve uma atividade e um relaciona
m ento objetai respaldados pelo instinto ou impulso” (1 972c, p. 149).
285
A T B O lilA IK ) AMAIH'RICt:i.\l£XTO Dli l) W. W LVNICOTT
50 1’ara poderm os nos referir aos casos clínicos cie Winnieott sem ter de a eadn
vez descrevê-los, vou usar uma sigla pela qual se possa reconhecê-los, Kste
easo será batizado de KM, por ser o exemplo elínieo ilustrativo do lexlo
sobre elementos feminino e nuisuuliiio puros.
2,Ní>
OS K-S rÁ C IO S DA [»K I*liNl)jí.\Cli\ E IN'l)KI’ lí\'l))i.\(.:L\ UlvI-ATIVAS
28 7
A T1ÍOKIA I K ) AAIADrRKCLM U NTO 1)K 1). W WIXXU :c m '
(sabendo ser h om em ): sou uma garota. Não sou louco assim. Mas você
o disse e talou para ambas as partes do m im ” (ülcm ).
Num caso com o este, é preciso que o analista seja capaz de
acompanhar, tolerar e m esmo de propiciar, ao paciente, a expe-
riêneia cabal da identificação deliranie. “ Poder-se-ia d izer” , afirma
W innieott, “ que o paciente estava em busca do tipo certo dc aruilistu
louco e, a fim de atender às suas necessidades, tive dc assumir esse
papel” (ibiil., p. 148). Com respeito a esta nova com preensão, ele
assinala que não havia, ah,
2 SN
o s K S T .u iio íi i>.\ ni:rK .\i)i:.\ci.\ k í n i h í i , k n 1)ií .nc i a u k i .a t i v a s
2N<>
A TK< JRIA I X > A ilA D C K K t XU KN Tl 1 1)K 11. W. W lX X IC t H T
52 Este paciente c.stcvc cm tratamento por dois períodos, dos quais Winnicott
fez relatos dc sessões c algumas anotações clínicas Do primeiro período de
análise, temos apenas a introdução às suas anotações clínicas, inseridas por
Khan na Introdução ao livro llotdiwj c mtcrjtretuçâo (19 86a). Do segundo
período, existem dois grupos de anotações: o primeiro data de l'J54 (l*JS5e)
c é composto tle anotações que sc referem a seis episódios du análise: o se
gundo c o que compõe o livro Holding e mferpnetiiçtm, que abrange seis
meses tio segundo período da análise. Referindo-se ao prim eiro período dc
análise, Winnicott diz que o rapaz, na época “ um caso tle esquizoitlia". o
procurara dizendo que “não conseguia falar livremente e manter conversas
informais, não tinha imaginação ou capacidade para jogos, e que não conse
guia fazer um gesto espontâneo, nem ficar excitado" { 1980a, p. 22).
200
OS K S TÁ iilO K DA |)K I'K M jK.\i :1.\ B 1M)KI>KM)ICM;1A KBI.ATiV.VS
portanto, não tem ód io nem m edo cio hom em , c está de volta à sua
ariti^a posição: ser frustrado pela mãe 011 desenvolver uma inibição
interna" (1986a, p. 9 2 ). Numa outrn ocasião, referindo-se a uni
sonho, o paciente diz: "Resum indo, meu problem a é com o encon
trar uma luta que nunca houve. X o sonho, a luta era o que estava
faltando.” W innieott responde: “V oeê não conseguiu o alívio que a
situação triangular traz quando a criança está em confronto com o
pai; o alívio de não ter tle lutar sozinho com a m ãe” (?'/>/</.. p. IS 5 ).
Além das dificuldades advindas da impossibilidade do pai para
exercer a sua parte, esse rapaz não havia podido desenvolver, na fase
fálica, a necessária relação homossexual com o pai e identificar-se com
este. Num m om ento da análise, em que ficou claro que suas escolhas
afetivas e sexuais eram sempre orientadas na direção da “ moça com
pênis do seu sonho adolescente” , o paciente disse: "Devo estar procu
rando um homem, o que pode ser um tipo de homossexualidade, c
implicaria que eu sou um tipo afcmimido de hom em ." Winnieott
responde: “ Não, não creio. 0 fato é que voeê está procurando pelo seu
pai, o homem que proíbe a relação sexual com a sua mãe. Lembre-se
do sonho no qual a sua namorada apareceu pela primeira vez. Era
sobre um homem, um homem que estava doente.” Diz o paciente:
“ Isso explicaria a falta de sofrim ento o pesar quando meu pai morreu.
Ele não me viu com o rival, e por isso deixou-me com a terrível incum
bência de fazer eu mesmo as proibições.” t) analista responde: “ Sim,
por um lado ele nunca lhe c/eu a honra f/e reconhecer a sua nuitiiri-
(Uule, proibindo as relações sexuais com sua mãe. mas ele também o
privou da alegria e do prazer da rivalidade, assim com o da amisatle que
surge da rivalidade entre homens, lí-ntão, você teve de doseim >l\er uma
inibição geral. Voeê não poderia sentir dor por um pai que você nunca
‘m atou’ ” (ibid., p. 87: gritos meus).
A tensão instintual, característica desse período, atinge o auge em
algum m om ento entre os três e os cinco ou seis anos, quando, então, é
resolvida ou arquivada, também cm conseqüência do fenômeno endo-
erlnológico de suspensão da tensão instintual na fase dc latcneia.
Durante esse período, quando saudável, a criança faz todo o tipo de
experiência nas brincadeiras, sonhos e fantasias, ext raindo proveito da
identificação com os pais e outros adultos. As experiências pré-ge-
nitais c genitais imaturas, que estão ao seu alcance, incluem o corpo c
os prazeres corporais que não dependem da ajuda de outras pessoas.
Sc há suporte familiar e confiável, se alguém permanece presente,
291
A TK O KIA !)(> A ÍIA I)I.K I; í :IM K N T() de |). w .w ix x ic o t t
7. A puberdade e a adolcsecneia
J ‘ >2
O S K S TÁ üli >S 1).\ l>Kri-,\[)í.N ( .l.\ K IM>KI'KNI)KN< :l.\ ISKI..VI l\AS
!
A T K O R IA IH> A M .U H K K C IM ivN TU ])E 1). W. W IN M C O I T
8. A idade adulta
294
Oh ESTAI HOS DA Di;i’K.\DKN<:iA li IN1)ICI,I'-X1)I:,.V(;]A )Utl„\TIV.V>
295
A TKIJRIA 11<) A M A l)fR W 3 \ IK M X > 1HÍ li. W. W IX X IC O T T
2 9 í,
<JS KSTAC.IUS l).\ 1>BI'I:XJ)KX( !IA Ji IMJKIMíNDÈXCIA I4KI ATIV.VS
9. A volta à origem
[...| eom exceção cio pró prio início, não haverá jam ais um a repro
dução exata dessa solidão fundam ental c inerente. A pesar disto,
pclíi vida afora do indivíduo, continua a haver um a solidão funda
m ental, in eren te e inalterável, ao lado da qual continua existindo a
inconsciência so b re as condições indispensáveis a este estado de
solidão (1 9 8 8 , p. 154).
yn
i\ TEORIA IX I A M A W K B ta .U K M X ) 1)K l>. W. W IX N IU W T
298
O S KSTÃl 1IOS l>A I)K I'B N l»É N tX \ E L V n iiP E X n K » :IA KKIATIV.VS
299
A TK O K IA 1 )0 A M A lH TiK C IM K N TO Dl. D. \Y W IX M C u T T
300
US KST.ÚaoS DA DliriiNDÉXUlA K l.\lil-;i'i:\l)í-,M :1A l«KI..\Tl\.VS
.101
A T K O K IA IX ) AM At)t'l!li<Ü M KXTC > ÜK 1). W. WINNH :<)T T
.1 0 2
OS KSTÁCIOH 1),\ l)K I'K N I)K X t:i.\ K IN D IiH iX D K X l ILA RKLVTIVA.S
30.1
A T liO K lA lK ).\M ,M H K K (:r.\Ilí.\T()l)K I) \V W IN N IC U T I
alguma coisa que lhe seja externa, uma voz que ainda iiílo tom o
sentido da externalidíide. Fxatam ente por não ter exam inado as
questões que regem as etapas iniciais do am adurecim ento, a teoria
freudiana desconsidera duas im portantes raízes da agressividade: a
destrutividade que é inerente ao impulso instintuai prim itivo — já
em 1939, W inn icott dizia que o bebê m orde quando está excitado e
não quando está frustrado (1957d, p. 92) — c a reação às invasões
ambientais que interrom pem a continuidade dc ser.
Para Kreud, os mecanismos mentais de projeção c introjeção
estão ativos- desde o início e são eles que m ovem o psiquismo. Para
W innicott, as bases da saúde psíquica não repousam sobre m eca
nismos mentais, nem as tarefas iniciais e as suas soluções são refe
ridas à mente ou a processos mentais. Ilá muitas conquistas a serem
feitas antes que estes entrem em ação. Ao contrário, se os processos
mentais forem levados a funcionar prooocem ente, antes que alguma
integração psicossom ática se estabeleça e antes que algum “ saber7’
— dc caráter oxporiencial e não m ental — se constitua, isto terá
caráter defensivo patológico e levará ao estabelecim ento de um
distúrbio de tipo esquizofrênico.
Além disto, os mecanismos mentais são concebidos, pela teoria
tradicional, segundo uni m odelo corp óreo de incorporação c excre
ção. A concepção winnieottiana da criatividade prim ária exclui a
idéia de um psiquismo humano construído na base dc projeção dc
objetos previam ente introjetados, ou seja, digeridos, reproeessados
e expelidos. l'n i elem ento teórico im portante no fundam ento desta
diferença consiste em que, para Freud e, de form a exacerbada, para
Melauie Klein, o juízo de atribuição (bom e mau) precede o dc exis
tência. Por isso, a constituição do Lust-Ich, o eu-prazer originário,
pode ser pensada em term os dc projeção do que é mau (desprazo-
roso) e introjeção do que é bom (prazeroso), o que significa também
que já haveria um dentro e um fora antes de haver um indivíduo. Em
W innicott, a existência, o sentido (subjetivo) de real, necessaria
m ente antecede qualquer ju ízo do atribuição, o qual supõe a per
cepção da existência do objeto. Além disto, no início, o “ bom " e o
“ mau” estão articulados exatam ente com a existência, ou não, dc
algo real, no sentido subjetivo, líoa é a experiência que é real.
mesmo quando for frustrante; má é a experiência falsa, em que algu
parece acon tecer mas não acontece.
.1 0 1
OS IÚSTAGIUS DA t)!Cl,K.\!)K.\ClA K IMJIilMí-VDKNCIA U IÍL V IIV A S
AOS
A T K D lílA IHJ AM AD UK IÍC IM K NTO l)li I) W. W IX X IC O T T
3 (J f .
OS RHT.VÍIUS |).\ D líre.N U K X C lA li IX D B W ÍX D f^ C IA KELATIYA.S
íiO Tentando, por vários meios, dialogar eom os kleinianos. Winnicott escreve
numa carta, dc 1956. a .loan Kivière: "M eu problema, quando co m eço a falar
eom Mclanic a respeito tle sua formulação sobre a primeira infância, c que
me sinto eomo se estivesse falando de eores com um daltônico. li Ia simples
mente diz que não se esqueceu da mãe e da parte que eompece à mãe,
embora, na verdade, eu ache que ela não dá indíeio algum de ter com preen
dido a parte que a mãe desempenha bem no início” (19.S7b, p. f»-l). Nesta
mesma carta, comentando sobre o ensaiu “ Um estudo da inveja e da
gratidão”, apresentado por Klein à Sociedade Britânica dc Psicanálise
(cf. Klein, I9.S4). ele discrimina três diferentes temas contidos no ensaio, e
diz que, no que sc refere " ] ...| à tentativa [ tle Klein] dc formular a psico
logia da infância mais inicial ela prestou um grande desserviço a si
mesma ao fazer uma formulação que é liem fácil de ser completamente
destruída (a inveja inata) e que pode facilmente deter o estudo do desenvol
vimento da estabilidade do e£o e as pesquisas que estão correndo cm várias
partes do mundo sobre o tratamento da psicose” (ibUi.. p. 6>,T).
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