Você está na página 1de 12

ESTRATÉGIAS MISSIONÁRIAS

UNIDADE 2

1. Situando os fatos: As missões em contexto de


modernidade
Na unidade anterior enfatizamos alguns aspectos da missão, a saber, os bíblicoteológicos
e sócio-antropológicos. Naquela introdução, discutimos os olhares da igreja com relação
à sua atuação missionária, que pode ser em algum momento ora reducionista e limitada,
ora expansionista e que perde de vista a ação discipuladora e de serviço no contexto da
comunidade local.

Quanto aos aspectos bíblico-teológicos e socio-antropológico, compreendeu-se que a


missão tem um acento divino e humano. Da parte de Deus, temos a iniciativa de tornar
Seu nome e Sua glória conhecidos em toda a humanidade. Do lado humano, no Antigo
Testamento o povo da Aliança (Israel) representou um projeto missional redentivo que
viria a culminar na manifestação do Messias, Jesus de Nazaré. Este, em sua trajetória de
vida dedicou-se à obra de Deus servindo e fazendo o bem por toda a parte. Seu
compromisso com o reinado de Deus o fez ser fiel à sua missão, até a entrega na cruz.

Das ações, palavras e ensinamentos de Jesus, após sua ressurreição, brotam a comunidade
que, ancorada em fidelidade ao seu chamamento responde ao serviço missionário, indo a
todas as etnias fazendo discípulos. Assim verificamos que a missão da igreja está
associada à cooperação com o que Deus faz no mundo e em fidelidade e obediência ao
seu mestre, Jesus.

Nesta unidade daremos um passo mais adiante na construção dos pilares que nortearão
nossa compreensão das estratégias na missão para a atualidade. Desse modo,
articularemos em nossa reflexão o surgimento das missões na modernidade, das quais
somos todos como que um desdobramento daquelas incursões adotadas pelas plataformas
missionárias e dos missionários que a elas se vinculavam.

Discutiremos em um primeiro momento a Reforma como um movimento e seus


desdobramentos na vida comunitária, cultural e religiosa. Após tal discussão,
adentraremos mais especificamente nas missões modernas em suas origens e os
pressupostos de seus precursores quanto a estratégia das missões em parceria e
cooperação.

2. A Reforma, os reformadores o surgimento das missões


protestantes
As missões protestantes surgiram e se desenvolveram no contexto da modernidade em
sua esteira de transformações sociais, culturais, religiosas e políticas. Tais transformações
geraram alterações nos modos de conhecer, descrever e analisar o mundo que, até então,
fora constituído sob os auspícios religiosos. Sobre a modernidade, há elementos diversos
que a situam e a descrevem em seu projeto. No entanto, sua configuração pode ser
percebida a partir de algumas características, como destaca Pereira (2006):

Constata-se, dessa forma, que a modernidade surgiu como um paradigma


ambicioso e revolucionário científico, filosófico e sociocultural. Ao mesmo
tempo em que contrapunha e rompe definitivamente com os ideais e valores da
medievalidade, também trazia novos referenciais para se pensar, sentir, agir e
conhecer, em que o foco era o antropocentrismo e não mais o teocentrismo.
Assim sendo, pode-se dizer que o projeto da modernidade foi um projeto
ambicioso e revolucionário, uma vez que ele instituiu modos de vida,
extremamente, diferentes do modelo anterior. (PEREIRA, 2006, p.18)

A descrição acima permite compreender que, certa cosmovisão que orientava os modos
de vida das pessoas advinda do período medieval, nessa nova conjuntura, é encarada de
maneira crítica. Tal aspecto causou na sociedade, na cultura e na própria religião
alterações significativas, com impactos na autocompreensão individual e coletiva neste
contexto. O pensamento medieval possuía uma matriz, a saber,

O homem, por sua vez, era compreendido como passivo e sujeito dos desígnios
de Deus, sendo este a base de sua vida, de seu agir e de suas possibilidades.
[...] Em outras palavras, a produção do conhecimento era para afirmar e
legitimar as proposições que a igreja acreditava, cria e pregava e não para gerar
dúvidas e questionamentos e novos conhecimentos. (PEREIRA, 2006, p.18)

As proposições que balizavam o conhecimento de então estavam ancoradas no método


escolástico, no qual se via a autoridade e o conhecimento da igreja e da tradição como
meios de se acessar a realidade. Em outras palavras, o conhecimento estava circunscrito
à ordem da essencialização. Ou seja, a ordem vigente, por ancorar-se na que é divina,
possuía aspecto imutável ou passível de ser alterada, transformada.

Essa compreensão mudaria na medida em que o Humanismo e o Renascimento,


movimentos de cunho naturalista e antropológico, viriam a atravessar o caminho
histórico, político e social da Europa. Com o teocentrismo sendo substituído pelo
antropocentrismo, recebem acento e destaque nesta nova conjuntura o homem, a razão, a
ciência e o método científico.

A partir de alguns fundamentos erigidos, a modernidade vai gestando seu projeto, no qual
a sociedade desdobra-se em uma verdadeira efervescência social, política e cultural. Sobre
esse dado Pereira destaca que:

A modernidade, então, é um movimento que abarca e envolve a filosofia, como


as artes, a epistemologia, a economia e a política e tudo isso, por um lado,
envolve uma ruptura com a tradição e, por outro, a novidade e a mudança
concernente à produção do conhecimento. Nesse processo de ruptura, novidade
e mudança encontram-se alguns caracteres da modernidade em que o foco é o
progresso, o desenvolvimento material e econômico contínuos e a
possibilidade de um conhecimento que tenha como pressuposto o uso da razão
e do método científico. (PEREIRA, 2006, p.19)
No bojo das transformações modernas apresentadas acima se percebe um conjunto de
reflexões simultâneas que vão perpassar também os aspectos religiosos. A Reforma e seus
reformadores estão intrinsecamente relacionados a estes fenômenos sócio-culturais na
medida em que seguem os vultos da nova ordem ora instituinte.

É válido recordar, em viés religioso, que Lutero está num contexto no qual a Igreja na
Europa vai perdendo o poder de estruturar a vida social e política naquela atual
conjuntura. E, em todos esses dados, vêem-se alterações e críticas desde dentro das suas
estruturas, bem como de fora, pelos próprios desdobramentos das ideias humanistas e
renascentistas. Assim, a Reforma terá lugar, somando-se às diversas alterações e
transformações no âmbito geral da sociedade daquele contexto.

Mas o que foi mesmo a Reforma? A resposta simples poderia ser esta: a
Reforma foi a humanização do homem, isto é, a Reforma fez o homem descer
dos pedestais celestes, porque era visto e educado como se não pertencesse a
este mundo, e se pôr no mundo como parte dele e por ele responsável. Assim,
a Reforma é uma das expressões do humanismo que começou no século XIV.
A verticalidade cedeu lugar à horizontalidade que significou liberdade e
responsabilidade do indivíduo perante si mesmo, o mundo e o próximo. Em
suma, mas não resumindo, a Reforma colocou o homem individualmente
perante Deus com suas culpas e necessidades.
(MENDONÇA, 2007, p.162)

Percebe-se na assertiva acima que as mudanças paradigmáticas ocorridas na sociedade


em geral, ao alcançar a religião, terão seu acento específico, com a construção de teologias
a depender da interpretação dada por cada um dos reformadores. Estes foram
desenvolvendo suas construções teológicas contextualizadas, guardadas as devidas
especificidades de cada um em sua proposição da fé.

Direcionando o olhar para este contexto de Reforma e, pensando de maneira específica


em como as missões, nos moldes do que conhecemos hoje, era algo ainda latente, indaga-
se o porquê de tal fato? Descrevendo os desdobramentos da Reforma no contexto Europeu
e os desafios encontrados pelos reformadores, o historiador das missões Stephen Neill
aponta que:

No mundo protestante, durante o período da Reforma, houve pouco tempo para


pensar em missões. Até 1648 os Protestantes lutavam pela conservação das
próprias vidas [...]. Naturalmente os reformistas tinham conhecimento do
mundo não-cristão que os rodeava. Lutero diz muitas coisas, por vezes
surpreendentemente amáveis, acerca dos Judeus e dos Turcos. É evidente que
a idéia do progresso firme da pregação do Evangelho através do mundo não é
alheia a este pensamento. Contudo, depois de indicar todas as razões
explicativas e de citar todos os escritos possíveis dos Reformistas, tudo isso
representa bastante pouco. (NEILL, 1989, 225).

A descrição de Neill permite compreender que a Reforma, em sua fase inicial tinha foco
em firmar certas bases teológicas e formais diante dos desafios político-religiosos daquele
contexto. Nesse sentido, as missões protestantes, enquanto missões transculturais com
criação de plataformas no envio de obreiros é algo que se deu posteriormente.

Pense nisso: Embora não se percebia de maneira evidente textos escritos e ações
missionárias por parte de Calvino, verifica-se em suas cartas referências a pedidos de
envio de obreiros para atuarem como pastores vindos de outros locais na cidade. Ainda
podem ser lidos textos nos quais compreende a pregação do Evangelho a outros povos,
quando utilizou de vários meios para essa ação (BARRO, 1998).

Por outro lado, se pensarmos a missão nos moldes do que percebemos na discussão
introdutória de nosso curso, veremos que os reformadores, cada um em sua
particularidade teológica, vão gestando uma maneira de fazer missão que abranja a
comunidade local bem como para além daquelas comunidades.

É o caso de Lutero (ALMEIDA, 2011), com a sua visão acerca da música, dos processos
de educação e da formação humana, de sua compreensão acerca da economia, etc. Pode
ser percebida, também, em Calvino (TOLEDO e VIEIRA, 2006) a reforma moral por
meio do Culto e das celebrações em Genebra, com a qual possibilitou mudanças
importantes nas comunidades e na sociedade de então como um todo.

Embora não se percebera de maneira específica textos escritos e ações missionárias por
parte de Calvino, verifica-se sua preocupação em atender pedidos de envios de obreiros
feitos por parte de outros países. A criação da Academia de Genebra, que recebia
estudantes de vários lugares tinha essa preocupação de formar lideranças que se
destacassem no campo da cultura e com convicções bíblicas. Ainda foi marcante sob a
direção de Calvino o uso de jornal impresso, entre outros (BARRO, 1998).
Sob esta compreensão acerca dos reformadores, é valido ressaltar que para Lutero a
missão tinha como ponto de partida o próprio Deus Trino, que agindo no mundo trabalha
para a culminação do seu reino. Como comentado por Neill (1989):

Para Lutero, a missão é sempre de forma preeminente obra do Deus triúno –


missio Dei - e seu alvo e resultado são a vinda do reino de Deus. Lutero vê a
Igreja, juntamente com a palavra de Deus e todo crente batizado, como
instrumentos divinos cruciais para a missão. Entretanto, em nenhum lugar o
reformador faz da Igreja o ponto de partida ou o alvo da missão, como a
missiologia do século XIX tendia a fazer. É sempre a missão do próprio Deus
que domina o pensamento de Lutero, e a vinda do reino de Deus representa sua
culminação final. (NEILL, 1989, p. 225ss)

Esse dado é importante para se compreender a perspectiva do reformador quanto às


missões transculturais. Mas, como verificado anteriormente, a sua ação enquanto pensada
sob uma base teológica que amplia os horizontes da fé na sociedade de seu tempo, pode
apontar, mesmo que forma latente, um viés missional em sua teologia.

Conceito-chave: Constata-se, desse modo, que a reforma e seus reformadores, nos


pressupostos que defendiam e nos quais fundamentaram suas convicções de fé foram, nos
seus moldes, missionários, no sentido de pensar a fé em movimento e sua realização
histórica no mundo. É valido ressaltar que para Lutero a missão tinha como ponto de
partida o próprio Deus Trino, que agindo no mundo trabalha para a culminação do seu
reino.

A partir dessa leitura que toma como base a ação dos reformadores Lutero e Calvino,
pode-se inferir que o espírito missionário alcançaria amplitude e abrangência por meio
das missões modernas. Mas antes disto, a semente de ambos, veio a influenciar igrejas
em todo o mundo, propondo transformação a pessoas e sociedades por meio do Evangelho
de Cristo.

Embora Lutero e Calvino, em termos práticos, desenvolvessem a sua trajetória teológica


com influência no todo da sociedade, a compreensão de ambos acerca da expansão
missionária era percebida em certa vinculação da missão com a esfera do Estado. Dessa
maneira, ao pensarem em termos de expansão da fé, tinham como pressuposto a parceria
com o Estado, visto entender ser inviável a presença protestante onde o Estado não
estivesse em parceria concreta com as igrejas. Defendiam, com base nesta visão, um olhar
paroquial da missão, ou seja, a atuação de cada grupo, circunscrita a certo domínio
geográfico específico.

Diferentemente desses reformadores, os anabatistas, por constituírem como um grupo que


advogava a separação entre a igreja e o Estado, em sua proposição teológica destacou-se
maior abertura e interesse quanto à evangelização de todos os povos. Para estes, o campo
da missão incluía tanto a Europa cristã quanto os povos pagãos.

Essa perspectiva tinha uma razão de ser: trata-se da compreensão tida pelos anabatistas
de que a igreja, ao longo de sua história após o Novo Testamento havia se corrompido e
que o caminho para se retornar às origens cristãs era justamente negar o sistema religioso
atual com suas estruturas e voltar ao Novo Testamento. Assim, enquanto Calvino e Lutero
não subscreviam a Grande Comissão de Mateus, os Anabatistas a aceitavam como sendo
responsabilidade cristã para atualidade.

Pense nisso:

Diferentemente desses reformadores, os anabatistas, por constituírem como um grupo que


advogava a separação entre a igreja e o Estado, em sua proposição teológica destacou-se
maior abertura e interesse quanto à evangelização de todos os povos. Para estes, o campo
da missão incluía tanto a Europa cristã quanto os povos pagãos.

A discussão em torno dessa questão rendeu grandes disputas teológicas, mas, de tudo isso
podemos verificar que duas perspectivas brotam da Reforma, uma que explicitamente
propõe expandir a fé a outros povos e outra que, vê a missão como marca intrageográfica
e ação específica de Deus no mundo.

Constata-se, desse modo, que a reforma, nos pressupostos que fundamentaram as diversas
convicções de fé ensaiou em sua gênese, o que em séculos posteriores veio a se
concretizar nas missões protestantes.

Por esta razão que para se entender os desdobramentos da Reforma em épocas posteriores
e sua relação com a expansão do protestantismo tornam-se importantes elencar alguns
elementos-chave no movimento e que culminaram no surgimento das missões modernas.
Um dos aspectos que favoreceram o surgimento das missões modernas está relacionado
com o movimento pietista. Como aponta Bosch (2009, p.309) “no pietismo, a fé
formalmente correta, fria e cerebral da ortodoxia deu lugar a uma união cálida e devota
com Cristo. Conceitos como arrependimento, conversão, renascimento e santificação
receberam significados novos”.

Neste movimento que surgiu deste dentro do luteranismo alemão, a perspectiva da fé


estava mais relacionada com a experiência vívida conjugada com a escolha pessoal acerca
das decisões de fé, o que se diferenciava das conversões em grupo ou coletivas do
luteranismo pós-lutero. Este luteranismo, também, se pautava na racionalidade da fé a
qual estava balisada pela reta doutrina e não pela experiência pessoal e subjetiva.

Foi a partir do pietismo que a igreja morávia em sua paixão pelo Cristo Redentor, vai
gestando em suas ações o que veio a se tornar em missões transculturais. Sobre os
moravianos Sanches (2008, p.55) aponta que:

Dentro da Reforma pietista destacou-se a igreja moraviana no século XVIII.


Eram grupos protestantes peregrinos, procedentes da região da Morávia, e que
foram acolhidos na fazenda do conde Nicolaus Von Zinzendorf [...]. O
moravianismo marcou a atividade missionária protestante com uma forte
dedicação à evangelização dos povos. Ele acrescentou ao modelo pietista da
ênfase na experiência de fé, o desprendimento sacrificioso na tarefa
missionária transcultural e atuaram como dedicados evangelistas e
missionários em outras culturas.

As missões protestantes modernas estão imbuídas desse sentimento que conjugava paixão
por Jesus e, ao mesmo tempo, desejo de torná-lo conhecido a outros povos. É sobre esta
linha conjuntural que vai se gestando o movimento missionário moderno. Como apontado
por Bosch (2009, p.337), as forças de renovação dentro do protestantismo são percebidas
de modo enfático a partir dos Avivamentos ocorridos nos EUA e na Inglaterra. Estes
avivamentos também conhecidos com “Despertares” foram o motor da atividade
missionária que viria a se expandir por além-mar e transculturalmente.

Em termos de ação missionária concreta por meio de plataforma de envio, destaca-se a


figura de William Carey e sua viagem a Índia. Carey foi o primeiro missionário enviado
pela “Particular Baptist Society for Propagating the Gospel Among the Heathen”
[Sociedade Batista Particular para a Propagação do Evangelho entre os Gentios] (BOSCH,
2009, p.341).

Carey é considerado o articulador das missões transculturais e, dentro desta mesma


intenção missionária podem ser destacados outros nomes os quais entendiam as missões
sobre este prisma, ou seja, uma expansão do evangelho de Jesus Cristo aos confins da
terra. Um nome que pode ser destacado como o de Carey é o de Jonathan Edwards. Em
sua obra que poderia ser traduzida por “Humilde tentativa de promover um acordo
explícito e uma união visível do povo de Deus em oração extraordinária pelo
reavivamento da religião e pelo avanço do reino de Deus na terra” (BOSCH, 2009, p.341).

Na perspectiva de ambos os nomes destacados acima conflui a iniciativa de desenvolver


a missão da igreja não somente a partir de uma limitação geográfica e territorial
específica, mas de uma expansão que leva em conta investimentos de vida e recursos,
sobretudo em ação apaixonada por conhecer novos povos e comunicá-los as boas novas.

Se há um dado inicial marcante nos idealizadores das missões modernas é sua abertura ao
diálogo para comunicação do evangelho em parceria que convergia para um fim comum:
a causa de Cristo e seu reino. Diferentemente do que se percebem em tempos posteriores
ao desenvolvimento da missão, cada vez mais o espírito individualista e sectário ocupou
as plataformas missionárias. Sobre este dado, Gibellini destaca o papel de Carey como
um dos precursores do que mais adiante se formalizaria como movimento ecumênico.
Para ele:

As pesquisas historiográficas situam as origens do movimento ecumênico nos


inícios do século XIX, precisamente em 1805, com o pedido do missionário
batista William Carey de dar vida a uma “associação geral de todas as
denominações cristãs existentes nas ‘quatro partes do mundo’. A proposta e o
pedido nasciam da base, nos movimentos missionários protestantes, engajados,
sobretudo na África e na Ásia, onde era mais visível o efeito paralisante das
divisões sobre a missão.

Percebe-se que a visão cooperativa e participativa presentes nos primórdios das missões
conduziu-os à busca de uma unidade mínima em torno da ação e tarefa da igreja na
comunicação do evangelho a outros povos. Isso significa que essa perspectiva tão pouco
lembrada em tempos atuais, na gênese da missão foi uma espécie de fundamento para
expansão das plataformas de envios de missionários transculturais.

Hoje não é raro verificar em quanto certas estratégias missionárias privilegiam muito mais
a estrutura específica de um grupo denominacional que a parceria frutífera e cooperativa
entre cristãos. Sabe-se, entrementes, que as denominações possuem suas metas
particulares e seus objetivos específicos a serem alcançados. Porém, as armadilhas de uma
ação exclusiva – para não dizer competitiva- entre as missões de cada grupo religioso é
algo que deveria nos colocar sempre em alerta quando o assunto das missões cristãs
estiver em pauta.

Os desdobramentos das missões percorrem o século XIX e chega ao século XX com


reflexões que vão ocupar a pauta da igreja em torno de temas mui intrinsecamente ligados
à atuação e revisão dos conteúdos e as estratégias adotadas pelas juntas missionárias bem
como seus missionários (discutiremos sobre esse tema em unidade posterior de nossa
reflexão).

3. Conclusão
Vimos nesta unidade um esboço que compreendeu a reforma, os reformadores e o
surgimento das missões protestantes de cunho transculturais. Refletimos que a reforma
protestante e os reformadores, por estarem inicialmente envolvidos na tarefa de
fundamentarem-se em suas convicções e bases doutrinárias, defendiam, sobretudo em
Lutero e em Calvino, que as missões fixassem-se em termos geográficos. Ou seja, missões
ficariam circunscritas a certo território, em virtude da possibilidade de apoio do Estado à
presença protestante naquele espaço definido.

Dessa maneira, as missões transculturais ainda não estavam em voga de maneira explícita
no pensamento dos reformadores. Compreendendo, Latu Sensu, as ações empenhadas por
Calvino e Lutero quanto a transformação social por meio da fé podem ser consideradas
como missionárias, pois possuíam intenção clara em sua teologia em como a Deus pode
ser manifesta na história humana e no contexto das sociedades.
Diferentemente dos reformadores acima, a reforma radical presente entre os Anabatistas
possuía uma versão acerca da obra missionária na qual contemplava as missões
transculturais. Os Anabatistas advogavam desse modo, a responsabilidade cristã de
evangelização dos povos tomando como base a Grande Comissão de Mateus 28.

Aprofunde seus conhecimentos:


Leia este artigo que faz um panorama na vida e história de William Carey. Disponível em
http://www.igrejaredencao.org.br/ibr/index.php?option=com_content&view=article&id=90:williamcarey-a-
vida-e-a-obra-do-pai-das-missoes-modernas-pr-marcos-granconato&catid=19:monografiastxt&Itemid=111.

William Carey, como iniciador do movimento missionário moderno, e Jonathan Edwards,


articulador do pensamento acerca das missões transculturais em parceria, ambos
contribuíram grandemente para o avanço das plataformas missionárias bem como para a
prática das missões em parceria e cooperação das igrejas. Uma grande contribuição
advinda das missões modernas em seu nascedouro foi a possibilidade de pensar a missão
estrategicamente em parceria global, sem os entraves das discussões teológicas e
doutrinárias.

Aprofunde seu conhecimento:

Assista ao filme intitulado “Uma chama na escuridão” que retrata a história das missões
na Índia por William Carey. Clique aqui
https://www.youtube.com/watch?v=LZ6ZRvCwzNo e assista.

Assim, podemos avançar em nossa tarefa de reflexão compreendendo os tipos de


protestantismo gestados a partir da obra missionária no mundo, dando acento específico
na América Latina e sua cultura. É o que veremos adiante.

Referências:
ALMEIDA, Suenia Barbosa de. Martinho Lutero e os usos da música: o passado ainda
canta. Dissertação de mestrado. Disponível em:
http://tede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/1803/1/Suenia%20Barbosa%20de%20Alm
eida.pdf. Acesso em 23 de julho de 2020.

BARRO, Antonio Carlos. A consciência Missionária de João Calvino. Fides Reformata


3/1, 1998.

BOSCH, David. Missão Transformadora. 3 Ed. São Leopoldo, RS: EST/ Editora
Sinodal, 2009.

GIBELLINI, Rosino. A teologia do século XX. São Paulo: Edições Loyola, 1998.

GRANCONATO, Marcos. William Carey: A vida e a obra do pai das missões


modernas. Disponível em:
http://www.igrejaredencao.org.br/ibr/index.php?option=com_content&view=article&id=
90:william-carey-a-vida-e-a-obra-do-pai-das-missoes-modernas-pr-
marcosgranconato&catid=19:monografias-txt&Itemid=111. Acesso em 23 de julho de
2020.

MENDONÇA, Antônio Gouvêa. Protestantismo no Brasil. REVISTA USP, São


Paulo, n.74, p. 160-173, junho/agosto 2007.

NEILL, Stephen. História das missões. São Paulo: Edições Vida Nova, 1989.

PEREIRA, Reinaldo Arruda Pereira. Pós-modernidade e liderança. Ameaças e


oportunidades em tempos de mudança. Belo Horizonte - MG: Editora Betânia, 2006.

SANCHES, Regina Fernandes. Teologia da Missão Integral. São Paulo: Reflexão, 2009.

TOLEDO, Cézar de Alencar Arnaut de; VIEIRA, Paulo Henrique. João Calvino
(15091564) e a 1564) e a educação no século XVI. Acta Sci. Human Soc. Sci. Maringá,
v. 28, n. 2, p. 191-199, 2006.

Você também pode gostar