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Frente Ampla e Unidade Popular?

Paulo Vinícius da Silva

Si vis pacem, para bellum. Se quer paz, prepare-se para a guerra.


Provérbio latino.
O povo nos mostra o caminho, e devemos valorizar sua unidade face às eleições de 2022,
quando sinaliza claramente pela Unidade Popular e pela Frente Ampla, ainda em 2021.
Sinaliza também quando Bolsonaro, finalmente, cai abaixo dos 20% de intenção de voto.
Contudo, muitas vezes não fazemos a leitura correta dos sinais do povo, que tanto tem
sofrido, e é generoso com nossos erros recentes.

Não está decidido ainda o papel que a História reserva a Lula e nem ao Brasil, mas
teremos a chance de o ver e viver. As personalidades são fundamentais para a História,
mas há que reconhecer os percalços do incorreto balanceamento da relação líder/massas,
que testemunhamos especialmente os(as) comunistas no século XX. O PCdoB entende
disso por força da História centenária que possui. Erramos e acertamos nessa seara, mas
tivemos a sorte imensa de ter um líder como João Amazonas, baixinho, cara de povo,
paraense, sétimo filho de uma família pobre, pai padeiro, mãe, dona de casa. Quem diria…
Essa é a força do povo, e foi isso que ele viu no Lula, e isso mudou tudo. Sua fé no coletivo
era muito maior que em si mesmo. Só isso explica como - apesar dos vaticínios do nosso
fim à esquerda e à direita - o PCdoB tenha sobrevivido ao longo de tantas provas, mártires,
sofrimentos.

Os erros não foram postos sob o tapete, nunca, porque a autocrítica é um tesouro, e não
um problema, pois permite corrigir-nos. Registre-se, medo de dificuldades e de inimigo
grande, nunca fomos disso. O mesmo Amazonas que liderou rupturas foi o propositor genial
da unidade popular quando era improvável. Perdemo-lo às vésperas da vitória de Lula, mas
jamais esquecemos suas lições, seu legado.

Sem o PCdoB, com certeza, muito da unidade do povo desde a redemocratização não teria
havido. Copa, Pan, Olimpíadas, Pré-Sal, Praças Esportivas, Cotas, PROUNI, REUNI,
Pontos de Cultura, sobrevivência no Congresso, também não. Nós não fomos coadjuvantes
nas mudanças do Brasil, sempre miramos longe, e damos nossa vida nas batalhas.
Registro o valor de três categorias que Amazonas trabalhou, já idoso, em meio às
dificuldades excruciantes do final do século XX: transição, encruzilhada histórica,
unidade, bandeira da esperança, pois essenciais para sobrevivermos ao próximo período.
Qual a transição em curso? Qual a encruzilhada histórica e o momento decisivo, que não
admite erro? Como unir o povo para salvar a Nação? O líder e as massas se fundem e
enfrentam as encruzilhadas históricas, se há verdadeira vanguarda, capaz de unir e
mobilizar milhões, dar a liga que una o nacional, o democrático e o popular, se há
sagacidade, sorte, correlação de forças interna e mundial.

Ou seja, é preciso muita sinergia, ação, força de vontade e consciência para que nossos
desejos de democracia, soberania e desenvolvimento sustentável com valorização do
trabalho se tornem realidade. A derrota em 2016 nos trouxe aqui. Aonde uma segunda
derrota poderá nos levar? De que nos serve o otimismo que desarma e traz soberba? De
que nos servem as ilusões com a fidelidade das classes dominantes à democracia, por
exemplo?

O líder cumpre papel superior, histórico, quando entende ser ele mesmo mescla de potência
e fragilidade. Só assim, um se torna multidão e muda a história, legando à posteridade os
frutos desse encontro decisivo. No nosso caso, afirmar a Nação Brasileira como caminho
para o Socialismo.

Um paralelo pode ser feito entre a Era Vargas e os governos Lula/Dilma. O que ficou dos 13
anos que governamos o Brasil? Como chegamos até a situação desesperadora que o Brasil
vive? Quem disse que não passará nova derrota ou uma vitória imune à guerra híbrida em
curso, das imensas forças inimigas da Nação, da Democracia e do Povo? Pelo que me
consta, não vencemos o jogo ainda, suas regras, não as definimos. Levamos vários 7x1
seguidos, não haveria Golpe, e houve. Rasgou-se a CLT, morreram centenas de milhares
de pessoas.

Costumo dizer, em 2022, até o voto pode valer. Mas, certamente valerão as milícias, grande
parte das FFAA, o pentecostalismo de negócios e o fundamentalismo, a ingerência do
mercado do financeiro, o big data, o poder econômico e a influência dos EUA e seu
imperialismo genocida. Alerta-nos o site Poder 360: "Em 2020, novos registros de armas
junto à Polícia Federal bateram o recorde da série histórica, que começou em 2009.
Os dados de janeiro a novembro deste ano (168.019) já superaram os de todo 2019
(94.064)".1

E, a despeito de tanta nuvem no horizonte, observamos um ufanismo injustificável, fruto de


pesquisas eleitorais que apontam para as possibilidades de Lula em 2022. Ter "furado a
bolha" com a participação de Lula num podcast assistido por 295 mil pessoas ao vivo, levou
a uma declaração infeliz, às vésperas das definições acerca das federações partidárias: "o
PT é o único partido do Brasil". Poucas coisas podem ser mais estranhas que um partido
social democrata tardio e brasileiro, expressar essa ânsia de ser partido único… Sem
qualquer propósito, feriu-se gratuitamente quem se deveria atrair. Pior, a federação que se
busca construir passa a ser interpretada como adesão, e não como Unidade Popular, que é
exatamente o nó górdio para assegurar à Frente Ampla o seu caráter progressista, capaz

1
Leia mais no texto original:
(https://www.poder360.com.br/brasil/novos-registros-de-armas-triplicam-de-2018-a-2
020/)
de abrir amplas avenidas para o poder e à reconstrução nacional. O cheiro acre do
hegemonismo foi longe, as ilusões com a democracia, burguesa mais uma vez se
expressam num grau de ingenuidade impressionante para quem estava "eleito" em 2018, e
acabou passando 580 dias na prisão. Quem avisa, amigo é, e nunca faltou a solidariedade
do PCdoB, nem ao Lula, nem ao PT, desde janeiro de 1989, a Classe Operária propôs a
Frente Brasil Popular.

Parece que não enterramos mais de 600 mil compatriotas, e que isso não é um fato político,
derivado de nossa derrota, em 2016, pacífica e republicana, pois não ia "haver golpe".
Parece que não sofremos o Golpe de 1964, mesmo com a frase atribuída a Prestes:
"Estamos no governo, só nos falta o poder". Parece que no Brasil, a democracia é tão forte
que o voto é o senhor, e não os diversos fatores que os inimigos têm em suas mãos. Parece
que o Fora Bolsonaro deu certo, que vencemos a Deforma Trabalhista e que o movimento
sindical está bombando, "tá tudo dominado". A democracia burguesa no país da escravidão
é assim: uma ilha cercada de vetos classistas e imperialistas por todos os lados. Salto alto
não constrói unidade, não impede golpe, não protege candidato, nem ganha eleição. E,
se ganhar, tem que governar depois da hecatombe que ameaça a continuidade da
Nação Brasileira.

Tudo certo, mas nada resolvido. Federação não será jamais adesão, mas pode ser algo
mais profundo e duradouro, como Chávez, Mandela, e Arismendy ensinaram, na Venezuela,
África do Sul e no Uruguai: precisamos mais que um líder, mais que um partido, precisamos
de algo ainda muito distante: Frente Ampla e Unidade Popular. Precisamos de uma nova
fase, que integre partidos, movimentos sociais, o povo tão sofrido, mas tão potente, criando
assim uma solidariedade muito maior que a existente entre nós da esquerda. Em parte,
essa falta de empatia decorre do papel necessário, mas não cumprido, dos partidos que
deveriam ter estado à altura do enfrentamento dos Golpes, em 1964 e em 2016. A não
resistência efetiva de quem devia ter liderado é a mãe do desencanto, do desamparo e do
nosso legado de divisão. Assim, teremos que decidir se a oportunidade das federações, da
Lei Haroldo Lima, servirá ao propósito extremamente nobre de unir patriotas, democratas e
a esquerda para salvar o Brasil. Se servir apenas aos interesses de um partido, a derrota
nos assombrará como uma maldição que não podemos mais tolerar.

Encruzilhada história e transição diante de nós. Uma quadra ainda mais conturbada, e
levando em conta que as pessoas não são eternas. O que deixará, coletivamente, nossa
passagem por esta Terra? Cabe pro Lula, cabe para cada um de nós.
Mais que uma federação eleitoral ou resolver nossos deputados(as), precisaremos resgatar
o sentido da Frente Brasil Popular em 1989, lançada pelo Partido Comunista; o aprendizado
da frustração da Frente Ampla de Goulart/JK/Prestes e Lacerda que, ao final, enterrou a
Ditadura, com Tancredo/Sarney. Foi um difícil caminho que teve de ser palmilhado das
diretas até 1988 e que nos legou a CF, com uma unidade básica que reuniu, à época,
PCB-PCdoB-MR8, a despeito de nossas muitas diferenças, e que soubemos entender e
superar. Essa base permitiu os governos Lula e Dilma, mas isso é passado, e o futuro é
incerto. Será um acaso estarmos aqui, filhos de Prestes, Amazonas, Arraes, Cláudio
Campos, e Lula ter uma nova chance? O que faremos com essa chance e com esses
perigos?
Não desaprendamos as lições da história. Amplitude e unidade do povo, nas ruas e a nas
redes, serão mais que garantia de vitória, serão a nossa única possibilidade de vencer o
imperialismo, unindo o país, retomando a economia e as perspectivas do Brasil em perigo.
Frente Ampla e Unidade Popular para reverter a destruição de nossa democracia e de
nosso país, para retomarmos a vida e o futuro, desviando-nos dos graves perigos e mirando
nas possibilidades imensas do nosso amado Brasil, esteio para a unidade latino-americana
contra o inimigo central, o imperialismo. E, ensinou-nos o Che o cuidado devido, que afaste
as ilusões. A luta pela pátria livre é de vida e morte, e ao imperialismo não devemos
conceder nem um tantinho assim, nada!

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