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Neusa Maria Dal Ri e Candido Giraldez Vieitez

A educação do movimento dos sem-terra

Neusa Maria Dal Ri


Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Filosofia e Ciências

Candido Giraldez Vieitez


Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Filosofia e Ciências

Introdução ensino superior encontra-se privatizado em cerca de


80% das matrículas.
A educação no Brasil vem evoluindo segundo o Vários autores, já há décadas, preocupados com
diapasão de um país do terceiro mundo que se encon- a realidade social, têm formulado idéias educacionais
tra em secular e interminável processo de desenvolvi- com o propósito de incitar uma formação acadêmica
mento econômico. Nas últimas três décadas, o Estado que habilite a população para efetuar uma ação trans-
brasileiro quase conseguiu universalizar a educação formadora na sociedade, tendo como perspectiva o
pública gratuita fundamental, constituída de oito anos fortalecimento da democracia, a cidadania, a igual-
de ensino.1 Entretanto, há ainda muitos problemas a dade social e até mesmo o socialismo. Nesse contex-
serem resolvidos. Essa modalidade do ensino público to surgem formulações tais como a educação para a
reproduz a dicotomia característica do sistema esco- cidadania, a formação de consciência crítica, o culti-
lar, ou seja, essa educação é destinada às classes po- vo dos valores humanistas e várias outras.
pulares e pobres, enquanto que para as classes média Nesse campo de preocupações inserem-se os es-
e alta o Estado estimula a educação privada. Acres- forços pedagógicos do Movimento dos Trabalhado-
centemos que a educação infantil é ainda assistencial res Rurais Sem Terra (MST). Com a ressalva de que
e compensatória, o ensino médio é deficitário,2 e o se trata de uma práxis pedagógica que está em conso-

1
Na faixa etária de 7 a 14 anos, idade em que é obrigatória a do Ensino Médio (ENEM) demonstram que “[...] o estudante ca-
matrícula, o país atingiu o percentual de 94,9% das crianças na rente que chega ao final do ciclo médio já faz parte de uma peque-
escola, segundo o Censo 2000 (Gois, 2002, p. A6). na elite, pois boa parte dos mais pobres abandona os estudos bem
2
De acordo com editorial da Folha de S. Paulo de 22 de antes. No Brasil, infelizmente, a escola pública não se tem mos-
novembro de 2003, os resultados do último Exame Nacional trado um instrumento eficiente de inclusão social” (p. 2).

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nância com a experiência político-social e organizativa classes trabalhadoras em geral, do ponto de vista de-
mais ampla do próprio Movimento.3 Assim, cabe res- mocrático e popular.
saltar que a práxis educacional do MST é diferente A concepção de educação do MST comporta vá-
das outras proposições críticas existentes. rios aspectos teóricos e ideológicos, bem como di-
Neste artigo tomaremos como objeto de análise versas práticas educacionais. Para os propósitos des-
o Instituto de Educação Josué de Castro (IEJC), em te artigo, no entanto, tomaremos apenas os aspectos
especial o curso de Técnico em Administração de que consideramos elementares ou básicos e sobre os
Cooperativas (TAC). O IEJC tem como mantenedor quais o Movimento, num processo experimental, vai
o Instituto Técnico de Capacitação e Pesquisa da Re- buscando erigir uma pedagogia.
forma Agrária (ITERRA), que é vinculado ao MST. Nesta reflexão sustentamos que os elementos
Tem sua sede atual no Município de Veranópolis, básicos presentes na concepção educacional do IEJC
Rio Grande do Sul. O IEJC constitui-se em uma es- estão em correspondência com a práxis econômica e
cola de educação média e profissional que combina com a organização política de base do MST, e que há,
também, influências teóricas educacionais advindas
[...] objetivos de educação geral, escolarização e formação principalmente de Pistrak, de Paulo Freire e da peda-
de militantes e técnicos para atuação no MST. Seu funcio- gogia da alternância.
namento está organizado em torno de cursos formais de
nível médio, de educação profissional e de formação de Educação para a reprodução do Movimento
professores, criados a partir de demandas apresentadas pe-
los diversos setores do MST. (ITERRA, 2001, p. 5) Como ocorre com outras organizações que di-
vergem da ordem social capitalista, o MST percebe
Este trabalho apóia-se em pesquisa empírica rea- que o ensino oficial não atende às necessidades de
lizada no IEJC, em novembro de 2001. Nessa oca- formação dos seus membros, pois podemos dizer em
sião, o IEJC mantinha, além do TAC, o curso de for- relação à educação o que já se disse em relação à ideo-
mação de professores (Curso Normal de Nível Médio), logia: na sociedade de classes, a educação dominante
atividades de formação de curta duração como semi- é a educação das classes dominantes, ainda que a
nários, oficinas e cursos livres de qualificação profis- ideologia pedagógica oficial apresente-se travestida
sional, e estava também iniciando o curso de nível na forma de conhecimentos, valores e habilidades
médio sobre saúde. O Instituto tem alunos oriundos universais.
de 21 estados do país e os cursos funcionam em tem- Nesse sentido, o IEJC foi criado para atender às
po integral, em regime de internato. características e necessidades específicas do MST,
O objetivo deste texto é expor os elementos edu- dentre as quais se destacam a formação dos militan-
cativos principais presentes no IEJC, bem como elu- tes e quadros do Movimento.
cidar se a sua concepção educacional, que parece ser O empenho do MST em criar uma instância de
a mesma vigente nas escolas controladas pelo MST, educação própria é análogo ao de outras organizações
contém elementos educacionais de interesse para as coletivas de massa, como partidos e sindicatos, uma
vez que compreendem que a escola burguesa, dada a
sua concepção de mundo, lhes é antagônica. Contudo,
a similitude entre o IEJC e as agências educacionais
3
A ação educativa do MST ocorre principalmente por meio normalmente utilizadas por outras organizações po-
da participação no Movimento. Contudo, ações educativas por meio pulares para a formação de seus militantes termina aí.
da escola também estão sendo desenvolvidas. A esse respeito ver O ensino ministrado no IEJC relaciona-se dire-
Caldart (2000). tamente com a especificidade do militante que o Mo-

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vimento necessita. Para o Movimento, não basta que mediado pela organização da produção agrária, o que
o militante tenha formação política, ainda que esta implica imediatamente a produção de bens e a orga-
seja essencial. Paralelamente a essa qualidade, o nização do trabalho.
Movimento precisa que o seu membro tenha também A reforma agrária significa, em princípio, a divi-
capacitação técnica, bem como desenvolva as apti- são da terra em pequenos lotes de exploração familiar.
dões necessárias à organização coletiva da vida so- Porém, o Movimento, compreendendo as dificulda-
cial, à organização coletiva da produção e de outras des e limitações da exploração individual da terra no
atividades econômicas. contexto de uma agricultura que compete num amplo
Esses requisitos derivam de uma característica mercado, tem-se esforçado para criar formas de coo-
organizacional insólita do MST no contexto das or- peração entre os produtores. Segundo nosso juízo, a
ganizações populares, ou seja, o fato de que três ins- organização mais avançada, dentre essas formas, é a
tâncias da realidade social – a política, a econômica e Cooperativa de Produção Agropecuária (CPA), ou
a social –, que se encontram normalmente separadas seja, cooperativa socializada de gestão democrática ou
nas práxis de outras organizações, no MST encon- de autogestão. As características básicas desse tipo de
tram-se organicamente reunidas. empreendimento são as seguintes: a inexistência do
O militante do partido não vive no partido, o as- trabalho assalariado; a distribuição igualitária do ex-
sociado ao sindicato não vive no sindicato, embora cedente econômico; o trabalho coletivamente organi-
ambos possam vivenciar com maior ou menor inten- zado; e a gestão democrática. A gestão democrática
sidade suas entidades. aqui é uma autogestão da cooperativa pelos próprios
Os membros do MST, diversamente, encontram- trabalhadores, com base em instâncias decisórias
se articulados ao Movimento não apenas por ideolo- como assembléias gerais, núcleos de base, setores de
gia e funções políticas, mas também pelo fato de en- produção e de serviços, e outros mecanismos de to-
contrarem-se inseridos em alguma das suas estruturas mada de decisão pelo coletivo de associados ao em-
organizacionais de base, que são o acampamento e o preendimento. O autogoverno, com a tomada de deci-
assentamento. sões coletivas e diretas, é um dos elementos que
O acampamento é a forma primária de organiza- diferencia esse tipo de cooperativa, dentre tantos ou-
ção e luta no MST, pois ele ou prepara a ocupação de tros existentes.
terra ou é organizado imediatamente após esta. O Além da questão crucial de organizar a produ-
acampamento organiza as famílias, tendo em vista a ção, o assentamento coloca outros desafios ao Movi-
realização de atos, especialmente a ocupação, que con- mento. Convém destacar dois problemas: a manuten-
duzam à conquista da terra. Nesse sentido, o acampa- ção dos jovens no trabalho agrícola e a permanência
mento é uma instância de luta. Entretanto, também é dos assentados no MST.
um meio de sobrevivência e reprodução da vida so- Para os assentados que obtiveram a terra, a refor-
cial, na medida em que origina uma comunidade que ma agrária realizou-se e, em princípio, eles não teriam
desenvolve uma sociabilidade própria e que se man- mais motivo para dar continuidade à luta. Concomi-
tém unida, muitas vezes, por vários anos. Por essa tantemente, os jovens dos assentamentos sentem-se
razão, a comunidade do acampamento soluciona, den- fortemente atraídos pela vida urbana, o que coloca em
tro do seu caráter de transitoriedade, vários proble- risco a continuidade desses empreendimentos obtidos
mas elementares da vida social, tais como a obtenção com tantas dificuldades. Assim, em última análise,
e a gestão dos recursos necessários à sobrevivência, à para o MST, trata-se tanto de garantir a exeqüibilidade
educação, à saúde, entre outros. do assentamento, quanto a de manter esses segmentos
Conquistada a terra, surge o assentamento. No integrados ao Movimento com o propósito de que a
assentamento, o problema da subsistência passa a ser luta pela reforma agrária possa avançar.

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Em suma, o MST distingue-se claramente de to- A seguir, destacaremos as instâncias estratégi-


das as demais organizações populares clássicas. Ele é cas que fazem com que a atividade de educação esco-
um movimento de luta e, ao mesmo tempo, o demiurgo lar do MST, voltada antes de tudo para seus membros
de uma economia distinta da economia burguesa do- ou militantes, configure-se como um processo peda-
minante. É um sujeito ativo e até altissonante na luta gógico próprio, característico, significativamente dis-
de classes na ordem social brasileira. Mas a sua luta, tinto daquele que é praticado nas escolas oficiais, ou
diversamente do que ocorre com as demais organiza- mesmo nas escolas de outras organizações populares.
ções populares, dá-se também imediatamente no ter-
reno da organização da produção. A reivindicação da Estrutura e processos escolares
reforma agrária não é apenas a reivindicação de aces-
so à terra, de distribuição de terra para quem não a Os conteúdos curriculares
tem e a quer, mas a exigência do direito de promover
in continenti uma reorganização não-capitalista das Tomemos o exemplo do TAC. O currículo bási-
relações de produção num segmento da economia co segue os referenciais da legislação. As disciplinas
agrária.4 Essa reorganização dá-se no âmbito interno ministradas referem-se à formação geral e à adminis-
dos assentamentos nos quais foram criadas as CPAs tração de cooperativas. Dessa forma, nesse âmbito, o
ou outras organizações do MST. As relações de tra- aspecto diferencial desse curso encontra-se em três
balho instauradas nas CPAs diferenciam-se das rela- variáveis: a história do Movimento; a impostação pe-
ções capitalistas de trabalho porque, dentre outras ra- dagógica dos professores; e a articulação entre os con-
zões, o trabalho assalariado é substituído pelo trabalho teúdos disciplinares e a realidade dos acampamentos
associado. No entanto, as CPAs continuam integran- e assentamentos.
do o sistema do capital na medida em que são unida- No trato da disciplina de história há duas carac-
des produtoras de mercadorias e, conseqüentemente, terísticas a ressaltar. A primeira refere-se a um impor-
atuam no mercado. tante espaço que é reservado ao estudo da história do
A opção do MST com a criação dos cursos men- próprio Movimento. E, embora o estudo da história
cionados reflete as determinantes discutidas anterior- do Movimento não ocorra apenas por meio dessa dis-
mente. O curso de formação de professores expressa ciplina, como se verá mais adiante, não há dúvida de
a preocupação com a educação escolar das crianças que ela contribui significativamente para a reprodu-
nos acampamentos e assentamentos. O TAC revela a ção da identidade dos sem-terra. A segunda caracte-
disposição do Movimento em promover formas va- rística, correlata à primeira, é a preocupação de colo-
riadas de cooperação e, em especial, a criação de co- car à disposição dos alunos interpretações analíticas
operativas de trabalho coletivo e gestão democrática. que não apenas evidenciam o papel histórico das clas-
E o curso de saúde indica uma outra área básica com ses subalternas, como também apresentam de forma
a qual o Movimento tem de se preocupar, diante das positiva os seus valores e feitos, os quais aparecem
insuficiências das estruturas públicas existentes. contrapostos aos das classes dominantes. Acrescen-
tamos que a história trabalhada não se apresenta sim-
plesmente como o passado do Movimento ou da civi-
lização, mas como um passado que se articula com o
4
A reorganização das relações de produção também ocorre presente, particularmente com a realidade desse seg-
quando os trabalhadores fabris apropriam-se de uma empresa ca- mento social.
pitalista ou criam uma empresa própria, embora eles não estejam
organizados em um movimento geral de autogestão nas empresas. A diferença básica que existe é que o aluno tradicional, na
A esse respeito, ver Vieitez e Dal Ri (2001). minha disciplina, não consegue enxergar a história como

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algo que renda algum fruto na sua vida. Faz porque é obri- mais respeito à gente. Nos primeiros cadernos, com os te-
gado. Aqui [no IEJC], até em função da própria formação mas geradores. A relação escola e comunidade. Os proble-
de vida, uma das primeiras coisas que o Movimento traba- mas do assentamento, do acampamento. Parecia algo que a
lha com as pessoas é que elas conhecem uma história que escola ia ajudar. [...] Aqui de fato a gente vai aprender uma
não é a sua; é uma história que foi inventada por alguém coisa útil. [...] A mudança qualitativa da consciência das
devido a seus interesses. Então, os alunos têm esse interes- pessoas parece ser um dos pilares. Que as pessoas enten-
se em saber. Por que tenho que glorificar o Duque de Caxias? dam o processo em que elas vivem. Ser capaz de identificar
os amigos, os inimigos etc. Saber identificar problemas e
Eles têm um interesse pela história. É um marco diferencial resolver. Em qualquer nível elas poderão atuar. Ler a reali-
aqui. A história de uma classe dominada. Tem gente que dade, saber fazer isso. (Acompanhante de turma do TAC,
vem pra cá que já tem o segundo grau. O pessoal vem pra em entrevista aos pesquisadores, em 2001)
cá e muita gente diz que odiava a história. E vem aqui e vai
até à biblioteca ler livros. Eles têm uma visão da história Esse ensino, que contempla a realidade social da
que os alunos normais não têm de jeito nenhum. Compara- qual emergem os educandos, decorre das característi-
do com os alunos normais, é outro patamar. (Professor de cas do Movimento, bem como das influências teóri-
História do TAC em entrevista aos pesquisadores, em 2001) cas de Paulo Freire, de Pistrak e da pedagogia da al-
ternância.5
O IEJC quer ajudar a cultivar a memória do MST e do con- A terceira variável, a impostação pedagógica dos
junto das lutas populares, e se sente responsável pela forma- professores, está relacionada com a constituição do
ção da consciência histórica de seus educandos e educado- próprio quadro docente. Quando há necessidade de
res. Isto implica em desenvolver alguns aprendizados bási- contratação, esta não ocorre por meio do mercado de
cos: compreender a nossa própria vida como parte da histó- trabalho. Os professores são indicados ou recomen-
ria; respeitar as lições da história; aprender a ver cada ação dados levando-se em conta a competência técnica e a
ou situação numa perspectiva histórica, quer dizer, em um proximidade com o MST. Trata-se de professores que
movimento entre passado, presente e futuro, compreendê- são do MST ou que têm simpatia pelo Movimento.
las em suas relações com outras ações, situações, uma tota- Isso significa que, mesmo quando os assuntos
lidade maior. (ITERRA, 2001, p. 17) tratados nas várias disciplinas nada têm a ver com
postura ideológica ou política, os professores acabam
Diferentemente da escola oficial, que ministra por transmitir aos seus alunos valores e idéias favorá-
conteúdos gerais, com escassa referência a realida- veis ao Movimento. Esta característica parece ser ge-
des sociais mais específicas, o ensino no TAC busca ral entre os professores, embora seja mais acentuada
constantemente estabelecer vínculos relacionais com entre os docentes da área de humanas, pois, dada a
a realidade do Movimento, dos assentamentos e acam- natureza das disciplinas, há mais oportunidades de
pamentos. emissão de juízos acerca da realidade social. Do mes-
Um ex-aluno do TAC, atual membro do quadro mo modo, dado o caráter diferenciado dos alunos e
pedagógico do IEJC, relembrando as impressões que da escola, os professores também parecem apreciar e
teve ao chegar no Instituto, diz o seguinte: valorizar o trabalho no Instituto.

Eu já era técnico em agropecuária, no Colégio da Universi- Os outros professores vêm pra cá com um objetivo: dar a
dade Federal de Santa Maria. [...] No curso Técnico eu acha- ementa do curso. É fechado. Eles vêm e trabalham as ques-
va que a gente estudava muitas coisas abstratas. Me per-
guntava quando isso serviria pra gente. E aí vi [no IJEC],
quando comecei a discutir, algo mais concreto, que dizia 5
A respeito da pedagogia da alternância, ver Costa (1999).

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tões de Física, de Matemática. Não abrem para as questões ções burocráticas são as relações naturais e eternas
políticas. A visão de todo mundo é que aqui é um lugar da sociedade. Em uma palavra, uma das lições minis-
diferenciado. Eles gostam. Fazem questão de continuar. tradas na escola consiste na visão de que a burocracia
Muitas vezes largam tudo o que têm que fazer e vêm pra cá. é a forma mais racional e eficiente de organização do
Tem um professor de Química que não cobra nada do trabalho.
ITERRA, faz doutorado e vem aqui. É uma coisa que vai O IEJC tem na organização escolar uma das prin-
além da militância. E pela diversidade também, que é uma cipais dimensões que o diferencia da escola oficial.
coisa muito interessante. Temos alunos aqui de 21 estados. Nos aspectos pedagógicos, políticos e administrati-
Além das leituras normais, os alunos realizam outras. Eles vos, inclusive orçamentário, o Instituto é gerido pe-
têm uma literatura mínima para ler. Eu nunca li O Capital los alunos, professores e funcionários. O mecanismo
inteiro. E eles, chegando ao fim do curso, muitos leram O básico operatório da gestão é o que se denomina no
Capital. Eles vão se automotivando. Eles estão lendo os IEJC de reprodução da gestão. Isso significa que
clássicos da literatura brasileira. Os alunos lêem no tempo mensalmente há uma avaliação e um novo planeja-
leitura. Um menino veio e me disse: “Professor, estava vendo mento de todas as atividades.
aqui um negócio no Guarani que fala da guerra entre os O Instituto tem várias instâncias organizacionais
espanhóis e os árabes, e não estou contextualizando”. O nas quais participam alunos, professores e funcioná-
que significa isso? Ele achou um negócio de história, não rios. Paralelamente a essas instâncias mistas, há or-
entendeu, e veio falar comigo. (Professor de História do ganismos compostos apenas por alunos. Trata-se da
TAC em entrevista aos pesquisadores, em 2001) auto-organização dos alunos em núcleos de base.
Essa estrutura, que apresenta várias mediações,
conflui para a assembléia geral do Instituto, da qual
A estrutura organizacional: as relações de participa toda a comunidade escolar. A assembléia
produção pedagógicas geral delibera mensalmente sobre a maior parte das
questões que se apresenta à escola, desde o orçamen-
A organização da escola não costuma ser apre- to até possíveis problemas pedagógicos.
sentada como um fator pedagógico importante. Os A assembléia geral é o organismo superior de
atores escolares normalmente vivenciam essa orga- tomada de decisões do Instituto. Acima dela, com o
nização sem maiores reflexões ou preocupações, con- papel de realizar a mediação entre o Instituto e a dire-
siderando-a um meio para a realização dos objetivos ção do MST, encontra-se a Direção Política do IEJC/
pedagógicos propostos. MST. Essa direção atém-se a questões estratégicas que
No entanto, a organização da escola é um impor- implicam princípios e diretrizes políticas do Movi-
tante elemento pedagógico, é um currículo que, por mento.6
não fazer parte dos conteúdos programáticos explici- Em suma, há uma grande autonomia na gestão
tados, se encontra, por assim dizer, oculto. da escola, preservados os vínculos e diretrizes gerais
A ação desse currículo incide sobre a formação que emanam do MST.
dos educandos de diversos modos. Entretanto, dentre
os seus ensinamentos, o mais importante é aquele que
decorre do fato de as relações pedagógicas serem uma 6
“No dia-a-dia, a autonomia está nos núcleos de base. O MST
réplica, ainda que em clave escolar, das relações so- tem autoridade para vir aqui [IEJC], ou através da minha pessoa, e
ciais fundamentais dominantes. Desse ponto de vis- cuidar da observância dos princípios. Os educandos sabem o que o
ta, a escola burguesa, uma organização burocrática, MST quer. Então, eles respeitam isso. Há um entendimento diante
transmite aos alunos, por meio da vivência das rela- dos princípios” (Diretora do Instituto e membro da Direção Nacio-
ções escolares, a percepção e a visão de que as rela- nal do MST, em entrevista aos pesquisadores, em 2001).

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Ressaltamos que, embora exista uma hierarquia atuação de figuras destacadas na história. É também
em relação à direção do Movimento, esse tipo de or- uma forma de ensinar às gerações mais jovens a his-
ganização apresenta um grau de radicalismo demo- tória de lutas do Movimento, bem como afirmar os
crático que se encontra em divergência com a organi- seus princípios, objetivos e ideologia.
zação burocrática da escola oficial. Na percepção dos No IEJC, a mística
membros do IEJC, trata-se da gestão democrática. No
entanto, podemos concluir que essa organização pode Vai muito do que o núcleo de base pensou. De manhã cedo
também ser denominada de autogestão.7 chamamos todos os núcleos de base para ver se está faltando
alguém, se está doente, e dar os avisos do dia. Aí tem uma
Atividades culturais e lúdicas encenação, um teatro, a motivação do dia, cantar a música.
Se sair ruim, na reunião todo mundo cobra. A mística de
O Instituto desenvolve várias atividades cultu- ontem foi uma homenagem ao Zumbi. O pessoal tem que
rais, lúdicas e recreativas. Porém, destacaremos ape- buscar, pesquisar, inventar. [...] Mística? Aprendemos com a
nas aquela que constitui um dos elementos que dife- Igreja. (Diretora do Instituto e membro da Direção Nacional
renciam a pedagogia do IEJC. Trata-se do que no do MST, em entrevista aos pesquisadores, em 2001)
Movimento denomina-se de mística.
A realização da mística é de responsabilidade dos O objeto da mística é sobretudo a história ou os
núcleos de base formados pelos alunos. Ela é realiza- eventos significativos da história do MST e do movi-
da formalmente todos os dias, pela manhã, mas pode mento operário e popular. Porém, a História é minis-
ocorrer também em várias outras situações. A mística trada como disciplina científica e segundo o método
é expressa por meio de poesias, performances, músi- inerente à sua condição. Diferentemente, a mística
cas, expressões corporais, palavras de ordem, símbo- busca mobilizar cotidianamente as energias psíqui-
los do MST, entre outras. cas da evocação, do imaginário, do simbolismo, vale
A mística tem a finalidade de manter a identida- dizer, do que desencadeia mais facilmente os senti-
de dos sem-terra, reviver os sentimentos das pessoas mentos e a afetividade.
pelo Movimento e desencadear o respeito aos seus
símbolos. Por meio da mística resgata-se a memória A escola do trabalho e o trabalho na escola
de eventos importantes para o MST e para a classe
trabalhadora, rememoram-se episódios de lutas e a A escola na sociedade capitalista desempenha
várias funções, sendo que a mais imediata para o ca-
pital é a de formar mão-de-obra para o mundo do tra-
7
O ordenamento estatutário e jurídico da cooperativa de balho. Entretanto, a relação entre a escola e o mundo
produção de trabalho associado possibilita o exercício democráti- do trabalho não é direta, encontrando-se mediada pelo
co do poder por todos os trabalhadores. Esse fato é fundamental, mercado.8 Desse ponto de vista, o estudante é um tra-
na medida em que essa dinâmica diferencia-se dos mecanismos balhador em potencial,9 que deverá integrar o merca-
representativos clássicos. No entanto, há vários intervenientes que
inibem e limitam o exercício da gestão democrática. Uma delas é
8
a oposição latente e/ou real existente entre o conjunto dos traba- A esse respeito, ver Vieitez e Dal Ri (2001).
9
lhadores e os seus quadros, pois os últimos freqüentemente detêm A sociedade capitalista criou a categoria social dos estudan-
a hegemonia nas organizações. Por essa razão, dadas as condições tes. O estudante, enquanto categoria, não tem relação direta com o
atuais, a gestão democrática deve ser considerada um tipo de ges- mundo do trabalho. Mesmo o estudante que é ao mesmo tempo um
tão na qual os quadros tendem a ter um peso excessivo. A esse trabalhador apresenta essa característica, pois o seu estatuto como
respeito, ver Vieitez e Dal Ri (2001). aluno não mantém relação alguma com o de trabalhador.

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do para poder realizar esse potencial. Dito de outra A importância de Pistrak, aqui, está no fato de
forma, a escola não educa diretamente para o traba- que, ao que tudo indica, foi a esse autor que o MST
lho na produção, mas para que o estudante converta- recorreu, enquanto influência teórica, para pensar um
se numa força de trabalho habilitada, que as organi- dos princípios da sua pedagogia: “a educação para o
zações buscarão no mercado de trabalho, o qual é uma trabalho e pelo trabalho” (MST, 1996, p. 15). Dessa
das categorias fundamentais da ordem social. forma, essa referência ocorre, sobretudo, porque essa
A realidade no IEJC já é outra. Uma das princi- é a proposta que melhor atende às necessidades do
pais características das escolas do MST ou das que Movimento.
estão sob a sua hegemonia é o vínculo direto entre o Que tipo de formação, na fase atual, o Movimento
ensino e o trabalho. E esse vínculo dá-se por meio do necessita? O Movimento precisa que os seus militan-
trabalho real, concreto. tes e trabalhadores da terra aprendam a lutar, a orga-
A concepção de ensino vinculado ao trabalho não nizar e a gerir a produção. O estudante do IEJC já era
é uma novidade e nem é um método defendido e apli- uma pessoa integrada ao trabalho antes de ir para a
cado apenas pelos críticos da educação burguesa. escola. E mesmo depois de integrar-se a ela continua
Várias correntes de pensadores têm colocado e dis- sendo um trabalhador, ainda que em condições espe-
cutido a questão do princípio do trabalho na escola, ciais, as quais garantem a sua permanência na escola.
embora com variações nos objetivos e propostas. Da Como é possível um estudante, em regime de
mesma forma, a burguesia não apenas propôs, mas internato, ser um trabalhador e continuar sendo, mes-
implantou, em vários momentos da história, escolas mo estando na escola? Isso ocorre por várias formas.
ligadas ao trabalho. Entretanto, as idéias principais A primeira delas diz respeito ao que se denomi-
que sempre estiveram alicerçando essas propostas, na pedagogia da alternância. Os cursos do Instituto
excetuando as de alguns autores, são, basicamente, estão organizados em etapas, cada uma constituída
as de que o aluno aprende mais e melhor por meio do de dois tempos: o tempo escola e o tempo comunida-
trabalho; o aluno torna-se mais disciplinado, organi- de. O tempo escola é o tempo no qual os alunos ficam
zado e aprende a valorizar e a respeitar o trabalho. no Instituto e desenvolvem um conjunto de ativida-
Ou seja, a maioria das correntes parece considerar o des do curso e a participação na gestão da escola. O
trabalho de uma forma abstrata, laboratorial, como tempo comunidade é o tempo no qual os alunos retor-
uma disciplina escolar, portanto, isolada e separada nam aos acampamentos ou assentamentos, realizan-
do ato real de produção. do tarefas que foram delegadas pelo IEJC ou pelas
Destacamos um autor que se colocou como críti- instâncias do MST. Nesse tempo os alunos combi-
co das abordagens existentes em sua época, e que pôde nam atividades de estudo com a participação direta
elaborar uma proposta de vínculo entre a educação e nas ações do Movimento, continuam ou iniciam tare-
o trabalho real na produção. Trata-se de Pistrak, edu- fas que os levaram a fazer um curso específico e aten-
cador russo e autor da obra Fundamentos da escola dem às demandas de trabalho de cada local.
do trabalho, escrita em 1924. As comunidades do MST onde se realiza o tra-
balho produtivo não têm mais como objetivo absolu-
O trabalho na escola, enquanto base da educação, deve to a extração do excedente econômico da força de
estar ligado ao trabalho social, à produção real, a uma ati- trabalho. Em decorrência, essas organizações podem
vidade concreta socialmente útil, sem o que perderia seu substituir competição por ações solidárias e de coo-
valor essencial, seu aspecto social, reduzindo-se, de um lado, peração, o que lhes permite adaptar às suas condi-
à aquisição de algumas normas técnicas e, de outro, a pro- ções o estudante-trabalhador.
cedimentos metodológicos capazes de ilustrar este ou aquele Um aluno do TAC, assentado e solteiro, diz o
detalhe de um curso sistemático. (Pistrak, 2002, p. 38) que significam essas ações solidárias.

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Planto arroz, milho, feijão, mandioca, batata-doce e Alguns vão para o mercado de trabalho. Mas é uma mino-
abóbora. Só vendo o excedente. A maioria fica para o con- ria. A maioria vai mesmo para os assentamentos e acampa-
sumo. Eu sou ligado a uma família, então contribuo com mentos. (Acompanhante de turma do TAC, em entrevista
essa família. Agora que estou estudando, não só pra mim, aos pesquisadores, em 2001)
então a comunidade está assumindo o meu trabalho. Lá não
tem cooperativa, tem associação. Não é perfeito. Onde tem Os estudantes do IEJC trabalham durante o tem-
cooperativa essa questão é mais bem controlada. Mas, onde po escola no qual ficam na Instituição. Eles atuam
tem associação ou outro coletivo também funciona. (Aluno em três setores básicos: a) a manutenção e conserva-
do TAC, há um ano e meio no Instituto, coordenador de ção da escola, o que significa o desempenho de vá-
Núcleo de Base e coordenador da Coordenação dos Nú- rios tipos de trabalhos domésticos como cuidar da lim-
cleos de Base, em entrevista aos pesquisadores, em 2001) peza, lavar e passar roupa, cozinhar e organizar o
refeitório coletivo; b) as unidades de produção, que
Em virtude do fato primário, qual seja, de todo e aportam produtos in natura para consumo próprio ou
qualquer membro do MST ser um trabalhador, desde que são colocados no mercado, gerando renda mone-
tenra idade, ainda que em condições especiais como tária; c) a gestão coletiva da escola, que é responsá-
a relatada, decorre que entre as escolas do Movimen- vel por sua organização e funcionamento.
to e as suas unidades econômicas não pode haver a Um dos trabalhos mais importantes que os alu-
separação radical que se observa entre o universo nos realizam é a gestão da escola, a qual comparti-
empresarial e a escola oficial. lham com professores e funcionários, como assinala-
Como há uma ligação orgânica entre escola e tra- do. Além dessa tarefa estratégica e primordial, os
balho, observa-se uma outra questão fundamental, que alunos ajudam a custear o Instituto, administrando e
é o desaparecimento da tarefa básica que cumpre a trabalhando nas unidades de produção. Uma pequena
escola em uma sociedade capitalista: a formação de fábrica de conservas, que coloca seus produtos no
mão-de-obra para o mercado de trabalho. O MST pro- mercado, além de gerar uma renda monetária permite
cura estabelecer um vínculo direto entre a escola e os aos alunos vivenciarem a comercialização, os proces-
seus empreendimentos econômicos. O aluno do TAC, sos de trabalho e a administração do negócio. Função
por exemplo, pode, se assim o desejar, dirigir-se ao análoga tem a padaria, que atende às necessidades de
mercado de trabalho e disputar uma vaga em qual- consumo da escola e também coloca no mercado lo-
quer organização, pois a formação que recebe no IEJC cal uma parte da produção. A horta fornece produtos
o habilita para isso. Contudo, os empreendimentos in natura. E a creche, denominada Ciranda, cuida das
econômicos do MST, notadamente as cooperativas de crianças da comunidade escolar.
trabalhadores associados, não constituem um merca- Convém ressaltar que o trabalho realizado no
do de trabalho e nem interagem com este, uma vez Instituto pelos alunos não é uma simulação laborato-
que suprem suas necessidades de trabalho por meio rial, mas trabalho real que, de algum modo, se articu-
de outros mecanismos. O aluno formado pelo TAC la com a economia. Entretanto, o seu significado é ao
não vai à busca de um emprego, pois ele já pertence a mesmo tempo educativo, pois uma das premissas da
uma comunidade de trabalho, ou poderá ser alocado abordagem pedagógica do Instituto é a de ligar orga-
em outro setor qualquer do Movimento. nicamente o ensino e o trabalho.

Um dos objetivos é que, no tempo comunidade, ele Funções sociais da escola


[aluno] comece a se inserir nesse coletivo para ajudar a
resolver os problemas que tem ali. Quando termina o cur- A escola capitalista desempenha várias funções
so, a grande maioria já é sabedora de onde vai trabalhar. sociais. Dentre elas destacam-se a preparação da força

52 Maio /Jun /Jul /Ago 2004 No 26


A educação do movimento dos sem-terra

de trabalho para o mercado, a legitimação da ordem educacional vigente. Entretanto, o Instituto introdu-
social por meio da ideologia e de outros mecanismos, e ziu nos cursos elementos pedagógicos diferenciados,
a transmissão de conhecimentos culturais e científicos. concordantes com a visão educacional do MST, e que
No IEJC observam-se alterações significativas são responsáveis pelo caráter sui generis da pedago-
quanto às funções sociais que a escola desempenha. gia adotada. Esses elementos pedagógicos dizem res-
A transmissão de conhecimentos científicos, lingüís- peito aos conteúdos disciplinares, ao modo como a
ticos e culturais é realizada por meio das disciplinas, escola se organiza, aos processos de ensino e apren-
como em qualquer escola. Porém, a tônica de exposi- dizagem e às funções que a escola desempenha no
ção não é a do universalismo, como ocorre na escola Movimento.
burguesa. Observa-se uma preocupação em explici- As disciplinas ministradas são as usuais para os
tar os possíveis vínculos existentes entre ideologia, cursos do mesmo gênero, e caracterizam a cultura, a
ciência e classes sociais, o que é mais evidente quan- tecnologia e a ciência contemporâneas. Contudo, um
do a organização da sociedade é o objeto de explica- enfoque de classe, nomeadamente a dos trabalhado-
ção. Esta questão remete-nos imediatamente à fun- res do campo, contrapõe-se ao universalismo abstra-
ção ideológica da escola. A função de transmissão de to dominante na escola oficial.
ideologia também se encontra no Instituto. Entretan- Uma das mudanças introduzidas mais importan-
to, a sua teleologia não é a legitimação da ordem es- tes é o modo de organização e funcionamento da es-
tabelecida, mas a reprodução e o fortalecimento do cola. Um sistema de poder baseado em uma demo-
Movimento segundo um ponto de vista determinado cracia direta, na autogestão ou gestão democrática
de classe social. partilhada por alunos, professores e funcionários, em
No ensino oficial, o vínculo entre a escola e o condições de igualdade inusitada na ordem social,
mundo do trabalho é forte porque a escola, em sua substitui a variante meritocrática da burocracia que
condição de habilitadora universal da força de traba- domina a escola pública, ou o despotismo imediato
lho, constitui uma peça essencial do mecanismo de da personificação do capital na escola privada.
reprodução do mercado de trabalho e, por último, da A articulação entre o ensino e o trabalho real é
extração do excedente econômico. uma outra modificação importante. A categoria de es-
A relação entre ensino e universo do trabalho no tudante, típica da escola capitalista, tende a dissol-
Instituto é outra. A categoria de estudante tal qual se ver-se, dando lugar à categoria de estudante-traba-
apresenta na escola oficial se desarticula. O aluno não lhador. Concomitantemente, as organizações
está destinado a integrar o mercado de trabalho. Uma econômicas do Movimento, sobretudo os vários tipos
vez concluído o curso, o aluno permanece em sua co- de cooperativas, afastando-se do economicismo da
munidade de origem, na qual já é um trabalhador, ou empresa tradicional, passam a partilhar com a escola
desloca-se para um outro setor no âmbito de atuação a responsabilidade pela educação.
do Movimento. Em qualquer dos casos, os critérios de Outra mudança diz respeito às funções sociais
alocação não estão presididos pela lei do valor e pela da escola. Uma das funções mais significativas da
extração do excedente econômico, mas sim pelos re- escola oficial é a habilitação da força de trabalho que
quisitos políticos do Movimento, bem como as neces- compõe o mercado de trabalho capitalista. O propó-
sidades de reprodução das comunidades de trabalho. sito do IEJC não é habilitar os estudantes para com-
por o mercado, embora os formados estejam prepara-
Conclusão dos para isso e possam fazê-lo. De fato, o trabalhador
estudante, uma vez terminado o seu curso, geralmen-
Os cursos do IEJC são reconhecidos pelo MEC te retorna para trabalhar em sua comunidade. Em al-
e atendem aos dispositivos impostos pela legislação guns casos o aluno formado no Instituto pode, tam-

Revista Brasileira de Educação 53


Neusa Maria Dal Ri e Candido Giraldez Vieitez

bém, ser alocado em outra unidade de produção que Nesse tipo de cooperativa reaparece, como um
não a sua de origem, dependendo das necessidades princípio de organização, a categoria de autogestão.
políticas, econômicas e técnicas do Movimento. A A premissa para o funcionamento da autogestão, ou
intersecção entre a escola e as organizações econô- gestão democrática, segundo a variante cooperativa,
micas não se dá pela mediação do mercado de traba- apresenta as seguintes determinantes básicas: a pro-
lho, mas sim por meio do estabelecimento de rela- priedade da terra por um coletivo de trabalhadores; a
ções diretas e orgânicas entre elas. supressão do trabalho assalariado; a distribuição igua-
Alguns pensadores, como Freire e Pistrak, exer- litária e ou eqüitativa dos rendimentos. Resumindo, a
cem influência na concepção pedagógica do MST. instauração de um modo de apropriação do exceden-
Freire insiste na necessidade da conexão entre a edu- te econômico que descarta a exploração econômica e
cação e a transformação da consciência do sujeito em a subordinação política dos trabalhadores, pilares tí-
consciência crítica, bem como na emancipação hu- picos do capitalismo. Portanto, esse tipo de organiza-
mana. Pistrak, criticando a utilização do trabalho na ção abre espaço para a vigência de formas igualitári-
escola como simples exercício educacional, preconi- as de produção e de distribuição, bem como para a
za a integração do ensino com o trabalho real na pro- autogestão dos trabalhadores.
dução. Esclarece-se, pois, a conexão existente entre a
A contribuição das teorias é real. Mas deve-se pedagogia e a prática política e econômica do MST.
ter em conta que a pedagogia em questão expressa as A autogestão pedagógica, uma categoria central, é a
características, as necessidades e os interesses da prá- reedição na escola da autogestão nas organizações po-
xis política e econômica do MST. líticas e, em parte, nas organizações econômicas de
Compelido a organizar a sobrevivência das fa- base do Movimento. A categoria de autogestão, na
mílias nos acampamentos e a produção nos assenta- medida em que expressa o controle da vida escolar
mentos, o MST chegou a formulações organizacio- pelos sujeitos imediatos da ação educativa, é demons-
nais que, embora tendo como referência essas distintas trativa das origens da educação de classe desenvolvi-
instâncias, confluem em pontos estratégicos. da no IEJC. A liquidação do trabalho assalariado, as-
No acampamento, a disciplina é rígida. A tecno- sim como sua substituição pelo trabalho associado,
logia social de organização empregada é a autogestão assinala a razão pela qual desaparecem o mercado de
do acampamento pelas famílias que o compõem. Essa trabalho e a função da escola como habilitadora da
tecnologia é uma variante radical dos parâmetros e força de trabalho. A formação de organizações eco-
procedimentos democráticos que historicamente di- nômicas, cujo objetivo primordial é a reprodução da
ferenciam as organizações populares das organizações comunidade de trabalho, rompe com o economicismo,
burguesas (Vieitez & Dal Ri, 2000b). o que possibilita a articulação solidária das coopera-
Nos assentamentos, o MST viu-se rapidamente tivas com as escolas e a conjugação do ensino com o
às voltas com os limites da pequena exploração agrá- trabalho real.
ria familiar num contexto de supremacia da grande A cooperativa de produção de trabalho associa-
propriedade fundiária e de economia-mundo. A pro- do representa hoje no Movimento a fronteira mais
posta formulada, visando a superação das limitações avançada de organização econômica e, num certo sen-
da pequena exploração familiar, é a cooperação, a qual tido, também política. Essa fronteira não reflete as
vem sendo encetada segundo patamares de organiza- diversas e contraditórias realidades que compõem o
ção e desenvolvimento bastante diversos. Na mais universo do Movimento, mas exprime uma tendência
radical das formas de cooperação experimentadas até programática ou o que pode vir a converter-se numa
o presente, de alcance ainda restrito, encontra-se a linha real de desenvolvimento. Isto é, a pedagogia
cooperativa de produção de trabalho associado. adotada pelo Instituto não exprime a realidade multi-

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A educação do movimento dos sem-terra

facetada e controversa do conjunto formado pelas ráter orgânico das suas várias instâncias é evidente.
unidades econômicas do MST, mas exprime o seg- De qualquer modo, Lopes sugere que a pedagogia do
mento mais avançado dessa realidade. MST é de valor geral para a emancipação dos traba-
Lopes, estudando um dos maiores assentamen- lhadores, o que nos remete a uma das questões deste
tos do MST, cujas cooperativas têm por base a pe- texto.
quena exploração privada familiar, surpreendeu-se As proposições pedagógicas do MST podem ser
com o comportamento conservador e o vigor do indi- aplicadas porque ele tem controle sobre o seu territó-
vidualismo e do mercantilismo manifesto por seus in- rio e, portanto, detém a autonomia para isso. Esse ter-
tegrantes, em razão do que apresenta a seguinte inter- ritório, que não deixa de ter expressão social e políti-
pretação: ca, é, no entanto, excêntrico à ordem social.
Recordemos as categorias principais da pedago-
[...] o próprio MST, centrando o cooperativismo como uma gia do Movimento que são o enfoque de classe, a
de suas principais estratégias de articulação do assenta- autogestão, a conjugação do ensino com o trabalho
mento – observando a questão a partir do caso em estudo – produtivo e o estudante-trabalhador.
acaba refém, como que numa armadilha, do próprio siste- Essas categorias educacionais, se aplicadas na
ma que, paradoxalmente, lhe garante ampliar as lutas para sociedade, significariam uma revolução pedagógi-
além da conquista da terra. Pelo viés econômico e pela ca, o que nos coloca no campo da utopia. Seja como
lógica produtivista que acabam sendo implementadas pela for, fica evidente que, ao se passar do contexto con-
prática cooperativista, o Movimento não faria mais que trolado pelo Movimento para o da sociedade inclu-
deslizar e reproduzir a mesma “redução da volta ao indiví- siva, passa-se da esfera de uma pedagogia que está
duo com a prevalência exclusiva do mercado”. (Lopes, 2002, sendo posta em prática, ainda que com restrições e
p. 324-325) sob pressão constante, para a esfera da aspiração po-
lítica. A questão subseqüente é inevitável. Esses prin-
Lopes, contudo, parece considerar que na agen- cípios são válidos quando se pensa numa ação con-
da cultural do Movimento, da qual faz parte a educa- tra-hegemônica geral e, portanto, na emancipação
ção, há um programa mais avançado, com um poten- das classes trabalhadoras?
cial contra-hegemônico e de emancipação que se A pedagogia do MST está sendo elaborada e im-
colocaria para além das limitações da vida econômi- plementada em íntima conexão com as realidades so-
ca que ele observou: ciais engendradas pelo Movimento. Se essas propos-
tas pedagógicas não tiverem a capacidade de transcender
Quando o Movimento se prescreve como sujeito coletivo a essa realidade específica, o seu aproveitamento por ou-
partir do indivíduo que produz vida e não exclusivamente tros trabalhadores fica comprometido. Porém, este não
mercadoria, parece-nos, a partir de nossas impressões no parece ser o caso, uma vez que essas proposições, inde-
[assentamento] Ireno Alves, que alcança maiores avanços pendente das realidades objetivas e subjetivas que estão
em termos de emancipação social: emerge a possibilidade em sua gênese, vão ao encontro de teses que são clássi-
de um projeto de construção de cultura, salta aos olhos o cas no pensamento pedagógico crítico.
conteúdo ministrado em suas escolas [...]. Talvez seja aí o Uma parte importante da pedagogia crítica vem
campo da ordem contra-hegemônica e efetivamente eman- postulando a importância da educação para o desen-
cipatória. (idem, p. 324) volvimento de uma consciência crítica e reflexiva nos
estudantes e professores. O objeto desse trabalho pe-
É pouco plausível que no MST o potencial con- dagógico é, antes de tudo, a subjetividade dos atores
tra-hegemônico e de emancipação possa evoluir se- educacionais. Essa subjetividade deve ser sensibili-
parado das atividades econômicas, uma vez que o ca- zada por meio dos conteúdos substantivos trabalha-

Revista Brasileira de Educação 55


Neusa Maria Dal Ri e Candido Giraldez Vieitez

dos no ato educativo, os quais implicam primordial- rência para o movimento popular mundial, o socialis-
mente conhecimentos e valores. mo real, o que parece haver no momento são mais
O que se entende por ensino crítico parece bas- perguntas do que respostas. Em todo caso, no proces-
tante impreciso no que diz respeito à avaliação socio- so de reflexão ora em curso, começam a aflorar algu-
lógica da ordem social, porém esse campo da ação mas teses que convém destacar, dados os percalços
educativa é o mesmo no qual se coloca o MST quan- históricos observados. Mészáros, por exemplo, em sua
do assume uma educação de classe. No entanto, na obra Para além do capital (2002), num esforço para
pedagogia do Movimento, as proposições relativas à tentar compreender o que houve de errado com as re-
dimensão objetiva do ensino, ou seja, as relações de voluções populares realizadas e fracassadas, afirma
produção pedagógicas encontram-se no mesmo pla- com toda a ênfase possível um dos princípios da au-
no de importância da dimensão subjetiva. É nesse togestão: ou a emancipação dos trabalhadores será
ponto que reside a maior originalidade da práxis edu- feita pelos próprios trabalhadores, ou não haverá
cativa do MST e, possivelmente, também o seu mais emancipação nenhuma.
importante aporte para uma concepção pedagógica
geral dos trabalhadores. NEUSA MARIA DAL RI é professora livre-docente no De-
Segundo essa perspectiva, a ação pedagógica partamento de Administração e Supervisão Escolar e no Progra-
deve buscar transformar estruturas, processos escola- ma de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Filosofia e
res e a própria função social da escola. A categoria Ciências da Universidade Estadual Paulista (UNESP – Campus
que sintetiza a proposta de mudança da pedagogia do de Marília), e coordenadora do grupo de pesquisa Organizações e
Movimento é a de gestão democrática ou de autoges- Democracia. Projeto de pesquisa atual: Educação nas organiza-
tão da escola por alunos, funcionários e professores. ções de trabalho associado. Publicou: DAL RI, N.M. (org.). Eco-
Os educadores do MST, nos espaços que têm à nomia solidária: o desafio da democratização das relações de tra-
sua disposição, estão implantando esse sistema orga- balho (São Paulo: Arte & Ciência, 1999); VIEITEZ, C.G., DAL
nizacional a partir das primeiras quatro séries do en- RI, N.M. Trabalho associado: cooperativas e empresas de auto-
sino fundamental. Como ficaria essa proposição se gestão (Rio de Janeiro: DP&A, 2001); VIEITEZ, C.G., DAL RI,
ela fosse trasladada como consigna de luta para o en- N.M. La economía social en Brasil. Revista de Economía Públi-
sino oficial público? Em última análise, a proposição ca, Social y Cooperativa. Cooperativismo y economía social en
conduziria à luta pela autogestão da escola pública América (Madrid: CIRIEC, nº 30, diciembre, p. 103-126, 1998).
por alunos, professores, funcionários, pais e outros E-mail: neusamdr@terra.com.br
membros da comunidade. Cairíamos com essa deman-
da em um extremismo? Pode ser. Em todo caso, as
CANDIDO GIRALDEZ VIEITEZ é professor doutor assis-
elites das classes dominantes já admitem a participa-
tente do Programa de Pós-Graduação em Educação na Faculdade
ção nas escolas públicas, o que, se por um lado signi-
de Filosofia e Ciências da UNESP (Campus de Marília), e coorde-
fica pouco, considerando os termos legais em que está
nador do grupo de pesquisa Organizações e Democracia. Projeto
formulada, por outro mostra que o tema é socialmen-
de pesquisa atual: Educação nas organizações de trabalho asso-
te significativo e que as aspirações dos trabalhadores
ciado. Publicou: VIEITEZ, C.G. Reforma nacional-democrática e
transcendem os limites da democracia parlamentar.
contra-reforma: a política do PCB no coração do ABC paulista –
Qual o potencial transformador da autogestão,
1956-1964 (Santo André: Fundo de Cultura do Município de San-
na forma como o MST a está implantando em suas
to André, 1999); VIEITEZ, C.G., DAL RI, N. M. Trabalho asso-
comunidades? Qual o potencial dessa proposição se
ciado: cooperativas e empresas de autogestão (Rio de Janeiro:
aparecesse como bandeira de luta do movimento po-
DP&A, 2001); VIEITEZ, C.G., DAL RI, N.M. La economía so-
pular por transformações profundas no sistema esco-
cial en Brasil. Revista de Economía Pública, Social y Cooperati-
lar? Diante da derrocada do que aparecia como refe-

56 Maio /Jun /Jul /Ago 2004 No 26


A educação do movimento dos sem-terra

va. Cooperativismo y economía social en América (Madrid: viver : os caminhos da produção não-capitalista. Rio de Janei-
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Revista Brasileira de Educação 57


Resumos/Abstracts

Palavras-chave: trabalhador rural; O Instituto de Educação Josué de Cas- takes as its motto such educational
participação; esfera pública tro, que tem como mantenedor o Insti- categories as the union between
The contribution of the ordinary tuto Técnico de Capacitação e Pesqui- education and work and democratic
man to the construction of the public sa da Reforma Agrária e é vinculado management processes in which
sphere: rural workers in Baturité – ao movimento dos sem-terra, constitui- students, teachers and school staff
State of Ceará se em uma escola de educação média e participate.
Analyses the participative experience of profissional. O objetivo desse texto é o Key-words: education; work; self-
the ordinary man – the rural landless de expor os elementos educativos prin- management
worker, lease-holder or tenant farmer – cipais presentes na escola, bem como
in public spaces like municipal councils, elucidar se a sua concepção educacio- Danilo Romeu Streck
associations of small producers and the nal, que parece ser a mesma vigente O Fórum Social Mundial e a agenda
Rural Workers’ Trade Union, in nas escolas controladas pelo MST, da educação popular
Baturité, a municipality of 30,000 contém elementos educacionais de in- Realiza uma leitura do III Fórum Social
inhabitants in the State of Ceará. The teresse para as classes trabalhadoras Mundial, a partir da perspectiva da edu-
research took as its starting point a em geral, do ponto de vista democráti- cação popular. Trata inicialmente dos
basic question: how does the ordinary co e popular. A investigação revelou objetivos e da dinâmica do Fórum para
man experience politics today? que o Instituto, estruturado e organiza- depois identificar temas que recompo-
Understanding politics as transgression, do de forma diferente daquela usual- nham a agenda da educação popular. O
dispute or the changing of positions, mente encontrada nas escolas oficiais, primeiro deles refere-se à necessidade e
achieved by means of discussion and coloca em epígrafe categorias educa- às possibilidades de a educação popular
demands, and by examining the cionais como a união do ensino com o ser pensada internacionalmente. O se-
possibility of constructing a public trabalho e a gestão democrática com- gundo trata da pluralidade de aportes e
sphere, the research followed partilhada entre alunos, professores e dos conseqüentes desafios epistemoló-
systematically the participative funcionários. gicos e metodológicos. Por fim, são
experiences of two rural communities, Palavras-chave: educação; trabalho; identificados alguns temas emergentes
which are characterised as State offers autogestão ou recorrentes, com base nas 1.286 ofi-
and as civil society conquests. The Education in the Landless Workers’ cinas oferecidas no Fórum.
participative dynamic is established by Movement Palavras-chave: Fórum Social Mun-
involving conflicting movements which The Josué de Castro Institute of dial; educação popular
at times are characterised as Education, sponsored by the Technical The World Social Forum and the
democratic and transparent relations Institute for Training and Research agenda for popular education.
between State and civil society and, at into the Agrarian Reform, which is This article presents a reading of the
others, as traditional relations based on associated with the landless workers’ III World Social Forum, based on a po-
authoritarianism and cordiality, salient movement, provides both secondary pular education perspective. It deals
features of Brazilian political culture. education and technical training. The initially with the goals and the dynamic
Although the material conquests of the aim of this paper is to explain the of the Forum and then identifies
associative experiences are limited, gra- principal features of this school, and themes which restructure the agenda
dual approximations to a style of to clarify whether its underlying for popular education. The first of
democratic being are experienced and educational premises, which seem to these refers to the need and the
these, in turn, signal the production of a be similar to those extant in the possibility of popular education being
legacy: the quest for citizenship and the schools under MST control, contain discussed internationally. The second
awareness of rights. educational characteristics which are deals with the plurality of
Key-words: rural worker; of interest to the working classes in contributions and the consequent
participation; public sphere general, from a democratic and epistemological and methodological
popular point of view. The challenges. Finally some of the
Neusa Maria Dal Ri e Candido investigation showed that the emerging or recurrent themes are
Giraldez Vieitez Institute, whose structure and identified based on the 1,286
A educação do movimento dos sem- organisation differ from those workshops offered during the Forum.
terra commonly found in state schools, Key-words: World Social Forum; po-
pular education

Revista Brasileira de Educação 181

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