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a | Sociedade e Gestão • Envelhecimento nas organizações

Envelhecimento
nas organizações:
preconceito ou
tendência?
A população brasileira está
se tornando mais velha e,
consequentemente, a força de
trabalho também. No entanto,
o preconceito contra esses
profissionais é cada vez maior.
Será que as organizações
estão preparadas para lidar
com essa nova realidade?

| Por Vanessa Martines Cepellos +


Maria José Tonelli +
Francisco Aranha +
João Lins Pereira Filho

| 24 GVexecutivo • V 12 • N 2 • Jul/dez 2013


Comprometimento, fidelidade, pontualidade, capacidade
de realizar diagnósticos e equilíbrio emocional são aspectos
positivos associados aos profissionais mais velhos

O
fato de que o Brasil está envelhecendo é Percepções sobre os
inegável. Para se ter uma ideia, de acor- profissionais mais velhos
do com o relatório Envelhecendo em um Os resultados da pesquisa apontaram que, de modo geral,
Brasil mais velho, divulgado recentemen- os gestores possuem uma percepção relativamente positiva
te pelo Banco Mundial (BIRD), em 1950, em relação aos profissionais mais velhos. Para eles, questões
os idosos com 60 anos ou mais represen- como comprometimento, fidelidade à empresa, pontualida-
tavam 4,9% da população total; em 2010, esse número de, capacidade de realizar diagnósticos precisos e equilíbrio
já havia saltado para 10,2% e, caso as projeções se con- emocional foram lembrados como pontos favoráveis associa-
firmem, no ano de 2050 eles irão corresponder a 29,7% dos aos colaboradores de mais idade.
dos brasileiros. Os gestores também avaliaram quais são os principais
O envelhecimento populacional implica diretamente no benefícios de se ter funcionários mais velhos compondo o
envelhecimento da força produtiva. Isso significa que, em ambiente de trabalho, e chegaram à conclusão de que eles
um futuro próximo, os empregos serão ocupados por pes- estão ligados à experiência profissional, à diversidade de
soas com mais de 45 anos, fato que exigirá iniciativas de ideias e à capacidade de disseminar a cultura e as condutas
gestão específicas às necessidades desses profissionais. esperadas pela organização.
Não há dúvidas de que o preconceito contra os mais ve- Apesar de predominar uma percepção relativamente po-
lhos é uma realidade. O ageism é o termo cunhado pelo sitiva sobre esses profissionais, alguns aspectos negativos
gerontologista Robert N. Butler, em 1968, para descre- também se fizeram presentes na avaliação dos gestores.
ver a discriminação etária que ocorre com adultos de ida- A  idade é associada à incapacidade de realizar trabalhos
de avançada. Juntamente com o sexismo e o racismo, o físicos pesados, dificuldade de adaptação às mudanças e às
ageism tem sido apontado como um problema nas empre- novas tecnologias, preferência por atividades que apresen-
sas nacionais e internacionais. tam menos desafios, inflexibilidade e falta de disposição
Em nosso país, a discussão a respeito do ageism e para receber treinamentos.
das práticas de gestão da idade ainda estão no início. Além disso, os entrevistados identificaram barreiras quanto
Entretanto, não se pode mais esperar para refletir a res- à integração dos colaboradores maduros com as equipes de tra-
peito do envelhecimento do profissional brasileiro devi- balho. Esses obstáculos estão ligados à proximidade da aposen-
do à velocidade com a qual o país está se tornando mais tadoria, percepções de limitações físicas e mentais, dificuldade
velho. A França, por exemplo, demorou mais de um sé- de se manterem atualizados segundo as necessidades do mer-
culo para dobrar a sua população idosa, ao passo que o cado, exigência de maiores salários e resistência para lidar com
Brasil terá essa mesma variação demográfica nas próxi- a liderança de profissionais mais jovens.
mas duas décadas. Apesar do reconhecimento das contribuições desses pro-
Será que as empresas no Brasil estão preparadas para esse fissionais, será que as organizações estão atuando de forma
desafio? Como são vistos, hoje em dia, os profissionais mais a valorizá-los em seu espaço de trabalho?
velhos que atuam nas organizações instaladas aqui?
Com o intuito de responder essas perguntas, a FGV-EAESP, Práticas de gestão da idade
em parceria com a PricewaterhouseCoopers (PwC), realizou As práticas de gestão são iniciativas que combatem as barrei-
uma pesquisa quantitativa com 138 gestores de Recursos ras impostas à idade e promovem a diversidade nas organiza-
Humanos de empresas atuantes no país e chegou a conclu- ções, colaborando para criar um ambiente no qual os funcioná-
sões intrigantes sobre a problemática. rios mais velhos são capazes de atingir o seu potencial.

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| Sociedade e Gestão • Envelhecimento nas organizações

É importante
Planejamento da força de trabalho Práticas de saúde e qualidade de vida implantar iniciativas
que promovam
a diversidade,
Conscientização sobre o envelhecimento
da força de trabalho colaborando para
um ambiente onde
funcionários com mais
Estratégias de retenção
e desenvolvimento
Estratégias de atração idade sejam capazes de
atingir O seu potencial

Na figura acima, o planejamento da força de trabalho preparação desse público para o desenvolvimento de uma
refere-se à análise dos dados demográficos da empresa, atividade autônoma.
considerando as projeções de aposentadoria e os índices
de turnover. Dessa forma, é possível estimar as necessida- Incoerências em evidência
des futuras de contratação da instituição. Embora na visão dos gestores os profissionais maduros
As práticas de saúde e qualidade de vida estão ligadas possuam mais conhecimento útil para o dia a dia da em-
à manutenção de uma equipe saudável e à reestruturação presa do que os jovens, práticas que tenham como foco a
do local de trabalho a partir do que os colaboradores mais transferência dessas informações não são adotadas. Apesar
velhos precisam. disso, ainda assim os gestores determinaram que alguns
As estratégias de retenção e desenvolvimento estão re- dos principais benefícios de se ter funcionários mais ve-
lacionadas à flexibilidade de jornadas de trabalho, tipos de lhos na empresa é a experiência técnica adquirida ao longo
atividades, envolvimento em programas de transferência da carreira, a diversidade de pontos de vista e a capacidade
de conhecimento, treinamentos e trabalhos compartilhados dessas pessoas em disseminar a cultura e os comportamen-
entre diferentes gerações. tos desejados pela organização.
Finalmente, as estratégias de atração implicam na revi- Não obstante os gestores acreditem que os mais ve-
são de métodos de recrutamento para torná-los mais com- lhos apresentam atributos como produtividade, con-
petitivos e adotar estratégias inovadoras. fiabilidade, comprometimento e pontualidade, veri-
As principais dimensões de boas práticas no ambiente ficou-se que, na maioria das vezes, as empresas não
corporativo podem ocorrer durante o processo de recruta- possuem uma postura proativa na contratação de pro-
mento, formação, desenvolvimento e promoção. Na pes- fissionais maduros ou que estão próximos da idade de
quisa, foi possível constatar que as atividades apresenta- se aposentar. Ou seja, eles pouco consideram um fun-
das geralmente não são implementadas nas empresas onde cionário com mais idade como alternativa de mão de
pessoas com mais idade atuam. obra, mesmo no contexto atual do país, em que a busca
Os resultados mostraram que práticas de saúde, que vi- por qualificação está intensificada.
sam minimizar os efeitos do envelhecimento, não são ado- Além disso, embora a saúde seja um tópico de impor-
tadas, assim como não existem políticas de remuneração tância para que os colaboradores sejam capazes de reali-
ou benefícios diferenciados aos mais velhos, nem a elabo- zar suas funções laborais, e apesar dos gestores acredita-
ração de treinamentos e campanhas especiais para a con- rem que uma das principais barreiras de se ter profissionais
tratação desses candidatos. Além disso, as empresas não mais velhos no ambiente de trabalho seja a questão das
trabalham com planos de carreira especializados ou a limitações físicas e mentais, não são aplicadas práticas

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relacionadas à manutenção da saúde do funcionário e à mostrou que esses estereótipos têm criado barreiras para a in-
prevenção de doenças. clusão dessas pessoas no mercado de trabalho. Para que essa si-
Essas incoerências são preocupantes para o futuro das or- tuação seja revertida, recomendamos as boas práticas de gestão
ganizações, pois apesar dos dados demográficos apontarem da idade apresentadas na figura da página anterior.
para o envelhecimento acelerado da população brasileira e, Em síntese, se considerarmos que estamos em um país
consequentemente, da força produtiva a partir de 2040, as que envelhece rapidamente, é preciso rever preconcei-
empresas mostram-se despreparadas para enfrentar esse ce- tos e revisar as políticas e práticas de gestão de pessoas
nário. Ademais, o ageism se fez presente a partir da evidência para adequar as empresas a um futuro que já está baten-
de práticas discriminatórias de emprego. do à porta.
Uma das mudanças necessárias é a de caráter cultural.
Os gestores devem ser educados e buscar conhecimento sobre Vanessa Martines Cepellos > Doutoranda da FGV-EAESP > vanessacepellos@hotmail.com
os profissionais com mais idade, a fim de não alimentarem es- Maria José Tonelli > Professora da FGV-EAESP > maria.jose.tonelli@fgv.br

tereótipos negativos e inviabilizarem sua atuação. A pesquisa


Francisco Aranha > Professor da FGV-EAESP > francisco.aranha@fgv.br
João Lins Pereira Filho > Professor da FGV-EAESP e Sócio da PwC > joao.lins@br.pwc.com

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