Você está na página 1de 100

Universidade do Minho

Instituto de Educação

Paulo Jorge Miranda Araújo O Ensino das Ciências Musicais e a Retórica: Discurso Musical no Período Barroco
Paulo Jorge Miranda Araújo

O Ensino das Ciências Musicais e a Retórica:


Discurso Musical no Período Barroco

UMinho|2016

julho de 2016
Universidade do Minho
Instituto de Educação

Paulo Jorge Miranda Araújo

O Ensino das Ciências Musicais e a Retórica:


Discurso Musical no Período Barroco

Relatório de Estágio
Mestrado em Ensino de Música

Trabalho realizado sob a orientação da


Professora Doutora Elisa Maria Maia Silva Lessa

julho de 2016
Nome: Paulo Jorge Miranda Araújo

Endereço eletrónico: pjmirandaa@gmail.com

Número de Cartão de Cidadão: 10858009

Titulo do Relatório: O Ensino das Ciências Musicais e a Retórica: Discurso Musical no Período
Barroco.

Orientadora: Professora Doutora Elisa Maria Maia Silva Lessa

Designação do Mestrado: Mestrado em Ensino de Música

Ano de Conclusão: 2016

É AUTORIZADA A REPRODUÇÃO INTEGRAL DESTE TRABALHO APENAS PARA EFEITOS DE


INVESTIGAÇÃO, MEDIANTE DECLARAÇÃO ESCRITA DO INTERSSADO, QUE A TAL SE
COMPROMETE.

Universidade do Minho ___ / ___________ / 2016

________________________________________

(Paulo Jorge Miranda Araújo)

ii
AGRADECIMENTOS
Um agradecimento especial à Professora Doutora Elisa Lessa, minha orientadora
e supervisora de estágio, pela orientação, apoio, otimismo e incentivo não só na
elaboração deste trabalho como também no meu crescimento pessoal e profissional.

Agradeço ao Conservatório de Música do Porto, cujos órgãos de gestão e


administração permitiram a concretização do meu estágio profissional em Música, ao qual
se refere o presente Relatório.

Aos professores cooperantes Sônia Marques e Nuno Rocha, pelo seu apoio e
aconselhamento da prática letiva.

Aos alunos das turmas com as quais trabalhei do Conservatório de Música do


Porto, no ano letivo 2015-2016, pela colaboração e empenho demonstrados ao longo de
todo o projeto.

Aos meus colegas de estudo, David Rodrigues e Leandro Monteiro, pelos


momentos partilhados e pelo incentivo constante ao longo destes dois últimos anos.

À Carina, em especial, pela paciência, carinho, incentivo, compreensão, apoio


constantes, sempre com um otimismo contagiante, nos momentos mais decisivos deste
trabalho.

iii
iv
RESUMO

O estudo intitulado “O Ensino das Ciências Musicais e a Retórica: Discurso Musical


no Período Barroco”, é uma abordagem à temática da retórica musical no ensino das
Ciências Musicais. Este projeto foi implementado no Conservatório de Música do Porto,
no âmbito do mestrado em Ensino de Música na Universidade do Minho. O trabalho
detém-se nas seguintes questões de investigação:1) o que é a retórica musical, 2) como
abordar com os alunos a problemática da retórica musical barroca, e 3) qual o contributo
da temática em estudo para a formação dos alunos. A metodologia utilizada nesta
investigação é de natureza qualitativa e os participantes foram os alunos de quatro turmas
das disciplinas de Iniciação Musical IV, Formação Musical (6º Ano/ 2º Grau e 9º Ano/ 5º
Grau) e História da Cultura e das Artes (11º Ano) do Conservatório de Música do Porto.
Em síntese, o estudo visa a compreensão a aplicação na didática das Ciências Musicais
das estruturas de discurso retórico nas obras do período musical do barroco, tendo em
conta que a retórica musical é uma temática pouco conhecida/ trabalhada pelos alunos;
que a retórica musical é um tema que se cruza com diversas disciplinas existentes no
currículo nomeadamente Filosofia e Português; que os alunos se interessam pela temática,
conseguindo estabelecer relações com as disciplinas supramencionadas e ainda pelo facto
do material de apoio pedagógico de suporte ser quase inexistente. O presente trabalho é
uma contribuição a uma possível abordagem ao universo da comunicação e organização
do pensamento musical.

Palavras-chave: Retórica Musical, Período Barroco, Didática das Ciências Musicais.

v
vi
ABSTRACT

The study entitled “The Education of Musicology and the Rhetoric: Musical
Discourse in the Baroque Period”, is an approach to the subject of musical rhetoric in
the teaching of Musicology. This project was implemented at the Oporto Music
Conservatory, within the framework of a Master's degree in Music Education at the
University of Minho. The study gives close attention to the following research questions:
1) what is music rhetoric, 2) how to deal with the issue of Baroque musical rhetoric with
students, and 3) what is the contribution of the subject matter at hand to the training of
students. The methodology used in this research is qualitative and participants were
students from four different classes studying Music Initiation IV, Music Training (grade
6 / level 2 and grade 9 / level 5) and History of Culture and Arts (Grade 11) at the Oporto
Music Conservatory. In short, the study aims to understand and apply the structures in
rhetoric discourse in the didactics of Musicology in the works of the baroque period,
taking into account that musical rhetoric is a subject that is often unknown / worked on
by students; understand that the musical rhetoric is a theme that overlaps with several
existing subjects in the curriculum including Philosophy and Portuguese; get students
interested in the subject, establishing relationships with the above mentioned subjects
taking into consideration that pedagogical support material is almost non-existent. This
study is a contribution to a possible approach to the world of communication and
organization of musical thought.

Keywords: Musical Rhetoric, Baroque Period, Didactics for Musicology.

vii
viii
ÍNDICE
ÍNDICE DE FIGURAS .................................................................................................. x
INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 11
I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO DA INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA ...... 13
1.1 A Retórica – Breves Apontamentos...................................................................... 13
1.2 A Teoria dos Afetos .............................................................................................. 18
1.3 Música e Retórica ................................................................................................. 24
1.3.1 As sete artes liberais: Trivium e Quadrivium ................................................. 24
1.3.2 Musica Poetica – Tratados ............................................................................. 25
1.3.3 Retórica Musical ............................................................................................ 27
1.4 Retórica – Análise do Discurso Musical ............................................................... 30
II – INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA ....................................................................... 39
2.1 Contexto geral de intervenção .............................................................................. 39
2.1.1 História e caracterização do Conservatório de Música do Porto ................... 39
2.1.2 Caracterização das turmas alvo de intervenção.............................................. 41
2.2 Observação de aulas .............................................................................................. 43
2.2.1 Formação Musical .......................................................................................... 46
2.2.2 História da Cultura e das Artes ...................................................................... 46
2.3 Plano Geral de intervenção ................................................................................... 47
2.3.1 Transdisciplinaridade no Ensino das Ciências Musicais................................ 47
2.3.2 Formação Musical .......................................................................................... 49
2.3.3 História da Cultura e das Artes ...................................................................... 55
2.3.4 Projeto Artístico “O Bandolim na Era Barroca” ............................................ 65
III – RECOLHA E ANÁLISE DE DADOS ................................................................ 69
3.1 Formação Musical ................................................................................................. 69
3.2 História da Cultura e das Artes ............................................................................. 71
IV – CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES .......................................................... 77
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................... 81
Anexo 1 .......................................................................................................................... 87
Anexo 2 .......................................................................................................................... 89
Anexo 3 .......................................................................................................................... 91
Anexo 4 .......................................................................................................................... 95

ix
ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 1- As Sete Artes Liberais .................................................................................... 25


Figura 2 - Para uma Análise Retórica ............................................................................. 32
Figura 3 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589)) ............. 33
Figura 4 - Excerto do Preludio nº 13 em Fá Maior “Tombeau” de Louis Couperin ...... 33
Figura 5 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) ............... 33
Figura 6 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) c. ........... 34
Figura 7- Excerto de Largo do Concerto nº5, BWV 1056, de Johann Sebastian Bach .. 34
Figura 8 - Excerto Responsório nº2 do Ofício dos Defuntos (1816) de José Maurício
Nunes Garcia. ................................................................................................................. 35
Figura 9 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) ............... 35
Figura 10 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) ............. 36
Figura 11 - Excerto do Behold a virgin shall conceive & O thou that tellest good tidings
to Zion do Messias de Haendel ...................................................................................... 36
Figura 12 - Excerto do Preludio nº 13 em Fá Maior “Tombeau” de Louis Couperin .... 36
Figura 13 - Excerto do Preludio nº 13 em Fá Maior “Tombeau” de Louis Couperin .... 37
Figura 14 - Figura 12 - Excerto do Vinea Fact Est, das Matinas e Vésperas de Sábado
Santo, de Manoel Dias de Oliveira ................................................................................. 37
Figura 15 - Aprendizagem Simultânea ........................................................................... 44

x
Introdução

INTRODUÇÃO
The union of music with rhetorical principles is one of the most
distinctive characteristics of Baroque musical rationalism and gave shape
to the progressive elements in the music theory and aesthetics of the
period (Buelow, s.d.).

O interesse por este tema foi-nos despertado desde a nossa formação de base, na
Unidade Curricular de História da Música e Análise Musical do período Barroco. Uma
das características deste período é a Teoria dos Afetos, que embora merecesse um
destaque na UC não nos satisfez e sentimos necessidade de o aprofundar.

O tema surgiu ainda durante as primeiras observações de aulas, em que nos


apercebemos que a incidência desta temática nos conteúdos da Disciplina de História da
Cultura e das Artes era demasiado reduzida. As razões do pouco tempo despendido
devem-se sobretudo ao demasiado volume de conteúdos a serem lecionados, incluindo
apenas uma breve abordagem à Teoria dos Afetos. Para que a abordagem desta temática
possa ampliada e compreender de uma forma mais assertiva o pensamento musical e as
obras do período Barroco, e conhecer a respetiva Retórica Musical.

Tendo em conta que a Retórica Musical está umbilicalmente ligada à Filosofia na


Grécia Antiga, nos temas abordados no programa do 11º Ano de Filosofia Argumentação
e retórica, Argumentação e Filosofia como também através do Racionalismo de René
Descartes abordado no conteúdo Estatuto do conhecimento científico (Barros, Henriques,
& Vicente, 2001), e contém um forte paralelismo com a Disciplina de Português do 10º/
11º Ano no módulo Do Renascimento ao Pré-Romantismo, especificamente na
elaboração retórica literária dos Sermões do Padre António Vieira (Campos, Grosso,
Loureiro, Pascoal, & Seixas, 2002), torna-se imperativo relacioná-la com estas disciplinas
aproveitando e direcionando o conhecimento prévio dos alunos deste tema através da sua
génese literária/ filosófica como também na sua contemporaneidade.

Com esta investigação pretendemos responder a questões como: O que é a retórica


musical, como trabalhar com os alunos a problemática da retórica barroca, qual o
contributo da temática em estudo para a formação cultural e profissional dos alunos. Para
concretização dessas respostas teremos que esclarecer a relação da Retórica Musical com
os temas desenvolvidos na disciplina de Filosofia da Grécia Antiga e do racionalismo do

11
Introdução

século XVII, compreender a forma das obras musicais à luz de uma análise retórica e
compará-la com a estrutura retórica de um sermão do Padre António Vieira.

O trabalho de investigação que apresentamos, O Ensino das Ciências Musicais e


a Retórica: Discurso Musical no Período Barroco está organizado em quatro capítulos.

No primeiro capítulo abordamos de forma sintética uma revisão da literatura sobre


Retórica desde a antiguidade clássica até à Idade Média, a Teoria dos Afetos, um
enquadramento da disciplina da Retórica no curriculum académico medievalista até se
tornar em Musica Poetica e a sua sistematização enquanto corpus para a composição
musical e, por último, ferramentas para uma realização de análise musical numa
perspetiva retórica.

O segundo capítulo, intitulado Intervenção Pedagógica, incide na


contextualização do local de intervenção (Conservatório de Música do Porto), a
caracterização das turmas alvo do projeto, a Intervenção Pedagógica ocorrida nas mesmas
como também a exposição e implantação do projeto artístico “O Bandolim na Era
Barroca”.

No terceiro capítulo, Recolha e Análise dos Dados, analisamos e interpretamos os


resultados obtidos, de acordo com as questões formuladas.

No quarto e último capitulo, apresentamos as conclusões deste estudo.

12
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO DA INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA

1.1 A Retórica – Breves Apontamentos

O Grande Dicionário da Língua Portuguesa indica que:

Retórica (è), s.f. (do lat. Rhetorica ). A arte de bem falar. || A arte que expõe as
regras para bem dizer ou falar eloquentemente; conjunto dessas regras; a arte do
orador. ||A aula em que se ensina essa arte. || Tratado ou livro que contém as regras
da oratória. || Expansão eloquente; exibição de meios oratórios. || Tudo aquilo de que
nos servimos no discurso para produzir bom efeito no público, para persuadir os
ouvintes. || Afectação da eloquência; discurso empolado e pomposo. || Discurso
pobre de ideias, embora possa ser brilhante na forma. […] Fazer retórica, falar ou
escrever com estilo empolado e em grande opulência de forma […] Figuras de
retórica, artificio de linguagem que modifica a expressão do pensamento, para a
tornar mais viva, mais enérgica ou mais compreensível (Machado, 1981, p. 338).

Segundo Reboul “[A] retórica é anterior à sua história, e mesmo a qualquer


história, pois é inconcebível que os homens não tenham utilizado a linguagem para
persuadir” (Reboul, 2004, p. 1). O que está determinado é a invenção da técnica retórica.
Esta técnica retórica (doravante chamaremos sempre retórica), originou-se em Siracusa,
na ilha da Sicília por volta do ano de 465 a.C.. Esta origem foi devida a uma guerra civil
em que os cidadãos viram retiradas as suas terras pelos tiranos Gélon e Hiéron. Após a
guerra civil, os verdadeiros donos das terras as reclamaram e entraram num processo
judicial. Para oferecer meios de persuasão aos litigantes, Córax e o seu discípulo Tísias
publicaram uma “coletânea de preceitos práticos que continha exemplos para usos de
pessoas que recorressem à justiça” (Reboul, 2004, p. 2). Dá-se também a Córax a primeira
definição da retórica, «a arte da persuasão». De estreitas ligações com Sicília, a Magna
Grécia adotou rapidamente a arte retórica. Para isso contribui em grande parte Górgias,
discípulo de Empédocles como também o foi Córax que, partindo da ilha siciliana para
Atenas no ano de 427 a.C., deslumbrou os cidadãos de Atenas com a sua prosa. A sua
prosa aproximava-se da poesia devido aos recursos estilísticos utilizados como (…)
“assonâncias, rimas, paronomásias, ritmo da frase […] perífrases, metáforas, antíteses”
(…) (Reboul, 2004, p. 4). Atenas, em meados do século V a.C. e em plena instituição da

13
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

democracia, necessitava de cidadãos hábeis na arte de bem falar e persuadir para fazer
valer o seu ponto de vista na vida pública.

É neste contexto que surgem os sofistas, que mediante uma remuneração,


ensinavam aos jovens cidadãos a técnica do discurso através da análise de poesia,
definição de partes do discurso e estudo de estilos de debate. Para isso, elaboraram (…)
uma espécie de modelo acrónico, ou melhor, uma certa conjunção de concepções
epistemológicas e éticas” (…) (Barilli, 1979, p. 13), fazendo os primeiros (…) “esboços
de gramática, bem como a disposição do discurso e um ideal de prosa ornada e erudita”
(…) (Reboul, 2004, p. 9). Os fundamentos da retórica sofística baseavam-se na forma e
não no conteúdo, onde o discurso não apresentava uma realidade objetiva, valendo-se da
sua forma/ técnica para persuadir e ganhar o auditório como o apresenta Górgias no seu
diálogo com Sócrates:

Quanto mais se soubesse tudo, Sócrates, a retórica, por assim dizer, abrange o
conjunto das artes, que ela mantém sob sua autoridade. Vou apresentar-te uma prova
eloquente disso mesmo. Por várias vezes fui com meu irmão ou com outros médicos
à casa de doentes que se recusavam a ingerir remédios ou a deixar-se amputar ou
cauterizar; e, não conseguindo o médico persuadi-lo, eu o fazia com a ajuda
exclusivamente da arte da retórica. Digo mais: se na cidade que quiseres, um médico
e um orador se apresentarem a uma assembleia do povo ou a qualquer outra reunião
para argumentar sobre qual dos dois deverá ser escolhido como médico, não contaria
o médico com nenhuma probabilidade para ser eleito, vindo a sê-lo, se assim o
desejasse, o que soubesse falar bem. E se a competição se desse com representantes
de qualquer outra profissão, conseguiria fazer eleger-se o orador de preferência a
qualquer outro, pois não há assunto sobre que ele não possa discorrer com maior
força de persuasão diante do público do que qualquer profissional. Tal é a natureza
e a força da arte da retórica! (Platão, Górgias, 2010).

Sócrates (470-399 a.C.) distanciou-se da retórica sofista ao promover primeiro o


autoconhecimento e só depois a arte de bem falar, e, a retórica não entrava nos domínios
da arte sendo uma habilidade prática e empírica. Já Platão (428/427-348/347 a.C.)
valorizava a filosofia sobre a retórica estando na filosofia a descoberta da verdade,
enquanto a retórica, na sua generalidade, destinava-se a ganhar argumentos através de
manipulação e alguma desonestidade.

14
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

Foi Aristóteles (384 a.C.-322 a.C.) que organizou de forma alargada a retórica,
sistematizando-a em quatro partes (…) “que representam as quatro fases pelas quais
passam quem compõe um discurso” (…) (Reboul, 2004, p. 43): Invenção, Disposição,
Elocução e Ação.

Invenção [heuresis]

Invenção é a procura do tema que se vai tratar no discurso. Estes temas podem ser
três como Aristóteles enuncia:

As espécies de retórica são três em número [deliberativo, judicial e epidíctico]; pois


outras tantas são as classes de ouvintes dos discursos. Com efeito, o discurso
comporta três elementos: o orador, o assunto de que fala, e o ouvinte; e o fim do
discurso refere-se a este último, isto é, ao ouvinte (Aristóteles, 2005, p. 104).

O tipo deliberativo serve para lidar com assuntos públicos que irão acontecer no
futuro tratando o orador de convencer o público a concordar ou a discordar de um
argumento. O tipo judicial serve para lidar com a acusação ou a defesa de episódios que
aconteceram no passado. Finalmente, o tipo epidíctico lida com a homenagem ou a crítica
individual.

Depois do tema estar decidido, deve-se encontrar instrumentos de persuasão, os


argumentos. Estes são o ethos, o pathos e o logos:

 Ethos: é a dimensão relativa ao carácter do orador. Este deve ser virtuoso e


credível para conseguir a confiança do seu auditório.
 Pathos: é a dimensão relativa ao auditório. Este deve ser emocionalmente
impressionado e seduzido.
 Logos: é a dimensão relativa aos argumentos, ao discurso. O discurso deve
estar bem estruturado do ponto de vista lógico-argumentativo, para que a
tese se imponha como verdadeira.

(Borges, Paiva, & Tavares, 2014, p. 96)

Para um discurso persuasivo torna-se necessário um leque de etiquetas (Topoi),


que funcionam como um esquema de argumentação transversal a todos os géneros de
discursos.

Disposição [taxis]

15
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

Independentemente da categoria temática, Aristóteles dividiu o corpo principal de


um discurso em quatro partes, de forma semelhante a Córax, estabelecendo exórdio ou
introdução, narração, confirmação e peroração. Exórdio é a parte inicial do discurso, na
tentativa de conquistar o auditório. A narração é a parte devotada à exposição dos factos
que mais interessam ao orador. A confirmação (…) “uma parte nitidamente mais longa
[…] [traz] […] um conjunto de provas, seguido por uma refutação (confutatio), que
destrói os argumentos dos adversários” (…) (Reboul, 2004, p. 57). A peroração é a parte
final do discurso, onde o orador conclui de forma categórica.

Elocução [lexis]

A parte em que se redige o discurso e passam as ideias a estarem fixas. O orador


deve escrever bem, ou seja, num bom vernáculo, orientado para o tema para que este seja
o mais persuasivo possível. Para isso, deve escolher bem o estilo que se adapta melhor ao
assunto que vai tratar. Também deve adaptar o estilo do seu discurso ao auditório a fim
de se tornar claro e convencer o público da sua causa. Por último, o orador deve (…)
“mostrar-se em pessoa no seu discurso, ser colorido, alerta, dinâmico, imprevisto,
engraçado ou caloroso, numa palavra, vivaz” (…) (Reboul, 2004, p. 63).

Ação [hipócrisis]

A ação é o culminar do discurso retórico, quando o orador se apresenta diante do


seu público e através da sua interpretação leva este ao encontro do que diz.

Após a conquista da Grécia pelo Império Romano, a retórica foi introduzida em


Roma, tendo tido um rápido desenvolvimento. O tratado de autor anónimo Rhetorica ad
Herennium (c. 85 a.C.) e os sete tratados de Cícero (106-43 a.C.) como também o tratado
Institutio oratoria (92-94 d.C.) de Quintiliano (35-100 d.C.) organizaram
sistematicamente os conteúdos didáticos, latinizando os termos do discurso retórico. As
fases traduziram-se em Inventio, Dispositio, Elocutio e Pronuntiatio, e foi acrescentada a
fase da Memoria. As definições das quatro fases da elaboração do discurso retórico
latinizadas são as mesmas dos gregos só definindo a Memoria como um processo de
interiorizar as informações com o intuito de falar de improviso (Mccreless, 2002, pp. 849-
850). O corpo principal do discurso mantém-se em seis partes, mas com termos latinos:
exordium, narratio, partitio, confirmatio, refutatio e peroratio, mantendo também as suas
definições. Para Cícero, os objetivos da retórica são docere, movere e delectare, ou seja,
a (…) “capacidade de atingir o entendimento (ensinar), de mover os afetos e a vontade

16
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

(inclinar), de estimular os sentidos (deleitar)” (…) (Massimi, 2008, p. 55) e o orador deve
possuir, além das técnicas da retórica, uma fundamentação filosófica e ética.

Com o declínio do Império Romano do Ocidente, a retórica política foi também


desvanecendo, mas, foi sendo apropriada e reinventada pelo primeiro Cristianismo,
mudando de paradigma, do político para o religioso. A igreja, depositária da cultura e
retórica do Império Romano, rejeitou os autores pagãos de retórica, mas (…) “não podia
deixar esses meios de persuasão em mãos de adversários” (…) (Reboul, 2004, p. 77) e,
para fazer uma leitura produtiva da Bíblia, cheia de recursos retóricos, tinha que
compreender a arte que rejeitava, como postula Santo Agostinho (354-430):

É um facto, que pela arte da retórica é possível persuadir o que é verdadeiro e o que
é falso. Quem ousará, pois, afirmar que a verdade deve enfrentar a mentira com
defensores desarmados? Seria assim? Então, esses oradores, que se esforçam por
persuadir o erro, saberiam desde o proémio [exórdio] conquistar o auditório e torná-
lo benévolo e dócil, ao passo que os defensores da verdade não o conseguiriam?
(Agostinho, 2002, p. 208).

A utilização da retórica por Santo Agostinho tinha como fim ensinar a verdade
cristã pelo uso de eloquência e, para isso, valia-se dos autores antigos como Cícero,
citando-os com frequência. A retórica desenvolveu-se na Idade Média sobretudo sob a
alçada e desígnios da Igreja, mas também na literatura profana. A educação secular
medieval incluía, nos seus currículos de estudos académicos nas universidades, a retórica
englobando-a no Trivium, que compreendia outras duas disciplinas, a gramática e a
lógica. Pertencendo ao Quadrivium estavam as disciplinas de música, aritmética,
geometria e astronomia. Estas, o Trivium e o Quadrivium, compreendiam as setes artes
liberais. A retórica deixou de ter uma participação com um auditório, ou seja, um discurso
público e voltou-se para as artes literárias, a poesia e a prosa (Mccreless, 2002, p. 850).

A retórica, desvalorizada para as suas disciplinas irmãs do Trivium, (…) “alcanzará


un papel preponderante durante os siglos XV, XVI y XVII, tanto na arte da enseñanza
como en el de la cultura” (…) (Hernández & García, 2005, p. 91). Para isso contribuíram
as descobertas dos autores latinos como Cícero e Quintiliano, que levaram os humanistas
a revalorizarem a retórica grega pois esta era a geradora das formas e dos conteúdos e
também dos adornos, dos textos clássicos. O campo da retórica alargou-se a outros
campos e a outras disciplinas com natural incidência na literatura e de forma
preponderante na música.

17
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

1.2 A Teoria dos Afetos

Desde sempre existiu uma clara tentativa de representar em música algo exterior
a ela. Segundo Harnoncourt (1995) pode indicar-se quatro linhas de aproximação: 1)
imitação acústica, 2) representação musical de imagens visuais, 3) retrato musical de
pensamentos e emoções e 4) música como linguagem (Harnoncourt, 1995, p. 118).
Destas, a última foi explorada exaustivamente pelos compositores barrocos.

Porém, a palavra música, como a entendemos atualmente, tem a sua génese


etimológica da palavra grega mousiké, que no período clássico significava «a arte das
musas» e, estava intrinsecamente ligado com as ciências do saber (matemática, geometria
e astronomia), e incorporando todas as artes como a poética, a prosa, o teatro, a dança e
a música.

Platão (427 a.C. -347 a.C.) na sua obra “A República”, através do diálogo entre
Sócrates e Gláucon1, discrimina as harmonias (ou modos medievais) que farão a boa
formação de guerreiros e as que, pelo seu carácter, atraem atitudes e comportamentos
inadequados a um estado ideal. Assim, as harmonias menos viris e as de carácter mais
ébrio são excluídas, pois umas são lamentosas e as outras festivas e apropriadas para os
banquetes. Nestas englobam-se as mixolídia e sintonolídia, quanto ao aspeto menos viril
ou lamentoso, e umas variedades da jónia e da lídia, próprias da preguiça e da moleza. As
harmonias ótimas para uma boa educação são a dória e a frígia que traduzem na perfeição
a coragem, a força e o bom senso pedidos a um guerreiro. Mesmo com estas duas
harmonias, basilares na educação dos jovens, não se deve praticar música em excesso,
pois assim condicionará a sua personalidade tornando-a mais mole e efeminada, e
acontecerá exatamente o contrário, com uma personalidade bruta e rude, se só exercitar o
corpo na ginástica. Assim, o equilíbrio ideal para a educação de um indivíduo é entre a
música e a ginástica, cada uma na sua justa parte, trabalhando o corpo no ginásio e a
mente nas aulas de música. Também é feita a distinção entre a música de Apolo, associada
a instrumentos de corda como a khitara2, de sons sóbrios e pacificadores, próprias para
uma educação regrada e de acordo com as harmonias atrás referidas, e a de Dionísio, com

1
Irmão mais velho de Platão.
2
Cítara – instrumento de cordas.

18
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

a sonoridade excitante e vibrante do aulos3, mais próxima da diversão e do relaxamento


inerentes aos desvios de carácter. Esta dicotomia notava-se nas grandes festas gregas: o
apolíneo, utilizado em grande escala nas festas Apolíneas, e o dionisíaco nas festas
Dionisíacas. Platão, sem entrar em pormenores musicais de natureza técnica, observa
como a música pode influenciar profundamente a personalidade de um indivíduo e assim,
com a educação através desta e da ginástica, encontra um equilíbrio na formação de
cidadãos ideais (Platão, 2001).

Discípulo de Platão e professor na sua academia, Aristóteles (384 a.C. – 322 a.C.),
em particular no livro VIII da sua obra “Política”, alargou o estreito espectro das
harmonias sugeridas pelo seu mestre, acrescentando à música um carácter lúdico e não só
educacional, como seu mestre fez. Para ele, a educação musical teria um objetivo de
cultivar o gosto pela música, que se tornará transversal durante toda a vida. Esta educação
musical não teria tanto impacto nos músicos profissionais, mas sim naqueles que a fruem
e assim veicular formas mais fáceis de partilha e de prazer na sua audição. Não reduzindo
a música só ao seu deleite, distingue três tipos de melodias: as éticas, as de ação e as
entusiásticas. Estas duas últimas são as ideais para apreciar enquanto os outros tocam, ora
procurando entretenimento nas de ação, ou de catarse (katharsis4) nas entusiásticas. Para
a educação, as que melhor se adequam são as melodias éticas, indo ao encontro do
pensamento de Platão. Quanto à aprendizagem dos instrumentos na escola, Aristóteles
aconselha como limite de idade a infância, pois é pouco digno os homens livres serem
instrumentistas profissionais, e tentou abolir as audições dos alunos com as suas peças de
difícil técnica a fim de não criar entusiasmo nas crianças. Os instrumentos a aprender
seriam os de sopro (aulos), a que ele não se refere como prejudiciais à educação, ao
contrário dos de corda (khitara) que deveriam ser retirados da educação (Strunk, 1950).

Na Idade Média, o texto e a música atuavam em conjunto para servir a adoração,


contemplação e doutrinação religiosa, os modos e os ritmos eram escolhidos de acordo
com o que se pretendia, de acordo com a herança grega, como Santo Agostinho postula:

O deleite da minha carne, ao qual não convém entregar a mente, que por ele seria
necessariamente enfraquecida, engana-me muitas vezes, quando o sentimento não
acompanha a razão de modo a ir resignadamente após ela, mas além disso, uma vez

3
Instrumento de sopro de palheta dupla.
4
Katharsis - no século IV a.C. significa assumir a vontade dos deuses. Procura obter a purificação através
de emoções fortes.

19
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

que mereceu ser admitido por causa dela, tenta até ir adiante e guiá-la. Assim, sem
me dar conta, peco nestas coisas e depois dou-me conta disso. (...). Quando me
lembro das minhas lágrimas, que derramei perante os cânticos da Igreja, nos
primórdios da recuperação da minha fé, e quando mesmo agora me comovo, não
com o canto, mas com as coisas que se cantam, quando são cantadas com uma voz
clara e uma modulação perfeitamente adequada, reconheço de novo a grande
utilidade desta prática. Assim, flutuo entre o perigo do prazer e a experiência do
efeito salutar, e inclino-me mais, apesar de não pronunciar uma opinião irrevogável,
a aprovar o costume de cantar na igreja, a fim de que, por meio do prazer dos ouvidos,
um espírito mais fraco se eleve ao afeto da piedade. Todavia, quando me acontece
que a música me comova mais do que as palavras, confesso que peco de forma a
merecer castigo e, então, preferiria não ouvir cantar. (Confissões. X, 33)

O texto e a música atuavam em conjunto para servir a adoração, a contemplação e


a doutrinação religiosa e, como na Grécia Clássica, os modos e os ritmos eram escolhidos
de acordo com a finalidade objetiva funcional da música.

Com a gradual relevância das disciplinas linguísticas no Renascimento e a paralela


humanização do pensamento musical, o texto expressivo levou a uma redução do peso da
musica theorica (música especulativa). A preocupação latente do compositor
renascentista deveria incidir na expressão dos afetos através do texto, adequando as
palavras com a música de forma harmoniosa, equilibrada, deixando de lado a capacidade
desta no despertar de afetos no ouvinte. Este equilíbrio entre música e texto foi perturbado
quando o texto ganhou demasiada preponderância resultando no maneirismo musical.

O compositor/ teórico barroco procurava com a música despertar e mover espírito


humano, criando afetos e demarcando-se do período anterior, que os espelhava
passivamente. Como refere Bartel:

To the Renaissance affectus exprimere the Baroque added affectus movere. It was
no longer enough simply to present the affection objectively through the music: the
listener was to be drawn into the drama of the presentation, to be emotionally
affected himself. The Baroque composer wanted to move the listener to a heightened
emotional state (Bartel, 1997, p. 32).

Para o ouvinte ficar num estado emocional intensificado surge um conceito barroco
dos afetos em que o compositor trabalhava, de forma racional/ calculada, para uma dada
reação emocional do ouvinte, controlando o seu estado emocional através do poder da

20
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

música. O afeto desejado poderia ser despertado através de um modo apropriado ou de


uma tonalidade, de um compasso ou ritmo juntamente com todo o arsenal de métodos e
artifícios retóricos. Ou seja, os compositores e teóricos barrocos, para o melhor despertar
de sentimentos e dos afetos, racionalizaram os conceitos tornando-os objetivos e
codificando-os numa linguagem puramente musical.

De uma grande quantidade de obras literárias barrocas concernentes ao tema, Les


Passions de l'âme5 (1649) de René Descartes foi a primeira tentativa moderna para
desenvolver uma teoria sistematizada e abrangente dos afetos, bem como uma das mais
influentes no mundo artístico da época sendo obrigatória para conhecer a visão barroca
sobre os afetos.

Descartes distingue entre alma e corpo, em que o corpo é explicado racionalmente


(através de processos mecânicos) e a alma localizada no cérebro na glândula Pineal,
comandando-a e assim provocando as paixões. Segundo o sistema cartesiano, existem
quatro temperamentos humanos, nomeadamente sanguíneo, melancólico, fleumático e
colérico concatenados com os elementos da Terra: ar, terra, água e fogo e determinam-se
por uma combinação de dois dos quatro atributos principais: quente e frio, húmido e seco.
Cada temperamento também está associado a um certo fluido corporal ou humor,
produzido por um órgão.

O temperamento humano está de acordo com a sua fisiologia, determinado em


parte, no momento do nascimento através dos astros. A idiossincrasia revelava-se na
conjugação equilibrada destes fatores, reagindo diferentemente a qualquer estímulo
afetivo externo. Este estado de equilíbrio altera-se quando se é despertado para
determinados afetos por estímulos, neste caso a música, provocando diferentes reações
dos ouvintes. Então, um modo ou tonalidade pode despertar a um indivíduo um
determinado afeto e a outro um diferente.

Embora não existisse uniformidade na atribuição de temperamentos diferentes a


diferentes modos/ tonalidades, teóricos e compositores versaram sobre a temática e
propuseram relações como sintetiza Cano (2000):

5
Editado em português com o titulo As Paixões da Alma. Este foi o último texto filosófico de René
Descartes, publicado no ano de 1649.

21
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

CHARPENTIER MATTHESON RAMEAU


(1643-1704) (1681-1764) (1683-1764)
Dó Maior Alegre, guerreiro Cólera, Raiva, impertinencia Vivo, jubilante
Dó menor Deprimido, triste Doçura transbordante, tristeza Ternura,
intensa lamentação
Ré Maior Alegria, raiva Obstinação, acuidade, escândalo, Vivo, jubilante
beligerância, animação
Ré Menor Solene, devoto Calma, religiosidade, Doçura, tristeza
[religioso] grandiloquência, alegria refinada
Mi bemol Maior Cruel, duro Agudeza, seriedade, reflexão,
lastimoso
Mi bemol menor Horror, espanto
Mi menor Afeminado, amoroso e Reflexão, profundidade, tristeza, Doçura, ternura
lacrimoso expressa dor
Fá Maior Fúria, cólera Generosidade, resignação, amor Tempestuoso,
raiva
Fá menor Deprimido, magoado Ansiedade, desespero, fragilidade, Ternura,
relaxado lamento,
deprimente
Fá sustenido menor Tristeza profunda, solidão,
languidez
Sol Maior Doce, jovial Insinuação, persuasão, brilho, Canções ternas
alegria e alegres
Sol menor Severo, magnificente Graça, complacência, nostalgia Ternura, doçura
moderada, alegria e ternura
moderadas
Lá Maior Jovial, pastoral Lamentação, comovedor, tristeza Vivacidade,
regozijo
Lá menor Terno, lacrimoso Choro, nostalgia, dignidade,
relaxado
Si bemol Maior Magnificente, jovial Diversão, ostentação Agitação, raiva
Si bemol menor Deprimido, terrível Extroversão Canções tristes
Si Maior Duro, lacrimoso
Si menor Solitário, melancólico Raro, temperamental, melancolia,
mudança de humor constante
Traduzido a partir de (Cano, 2000, p. 67)

O ritmo, compasso e pulsação também foram examinados, explicados e aplicados na


composição musical de acordo com as suas propriedades afetivas, como também os vários
tipos de danças e outras composições. Cano (2000) sintetiza desta forma as interpretações
de Johann Mattheson no seu tratado Der Vollkommene Capellmeister6 (1739) em relação
ao tempo musical/ andamento:

 Adagio: tristeza  Afetuoso: amor


 Lamento: lamento  Allegro: consolo
 Lento: alivio  Presto: desejo
 Andante: esperança

6
Tradução do titulo para português “O Maestro de Capela Perfeito”. Este tratado contempla a descrição
mais detalhada e abrangente da conceção musical segundo as prescrições da retórica.

22
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

A alguns tipos de danças e composições:

 Minueto: alegria moderada  Rondeau: firmeza e convicção


 Gavota: alegria jubilosa  Sarabanda: ambição
 Bourrée: contentamento,  Courante: doce esperança
satisfação, indiferença e laxismo  Allemande: espírito contente e
 Rigaudon: deliciosa coqueteria feliz que se deleita na calma e na
 Marcha: heroísmo e valentia ordem
 Entrée: altivez e majestosidade  Fantasia: imaginação
 Giga inglesa: ardente e  Chacona e Passacaglia: saciedade
precipitada; ansiedade, raiva  Intrata: promessa
efémera.  Sonata: complacência: cada um
 Louvre: altivez e pomposidade encontrará o afeto, de acordo com
 Canarie: desejo o movimento indicado (adagio,
 Giga italiana: velocidade e andante, presto, etc.)
ímpetos extremos  Concerto grosso: sensualidade,
 Polonaise: sinceridade e inveja, vingança e ódio
franqueza  Sinfonia: o mesmo do resto da
 Angloise: obstinação obra
 Passepied: frivolidade  Abertura: nobreza

As tonalidades, o ritmo/ compasso e o texto (quando cantado) são as primeiras


indicações/ prescrições que um compositor deveria considerar para alcançar um
determinado afeto com a composição musical. Embora em algumas indicações os teóricos
barrocos não sejam concordantes, essas diferenças esbatem-se no panorama geral,
obtendo-se uma certa homogeneidade, não variando da alegria para a tristeza o afeto
proposto para uma certa tonalidade.

23
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

1.3 Música e Retórica

1.3.1 As sete artes liberais: Trivium e Quadrivium

A existência de um vocabulário comum entre a disciplina de retórica e música


como tropo, colores, clausula, cópula, diminutio e variatio, a utilização de figurae
(ornamentos retóricos de estilo presentes no elocutio), e a utilização de recursos
mnemónicos como a mão Guidoniana como forma de memorizar as figuarae musicais
são certamente pontos com algum contacto entre a retórica literária e a musical.

No período renascentista, os compositores utilizaram, de forma isolada, a projeção


afetiva do texto, o uso de acordes em suspensão (fermata) em palavras-chave, a elegância
no texto poético, assim como a preocupação latente da expressão musical das palavras, a
gramática, as cadências, o ritmo utilizado entre outros, denotando uma ligação mais
próxima com a retórica, vitalizada pela descoberta dos tratados de Cícero e de Quintiliano
neste período (Wilson, s.d.).

Tal como na Antiguidade clássica, a música, na educação medieval, estava


associada ao Quadrivium das sete artes liberais. Esta configuração é creditada a Boécio
(480-524), filósofo romano e educador que veiculou a conceção Pitagórica da música, ou
seja, uma disciplina intimamente relacionada com relações matemáticas, sendo por isso
especulativa, teórica. No seu tratado, De institutione musica, define três categorias de
música: Musica Mundana na sua dimensão cosmológica; musica humana na sua relação
com o corpo e o espírito humanos; e musica instrumentalis, a relação entre música e os
instrumentos.

Este conceito de música como uma arte matemática mudou no início do século
XVI, sendo o estudo da música abordado em duas perspetivas diferentes. Ao Quadrivium
pertenciam as disciplinas matemáticas, com o número na sua génese. O conhecimento
procurado através destas disciplinas é racional e a música é abordada na sua dimensão
matemática pitagórica, sendo a manifestação sonora desta. Os músicos que abordavam a
música por esta perspetiva consideravam-se superiores aos músicos práticos.

No Trivium encontram-se as disciplinas dedicadas à palavra, ou seja, à linguagem.


A musica practica, sendo uma aplicação prática da música foi considerada com uma
relação mais estreita com as disciplinas da palavra. Quem pertencia à musica practica era

24
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

compositor, dirigia os coros e ensinava a sintaxe musical como também Latim e Retórica,
estando assim muito próximos do Trivium (Bartel, 1997).

Esta divisão da música seria aumentada por Nicolaus Listenius no seu tratado
Musica (1537), ao acrescentar a musica poética às duas existentes. A nova disciplina
voltava-se para o ensino da composição musical e, naturalmente, a retórica tornou-se a
fonte desta (Cano, 2000).

Septem artes liberales

Quadrivium:
Trivium:
Arithmetica
Grammatica
Musica Musica
Rhetorica
Geometrica
Dialectica
Astronomia

Musica theorica Musica practica

Ars cantus Ars compositionis


Ars executionis (Musica poetica)

Figura 1- As Sete Artes Liberais (Liao, 2015, p. 20)

A musica theorica radicada no Quadrivium relaciona-se intimamente com a


matemática como a musica practica, na sua dimensão aplicada une-se à retórica. Nesta
configuração das disciplinas das universidades teria sido instruído o músico (compositor
ou cantor) e apreendido esta dimensão poética da música.

1.3.2 Musica Poetica – Tratados

Segundo Cano “El término “poética” (del griego “crear”) se refiere a la


teorización, normativización, sistematización e invención de instrucciones,
conocimientos y recursos técnicos con los cuales cuenta el artista durante el proceso de
creación” (Cano, 2000, pp. 38-39). Os tratadistas pré-barrocos e barrocos sistematizaram
e normalizaram a Musica Poetica. Passaram da utilização da terminologia retirada da
retórica literária a uma conceção da música seguindo os princípios retóricos. Segundo
Bartel (1997), os mais importantes tratadistas e seus respetivos tratados, são os seguintes:

25
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

Joachim Burmeister (1564-1629) Hypomnematum musicae poeticae (1599)


Musica autoschediastike (1601)
Musica Poetica (1606)
Johannes Nucius (ca. 1566-1620) Musices Poeticae (1613)
Joachim Thuringus (?-?) Opusculum Bipartitum (1624)
Athanasius Kircher (1601-1680) Musurgia Universalis (1650)
Christoph Bernhard (1628-1692) Tractatus compositionis augmentatus (ca.
1660)
Ausführlicher Bericht vom Gebrauche der
Con – und Dissonantien (?-?)
Wolfgang Caspar Printz (1641-1717) Phrynis Mytilenaeus (1676-79)
Johann Georg Ahle (1651-1706) Sommer-Gespräche (1695)
Tomás Baltazar Janovka (1669-1741) Clavis ad Thesaurum magnae artis
musicae (1701)
Mauritius Johann Vogt (1669-1730) Conclave thesauri magnae artis musicae
(1719)
Johann Gottfried Walther (1684-1748) Praecepta der musicalischen Composition
(1708)
Musicalisches Lexicon (1732)
Johann Mattheson (1681-1764) Der vollkommene Capellmeister (1739)
Meinrad Spiess (1683-1761) Tractatus musicus compositorio-practicus
(1745)
Johann Adolf Scheibe (1708-1766) Der critische Musikus (1745)
Johann Nikolaus Forkel (1749-1818) Allgemeine Geschichte der Music (1788-
1801)
(Bartel, 1997, pp. 93-164)

Todos estes tratados têm temas em comum, embora em alguns não sejam
abordados todos eles. Dos assuntos principais destacam-se a estreita relação com a
retórica, o seu contributo significativo como função pedagógica e o caráter divino da
música, de acordo com a doutrina luterana onde se manifestou com grande expressão.

26
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

1.3.3 Retórica Musical

A partir das fases de construção de um discurso (Invenção, Disposição, Elocução,


Memória e Representação/ Ação), Joachim Burmeister, no seu tratado Musica Poetica de
1606, adaptou-a para a composição musical e estabeleceu três partes na estrutura do
Dispositio/ Disposição: Exórdio (Exordium), Corpo da Composição e Conclusão como
também uma lista de figuras musicais a serem utilizadas pelo compositor como assegura
Harrison:

Burmeister's analysis of Lassus's In me transierunt perfectly illustrates an


analysis based on principles of secondary rhetoric. The analysis consists of a
division of the text into sections using the rhetorical terms exordium, confirmatio,
and epilogue as well as a listing of musical figures (Harrison, 1990, p. 4).

Desde o tratado de Joachim Burmeister (1566-1629) foram escritos vários


tratados, mas foi o tratado de Johann Mattheson de 1739, Der volkommene Capellmeister,
o mais elaborado e discricionário da utilização da Retórica Musical na composição, com
um receituário de estruturas retóricas musicais a serem utilizadas pelo compositor
(Bukofzer, 1939). Segue-se uma exposição do que se trata nas fases de composição
musical.

Inventio – Invenção

Para a composição é necessário obter ideias ou argumentos musicais adequados.


O sistema funcional do Inventio musical denomina-se loci topici, (…) “conceito de tópico
[que] vem da retórica aristotélica. Esse conceito concerne a um sistema pelo qual se obtém
argumentos eficazes com o mínimo de informações disponíveis. […] A fórmula loci-
topici, pela qual os tópicos eram designados, apresentava uma série de estratégias
composicionais para a produção do discurso musical” (Duarte, 2006, p. 48). Para
Matheson, haviam 15 topi-lopici diferentes:

Locus notationis Locus effectorum


Locus descriptionis Locus adjunctorum
Locus generis et specie Locus circumstantiarum
Locus totius et partium Locus comparatorum
Locus causae efficientis Locus oppositorum

27
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

Locus causae materialis Locus exemplorum


Locus causae formalis Locus testimoniorum
Locus causae finalis

(Cano, 2000, pp. 76-77)

Dispositio – Disposição

Dispositio é a estruturação do discurso, como ordenar o(s) lopi-topici do inventio


para obter mais impacto e assim mais persuasão. Nas palavras de Cano:

La dispositio musical es una infraestructura, un ordenamiento subyacente que


permite entender cada momento musical como parte funcional de un todo orgánico
y se vincula directamente con el discurso musical en acción, es decir, en el mismo
instante en que se percibe como sonidos distribuidos en el tiempo, dirigidos en un
espacio y a un público específicos (Cano, 2000, p. 88).

A estrutura (flexível) do dispositio literário compreende Exordium, Narratio,


Propositio, Confutatio, Confirmatio e Peroratio, como já referido anteriormente, assim
como a musical, embora sofresse pequenas alterações na sua aplicação. Na sua aplicação
prática é o esboço da composição, as linhas gerais.

Exordium – introdução ao tema musical com a finalidade de captar a atenção do público


e preparar para o que vem a seguir. Para Bartel (…) “this might take the form of a prelude
to a fugue or […] an opening ritornello in an aria or concerto (Bartel, 1997, p. 81)”.

Narratio – a definição ou afirmação do tema e a sua natureza. Pode ser a entrada da voz
numa aria ou a entrada do instrumento solista num concerto. Este pode ser incorporado
no Propositio.

Propositio – como o narratio pode ser incorporado no propositio. Numa fuga pode ser a
primeira reexposição do sujeito. Apresenta o propósito da composição.

Confutatio, Confirmatio – confutatio ou refutatio faz alterações substanciais ao tema com


cromatismos, modulações entre outros, afastando-se do tema, refutando-o e depois com
uma resolução eficaz o eleva. Confirmatio afirma o tema através de repetições mais ou
menos variadas. Podem ser dois processos contrastantes, mas com o mesmo objetivo,
reforçar e elevar o tema principal através da sua discussão.

28
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

Peroratio – a conclusão da composição podendo ser através da repetição do exordium ou


ritornello.

Elocutio – Elocução

No elocutio ou decoratio ocorre o ajuste da escrita ao esboço prévio, obtido do


dispositio. Para tornar a composição musical mais apelativa ou mais persuasiva
acrescentam-se alterações, ornamentações, entre outros. No discurso literário é a escolha
acertada das palavras como também das figuras de estilo e na composição musical é a
escolha de figuras retóricas musicais. Para Cano a figura retórica musical:

Es el proceso de transgresión a la regla musical que provoca que, en un contexto


determinado, la forma “correcta” de la realización musical, ceda su lugar a otra de
carácter sorpresivo, inesperado, inusitado y extracotidiano que se propone ofrecer al
discurso musical belleza, refinamiento, elegancia, atractivo y, sobre todo, se propone
mover los afectos del oyente (Cano, 2000, p. 109).

Uma figura musical opera basicamente de quatro modos: adição, subtração ou


supressão, permutação e substituição. Podem ser classificadas segundo a sua hierarquia,
o seu estilo e os elementos musicais afetados.

Classificação por hierarquia

Nucius (1613) divide as figuras em dois grandes grupos:

A) Figurae principalis: fuga, commisura, repetitio.

B) Figurae minus principalis: climax, complexio, syncopatio, homoioteleuton.

Classificação por estilos

Segundo Bernhard (1660), as figuras classificam-se pelos seguintes estilos:

A) Stylus gravis: polifonia religiosa tradicional. Prima prattica.

B) Stylus luxurians communis: música de câmara. Seconda prattica.

C) Stylus luxurians theatralis: ópera, oratório, cantata, etc.

Classificação por elementos musicais afetados

Figuras que afetam a melodia:

 Figuras de repetição.

29
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

 Figuras descritivas: Hypotiposis

Figuras que afetam a harmonia:

 Figuras de dissonância
 Figuras de acordes

Figuras que afetam vários elementos:

 Por adição
 Por subtração
 Por permutação e/ou substituição

(Cano, 2000, pp. 117-121)

Memoria – Memória.

A memória é importante para quem executa/ interpreta música, recorrendo a


sistemas mnemónicos para melhor assimilar. No período barroco, a música era para a
contemporaneidade e como tal não era necessário memorizar peças do passado, e não
tendo tempo para memorizar as do imediato. Mas pode considerar-se o Baixo Contínuo
um sistema mnemónico.

Pronuntiato – Representação/ Ação

Representação, ou seja, a forma de executar a composição musical foi bastante


importante para vários compositores do período barroco, como François Couperin,
deixando várias indicações para uma forma correta de tocar. François Couperin e J.S.
Bach deram indicações precisas de como executar as suas obras bem como se deviam
estudar, mostrando uma forte preocupação com a representação do seu discurso musical
(Benedetti, 2012).

1.4 Retórica – Análise do Discurso Musical


A retórica é a arte da persuasão e assim, qualquer análise retórica deve começar
com uma única pergunta: “Qual é o objetivo persuasivo no discurso ou na composição?”
Esta pergunta leva a outras questões de que se destaca: “Quais os meios retóricos pelo
qual o orador/ compositor se recorre para tornar o seu discurso/ composição o mais
persuasivo/a possível?” (Anderson, 2012, p. 39).

30
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

Como já foi supramencionado, ao longo do período barroco os princípios da


retórica eram prescritivos: eles forneceram técnicas de rotina para o processo de
composição em vez de técnicas descritivas para uma análise. Assim, para realizar uma
análise eficaz, torna-se necessário desconstruir uma composição à luz dos seus princípios
prescritivos (Bent & Pople, 1980).

Como sintetiza Bartel (1997), um compositor, na fase do inventio, primeiramente


escolhe um tema que será a base para evocar um determinado afeto. Em segundo lugar,
determina a tonalidade de acordo com o afeto pretendido. Em terceiro, escolheria o ritmo
(compasso) e a métrica adequada. Se o compositor trabalhasse num texto pré-
determinado, este sugeriria de acordo com a sua natureza, uma certa tonalidade, um ritmo
e obviamente a métrica. Para uma composição vocal, a análise naturalmente começará
pelo texto. No caso das composições instrumentais, em que as palavras não ajudam para
determinar o tema ou afeto pretendido, o ritmo e o andamento serão determinantes como
também a tonalidade. No caso das Suite de dança, os diferentes compassos, ritmos e
andamentos utilizados estão conotados com um determinado afeto.

Depois de determinar o género de inventio, a análise deve incidir no dispositio, ou


seja, como a composição se apresenta estruturada. Para isso, torna-se necessário uma
análise à estrutura harmónica para melhor compreender as partes do discurso musical.
Com uma estrutura harmónica realizada torna-se mais óbvia a segmentação em partes do
discurso musical, seguindo as prescrições dos teóricos da época. Como já referido
anteriormente, o Exordium faz a introdução ao tema musical, o Narratio define ou afirma
o tema e a sua natureza, o Propositio (que pode ser incorporado no narratio) reafirma o
tema, o Confutatio (Refutatio) e o Confirmatio em que o primeiro faz alterações
substanciais ao tema com cromatismos, modulações entre outros e o segundo assegura o
tema através de repetições mais ou menos variadas e, por último, o Peroratio, a conclusão
da composição.

Para finalizar, identifica-se as figuras retóricas utilizadas na composição,


associando-as ao afeto pretendido no geral como também no seu particular. Se uma
composição é alegre e festiva, naturalmente as figuras retóricas terão esse carácter na sua
generalidade, mas o compositor, com a intenção de reforçar a alegria e a jovialidade pode
utilizar outras menos próprias a esse afeto desejado. Nas composições vocais analisam-
se as figuras retóricas de acordo com o afeto presente no texto.

31
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

Segue um esquema de como proceder a uma análise retórica:

Análise Musical numa Perspetiva Retórica

Determinação do Inventio e/ou dos afetos pretendidos


Natureza do texto (se a composição for vocal)
Tonalidade
Compasso
Andamento
Métrica

Estrutura do dispositio
Análise harmónica
Exordium - pode ser o prelúdio que antecede a fuga, o próprio sujeito da fuga, o ritornello
inicial numa aria ou concerto.
Narratio e Propositio - pode ser a entrada da voz ou do instrumento solista num concerto.
Confutatio - passagens contrastantes com utilização de suspensões, cromatismos.
Confirmatio - repetições variadas e inventivas do Propositio/ Narratio.
Peroratio - a conclusão da composição que pode ser a repetição do ritornello inicial, do
exordium ou uma passagem pedal.

Análise do Elocutio
Determinação das Figuras Musicais

Figura 2 - Para uma Análise Retórica

32
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

Seguem alguns exemplos de figuras retóricas comumente utilizadas, e o seu significado


afetivo7:

Catabasis – Passagem musical descendente, que expressa imagens ou afetos negativos,


de lamento, submissão ou humildade.

Figura 3 – Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) com uma Catabis nos compassos 2 e 3
(Rodrigues, 2006, p. 41)

Figura 4 - Excerto do Preludio nº 13 em Fá Maior “Tombeau” de Louis Couperin (Persone, 1996, p. 93)

Suspiratio – Expressão musical de um suspiro através de uma pausa.

Figura 5 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) com um Suspiratio no compasso 18
(Rodrigues, 2006, p. 42)

7
No capítulo III, Definitions and Translations of the Musical-Rhetoric Figures, do livro Musica Poetica do
autor Dietrich Bartel (Bartel, 1997, pp. 165-438) e na seção Registro de Figuras do livro Música y Retórica
en el Barroco do autor Rubén López Cano (Cano, 2000, pp. 123-237) tem uma lista e definição
pormenorizada das Figuras Musicais.

33
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

Saltus duriusculus – Salto dissonante.

Figura 6 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) com um Saltus Duriusculus no compasso
27 (Rodrigues, 2006, p. 45).

Figura 7- Excerto de Largo do Concerto nº5, BWV 1056, de Johann Sebastian Bach com um Saltus Duriusculus
entre o compasso 3 e o 4 (Lanzoni, 2013)

34
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

Passus Duriusculus – Ocorre quando a voz sobe ou desce meio-tom.

Figura 8 - Excerto Responsório nº2 do Ofício dos Defuntos (1816) de José Maurício Nunes Garcia.

Auxesis – Repetição de uma passagem musical um tom acima.

Figura 9 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) com um Auxesis no solo dos compassos
19 e 20 (Rodrigues, 2006, p. 44)

35
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

Circulatio – Série geralmente oito notas de forma formação circular ou senoidal.

Figura 10 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) com um Circulatio na voz no texto
Agnus Dei, Filius Patris (Rodrigues, 2006, p. 42)

Noema – Passagem homofónica inserida numa textura de contraposição.

Figura 11 - Excerto do Behold a virgin shall conceive & O thou that tellest good tidings to Zion do Messias de
Haendel (Mateus, 2016, p. 47)

Interrogatio – pergunta musical.

Figura 12 - Excerto do Preludio nº 13 em Fá Maior “Tombeau” de Louis Couperin (Persone, 1996, p. 93)

36
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

Anabasis – Passagem musical ascendente, expressando imagens positivas.

Figura 13 - Excerto do Preludio nº 13 em Fá Maior “Tombeau” de Louis Couperin (Persone, 1996, p. 94)

Aposiopesis – Pausa ou silêncio inesperado.

Figura 14 - Figura 12 - Excerto do Vinea Fact Est, das Matinas e Vésperas de Sábado Santo, de Manoel Dias de
Oliveira (Soares & Neto, 2014)

37
Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

38
Intervenção Pedagógica

II – INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA

2.1 Contexto geral de intervenção

2.1.1 História e caracterização do Conservatório de Música do Porto

O projeto O Ensino das Ciências Musicais e a Retórica: Discurso Musical no


Período Barroco foi implementado no Conservatório de Música do Porto (CMP), que é
uma escola pública do Ensino Artístico Especializado em Música e é, conjuntamente com
todos os outros conservatórios e escolas artísticas públicas, um setor específico do nosso
sistema educativo.

O CMP surgiu para responder a uma necessidade de criar uma instituição pública
destinada ao ensino de Música, na cidade do Porto. Esta necessidade foi despoletada
desde a segunda metade do século XIX, após a criação do Conservatório Nacional de
Lisboa em 1835 e foram feitas várias tentativas por nomes insignes como Carlos Dubbini
ou Ernesto Maia.

Porém, o CMP foi fundado somente no século XX, em reunião de 1 de junho de


1917, por votação unânime do senado da Câmara Municipal e inaugurado no dia 9 de
dezembro de 1917, sendo o mérito reconhecido ao diretor de orquestra e pianista
Raymundo Macedo. Logo no ano letivo de inauguração do CMP, matricularam-se 339
alunos, para os cursos de Piano, Violino e Violeta, Violoncelo, Canto, Instrumentos de
Sopro e Composição, sendo o corpo docente constituído por 12 professores entre os quais
Raymundo Macedo, Moreira de Sá e Luís Costa.

O acervo bibliográfico e documental, as obras de arte, instrumentos e objetos


pessoais de personalidades da nossa história constituem o seu património, bem como os
espólios de Guilhermina Suggia e Nicolau Ribas, doados a esta instituição.

A necessidade de instalações com maior capacidade e com mais potencial para


responder à procura de formação artística, aliado às (re)organizações consequentes do 25
de abril de 1974, levaram a que fosse possível uma transferência do CMP para um
palacete municipal8, a partir de 13 de março de 1975.

8
O Palacete Municipal pertenceu à família Pinto Leite e situa-se no nº13 da Rua da Maternidade na cidade
do Porto.

39
Intervenção Pedagógica

Embora o edifício e jardins envolventes fossem repletos de qualidade e beleza,


não conseguiam responder às necessidades de espaço que o CMP precisava. No sentido
de responder à procura exponencial deste tipo de ensino bem como assumir outros
regimes de frequência, o CMP mudou de instalações, passando a ocupar a área oeste da
Escola Secundária Rodrigues de Freitas, a partir do dia 15 de setembro de 2008, até à
atualidade.

Hoje em dia, tem mais de 1000 alunos matriculados, desde o primeiro ciclo até ao
final do ensino secundário. Dado que se trata de uma escola de Ensino Artístico
Especializado em Música, é necessário que os alunos (com idades compreendidas entre
os 6 e os 23 anos) realizem provas de admissão/ aferição. Os critérios de seleção baseiam-
se exclusivamente nas suas aptidões musicais, independentemente do estatuto
socioeconómico das suas famílias ou da sua área de residência. É importante salientar que
o CMP não consegue dar resposta ao elevado número de estudantes que anualmente
procuram ter acesso, não só pelo número (ainda) limitado de meios físicos (salas de aula
ou outros espaços e equipamentos) como também de recursos humanos (professores e
pessoal não docente).

Deste modo, a escola (re)orientou conceções relativas a normas de organização e


de oferta formativa, nomeadamente o alargamento da frequência a outros regimes.

Assim, os alunos podem matricular-se escolhendo um de diversos regimes de


frequência que a legislação atual (Decreto-Lei n.º 344/90 de 2 de novembro) admite,
nomeadamente: a) regime integrado; b) regime supletivo e c) regime articulado.

a) regime integrado: quando os alunos obtêm a formação geral e a formação


específica (neste caso música) na mesma escola.

b) regime articulado: quando os alunos obtêm a formação geral numa outra escola
e integram o CMP neste regime para aprender música. É a solução mais adequada para
estudantes que vivem fora da cidade pois permite uma maior facilidade de gestão do seu
horário e do seu currículo. Por exemplo, o CMP tem um horário bastante alargado,
funcionando das 8h20 às 22h20 de 2ª a 6ª, e das 8h20 às 13h20 ao sábado. Este
prolongamento noturno conduz a uma panóplia de escolhas de horários, principalmente
para as famílias cujos filhos frequentam duas escolas. O CMP não cede apoio
socioeducativo a estes alunos pois cabe à escola que leciona a formação geral prestar este
tipo de apoio.

40
Intervenção Pedagógica

c) regime supletivo: quando os alunos frequentam o ensino especializado de


música numa escola para esse efeito independentemente das habilitações que possuem.

Por exemplo, o ano letivo de 2013/ 2014, de 1053 alunos, 545 frequentaram o
regime supletivo, 445 o integrado e apenas 63 o regime articulado.

É fundamental realçar que a escolha de estudar música, qualquer que seja o


regime, tem algumas implicações, nomeadamente o trabalho individual e continuado por
parte dos alunos em casa; apresentações públicas (concertos, audições, concursos, provas
e exames), algumas delas fora da escola; acompanhamento, compreensão e envolvimento
dos encarregados de educação. Para os alunos que não têm possibilidade de adquirir o seu
próprio instrumento musical, o CMP cede por empréstimo (Conservatório de Música do
Porto, 2016) (Rocha, 2007) (Conservatório de Música do Porto, 2016).

2.1.2 Caracterização das turmas alvo de intervenção

A prática pedagógica supervisionada desenvolveu-se no Conservatório de Música


do Porto, ao longo do ano letivo 2015/2016 dividindo-se em duas fases distintas: uma
fase de observação e uma fase de intervenção. A observação das aulas iniciou-se no final
do mês de outubro em níveis diferentes: Formação Musical ao 4º, 6º e 9º Ano e História
da Cultura e das Artes a uma turma de 11º Ano, lecionadas respetivamente pelos
professores cooperantes Nuno Rocha e Sónia Marques. A fase de observação revelou-se
fundamental no sentido de uma compreensão da realidade das turmas alvo para uma
melhor formulação de planificações, estratégias e metodologias adequadas a cada turma.
Para esta compreensão foram também de enorme importância, as informações obtidas por
parte dos professores cooperantes.

Formação Musical 6º Ano A/ 2º Grau

A turma de Formação Musical do 6º Ano A em regime de ensino integrado da


escola Conservatório de Música do Porto do ano letivo 2015/2016 é constituída por 11
alunos, 6 elementos do sexo feminino e 5 elementos do sexo masculino entre os 11 e 12
anos de idade. Todos os alunos frequentam o curso básico de Música de interpretação.

Das informações cotejadas ao longo do ano, de observação direta de aulas e


transmitidas pelo professor cooperante, constatou-se que a turma apresenta níveis
díspares de conhecimento das matérias, salientando-se dois/três elementos que

41
Intervenção Pedagógica

sobressaem em relação aos demais. Doravante, a turma exibe capacidades suficientes para
a assimilação dos conteúdos da disciplina.

De uma forma geral, o ambiente na sala de aulas é saudável, propiciando a


aprendizagem só contrariado algumas vezes por dois/ três alunos, que por vezes iniciam
conversas paralelas perturbando o normal funcionamento da disciplina.

Formação Musical 4º Ano/ Iniciação IV

O primeiro turno de Formação Musical do 4º Ano em regime de ensino integrado


da escola Conservatório de Música do Porto do ano letivo 2015/2016 é constituída por 12
alunos, 4 elementos do sexo feminino e 8 elementos do sexo masculino entre os 9 e 10
anos de idade. Todos os alunos frequentam o curso básico de Música de interpretação.

O segundo turno é constituído por 12 alunos, 5 elementos do sexo feminino e 7


elementos do sexo masculino, também entre os 9 e 10 anos e também frequentam o curso
preparatório de Música de interpretação.

Através das informações recolhidas da observação direta ao longo do ano como


também das partilhadas pelo professor cooperante, constatou-se que a turma apresenta
níveis similares de conhecimentos dos conteúdos, sobressaindo 4 elementos em cada
turno com uma facilidade de aprendizagem e assimilação de conhecimentos acima da
média.

A nível comportamental, é uma turma calma, que acata e entusiasma-se com os


conteúdos da disciplina, respondendo maioritariamente de forma positiva. Como na
generalidade, existem alunos mais introvertidos e alguns mais expansivos, mas não
interferem de forma significativa no desenrolar normal da aula.

Formação Musical 9º Ano B/ 5º Grau

O primeiro turno de Formação Musical do 9º Ano B em regime de ensino


integrado da escola Conservatório de Música do Porto do ano letivo 2015/2016 é
constituído por 12 alunos, 4 elementos do sexo feminino e 8 elementos do sexo masculino
entre os 14 e os 15 anos. Todos os alunos frequentam o curso preparatório de Música de
interpretação.

42
Intervenção Pedagógica

O segundo turno é constituído por 12 alunos, 4 elementos do sexo feminino e 8


elementos do sexo masculino entre os 14 e 15 anos e também frequentam o curso
preparatório de Música de interpretação.

Através de observação direta no momento de lecionação, constatou-se que o


primeiro turno tem conhecimentos díspares em relação aos conteúdos da disciplina.
Quanto ao nível de comportamento mostraram-se sempre atentos, sem conversas
paralelas nem comentários impróprios a uma sala de aula.

O segundo turno demonstrou ser bastante diferente tanto ao nível de


conhecimentos como ao nível comportamental. O nível de conhecimentos é inferior ao
primeiro turno, com algumas assimetrias entre alunos. Ao nível do comportamento é um
turno bastante expansivo nas atitudes, demonstrando menos motivação que o primeiro,
existindo conversas paralelas e comentários pouco próprios a uma sala de aula.

História da Cultura e das Artes 11º Ano

A turma de História da Cultura e das Artes é constituída por dezassete alunos (6


alunos e 11 alunas) sendo uma turma heterógena. As idades estão compreendidas nos
16/17 anos com exceção de uma aluna que já é maior de idade. A turma é muito unida
notando-se, por exemplo, no apoio aos colegas com maior dificuldade na aprendizagem.
Da totalidade da turma destacam-se algumas alunas com uma capacidade de
aprendizagem acima da média como também alguns alunos com maior dificuldade na
aprendizagem, mas na generalidade da turma salienta-se que existe um à vontade na
aprendizagem dos conteúdos da disciplina. A escolha da disposição física dos alunos na
sala de aula é por parte dos alunos e estes escolheram juntar pares de alunos bons com
alunos regulares, ajudando desta forma os colegas e demonstrando a referência anterior
sobre a união da turma.

2.2 Observação de aulas

A composição era ensinada a partir da invenção de um motivo (muitas vezes


como estereótipo), passando pela estrutura global, até à execução e
ornamentação (inventio, dispositio, elaboratio, decoratio), assim como pela
divisão em secções ou frases (incisiones, periodi) e pelo uso de flores de retórica
para determinadas representações (do texto), chamadas figuras (Michels, 2007,
p. 305).

43
Intervenção Pedagógica

O período da História da Música a que o autor se refere sobre o ensino da


composição musical é naturalmente o Barroco, instruída através dos princípios retóricos
levando a uma produção musical assente nestes mesmos. Como estes princípios retóricos
foram basilares na composição do barroco musical e doravante na sua música, tudo
levaria a crer que o ensino das Ciências Musicais na atualidade, lhe dedicasse um espaço
na lecionação de acordo com essa importância. O preencher desta lacuna norteou a Prática
Pedagógica com o objetivo de dar a conhecer os fundamentos/características da retórica
musical. As turmas comtempladas para a aplicação deste projeto, como referido
anteriormente, são Iniciação IV, 2º Grau/ 6º Ano e 5º Grau/ 9º Ano em Formação Musical
e 11º Ano em História da Cultura e das Artes. Como as disciplinas são de natureza
diferente e os alunos compreendem idades em fases de desenvolvimento diferentes o tema
também foi abordado de forma bastante díspar.

Assim, em Formação Musical procurou-se conduzir a lecionação a partir de uma


aprendizagem simultânea como referida por Paul Harris (Harris, 2006), ou seja, foi a
partir de uma ou mais obras do repertório do período barroco que todas as atividades da
sala de aula se desenvolveram, sempre de acordo com o nível de ensino da turma em
questão. A Aprendizagem Simultânea, defendida por Paul Harris é uma filosofia que
habilita os alunos a um entendimento musical completo, num percurso holístico e
orgânico a partir de obras existentes, independentemente do seu género ou do período
estilístico:

Figura 15 - Aprendizagem Simultânea (Harris, 2006, p. 11)

44
Intervenção Pedagógica

Quanto a História da Cultura e das Artes, os conteúdos abordados foram os do


próprio currículo, mas de uma perspetiva orientada através de uma análise retórica da
música. A lecionação desenvolveu-se no período barroco, com exceção da última aula
confinada na transição entre períodos e também no clássico. Foi também realçada a ponte
existente com as disciplinas de Filosofia e Português, promovendo uma
transdisciplinaridade sendo que a retórica faz parte dos currículos destas.

O projeto de Intervenção pedagógica foi acolhido pelos professores cooperantes


da melhor forma já que acreditam que novas estratégias de ensino são sempre benéficas
para os alunos. Foi sendo estabelecido, durante a fase de observação, a melhor altura para
a fase de implementação do projeto de acordo com os conteúdos a abordar como também
respeitando o plano anual do professor cooperante.

A observação das aulas iniciou-se no final de outubro de 2015 na turma do 6º Ano/


2º Grau de Formação Musical e no 11º De História da Cultura e das Artes. A observação
das turmas de Iniciação Musical IV e Formação Musical 9º Ano/ 5º Grau iniciou-se a
meados do segundo período.

A informação mais relevante sobre os conhecimentos, aptidões e comportamentos


da turma foram facultadas em conversas informais com os professores cooperantes, mas
foi a fase de observação que trouxe um plano mais delimitado e direcionado para a
lecionação e implementação do projeto nas duas disciplinas de acordo com as suas
especificidades tanto ao nível de conteúdo a ser lecionado como também ao nível
comportamental e recetivo.

Devido à diferença das duas disciplinas como também aos diferentes níveis de
maturidade, os professores cooperantes diferiam na forma de trabalhar. Em Formação
Musical o ensino centrou-se nos exercícios propostos pelo professor e em História da
Cultura e das Artes numa exposição dialogante do professor com os alunos e posteriores
reflexões dos alunos sobre o conhecimento adquirido.

45
Intervenção Pedagógica

2.2.1 Formação Musical

6º Ano/ 2º Grau; Iniciação IV; 9º Ano/ 5º Grau

O processo de ensino desta disciplina divide-se em três grandes blocos quase


sempre nesta ordem: 1) Imitação, leitura e identificação rítmica; 2) Leitura solfejada; e 3)
Entoações. Nestes grandes blocos é inserido, quando necessário, o conteúdo teórico
subjacente à parte prática desta disciplina. No bloco rítmico, o professor utiliza vários
recursos para expor/ consolidar/ recapitular os conteúdos. Sendo assim e com este bloco
ocorrendo de uma forma dinâmica, os alunos estavam motivados e atentos, o que se notou
ao nível da aprendizagem/ sedimentação dos conteúdos, estando os alunos muito à
vontade com as metas do programa. No bloco relativo à leitura solfejada, observou-se
uma quebra na motivação dos alunos. Isto acontece, na nossa opinião, à própria essência
do que é uma leitura solfejada, um conteúdo pouco motivador em que existe a dificuldade
em encontrar materiais e formas de o expor apelativas para os alunos. No bloco relativo
a entoações/ improvisações /ditados melódicos/ distinção auditiva de intervalos e acordes,
as turmas estavam motivadas, fazendo corretamente, mas de forma pouco segura,
principalmente as entoações. Os ditados melódicos com ou sem ritmo dado foram
alcançados pela maior parte dos alunos de forma razoável. Estes três blocos
supramencionados têm como recurso material uma sebenta realizada pelo professor
cooperante, que foi entregue aos alunos no início do ano e contém quase tudo o que os
alunos viriam a necessitar durante o ano letivo.

De uma forma geral, o ambiente na sala de aulas revelou-se saudável, propiciando


a aprendizagem contrariado algumas vezes por dois alunos, por vezes três, que conversam
bastante na sala de aula levando a que, o professor interrompa a aula para fazer chamadas
de atenção mais vincadas, terminando-as.

2.2.2 História da Cultura e das Artes

A turma observada demonstrou uma grande união notando-se, por exemplo, no


apoio aos colegas com maior dificuldade na aprendizagem. Da totalidade da turma
destacam-se algumas alunas com uma capacidade de aprendizagem acima da média como
também alguns alunos com maior dificuldade na aprendizagem, mas no grosso da turma
salienta-se que existiu um à vontade na aprendizagem dos conteúdos da disciplina. A
escolha da disposição física na sala de aula é feita pelos alunos e, estes fizeram
46
Intervenção Pedagógica

normalmente a escolha a pares de alunos bons com alunos regulares, ajudando desta
forma os colegas e demonstrando a referência anterior sobre a união da turma. A relação
entre alunos e docente foi excelente, este ajudando-os nas mais variadas situações, de uma
forma mais concisa na disciplina que leciona.

As aulas foram lecionadas de uma forma expositiva-dialogante. Assim, os


conteúdos foram sendo expostos à turma, com muitas intervenções por parte dos alunos,
pedidas pela professora ou surgindo da curiosidade natural dos alunos. Notou-se o esforço
da professora cooperante na síntese e esquematização dos conteúdos pois estes são
extensos para o número de aulas a lecionar e ainda com a incumbência de, devido ao
atraso do começo do ano letivo de 2014/2015, ter lecionado os conteúdos da última fase
do Renascimento (conteúdos do último período do 10º Ano) neste ano letivo (2015/2016)
que ocuparam maior parte das aulas do 1º período.

De um modo geral as aulas observadas tinham o seguinte itinerário: elaboração


do sumário com uma exposição breve dos conteúdos a serem abordados, recapitulação,
com a ajuda voluntária ou solicitada dos alunos, das aulas anteriores de forma breve e
esquemática, obrigando alguns alunos a reverem os apontamentos dessas mesmas aulas.
Depois da recapitulação, a lecionação incidia nos conteúdos, numa exposição-dialogante,
com uma utilização do quadro para esquematizar os conteúdos e para apontar os nomes
dos intervenientes da História da Música e das suas obras. As aulas foram sempre
pontuadas com audições/ visualizações de obras relevantes para a disciplina
nomeadamente composições musicais/ tratados/ textos/ quadros pictóricos, entre outros,
fazendo a ponte entre o tronco comum desta disciplina e o tronco específico do ensino
especializado da música. As dúvidas suscitadas pelos alunos foram sendo dissipadas e se
alguns demonstravam alguma dificuldade na compreensão dos conteúdos, não se
avançava na exposição de nova matéria até a anterior estar assimilada e compreendida.

2.3 Plano Geral de intervenção

2.3.1 Transdisciplinaridade no Ensino das Ciências Musicais

A transdisciplinaridade, como o prefixo “trans” indica, diz respeito àquilo que


está ao mesmo tempo entre as disciplinas, através das diferentes disciplinas e
além de qualquer disciplina. Seu objetivo é a compreensão do mundo presente,

47
Intervenção Pedagógica

para o qual um dos imperativos é a unidade do conhecimento (Nicolescu, 1999,


p. 11).

Na génese deste projeto já estava plantada a ideia da transversalidade do tema a


várias disciplinas do 11º Ano nomeadamente História da Cultura e das Artes, Filosofia e
Português. Ao longo da pesquisa dos programas destas disciplinas e da pesquisa
bibliográfica relativa ao tema, a sua transversalidade recorria:

[…] a essa lógica [transdisciplinaridade] quando articulam os conhecimentos das


diversas disciplinas. Os temas transversais, tendo em vista um tema social,
transgridem as fronteiras epistemológicas de cada disciplina, possibilitando uma
visão mais significativa do conhecimento e da vida. Na medida do viável, os temas
transversais resgatam as relações existentes entre os conhecimentos (Santos, 2008,
p. 75).

De qualquer forma a implementação deste projeto não poderia ser transdisciplinar


devido aos constrangimentos do mestrado em ensino e a dificuldade de articular com as
várias disciplinas sem estar um período mais longo de tempo durante a semana escolar.

Inserido num projeto curricular com as várias disciplinas em articulação e com


“empréstimo” de conhecimentos levaria com certeza a uma (…) “visão mais significativa
do conhecimento e da vida” (…) (Santos, 2008, p. idem) por parte dos alunos.
Privilegiando a disciplina berço deste projeto, História da Cultura e das Artes, a sua
implementação poderia ser, sem afetar significativamente os conteúdos curriculares, um
aprofundar da Teoria dos Afetos e do simbolismo musical do período barroco que
desembocaria numa exposição dos fundamentos/ características da retórica musical e a
audição de exemplos musicais durante a lecionação do período barroco, recorrendo a
guias de audição e realizando análises, ambos numa perspetiva retórica.

Quanto à disciplina de Formação Musical, principalmente no ensino básico e


preparatório, a lecionação passaria por mais cultura dentro da sala de aula, com exemplos
“reais” e aprendizagens simultâneas destas. Balizar um dado período estilístico nos
exemplos “reais” não nos parece motivador e procedente, mas a cultura da audição e da
sua contextualização, seja ela de que período ou género estilístico for, nos seus mais
variados aspetos deveria estar presente nas aulas desta disciplina, adequando obviamente
a complexidade do pensamento ao nível de ensino.

48
Intervenção Pedagógica

2.3.2 Formação Musical

Para a implementação do projeto em Formação Musical foram estipuladas duas


aulas de 90 minutos para o 6º Ano/ 2º Grau, duas aulas de 45 minutos para Iniciação IV
e duas aulas de 90 minutos para o 9º Ano/ 5º Grau. Como já referido anteriormente, as
lecionações das aulas tiveram como matéria basilar peças de repertório do período
barroco, partindo destas para uma aprendizagem simultânea.

A primeira aula foi lecionada ao 6º Ano/ 2º Grau. Para esta disciplina e para os
blocos de 90 minutos optou-se por dividi-los em blocos de 45, para fazer uma planificação
mais conseguida e controlada no tempo.

Recorrendo ao livro Lectures d'auteurs a chanter: pour le Préparatoiure:


transcription à 1 ou 2 voix avec accompagnement foi escolhido uma aria (Ato V, Cena
2) da ópera King Arthur de Henry Purcell (Gartenlaub, 1985, pp. 14-15), adequada ao
nível dos alunos a lecionar.

O excerto da obra foi analisado quanto aos seus conteúdos teóricos como
tonalidade, ritmo e compasso utilizado e intervalos mais frequentes. Estes conteúdos

49
Intervenção Pedagógica

teóricos estavam bem presentes nos alunos e não foi necessário fazer uma recapitulação
6
ou exposição destes mesmos excetuando do compasso , em que este ainda não tinha
4

sido exposto aos alunos. Assim optou-se por levar a pulsação à unidade semínima e não
à mínima com ponto, próprio dos compassos compostos. Foi feita uma leitura solfejada
na clave de Fá da pauta inferior do sistema que não estava prevista na planificação e
depois nas duas claves em conjunto.

O segundo momento da aula teve como objeto de estudo o tema do projeto na qual
foi feita uma breve exposição sobre o significado da tonalidade de Fá M no período
Barroco e do andamento Allegro à luz dos princípios da Teoria dos Afetos/ Retórica
Musical:

 Fá Maior: Segundo o teórico e compositor Johann Mattheson esta


tonalidade tem a capacidade de exprimir os sentimentos generosidade,
fidelidade ou amor de maneira natural e sem qualquer esforço.
 Allegro: consolo.

Se seguida, foi realizada uma leitura/ entoação apontada da escala de Fá M,


tonalidade do excerto. De seguida os alunos entoaram a linha mais grave da Clave de Fá.
Sugerido pelos alunos, foram entoadas as duas vozes por dois grupos com a ajuda do
professor cooperante na voz mais grave, trocando os grupos para uma última vez.

O momento seguinte incidiu na análise do excerto obra Les Moissonneurs de


François Couperin (Gartenlaub, 1985, pp. 18-19) quanto à tonalidade e compasso
utilizado. De seguida, foi feita uma breve exposição sobre a tonalidade de Si bemol no
período barroco e o último momento da aula foi dedicado a um ditado melódico com
ritmo dado desta peça de repertório do período barroco.

50
Intervenção Pedagógica

Para este ano 6º A/ 2º Grau foi lecionada também a quarta aula. Depois da audição
do Minueto em Sol Maior (BWV Anh.116) e da distribuição da ficha de trabalho contendo
o material a ser utilizado durante a aula, foi proposto aos alunos uma breve análise do
excerto (Bach, 1993, pp. 8,9). Os alunos indicaram a tonalidade, o compasso, a escala da
tonalidade, as figuras rítmicas mais frequentes como também os intervalos mais
frequentes. Depois desta análise, foi feita uma exposição do significado barroco da
tonalidade de Sol M e deu-se a conhecer uma edição fac-similada do Pequeno Livro de
Anna Magdalena Bach (Bach, 1988). Foi também feita uma breve contextualização do
compositor maior do barroco, J.S. Bach.

51
Intervenção Pedagógica

O exercício seguinte foi uma leitura solfejada do excerto por todos os alunos da
clave de Sol e da clave de Fá com marcação de pulsação. O desafio seguinte foi a
realização do solfejo do primeiro compasso na clave de Sol e o seguinte na clave de Fá,
alternando sempre até ao fim do excerto.

O momento seguinte foi dedicado à entoação do excerto. Para um aquecimento


vocal, fez-se ordenações na escala de Sol Maior como também uma leitura apontada do
excerto. Depois, realizou-se identificação auditiva de intervalos, estes relacionados com
o excerto e de seguida, foi executada uma leitura rítmica a duas partes adaptada também
do excerto.

De seguida foi realizado um ditado rítmico com notas dadas da obra Polonaise em
Sol menor, BWV Anh.119 (Bach, 1993, p. 11). A obra escolhida estava em Sol menor
numa natural atenção com a tonalidade de Sol M do excerto anterior, trabalhando
auditivamente e teoricamente as escalas maiores e menores. Fez-se uma breve análise e
procedeu-se à audição da melodia para os alunos realizarem o ditado.

52
Intervenção Pedagógica

O momento seguinte dedicou-se à realização de um ditado melódico com ritmo


dado (Bach, 1993, p. 4) da obra Minueto em Sol Maior, BWV Anh.114, esta também
extraída e adaptada do Pequeno Livro de Anna Magdalena Bach.

A segunda, terceira, quinta e sexta aula foram aulas lecionadas a quatro turnos
diferentes, ou seja, uma aula por turno, o que tornou mais difícil a concretização do
objetivo proposto para este projeto. Para a aula lecionada aos dois turnos de Iniciação
Musical IV, ao primeiro turno e segundo turno respetivamente, optou-se por não
53
Intervenção Pedagógica

implementar o projeto devido principalmente, ao nível de maturidade dos alunos como


também ao tempo de aula disponível, 45 minutos.

A aula lecionada ao primeiro e segundo turno do 9º Ano/ 5º Grau iniciou-se com


uma leitura rítmica a duas partes (Jollet, 1988, p. 29) sendo seguido por um ditado rítmico
a duas partes em compasso composto. Foi também realizada uma leitura vertical e
horizontal nas claves de Dó na 4ª linha, Sol na 2ª linha e Fá na 4ª linha (Jollet, 1988, p.
45 (1)).

O ditado melódico proposto foi extraído e adaptado da parte do contralto do coral


de J.S. Bach Befiehl du deine Wege (Bach, 2008, p. 13 (20)). Por último foi realizado um
ditado melódico adaptado a duas vozes, também de um coral de J.S. Bach, An
Wasserflussen Babylon (Bach, 2008, p. 9 (15)). Antes da realização do ditado foram feitas
ordenações e uma leitura apontada na escala de sol Maior. Relativamente à implantação
do projeto, foram expostos o significado na Teoria dos Afetos/ Retórica Musical das
tonalidades de Sol Maior e Ré Maior como também uma breve contextualização do
compositor J. S. Bach.

54
Intervenção Pedagógica

2.3.3 História da Cultura e das Artes

Para a implementação do projeto em História da Cultura e das Artes foram


estipuladas quatro aulas de 90 minutos e uma de 45. Estas aulas foram divididas no tempo
e dedicadas aos conteúdos do currículo desta disciplina no período barroco, excetuando
a última que foi dedicada ao período clássico. Como o projeto só teria uma implementação
eficaz se uma aula fosse totalmente dedicada para a exposição teórica deste mesmo, foi
então reservada uma aula.

A aula iniciou-se com uma apresentação formal e uma pequena contextualização


do que se pretende com o projeto de estágio e a consequente investigação. Para esta aula
foi utilizada uma exposição dialogante com os alunos através dos conteúdos
programados. Iniciou-se sobre a etimologia da Suite barroca e depois uma exposição das
suas características gerais. De seguida, foi exposto a fixação em quatros danças por
Froberger (A-S-C-G) seguido da suite para instrumento solo em François Couperin e J.P.
Rameau (ordres) e em J.S. Bach (partitas, ouvertures).

55
Intervenção Pedagógica

No momento seguinte abordou-se as Suites Orquestrais de Bach e o acrescentar


das danças. Para a audição de uma Suite orquestral de J.S. Bach foi escolhida a Badinerie
da Suite Orquestral BWV 1067.

Para expor o contexto social das mega suites de Haendel optou-se por dar a ler um
texto de um testemunho da estreia da Música Aquática a um aluno e no correr ouviu-se a
Abertura da Música Aquática deste mesmo compositor.

Relativamente ao tema do projeto de investigação, foi relembrada a importância


da Teoria dos Afetos no meio musical barroco e como este se manifestava no género de
música Suite Orquestral e como os ritmos/ compassos das danças estavam associados a
propriedades afetivas (Cano, 2000, pp. 68,69).

A segunda parte da aula foi dedicada ao Concerto Orquestral Barroco. Iniciando


os conteúdos planeados para esta aula, sempre numa exposição dialogante, foi abordada
a etimologia do Concerto. Para isso fez-se uma recapitulação do período tardio do
renascimento e da policoralidade veneziana. Enquanto se fazia esta recapitulação
entregava-se aos alunos dois guias de audição.

Depois da apresentação dos antecedentes do Concerto, foi feita uma exposição das
características gerais do Concerto Grosso e Solo e de seguida as características específicas
do Concerto em Arcangelo Corelli com uma Audição do Concerto Grosso Op. 6 Nº 10
Dó Maior e em com uma Audição do Concerto Solo para Trompete em Ré Maior.

No momento seguinte, foi abordado o Concerto em Vivaldi e a revolução na forma


com a sistematização do ritornello, enunciando as suas características específicas e o
contexto social da sua composição. Após a exposição foi pedido aos alunos para fazerem
uma audição seguindo o guia do primeiro andamento do Concerto para Violino em Mi
Maior, Opus 8, Nº 1 – Primavera.

Por último, foi abordada a influência do Concerto italiano na Alemanha,


principalmente em J.S. Bach e as características do seu tipo de concerto. Para a audição
foi escolhido o primeiro andamento do Concerto Grosso Nº2 de Brandeburgo através do
Guia de Audição dado no início da aula. Na finalização da aula e para um enquadramento
global com o projeto foi reiterada a enorme importância que os afetos tiveram na
composição musical no período barroco e da importância da retórica musical na
estruturação da forma na música instrumental.

56
Intervenção Pedagógica

As duas aulas seguintes (uma de 90 minutos e outra de 45 minutos) foram


dedicadas a compositores do período barroco. Como os conteúdos são inúmeros e as aulas
são escassas para tanto, a professora cooperante sugeriu a lecionação de três blocos de 45
minutos dedicados ao projeto, mas a partir de trabalho realizado pelos alunos. Assim,
decidiram-se os compositores a serem tratados, conceberam-se os grupos dos alunos e a
cargo do mestrando as indicações para a realização do trabalho. Ficou decidido que os
alunos fariam uma pequena apresentação do compositor e teriam que entregar um resumo
escrito da apresentação oral. A avaliação ficou decidida em 70% para a apresentação e
30% para o resumo escrito. A apresentação deveria comtemplar uma biografia resumida
do compositor e um destaque especial para uma obra desse mesmo compositor. Para a
avaliação recorreu-se a duas grelhas, uma para a apresentação e outra para o resumo
escrito. A avaliação final foi a soma da avaliação oral do mestrando e da professora
cooperante dividida por dois, englobados nos 70% da avaliação e a avaliação do trabalho
escrito era exclusivamente pelo mestrando contando 30%.

Estas aulas deram-se no início do 3º período letivo. Cada bloco de 45 minutos foi
destinado para a apresentação de dois grupos, mas, na primeira aula só um grupo
apresentou. Segundo explicações dos alunos, isto deveu-se à distância geográfica que
existe entre eles pois quase todos vivem em diferentes concelhos limítrofes. Ficou
acordado então que as seguintes apresentações teriam que ser mais breves para todos as
conseguirem realizar.

Sendo assim, a apresentação da primeira do trabalho sobre o compositor J.S. Bach


foi mais extensa e com mais intervenções construtivas por parte dos alunos que pela nossa
parte. As outras apresentações foram mais breves, mas o trabalho pedido foi bem
realizado o que se traduziu na avaliação. A implementação do projeto decorreu de forma
natural, com análises retóricas breves dos exemplos musicais apresentados pelos alunos
como a tonalidade escolhida, a natureza do texto se fosse uma peça vocal, o compasso e
algumas figuras retóricas musicais mais evidentes.

A quarta aula (90 minutos) esteve destinada a uma explicação aprofundada do


projeto de estágio e da investigação. Para a implementação do projeto e uma possível
introdução deste nos conteúdos curriculares desta disciplina será sempre necessária uma
aula de exposição dos seus conteúdos teóricos para obtenção de um conhecimento mais
lato e profundo deste e assim, relacioná-lo com os conteúdos deste na disciplina de

57
Intervenção Pedagógica

Filosofia e a de Português. Por isso esta aula foi fundamental para a consolidação do
projeto de estágio.

No início da aula foi distribuído um Guia de Audição para quatro audições de


diferentes géneros de composições como também de diferentes compositores. Este guia
foi estrutural para a aula e poderá ser consultado posteriormente se os alunos assim o
quiserem. Incluídos também neste guia está um pequeno enquadramento teórico ao tema.

De uma forma expositiva dialogante, abordou-se o tema, recorrendo sempre ao


conhecimento dos alunos deste tema nas disciplinas de Filosofia e Português. Assim,
começou-se por uma breve história da retórica clássica, matéria já estudada pelos alunos
em Filosofia. Depois, duas breves abordagens à retórica latina e à medieval cristã e a
relação da disciplina música no contexto académico medieval.

O ponto seguinte foi a relação entre retórica e música no período barroco, as fases
da elaboração da retórica musical e a estrutura (dispositio) da retórica musical presente
no Guia de Audição. Durante esta exposição foi-se questionando os alunos sobre a relação
da retórica com a disciplina de Português, no caso específico da estrutura retórica dividida
em exórdio, exposição/ confirmação e peroração (Catarino, Fonseca, & Peixoto, 2014,
pp. 83,114) do Sermão aos Peixes do Padre António Vieira, conteúdo curricular desta
disciplina.

Alguns pontos, como a elaboração retórica musical e a sua estrutura, foram mais
demorados e recorreu-se a uma utilização de temas (peças musicais, canções) da
atualidade e transportá-los, com as devidas notas, para o universo musical barroco. Segue
o plano desta aula na página seguinte:

58
Intervenção Pedagógica

Plano de aula lecionada nº 6

Identificação da turma
Escola: Conservatório de Música do Porto Disciplina: História da Cultura e das
Professora: Artes
Curso Secundário: regime integrado Turma: 11º Ano
Duração: 45 m (13:35 – 14:20)
Data: 28 – 04 – 2016
Caracterização da Turma
A Turma é constituída por 17 alunos, sendo uma turma heterogénea a nível de atitudes/
comportamentos. Os alunos mostram interesse e motivação.

Recursos Materiais
Caderno diário e material de escrita; computador com colunas de som; data show.

Conteúdo
A retórica Musical no período barroco, os seus antecedentes desde a Grécia clássica.
As fases da elaboração na retórica musical.
As Figuras retóricas.

O aluno deverá estar apto a:


 Descrever e enquadrar a evolução da retórica desde a época clássica até à
retórica musical.
 Relacionar com a disciplina de Filosofia os conteúdos comuns (retórica e
argumentação; retórica e democracia; o racionalismo de René Descartes).
 Relacionar com a disciplina de Português os conteúdos comuns (a elaboração
retórica do Sermão aos Peixes do Padre António Vieira).
 Identificar as fases da elaboração retórica musical.
 Identificar a disposição/ estruturação retórica musical.

Metodologia:
1. O professor inicia explicando como decorrerá a aula e quais serão os conteúdos
abordados (5m).
2. O professor, numa exposição dialogante, responde às questões sobre a génese da
Retórica (15m).
3. O professor expõe a relação entre retórica e música no período barroco (10m).
4. O professor expõe as fases da elaboração da retórica musical (8m).
5. O professor expõe a estruturação da retórica musical (7m)

59
Intervenção Pedagógica

Avaliação:
Tendo em conta a metodologia utilizada – exposição dialogante – o docente tomou
boa nota/ reteve: 1) a atenção de cada aluno e 2) a participação espontânea ou
solicitada.

Bibliografia:

Bartel, D. (1997). Musica Poetica: Musical-Rhetorical Figures in German Baroque


Music. Nebraska: Nebraska University Press.

Buelow, G. J. (s.d). Rhetoric and music – 2. Baroque. Em G. G. Stanley Sadie, The New
Grove Dictionary of Music and Musicians online. Obtido em 23 de abril de 2016.

Cano, R. L. (2000). Música y Retórica en el Barroco. Ciudad Universitaria: Universidad


Nacional Autónoma de México.

Grout, D. & Palisca, C. (2007). A História da Música Ocidental, 5ª edição. Lisboa:


Gradiva.

Hill, J. (2008). La Música Barroca. Madrid: Ediciones Akal.

Mccreless, P. (2002). The Cambridge history of Western music theory. (T. Christensen,
Ed.) Cambridge: Cambridge University Press.

Michels, U. (2003). Atlas de Música Vol. I, Lisboa: Gradiva.

Michels, U. (2007). Atlas de Música Vol. II, Lisboa: Gradiva.

Reboul, O. (2004). Introdução à retórica. (I. C. Benedetti, Trad.) São Paulo: Martins
Fontes.

60
Intervenção Pedagógica

O segundo momento da aula foi dedicado de forma exaustiva ao projeto de


estágio. Como foi supramencionado, este projeto não se desvia dos conteúdos presentes
no currículo da disciplina. Para a disciplina de História da Cultura e das Artes neste caso
com incidência maioritária da História da Música Ocidental, os conteúdos curriculares da
história da música ocidental balizam-se no período barroco e no clássico. Neste projeto
de estágio foi feita uma leitura crítica do período barroco musical sob o enfoque da
retórica musical. Para isso, tornou-se fundamental dar a conhecer análises retóricas de
várias composições de diferentes géneros e de diferentes compositores. O momento
anterior foi para expor o tema de forma aprofundada de modo a ser possível compreender
e fazer uma analise retórica de uma composição.

Assim, consagrou-se na audição, análise e comentários sobre os vários exemplos


musicais. O primeiro exemplo foi Dominus Deus, Agnus Dei do Gloria de Vivaldi (RV
589) (Rodrigues, 2006). Depois da audição orientada através de um guia numa perspetiva
retórica foram feitas considerações sobre a análise quanto ao inventio, dispositio e figuras
retóricas utilizadas.

A análise da peça seguinte, de outro género e compositor diferente, foi a fuga em


Ré Maior de J.S. Bach. Desta peça, também orientada pelo Guia de Audição, destacamos
a gravação escolhida não ter sido a mais acertada, devendo ter sido uma gravação ao piano
e não ao cravo, instrumento mais familiar para os alunos e com maior expressão retórica.

A última peça a ser analisada (Persone, 1996) foi o Preludio n° 13 em Fá Maior


“tombeau” de Louis Couperin (1626-1661). Esta análise teve um impacto profundo nos
alunos, pois não conheciam a peça como também não conheciam os prelúdios non
mesurès. Foi assim alargado o repertório conhecido dos alunos a um tipo de um género,
pouco abordado nas aulas e foi feito através de uma análise retórica. Por falta de tempo o
último exemplo (Mateus, 2016) teve só uma breve consideração e uma recomendação
para ouvirem em casa seguindo o Guia de Audição.

Segue o plano desta aula na página seguinte:

61
Intervenção Pedagógica

Plano de aula lecionada nº 7

Identificação da turma
Escola: Conservatório de Música do Porto Disciplina: História da Cultura e das
Professora: Artes
Curso Secundário: regime integrado Turma: 11º Ano
Duração: 45 m (14:20 – 15:05)
Data: 28 – 04 – 2016
Caracterização da Turma
A Turma é constituída por 17 alunos, sendo uma turma heterogénea a nível de atitudes/
comportamentos. Os alunos mostram interesse e motivação.

Recursos Materiais
Caderno diário e material de escrita; computador com colunas de som; Gravações
musicais e partituras.

Conteúdo
A disposição/ estruturação da música barroca sob o escrutínio de uma análise retórica
musical.
As figuras retóricas no despertar dos afetos barrocos.

O aluno deverá estar apto a:


 Identificar as fases de elaboração retórica na música barroca.
 Identificar a disposição retórica na música barroca.
 Identificar a utilização das figuras retóricas barrocas para o despertar dos afetos.

Metodologia:
1. O professor inicia explicando como decorrerá a aula e quais serão os conteúdos
abordados (5m).
2. O professor expõe uma análise retórica do Dominus Deus, Agnus Dei do Gloria
de Vivaldi (RV 589) (10m).
3. O professor expõe uma análise retórica da fuga BWV 850 em Ré Maior de J.S.
Bach (5m).
4. O professor expõe uma análise retórica do Preludio n° 13 em Fá Maior “tombeau”
de Louis Couperin (1626-1661) (10m).
5. O professor expõe uma análise retórica do Behold a virgin shall conceive & O
thou that tellest good tidings to Zion do oratório Messias de Haendel (10m).
6. Considerações finais sobre o barroco musical visto sobre o prisma de uma análise
retórica e o seu declínio no período clássico (5m).

62
Intervenção Pedagógica

Avaliação:
Tendo em conta a metodologia utilizada – exposição dialogante – o docente tomou
boa nota/ reteve: 1) a atenção de cada aluno e 2) a participação espontânea ou
solicitada.

Bibliografia:

Bartel, D. (1997). Musica Poetica: Musical-Rhetorical Figures in German Baroque


Music. Nebraska: Nebraska University Press.

Buelow, G. J. (s.d). Rhetoric and music – 2. Baroque. Em G. G. Stanley Sadie, The New
Grove Dictionary of Music and Musicians online. Obtido em 23 de abril de 2016.

Cano, R. L. (2000). Música y Retórica en el Barroco. Ciudad Universitaria: Universidad


Nacional Autónoma de México.

Grout, D. & Palisca, C. (2007). A História da Música Ocidental, 5ª edição. Lisboa:


Gradiva.

Mateus, F. (24 de março de 2016). Sala de Estudo Textos. Recuperado de Flávio Mateus:
http://www.flaviomateus.com

Mccreless, P. (2002). The Cambridge history of Western music theory. (T. Christensen,
Ed.) Cambridge: Cambridge University Press.

Persone, P. (1996). A Interpretação Das Obras “Non Mesures” Para Cravo, Explicadas
Segundo As Leis Da Retórica (Dissertação de Mestrado, Universidade de
Campinas). Obtido de http://www.bv.fapesp.br/pt/bolsas/88950/a-interpretacao-
das-obras-non-mesures-para-cravo-explicada-segundo-as-leis-da-retorica/

Rodrigues, A. (2006). Análise de alguns aspectos Retórico-musicais de “Domine Deus,


Agnus Dei” Do Gloria rv 589 de Antonio Vivaldi. Música Hodie, 6(1), 35-49.

63
Intervenção Pedagógica

A quinta aula, como foi referido já estava balizada no período clássico, em que
este já estava fora do âmbito estilístico do projeto de investigação. Mesmo assim, tornava-
se necessário expor aos alunos que uma das características do período clássico era um
gradual abandono da retórica musical como base no ato de composição.

Para esta aula o conteúdo a ser abordado foi o género sonata no período clássico,
as suas características estilísticas e formais, como também a sua dimensão social e
pedagógica, recapitulando os seus antecedentes barrocos. Foi preparada também uma
breve exposição da forma sonata, caso os alunos não tivessem compreendido bem a sua
estrutura formal nas aulas anteriores. Foi utilizada uma apresentação em PowerPoint
numa tentativa de os alunos assimilarem mais e melhor e, fazer fluir melhor o decorrer
da aula. As audições utilizadas foram Sonata em Lá Maior, H. 186, Wq. 55/4, 2º
Andamento de C.P.E. Bach para esclarecer e demonstrar os antecedentes barrocos e o
período de transição para o clássico. Para esclarecer e demonstrar os meios de divulgação/
publicação da Sonata e evidenciar o desenvolvimento expressivo e organológico do
piano, foram ouvidos excertos da Sonata em Ré Maior, Op. 5, No. 2 de J.C. Bach no cravo
e no piano.

Os conteúdos seguintes foram as características da Sonata na Primeira Escola de


Viena, ou seja, em Haydn, Mozart e Beethoven. Para exemplificar auditivamente uma das
várias fases cronológicas e estilísticas de Haydn utilizou-se a Sonata para Piano Nº 31 em
Lá bemol Maior, Hob XVI-46, 1º Andamento. As características da Sonata do compositor
Mozart foi o conteúdo seguinte e o exemplo auditivo foi a Sonata para violino e piano em
Dó Maior KV6 – 1º Andamento.

O tema do projeto e de investigação esteve sempre presente durante toda a aula.


Palavras chave do barroco e do classicismo, como por exemplo artificialidade e
naturalismo, foram devidamente enquadradas dentro de um pensamento retórico musical
como também o seu declínio nesta mudança paradigmática do pensamento filosófico e
político.

O destaque foi dado à sonata em Beethoven, dando um exemplo musical, 1º


Andamento da Sonata n° 8 em Dó menor, Opus 13, “Patética”, orientado através de um
guia de audição numa perspetiva retórica (Assumpção, 2007, pp. 98-112). Através da
análise retórica desta peça, foi exposto o declínio da retórica e a sua importância como
ajuda na composição musical, já referido na aula anterior. Foi dado a compreender que a

64
Intervenção Pedagógica

retórica acompanha a criação nas suas mais variadas formas, atravessando os tempos e os
lugares, mas que a consciência e, escrever ou compor a partir dela teve uma importância
extrema no período barroco, o que não se verificou nesta magnitude noutros períodos da
música ocidental, principalmente nos consequentes.

2.3.4 Projeto Artístico “O Bandolim na Era Barroca”

Este Projeto Artístico partiu da iniciativa conjunta de dois estagiários no


Conservatório de Música do Porto. Devido à dificuldade de inserir um só projeto numa
agenda tão cheia e rica como é a desta instituição, optamos, David Rodrigues e Paulo
Araújo, por unirmos as nossas ideias num Projeto Artístico transversal aos temas de
ambos os projetos de Investigação. Assim, tornou-se mais fácil encontrar meios e horários
compatíveis com este, tornando-o de maior relevo e mais enriquecedor para ambos. Como
os temas de ambos projetos estão compreendidos no mesmo período temporal (Barroco),
e a observação das aulas coincidem nos mesmos anos de História da Cultura e das Artes
(11º) e em anos próximos de Formação Musical (6º e 7º Ano/ 2º e 3º Grau) a concretização
do projeto tornou-se mais fácil e, de certeza, terá maior impacto.

Este projeto foi desenvolvido pelos mestrandos David Rodrigues e Paulo Araújo
e foi parte integrante dos temas em desenvolvimento “O Repertório para Cordofones
Dedilhados: Uma Fonte de Aprendizagem no Ensino das Ciências Musicais” e “O Ensino
das Ciências Musicais e a Retórica: Discurso Musical no Período Barroco”.

A implementação de uma apresentação fora do contexto de sala de aula surgiu


com o intuito de reforçar os trâmites dos projetos que se encontraram em desenvolvimento
de forma a dar uma resposta mais assertiva aos problemas apresentados nos momentos
iniciais que deram mote aos projetos de investigação.

Por um lado, esta intervenção surgiu face à constatação dos seguintes factos: o
pouco conhecimento sobre alguns cordofones dedilhados, em particular, o bandolim no
ensino vocacional artístico; a dificuldade, por parte dos alunos, em reconhecer a dimensão
prática das Ciências Musicais; a utilização de um repertório referencial que,
habitualmente, não defende obras para cordofones dedilhados, quer no âmbito da
formação em Ciências Musicais, quer no domínio da interpretação musical; a associação

65
Intervenção Pedagógica

do instrumento bandolim apenas à música tradicional e popular. Por outro lado, procurou-
se dar uma importância maior à retórica musical neste período, partindo da análise
retórica de obras e doravante, explanar de uma obra musical para o contexto social da sua
criação.
“O Bandolim na Era Barroca” pretendeu ser uma atividade didática que aborde os
temas já referidos numa perspetiva expositiva-dialogante com interpretações musicais em
tempo real, direcionada à comunidade educativa do Conservatório de Música do Porto.

Na organização deste projeto participaram, para além dos Mestrandos já referidos,


a Professora Doutora Elisa Lessa enquanto supervisora dos mestrandos e a Professora
Sónia Marques como professora cooperante de ambos os estagiários e docente no
Conservatório de Música do Porto na disciplina de História da Cultura e das Artes. A
dinamização da atividade contou com professores do conservatório nomeadamente o
Professor António de Sousa Vieira e, como convidado, o professor Rui Gama.

Este projeto artístico decorreu no auditório do Conservatório de Música do Porto,


um espaço ideal para o seu desenlace e o Guia de Audição numa Perspetiva da Análise
Retórica (Anexo 4) para o primeiro andamento do concerto de Dó Maior de Antonio
Vivaldi foi distribuído no início da atividade.

Na continuidade e como planeado, o meu colega de estágio David Rodrigues fez


umas breves considerações sobre a história do bandolim. Na continuação, o Professor de
bandolim do Conservatório de Música do Porto, António de Sousa Vieira, fez uma
pequena palestra sobre a técnica do bandolim e os diferentes tipos existentes, expondo os
instrumentos para a plateia visualizar. Também tocou nos três bandolins com o objetivo
de a plateia diferenciar o timbre específico de cada um considerando as suas diferenças
de construção.

De seguida o professor António de Sousa Vieira no bandolim e o professor Rui


Gama na guitarra clássica interpretaram três peças para bandolim do período barroco. O
primeiro a ser ouvido foi a Sonata para Bandolim K.81 de Domenico Scarlatti, tocada na
sua totalidade. O segundo foi o primeiro andamento do Concerto em Dó Maior, RV485
de Antonio Vivaldi. A plateia seguiu com interesse o Guia de Audição numa Perspetiva
da Análise Retórica distribuído na fase inicial, acompanhando o primeiro andamento do
concerto através do Guia. O terceiro e último foi a Sonata para bandolim e baixo contínuo
de Aleixo Botelho de Ferreira, um ilustre português desconhecido.

66
Intervenção Pedagógica

No final do concerto notou-se que o público aderiu e mostrou-se entusiasmado


com o repertório barroco para bandolim, pouco conhecido e reconhecido nos dias atuais.
Com certeza irão procurar ouvir e conhecer mais repertório para este instrumento.

Relativamente ao Guia de Audição, teve o resultado esperado, que foi despertar a


curiosidade deste tema para o público geral. Como era de todo impossível fazer uma
pequena palestra sobre o tema pois este pede muito mais tempo, a opção pelo Guia de
Audição numa Perspetiva da Análise Retórica resultou e foi demonstrado pelo público
perguntando como se realizava uma análise musical numa perspetiva retórica. Foi
também pedido pela professora cooperante de História da Cultura e das Artes para expor
numa outra turma do 11º ano o tema do projeto.

67
Intervenção Pedagógica

68
Recolha e Análise de Dados

III – RECOLHA E ANÁLISE DE DADOS

Este capítulo compreenderá uma análise da literatura de base das duas disciplinas
onde os professores coligem a informação a ser transmitida aos alunos como também uma
apresentação e análise dos dados recolhidos na implementação do projeto. Quanto às
ferramentas utilizadas para a análise dos conhecimentos adquiridos por parte dos alunos
durante a realização do plano de intervenção em contexto de aula são na forma de
observações diretas/ diário de bordo coligidas durante e após a sua implementação, tanto
na disciplina de Formação Musical como na de História da Cultura e das Artes.

3.1 Formação Musical

Literatura

Em Formação Musical é notória a escassez de métodos ou manuais baseados, de


uma forma holística, em peças de repertório erudito e muito menos do período barroco,
no mercado livreiro o que leva a uma proliferação de sebentas/ repositório de exercícios
elaboradas pelos professores desta disciplina. Esta recolha de material, por vezes, não é a
mais adequada como também toma demasiado tempo ao professor, ressentindo-se disso
os alunos, pois leva algum tempo a polir/ melhorar a sua qualidade.

A escassez do mercado livreiro de literatura especializada ao serviço da disciplina


de Formação Musical, advém de dois fatores, na nossa opinião: 1) Falta de orientação
mais visível nos currículos de Formação Musical por parte do Ministério da Educação e
2) O número residual de alunos que frequentam Formação Musical, comparado com
outras disciplinas, que economicamente torna pouco viável a edição de manuais por parte
das editoras.

Assim e como refere (Pedroso, 2006, p. 8) “Um dos aspectos centrais da


disciplina de FM é a educação do ouvido, isto é, o desenvolvimento das capacidades de
identificação e escrita dos sons musicais ouvidos, bem como a capacidade de
imaginar/ouvir os sons/estruturas sonoras escritos”. Para a concretização deste
desenvolvimento a mesma autora, corroborada por vários autores, salienta que “é
fundamental o recurso a música “real”” e que:

É igualmente fundamental o recurso a outras áreas do conhecimento musical –


como a Teoria Musical, a História da Música, a Acústica, a Análise, a Composição.

69
Recolha e Análise de Dados

Os alunos poderão assim construir um conhecimento mais aprofundado e


contextualizado de conceitos que, ensinados num plano meramente teórico, sem o
suporte de situações musicais reais, se tornam estéreis e, muitas vezes, mal
compreendidos (Pedroso, 2006, p. 9).

Na conclusão a autora aponta um caminho que deveria ser percorrido e que foi uma
referência nas nossas planificações das aulas:

Uma preparação para a música – seja como músico, seja como público informado – deve,
necessária e logicamente, basear-se em música real, pelo que esta deve ser parte integrante
e constante das aulas de FM. O recurso a exemplos de música real pode/deve então servir
ambos os objectivos: para além de desenvolver a cultura musical dos alunos, permite
abordar, trabalhar e desenvolver conhecimentos, conteúdos e competências em contexto
real. Será igualmente importante englobar conhecimentos de outras áreas das ciências
musicais, bem como utilizar diferentes tipos de fontes musicais – em termos de épocas, de
estilos, de origens geográficas (Pedroso, 2006, p. 16).

Embora este artigo já tenha uma década de existência e que porventura alguma
realidade descrita nele pudesse ter sido mudada, o que se verifica nas aulas de Formação
Musical é uma proliferação de exercícios soltos que não englobam conhecimentos de
outras áreas das ciências musicais e também não são baseados ou extraídos do repertório
“real”.

Análise de dados recolhidos via observação direta.

As aulas lecionadas em Formação Musical tiveram quase sempre como ponto de


partida peças de repertório do período barroco. Como a lecionação desta disciplina se
dividiu por vários níveis de ensino também se dividiram as aulas previstas na sua
totalidade. Assim, a turma que a implementação do projeto teve uma fase mais duradoura
foi o 6º Ano/ 2º Grau com duas aulas de 90 minutos no mesmo turno, seguida pelo 9º
Ano/ 5º Grau com duas aulas de 90 minutos a dois turnos e a Iniciação IV com duas aulas
de 45 minutos a dois turnos.

A implementação do projeto foi bem acolhida em todas as turmas lecionadas. Nas


aulas observadas pode-se constatar que raramente eram utilizadas peças do repertório e
das que foram utilizadas nenhuma delas estava incluída nas peças de repertório do período
barroco excetuando o 9º Ano/ 5º Grau que faziam ditados a duas vozes de Corais de J.S.
Bach. Também se verificou que a implementação do projeto passaria por um trabalhar de

70
Recolha e Análise de Dados

aprendizagens simultâneas a partir de uma dada peça ou peças do repertório deste período
referindo o seu compositor, a época da criação e alguns aspetos – adaptados à faixa etária
– para uma análise musical numa perspetiva retórica como, o significado das tonalidades
e dos compassos presentes no excerto.

Quanto à utilização de peças de repertório do período barroco a maioria das


reações dos alunos foi positiva e tiveram uma atitude ativa durante as aulas e,
compreenderam que para os compositores barrocos a tonalidade e o tipo de compasso
utilizados eram importantes para definir a natureza afetiva das suas composições. As
aprendizagens simultâneas a partir de música “real” barroca foram importantes para eles
notando-se na atenção e na participação ativa de alguns alunos como também na
realização entusiasmada dos exercícios propostos. Alguns alunos fizeram comentários,
principalmente nas peças do Pequeno Livro de Anna Magdalena Bach, de como já as
conheciam ou tocaram e que era “engraçado” estudarem música conhecida.

Relativamente à utilização na sala de aula de gravações dessas peças por músicos


profissionais, os comentários dos alunos apontaram como uma mais valia na sala de aula,
não para fazer a totalidade dos exercícios (ditados melódicos com ou sem ritmo dado e
ditados rítmicos com notas dadas) através das gravações, mas, para ouvirem a peça na sua
totalidade em contexto de sala de aula.

Verificou-se também que a cultura musical dos alunos aumentou pois conheceram
e compreenderam peças do repertório erudito barroco, os seus compositores, alguns
aspetos dos seus métodos de composição e trabalharam de forma holística as
competências a desenvolver na disciplina como noção de intervalos, figuras rítmicas,
padrões melódicos, entoações entre outros.

3.2 História da Cultura e das Artes

Literatura

A análise sobre a literatura especializada para História da Música, especificamente


sobre a retórica na música do período barroco, escrita em Português compreenderá quatro
livros, certamente os mais utilizados pelos professores e pelos alunos como apoio a esta
disciplina. Os livros são História da Música Ocidental dos autores Claude Palisca e
Donald Grout (Grout & Palisca, 1994), Breve História da Música Ocidental em que o
71
Recolha e Análise de Dados

período barroco é da responsabilidade de Clive Unger-Hamilton (Unger-Hamilton, 2013),


Atlas de Música II de Michels Ulrich (Michels, 2007) e (Borges & Cardoso, 2003).

O espaço reservado para “Os Afectos” por Grout & Palisca (1994, p. 312) ocupa
menos de uma página. É referido de uma forma breve tanto a Doutrina dos Afetos como
também a utilização da estrutura da retórica literária e das figuras musicais pelos
compositores da época. As fases de elaboração retórica são três e são resumidas da
seguinte forma:

O próprio processo de composição musical era concebido, por analogia com as


regras da retórica, como consistindo em três passos: invento, a «descoberta» de um
tema, ou ideia musical de base; dispositio, a planificação ou exposição das divisões
ou «subtítulos» da obra; elaboratio, a elaboração do material (Grout & Palisca, 1994,
p. 312).

Esta divisão em três passos da estrutura retórica foi primeiramente introduzida por
Athanasius Kircher mas foi rapidamente desenvolvida e consumada por Johann
Mattheson no seu famoso tratado Der Volkomenne Capellmeister, aumentando as duas
finais, memoria e pronuntiatio (Bartel, 1997, pp. 76-77) e não está referida no livro em
análise. As figuras musicais são também referidas de forma superficial, mas devidamente
enquadradas no pensamento da elaboração retórica na música.

A importância dada por estes autores a este tema não vai de encontro à importância
e impacto que este teve na música do período barroco como também nas outras artes e na
ciência e filosofia.

Na seção do livro Breve História da Música Ocidental (Unger-Hamilton, 2013)


dedicado ao período barroco não está referido em qualquer momento a Teoria dos Afetos
nem, como é óbvio, a utilização da retórica na composição musical.

Quanto ao livro Atlas de Música II, expõe de uma forma sintética o Simbolismo
Musical, a Teoria dos Afetos como também a Musica Poetica. Resumidamente mostra
a utilização pelos compositores dos princípios e da estrutura da retórica na composição
como também algumas figuras retóricas associadas a virtudes ou sentimentos e, traça a
relação da Teoria dos Afetos com o pensamento filosófico de autores como Descartes.
Para uma ajuda ao declarado no texto tem tabelas com o significado do simbolismo
sonoro e da teoria das figuras retóricas como também alguns exemplos demonstrativos
destas (Michels, 2007, p. 305).

72
Recolha e Análise de Dados

O livro História da Música – Manual do Aluno 2º Ano descreve A Teoria dos Afetos
na sua estilização das (…) “relações entre os sentimentos, as virtudes ou os estados da
alma, quer com os modos/ tonalidades, quer com os instrumentos que os deveriam
representar” (Borges & Cardoso, 2003, p. 11). Refere também, sem esclarecer e
aprofundar, a utilização “particularmente importante” da retórica musical na composição
da música dramática (Borges & Cardoso, 2003, pp. 11,12).

Toda esta literatura aborda, com exceção da Breve História da Música Ocidental,
a Teoria dos Afetos e a utilização da retórica como parte estruturante e importante na
composição de música barroca. O tema está mais presente no Atlas de Música II com uma
exposição introdutória eficaz como também na utilização de exemplos isolados de figuras
retóricas e tabelas como por exemplo, a das relações entre virtudes e modos. Fazendo
parte da génese deste livro, relaciona sumariamente o pensamento filosófico e a
estilização da composição musical. O seguinte é naturalmente História da Música
Ocidental, com uma introdução vaga à Teoria dos Afetos como à utilização da retórica
como ferramenta na composição enunciando a estrutura retórica adaptada da literatura
para a composição musical. Concluindo no História da Música – Manual do Aluno 2º
Ano e de acordo com a sua natureza, ou seja, um manual para o aluno do secundário,
aborda resumidamente a Teoria dos Afetos e o simbolismo musical, e faz uma referência
residual à utilização da retórica na composição mesmo salientado a sua importância.
Neste género de livros, compêndios da História da Música Ocidental, não se espera uma
abordagem exaustiva da retórica musical no período barroco, mas também que a
informação não seja somente introdutória para uma das características fundamentais na
composição musical barroca e transversal na sua cronologia. Para compreender as fases
de elaboração retórica e a sua génese na Grécia clássica, o seu percurso no tempo até aos
dias do período barroco, a sua vida no currículo académico das Universidades Medievais,
o esclarecimento das fases de elaboração retórica como também nas divisões do dispositio
tem que se socorrer a livros especializados sobre o tema, algo que poderia ser realizado
resumidamente em poucas páginas.

Numa abordagem mais aprofundada ao tema, o livro Music in the Baroque Era:
From Monteverdi to Bach de Manfred Bukofzer e o La Música Barroca de John Walter
Hill oferecem uma visão mais alargada e mais contundente da importância da Retórica
Musical/ Teoria dos Afetos no período barroco. O primeiro expõe a importância da Teoria
dos Afetos para a composição barroca, a estereotipização das figuras retóricas para retratar

73
Recolha e Análise de Dados

os afetos como também a crescente relevância desta ao longo do período barroco


(Bukofzer, 1947, pp. 388-390). No segundo, numa seção intitulada La Retórica de las
Artes (Hill, 2008, pp. 31-36), é feita uma eficiente introdução ao tema, retratando a sua
dimensão no meio social alfabetizado, a sua ascendência à cultura grega e latina, as suas
fases bem como a sua divisão estrutural. Em cada uma das fases (Inventio, Dispositio,
Elocutio, Memoria e Pronuntiato) é exposto o seu significado como também para as
partes da divisão estrutural do Dispositio. A Teoria dos Afetos e a Retórica Musical são
aprofundados posteriormente numa seção intitulada La Doctrina de los Afectos (Hill,
2008, pp. 400-416), relacionando-os com o pensamento filosófico da época,
principalmente com René Descartes, enunciando as propriedades afetivas das danças da
Suite barroca, explicando algumas figuras retóricas e concluindo com exemplos
analisados sob uma perspetiva retórica.

Relativamente ao programa de História da Cultura e das Artes, o espaço dedicado


a este tema aborda de uma forma residual a Teoria dos Afetos e o simbolismo musical,
sem referir a utilização sistemática da elaboração e estruturação retórica na composição
musical no período barroco.

Análise de dados recolhidos via observação direta.

A implementação do projeto pela sua natureza do seu tema, teve uma orientação
mais vincada para a disciplina de História da Cultura e das Artes neste caso História da
Música. Questões como “O que é para os alunos a retórica musical?”, “Como trabalhar
com os alunos a problemática da retórica barroca?” e “Qual o contributo da temática em
estudo para o desenvolvimento profissional e cultural dos alunos?” foram sendo
respondidas quer através de uma pesquisa bibliográfica quer na observação e contato com
os alunos desta disciplina.

Nas aulas lecionadas os alunos mostraram-se na sua maioria atentos e curiosos


com o tema do projeto. Mostraram-se entusiasmados com os guias de audição, seguindo-
os com atenção na audição de exemplos musicais. Ficaram a conhecer os
fundamentos/características da análise numa perspetiva retórica, relacionando-os com as
disciplinas de Filosofia e de Português, com os alunos a participarem ativamente, a maior
parte por iniciativa própria e alguns quando solicitados, trazendo o conhecimento
adquirido das duas disciplinas para a aula. Nas aulas dedicadas a trabalhos de grupo sobre
a vida e obra dos compositores maiores do período barroco tiveram aprendizagens

74
Recolha e Análise de Dados

significativas sobre estes e, sobre o seu processo composicional, revelando-se esta


aprendizagem na boa avaliação que tiveram nas suas apresentações e nos trabalhos
escritos. Fizeram uma reflexão crítica a partir da análise musical numa perspetiva retórica
para as outras artes, como por exemplo a arquitetura, evidenciado por comentários por
parte dos alunos sobre a ornamentação simbólica dos retábulos barrocos, observados
durante a visita de estudo a monumentos barrocos da cidade do Porto, serem a
representação do simbolismo musical como também das figuras retóricas musicais.

75
Conclusões e Recomendações

76
Conclusões e Recomendações

IV – CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

O presente relatório de estágio pretende uma exposição clara e objetiva do que foi
a implementação do projeto nas turmas de Formação Musical e de História da Cultura e
das Artes no Conservatório de Música do Porto. Este processo ao longo do ano letivo de
2015/2016 permitiu um enorme número de aprendizagens, tanto a nível profissional como
a nível pessoal. A expressão “Aprende-se ensinando” foi substanciada pelas experiências
ao longo do ano letivo quer pela pesquisa bibliográfica, no sentido de sistematizar o
conhecimento para os alunos, quer pelas interpelações e reflexões destes, que no sentido
de as responder, levando-nos a um novo conhecimento e aprofundamento das matérias
tratadas.

Um dos problemas para a ausência da análise musical numa perspetiva retórica no


ensino básico, preparatório e secundário, prende-se com a sua ausência também nas
licenciaturas e mestrados em ensino do ensino superior. Os estudos superiores em
Portugal não contemplam nos seus planos de estudo um estudo aprofundado da retórica
musical no período Barroco. Da pesquisa realizada ao plano de estudos da licenciatura
em Ciências Musicais da Universidade Nova de Lisboa (Universidade Nova de Lisboa,
2016), comprovou-se que no período barroco a bibliografia recomendada não contempla
alguma referência específica à retórica musical e, do conteúdo enunciado, na cadeira
História da Música – de 1600 a 1750, só “Pensamento teórico musical na primeira metade
do século XVIII” parece ter alguma interseção. O mesmo acontece na licenciatura em
Musicologia na Universidade de Évora (Universidade de Évora, 2016), que embora o
plano de estudos não esteja detalhado quanto à bibliografia a utilizar como à
caracterização da unidade curricular, não aparece nenhuma com uma designação que nos
leve a uma análise musical numa perspetiva retórica. Quanto à licenciatura em Ciências
Musicais da Universidade do Minho (Universidade do Minho, 2016), tanto a bibliografia
a utilizar como o programa sucinto não indicam um estudo aprofundado da retórica
musical. Porém, nesta licenciatura este tema foi absorvido em algumas aulas dedicadas a
uma breve explicação dos princípios da análise retórica na música como também a uma
análise musical numa perspetiva retórica. Quanto aos mestrados em Ensino de Música de
Ciências Musicais/ Musicologia, onde poderia estar o tema da retórica musical
aprofundado, podemos referir o da Universidade de Aveiro (Universidade de Aveiro,
2016) que não contempla no sitio online qualquer informação a este tema como também

77
Conclusões e Recomendações

o da Universidade do Minho. De uma pesquisa, não exaustiva, dos planos de estudo das
licenciaturas e de mestrados em ensino das Ciências Musicais/ Musicologia deparamo-
nos com falta de formação nesta área, sendo que se os professores não têm essa formação
de base, dificilmente lecionarão análise retórica e a sua contextualização na sala de aula
das Ciências Musicais nos níveis de ensino básico, preparatório e secundário.

Dos dados recolhidos durante a observação direta e posteriores apontamentos e


reflexões, podemos concluir que os objetivos do projeto foram cumpridos. Relativamente
à disciplina de Formação Musical, como a interseção com o projeto não se manifesta tão
visível e as aulas lecionadas ocorreram de forma dispersa pelos vários níveis de ensino,
tornaram também a avaliação da sua implementação mais difícil, mas, podemos concluir
que uma primeira contextualização histórica das peças de repertório barroco
relativamente ao compositor, género, instrumentação, pequenos apontamentos de uma
abordagem inicial à análise retórica entre outros, tornou as aulas mais motivadoras,
levando os alunos a um maior conhecimento de repertório e também a uma maior cultura
musical, não deixando de lado as aprendizagens significativas próprias desta disciplina
obtidas durante a lecionação do projeto. Para a disciplina de História da Cultura e das
Artes – História da Música, segundo o nosso ponto de vista os objetivos foram
alcançados. Os alunos compreenderam e assimilaram a importância da retórica na
composição musical no período barroco, a sua ligação umbilical às disciplinas de
Filosofia e de Português, os conceitos para uma análise retórica musical como também
uma olhar crítico sobre a construção social da época baseado na codificação dos
sentimentos em música próprio da retórica musical, do simbolismo e da Teoria dos Afetos.
A utilização de guias de audição numa perspetiva de análise retórica conduziu a mais
motivação para audições por parte dos alunos que resultaram em aprendizagens
significativas.

As limitações deste estudo/ projeto prendem-se sobretudo com os dados


recolhidos, quer na sua insuficiência quer na sua fiabilidade. As aulas de lecionação e
implementação do projeto são insuficientes para fazer uma avaliação capaz deste, como
também o número de alunos intervencionados. No caso da disciplina de Formação
Musical, o número de alunos intervencionados foi de alguma forma significativo (cerca
de 50) mas o número de aulas foi muito reduzido o que levou a uma redução expressiva
da sua implementação e da consequente recolha de dados. No caso da disciplina de
História da Cultura e das Artes, um terreno mais fértil para a implementação deste projeto,

78
Conclusões e Recomendações

as aulas de lecionação/ implementação do projeto foram suficientes, mas a recolha de


dados por metodologia qualitativa, obtidos via observação direta podem levar a uma
conclusão enviesada. Neste caso, o número de alunos intervencionados deveria ser
exponencialmente maior e o método de recolha de dados deveria ser tanto por via
metodológica qualitativa como quantitativa, no sentido de obter uma conclusão mais
categórica. A amostra deveria também comtemplar as opiniões dos docentes das duas
disciplinas relativamente à implementação do projeto pois estes, fazendo uma metáfora
militar, estão na linha da frente do sistema educativo. Num sistema educativo que tudo é
decidido hierarquicamente, de cima para baixo, também se torna necessário considerar as
opiniões de quem faz os currículos das disciplinas e, questioná-los sobre as suas decisões
pois, estas afetam muitos docentes como também muitos mais alunos. Se a avaliação deste
tipo de projetos serve para aferir uma possível aplicação no futuro, torna-se necessário
que esse futuro contemple uma abertura para a inserção deste tipo de projetos no currículo
das disciplinas.

Como já foi referido em Transdisciplinaridade no Ensino das Ciências Musicais,


este projeto, quanto a nós, poderá ser enquadrado nos currículos das disciplinas de
Formação Musical e de História da Cultura e das Artes. Este relatório oferece
enquadramento teórico, planificação e material para ser desenvolvido em sala de aula nas
duas disciplinas, como também a base para uma articulação transdisciplinar com as
disciplinas de Filosofia e Português. O docente que queira aprofundar este tema nas suas
aulas tem assim, um ponto de partida para o seu trabalho.

79
Referências Bibliográficas

80
Referências Bibliográficas

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Allerme, J.-M. (1991). Du Solfège sur la F.M. 440.2. Paris: Gérard Billaudot Éditeur.

Anderson, R. J. (2012). The Arts of Persuasion: Musical Rhetoric in the Keyboard Genres
of Dieterich Buxtehude (Tese de Doutoramento, The University of Arizona). Obtido
de http://hdl.handle.net/10150/242454

Agostinho, Santo. (2002). A Doutrina Cristã. São Paulo: Paulus.

Aristóteles. (2005). Retórica. Lisboa: Imprensa Nacional Casa da Moeda.

Assumpção, S. (2007). Ascendéncia Retórica das Formas Musicais (Dissertação de


Mestrado, Universidade de São Paulo). Obtido de http://www.teses.usp.br/
teses/disponiveis/27/27140/tde-23072009-204002/pt-br.php

Bach, J. S. (1988). Facsimile de Klavierbüchlein für Anna Magdalena Bach (1725).


Kassel: Bärenreiter-Verlag.

Bach, J. S. (1993). Petit livre d'Anna Magdalena Bach. Paris: Editions Henry Lemoine.

Bach, J. S. (2008). Selections (BWV 253–438); Complete Score (Numbered 1-185). Palo
Alto: CCARH Team. Obtido de http://ks.imslp.info/files/imglnks/usimg/6/6b/
IMSLP24489-PMLP09471-CCARH_Bach_Chorales.pdf

Barilli, R. (1979). Retórica. (G. M. Dias, Trad.) Lisboa: Editorial Presença.

Barros, M. D., Henriques, F., & Vicente, J. N. (22 de 02 de 2001). Programa de Filosofia.
(M. M. Almeida, Ed.) Obtido de http://www.dge.mec.pt/sites/default/files/
Secundario/Documentos/Documentos_Disciplinas_novo/filosofia_10_11.pdf

Bartel, D. (1997). Musica Poetica: Musical-Rhetorical Figures in German Baroque


Music. Nebraska: Nebraska University Press.

Benedetti, D. (2012). O Prélude da Suíte para Piano Solo Le Tombeau de Couperin de


Maurice Ravel: considerações composicionais e interpretativas. Revista Música
Hodie, 12, 44-55.

Bent, I. D., & Pople, A. (s.d.). Analysis. Em S. Sadie (Ed.), The New Grove Dictionary
of Music and Musicians (Vol. 1) (pp. 340-388). London: MacMillan.

81
Referências Bibliográficas

Borges, J. F., Paiva, M., & Tavares, O. (2014). Novos Contextos. Porto: Porto Editora.

Borges, M. J., & Cardoso, J. M. (2003). História da Música – Manual do Aluno 2º Ano.
Alfragide: Sebenta.

Buelow, G. J. (s.d). Rhetoric and music – 2. Baroque. Em G. G. Stanley Sadie, The New
Grove Dictionary of Music and Musicians online. Obtido em 23 de abril de 2016.

Bukofzer, M. (1939). Allegory in Baroque Music. Journal of the Warburg and Courtauld
Institutes, 3(1/2), 1-21. doi:1

Bukofzer, M. (1947). Music in the Baroque Era: From Monteverdi to Bach. New York:
W. W. Norton & Company, Inc.

Campos, M. J., Grosso, M. J., Loureiro, M. D., Pascoal, J., & Seixas, J. (2002). Programa
de Português. (M. D. Coelho, Ed.) Obtido de Direção Geral de Educação:
http://www.dge.mec.pt/sites/default/files/Secundario/Documentos/Programas/port
ugues_10_11_12.pdf

Cano, R. L. (2000). Música y Retórica en el Barroco. Ciudad Universitaria: Universidad


Nacional Autónoma de México.

Catarino, A., Fonseca, C., & Peixoto, M. J. (2014). Outros Percursos. Vila Nova de Gaia:
Edições Asa.

Conservatório de Música do Porto. (2016). Projeto Educativo. Obtido de Conservatório


de Música do Porto: http://www.conservatoriodemusicadoporto.pt/
documentosorientadores/pe_cmp.pdf

Conservatório de Música do Porto. (2016). Regulamento Interno. Obtido de


Conservatório de Música do Porto: http://www.conservatoriodemusicadoporto.pt/
wp-content/uploads/bsk-pdf-manager/ri_cmp_1.pdf

Decreto-Lei n.º 344/90 de 2 de novembro

Duarte, M. (2006). A interação social no processo de criação de trilhas sonoras:


perspectiva para o ensino de música. XVI Congresso da Associação Nacional de
Pesquisa e Pós-graduação em Música (pp. 47-51). Brasília.

Gartenlaub, O. (1985). Lectures d'auteurs a chanter: pour le Préparatoiure:


transcription. Paris: Éditiones Musicales Hortensia.

82
Referências Bibliográficas

Grout, D., & Palisca, C. (1994). História da Música Ocidental. Lisboa: Gradiva.

Harnoncourt, N. (1995). Baroque Music Today: Music As Speech. (M. O'Neill, Trad.)
Portland: Amadeus Press.

Harris, P. (2006). Improve your teaching!. London: Faber Music Ltd.

Harrison, D. (1990). Rhetoric and Fugue: An Analytical Application. Music Theory


Spectrum, 12(1), 1-42.

Hernández, J. A., & García, M. d. (2005). História Breve De La Retórica. Madrid:


Síntesis.

Hill, J. W. (2008). La Música Barroca. (A. Giráldez, Trad.) Madrid: Akal.

Jollet, J.-C. (1988). Jeux de Rythmes et Jeux de Clés volume 5. Paris: Gérard Billaudot.

Lanzoni, P. A. (2013). Apontamentos retórico-musicais no Largo do Concerto n.5, BWV


1056, de Johann Sebastian Bach. Per Musi, 27, 218-226.

Liao, W.-C. (2015). A Study of Musical Rhetoric in J. S. Bach’s Organ Fugues BWV 546,
552.2, 577, and 582 (Tese de Doutoramento, University of Cincinnati). Obtido de
https://etd.ohiolink.edu/pg_10?0::NO:10:P10_ETD_SUBID:102144

Machado, J. P. (1981). Grande Dicionário da Língua Portuguesa (Vol. 10). Lisboa:


Amigos do Livro.

Massimi, M. (2008). Delectare, movere et docere: retórica e educação no Barroco. Per


Musi 17, 54-59.

Mateus, F. (24 de março de 2016). Sala de Estudo Textos. Obtido de Flávio Mateus:
http://www.flaviomateus.com

Mccreless, P. (2002). The Cambridge history of Western music theory. (T. Christensen,
Ed.) Cambridge: Cambridge University Press.

Michels, U. (2003). Atlas de Música I. Lisboa: Gradiva.

Michels, U. (2007). Atlas de Música II. Lisboa: Gradiva.

Nicolescu, B. (1999). Um Novo Tipo de Conhecimento - Transdisciplinaridade. 1º


Encontro Catalisador do CETRANS - Escola do Futuro (pp. 9-25). São Paulo.

83
Referências Bibliográficas

Obtido de http://www.vdl.ufc.br/solar/aula_link/llpt/A_a_H/didatica_I/aula_04/
imagens/01/transdisciplinaridade.pdf

Pedroso, F. (2006). A Disciplina de Formação Musical em debate: Perspectivas de


profissionais da música. Revista Música, Psicologia e Educação Nº 6, 5-18.

Persone, P. (1996). A Interpretação Das Obras “Non Mesures” Para Cravo, Explicadas
Segundo As Leis Da Retórica (Dissertação de Mestrado, Universidade de
Campinas). Obtido de http://www.bv.fapesp.br/pt/bolsas/88950/a-interpretacao-
das-obras-non-mesures-para-cravo-explicada-segundo-as-leis-da-retorica/

Platão. (2001). A República. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.

Platão. (2010). Górgias. Lisboa: Edições 70.

Reboul, O. (2004). Introdução à retórica. (I. C. Benedetti, Trad.) São Paulo: Martins
Fontes.

Rocha, M. (2007). Conservatório de Música do Porto - 90 Anos. Revista de Educação


Musical, 5-10.

Rodrigues, A. C. (2006). Análise de alguns aspectos retórico-musicais de “Domine Deus,


Agnus Dei” do Gloria rv 589 de Antonio Vivaldi. Musica Hodie, 6 Nº1, 35-49.

Santos, A. (2008). Complexidade e transdisciplinaridade em educação: cinco princípios


para resgatar o elo perdido. Revista Brasileira de Educação, 71-83.

Soares, E. A. (2014). Retórica: um novo objeto de estudo na Música Colonial Brasileira.


Anais do III SIMPOM, (pp. 1-11).

Soares, E. A., & Neto, D. M. (2014). Análise Retórica em Manoel Dias de Oliveira:
Exemplos de Figuras Retórico-Musicais. DAPesquisa, 1-17.

Strunk, O. (1950). Source Readings in Music History. New York: W. W. Norton &
Company Inc.

Unger-Hamilton, C. (2013). Música do Barroco. Em L. Jenkins, C. Unger-Hamilton, S.


Johnson, & D. McCleery, Breve História da Música Ocidental (pp. 87-162).
Lisboa: Bizâncio.

Universidade de Aveiro. (20 de 06 de 2016). Ensino de Música. Obtido de Universidade


de Aveiro: https://www.ua.pt/ensino/course/184/?p=4

84
Referências Bibliográficas

Universidade de Évora. (20 de 06 de 2016). Música - Licenciatura: Ramo de Musicologia.


Obtido de Universidade de Évora: http://www.estudar.uevora.pt/
Oferta/licenciaturas/curso/(codigo)/584

Universidade do Minho. (20 de 06 de 2016). Música - Pós-Laboral. Obtido de


Universidade do Minho: https://www.uminho.pt/PT/ensino/oferta-
educativa/_layouts/15/UMinho.PortalUM.UI/Pages/CatalogoCursoDetail.aspx?ite
mId=2027&catId=7

Universidade Nova de Lisboa. (20 de 06 de 2016). Faculdade de Ciências Sociais e


Humanas - Cências Musicais. Obtido de Universidade Nova de Lisboa:
http://www.unl.pt/guia/2012/fcsh/UNLGI_getCurso?curso=4006

Wilson, B. (s.d.). Rhetoric and music - 1. Middle Ages and Renaissance. Em G. G.


Stanley Sadie, The New Grove Dictionary of Music and Musicians online. Obtido
em 23 de abril de 2016.

Wright, C. (2008). Listening to Western Music (7 ed.). Boston: Schirmer Cengage


Learning.

85
86
Anexos

Anexo 1 – Formação Musical – plano de aula lecionada nº 5

Identificação da turma
Escola: Conservatório de Música do Porto Disciplina: Formação Musical
Professor: Turma: 2º Grau / 6º Ano
Curso Básico: regime integrado Duração: 45 m (8.20 – 9:05)
Data: 26 / 04 / 2016
Caracterização da Turma
A Turma é constituída por 11 alunos, sendo uma turma heterogénea. Destes 11 alunos
4 têm capacidades acima da média, 5 são alunos médios e 2 alunos com dificuldades
em acompanhar as matérias dadas. Os alunos mostram interesse e motivação pela
disciplina na sua componente prática.

Recursos Materiais
Livro do aluno; caderno diário e material de escrita; piano; computador com colunas
de som.

etc…
Objetivos gerais: Objetivos específicos:

 Desenvolver a leitura; O aluno deve ser capaz de:


 Desenvolver o rigor rítmico;  Analisar um excerto musical;
 Desenvolver a capacidade de  Ler à primeira vista;
memorização;  Cantar com o nome das notas;
 Desenvolver o ouvido harmónico;  Situar-se auditivamente no âmbito
 Desenvolver a expressividade na da tonalidade de Sol M;
entoação.  Desenvolver a consciência rítmica
e melódica;
 Entoar afinadamente um excerto
melódico;
 Consciencializar-se acerca do
processo de auto e heteroavaliação.

87
Anexos

Estratégias:
1. O professor inicia explicando como decorrerá a aula e quais serão os conteúdos
abordados.
2. Análise musical do excerto quanto aos seus conteúdos teóricos.
3. Recapitulação/ exposição de conteúdos teóricos.
4. Leitura solfejada na clave de sol.
5. Leitura solfejada na clave se fá.
6. Leitura solfejada em pauta dupla.
7. Recapitulação da formação de arpejos/ acordes identificando-os no excerto.
8. Identificação e entoação de intervalos e melodias com e sem partitura.

Atividades:

1. Após apresentação do excerto, o professor, em diálogo com os alunos, propõe uma


breve análise ao excerto pedindo aos alunos para anotarem: tonalidade, ritmo e
compasso utilizado, padrões ritmo-melódicos, intervalos entre outros (8m).
2. Exposição sobre o significado da tonalidade de Sol Maior e do compositor J.S.
Bach. Exposição do fac-smile do Pequeno livro de Anna Magdalena Bach (5m).
3. Solfejo do excerto por todos os alunos da clave de Sol (5m).
4. Solfejo do excerto por todos os alunos da clave de Fá (5m).
5. Solfejo do excerto por todos os alunos alternado entre clave sol e de fá – 1 cp.
cada (5m).
6. Entoação apontada da escala de Sol Maior, o seu arpejo como também ordenações
nesta escala (5m).
7. Entoação do excerto musical pela turma com acompanhamento do piano e de
seguida com acompanhamento pré-gravado. Avaliação da entoação (10m).
8. Autoavaliação (2m).

Avaliação:
Avaliação formativa a partir de observação dos alunos em pontos-chave.
Bibliografia:

Bach, J. S. (1993). Petit livre d'Anna Magdalena Bach. Paris: Editions Henry Lemoine.

88
Anexos

Anexo 2 – Formação Musical – plano de aula lecionada nº 6

Identificação da turma
Escola: Conservatório de Música do Porto Disciplina: Formação Musical
Professor: Turma: 2º Grau / 6º Ano
Curso Básico: regime integrado Duração: 45 m (9:05 – 9:50)
Data: 5 / 04 / 2016
Caracterização da Turma
A Turma é constituída por 12 alunos, sendo uma turma heterogénea. Destes 12 alunos
quatro tem capacidades acima da média, 6 são alunos médios e 2 alunos com
dificuldades em acompanhar as matérias dadas.

Recursos Materiais
Livro do aluno; caderno diário e material de escrita; piano; computador com colunas
de som.

Objetivos gerais: Objetivos específicos:

 Desenvolver a leitura rítmica; O aluno deve ser capaz de:


 Desenvolver o rigor rítmico na  Realizar leitura rítmica a duas
execução e na leitura; partes;
 Desenvolver a capacidade de  Realizar um ditado rítmico com
memorização; notas dadas;
 Desenvolver o ouvido  Realizar um ditado melódico com
harmónico. ritmo dado;
 Desenvolver a consciência rítmica e
melódica;
 Consciencializar-se acerca do
processo de auto e heteroavaliação.

Estratégias:
1. O professor inicia explicando como decorrerá a aula e quais serão os conteúdos
abordados.
2. Desenvolver a identificação e classificação de intervalos através do excerto
apresentado.
3. Desenvolver leituras rítmicas a duas partes.
4. Desenvolver a perceção rítmica de uma melodia.
5. Desenvolver a perceção auditiva.

89
Anexos

Atividades:

1. O professor, em diálogo com os alunos, pede–lhes para identificarem 8 intervalos


e depois encontrá-los no excerto da aula anterior (10m).
2. O professor explica a utilização e alteração do ritmo a duas partes retirado do
menuet estudado na aula anterior. Realização de leitura rítmica a duas partes
(10m).
3. Realização de um ditado rítmico com notas dadas (10m).
4. Realização de um ditado melódico com ritmo dado (10m).
5. Autoavaliação (5m).

Avaliação:
Avaliação formativa a partir de observação dos alunos em pontos-chave.
Bibliografia:

Bach, J. S. (1993). Petit livre d'Anna Magdalena Bach. Paris: Editions Henry Lemoine.

90
Anexos

Anexo 3 – Exemplo de material usado nas aulas de História da Cultura e das Artes

Ficha Síntese do Concerto Brandeburgueses nº2 de J.S. Bach

Os seis Concertos de Brandeburgo foram compostos entre 1717 e 1721 estando


J.S. Bach como Kapellmeister (Mestre Capela) ao serviço do príncipe Leopold de Anhalt-
Köthen na Alemanha. O príncipe era um apaixonado pela música como também um bom
violinista, tocando muitas vezes na orquestra, com cerca de dezoito instrumentistas, que
servia para entreter e impressionar os visitantes da sua corte. Nas suas obrigações
profissionais, Bach escreveu e interpretou a sua música numa série regular de concertos
que ocorriam na noite de domingo e, com certeza atraiu alguns talentosos instrumentistas
para a orquestra, quer como membros permanentes ou como convidados.

Esta associação de Bach com o príncipe durou quatro anos, compondo em


predominância música secular. No entanto, quando o príncipe casou com sua prima
Friederika Henrietta, que não partilhava da paixão do seu marido pela música,
gradualmente convenceu-o a gastar menos tempo e recursos nas suas atividades musicais.
Assim o compositor começou a procurar uma nova posição onde seus talentos poderiam
ser mais bem aproveitados e, vendo o Margrave de Brandeburgo como um possível
empregador e patrono, enviou-lhe os seis Concertos.

Bach não conseguiu o emprego, nem, tanto quanto pode ser determinado, ele
recebeu qualquer recompensa financeira pelos seus seis concertos, reformulando-os mais
tarde, mas mesmo assim ficaram esquecidos, sendo redescobertos no século XIX.

Considerações de interpretação

Deve-se considerar a diferença entre uma interpretação/ gravação com instrumentos


utilizados na época e uma da modernidade com os instrumentos atuais como:

 O uso de flautas-doces em oposição a flautas transversais


 A presença de poucos instrumentistas, de modo a produzir uma sonoridade de
música de câmara
 Uso de violone (seis cordas) no lugar dos Contrabaixos
 Direção a partir do cravista, em vez da presença de um maestro
 A utilização de instrumentos autênticos (da época ou recriados)

91
Anexos

 A afinação: O lá do período barroco pode ser definido em cerca de 415 Hz, em


oposição ao temperamento moderno em que o lá tem 440 Hz (cerca de meio-tom
abaixo).

Existem diferenças significativas entre os instrumentos autênticos e modernos:

Autênticos Modernos
Violinos
 Pescoço e braço mais curtos, com  Pescoço e braço mais longos com
um menor intervalo até à sexta maior variedade de alturas
posição
 Cordas feitas de tripa de gato com  Cordas de metal, som mais forte.
um som menos brilhante
 Arcos mais curtos e menos curvos  Arcos mais longos, em linha reta
com tensão menor com um som mais robusto
 Três notas possíveis (acorde)  Som mais sustentável para as notas
mais longas
 Pouco vibrato, fraseado mais leve  Algum vibrato, levando a um som
mais colorido e variado

Flautas-doces Flautas transversais


 Feitas de madeira, menor projeção  Feitas de metal (níquel ou prata)
com um som mais forte

Violone Contrabaixo
 6 cordas  4 cordas
 Som menos vibrante e com  Som mais cheio mas requer
extensão até ao Dó exigido por extensão para notas mais baixas
Bach.

Concerto

Os Concertos foram a forma instrumental mais popular do período barroco, dando


a oportunidade para os solistas exibirem o seu virtuosismo e foi para a era barroca o que
92
Anexos

a sinfonia representou mais tarde no período clássico, a excelência da música orquestral.


Um concerto barroco enfatiza contrastes bruscos com uma surpreendente mudança entre
a luz e a escuridão, característica que se pode encontrar facilmente numa pintura barroca.

Um concerto (do Latim concertare, rivalizar/competir) é uma composição musical


marcada por uma competição amigável ou concorrência entre solista(s) e orquestra.

Quando esta rivalidade ocorre entre um solista (violino, flauta, oboé entre outros)
e a orquestra, denomina-se Concerto Solo, mas se um pequeno grupo de solistas compete
em conjunto com a orquestra completa, denomina-se um Concerto Grosso. O grupo maior
forma a orquestra básica e denominam-se Concerto Grosso e, o grupo menor de dois, três
ou quatro solistas, é chamado de concertino. Quando tocam em conjunto constituem a
orquestra completa, chamada de tutti (que significa todos).

Como escrito por Vivaldi e Bach, o Concerto Solo e o Concerto Grosso


compreendiam normalmente três andamentos: rápido-lento-rápido. O primeiro
andamento, mais sério, é composto, obedecendo a uma estrutura chamada ritornello
cuidadosamente trabalhada; o segundo andamento é constantemente mais lírico e suave;
e o terceiro andamento, embora utilize a estrutura ritornello, tende a ser menos sério e
com mais humor.

O primeiro andamento do Concerto Brandeburguês Nº 2 foi incluído na seleção


de músicas da sonda espacial Voyager 1, que se dá pelo título Messages from Earth.

Guia de Audição

J.S. Bach: Concerto Brandeburguês Nº 2 em Fá maior,

Primeiro andamento (c. 4:45)

Data da composição: 1717-1718

Gênero: Concerto Grosso

Concertino: violino, oboé, flauta-doce, trompete

Andamentos:

I. Allegro

II. Andante

93
Anexos

III. Allegro assai

Primeiro andamento: Allegro; na forma de ritornello

O que ouvir: quatro instrumentos solistas (violino, oboé, flauta-doce, trompete), tocando
solos curtos alternando rapidamente com a orquestra completa.

Ritmo animado e marcado.

Tema recorrente (ritornello) na orquestra unifica o andamento, alternando com solos


individuais curtos. Textura polifônica com várias linhas melódicas ouvidas
simultaneamente.

Ritornello:

Seção Descrição Tonalidade


Ritornello Orquestra Fá Maior
Solo Solo de violino Fá Maior
Ritornello 2 Orquestra Fá Maior
Solo 2 Oboé e violino Fá Maior
Ritornello 3 Orquestra Dó Maior
Solo 3 Flauta-doce e oboé. Fá Maior
Ritornello 4 Orquestra Dó Maior
Solo 4 Trompete e flauta. Fá Maior
Ritornello 5 Orquestra Dó Maior
Solo 5 Trompete, violino, flauta e oboé. Fá Maior
Ritornello 6 Orquestra; tema longo alternado entre os Várias
instrumentos, acabando nos violoncelos.
Solo 6 Flauta, violino, oboé, trompete. Várias

Longa modulação com várias mudanças


entre instrumentos do tutti.
Ritornello 7 Orquestra. Fá maior

94
Anexos

Anexo 4 – Guia de Audição numa Perspetiva da Análise Retórica

O Bandolim na Era Barroca

Programa:

Sonata para Bandolim K.81 de Domenico Scarlatti


Sonata para Bandolim e baixo contínuo de Aleixo Botelho de
Ferreira
Concerto em Dó Maior, RV425 de Antonio Vivaldi

Com a participação de:


Professor António de Sousa Vieira (Bandolim);
Professor Rui Gama (Guitarra).

10 de maio de 2016
Auditório do Conservatório de Música do Porto

95
Anexos

Antonio Vivaldi
(Veneza, 4 de março de 1678 - Viena, 28 de julho de 1741)
Antonio Vivaldi foi o compositor italiano mais original, popular e influente na sua época,
tendo sido muito rapidamente esquecido. Durante um século o seu nome e a sua obra
estavam no completo esquecimento, sendo finalmente redescobertos no início do século
XX, tornando-se num dos compositores mais ouvidos novamente, e muitas vezes
associado a música excessivamente fácil. Sabe-se agora que ele compôs mais de
quinhentos concertos, além de óperas, sonatas, cantatas e trios.

Vivaldi começou a sua carreira como um virtuoso do violino (estudou com o seu pai),
mas também se preparou para o caminho do sacerdócio, tornando-se padre com 25 anos,
ficando conhecido como o padre-rosso devido à cor ruiva do seu cabelo. Nesse mesmo
ano, aceitou um emprego como diretor de música, professor de violino e compositor em
La Pietà, um orfanato para meninas, cargo que manteria por quase toda a sua vida, ou
seja, por mais de trinta e cinco anos. No auge de sua carreira foi altamente considerado,
inclusive por J. S. Bach, que admirava a sua música, tendo copiado várias das suas obras
e arranjado algumas para diferentes instrumentos. O género de composição/ especialidade
de Vivaldi foi o concerto, para um ou mais instrumentos, que compôs em abundância e
com uma facilidade incomum (Vivaldi alegou que poderia compor um concerto mais
rápido do que um copista poderia copiá-lo). Foi a publicação de uma coleção de doze
concertos chamado L'estro armonico em Amesterdão no ano de 1711 que tornou famoso
o seu nome por toda a Europa, tornando-se a coleção mais vendida no início do século
XVIII (Bach copiou e arranjou seis destes concertos para órgão ou cravo).

É atribuído a Vivaldi o estabelecimento da forma convencional dos três andamentos no


concerto barroco. Não sendo o inventor destes três andamentos, foi ele que os estabeleceu
ao utilizar este modelo constante e variadamente, padronizando e influenciando as
décadas seguintes. Foi também o primeiro compositor a fazer uma utilização regular da
forma ritornello em tonalidades diferentes, mas próximas, para todos os instrumentos
alternando com passagens livres dominadas pelo solista.

O Concerto para Bandolim em Dó Maior data de 1725, e é considerado uma das peças
barrocas mais famosas para bandolim. É dado um tratamento virtuosístico ao bandolim
com exigências técnicas mais elevadas do que a outros concertos. Divide-se em três
andamentos, Allegro, Largo e Allegro.

96
Anexos

Análise Retórica do 1º andamento (Allegro) do Concerto em Dó Maior


para Bandolim de Antonio Vivaldi, RV425

Adotada da retórica literária, esta com uma longa história desde a Grécia clássica, a
retórica musical desenvolveu-se principalmente na Alemanha luterana, tendo-se irradiado
por toda a Europa. Para uma elaboração de um discurso musical foram adotadas também
as fases da elaboração retórica literária:

Inventio – a determinação do tema, assunto, ou ainda do “tópico” sobre o qual se vai


discorrer (compor).

Dispositio – a parte do processo na qual as ideias do inventio serão organizadas. Para que
essa organização seja orientada e organizada, há uma subdivisão tradicional em seções:

 Exordium – funciona como uma introdução ao tema, silencia o auditório e prepara


os ouvintes, solicitando sua atenção para o que se seguirá.

 Narratio – uma clara definição do tema ou assunto principal, demonstrando a


intenção do orador ou a natureza de uma composição musical. Propositio – na
oratória surgia logo após a narratio, pois era comum que após a narração de factos
se propusesse um juízo acerca destes. Em música essa divisão confunde-se com o
propositio que acaba abarcando também as funções da narratio.

97
Anexos

 Confutatio ou Refutatio – ocorrem os argumentos que se opõem ao tema principal,


e que geram tensão e instabilidade. Na música equivale aos momentos
modulatórios, à utilização dos cromatismos e das passagens contrastantes.

 Confirmatio – a confirmação das ideias principais, sendo realizadas as objeções


apresentadas na confutatio. É caracterizado pelo retorno à estabilidade da
tonalidade principal, pela aquietação dos materiais temáticos propostos.

 Peroratio ou conclusio – a conclusão do discurso ou da composição musical,


numa cadência final cuidadosamente preparada ou ainda numa repetição literal ou
ligeiramente modificada do exordium.

Elucotio – o ajustamento na escrita das partes previamente esboçadas. Poderão ser


acrescidas ornamentações, ligações entre partes e alterações de estilo. Em música, o final
da escrita iniciada no dispositio acontece no elocutio (ou decoratio, como às vezes é
citada). Para que o discurso, organizado no dispositio, pudesse ser persuasivo, fazia-se
necessário reforçá-lo através de figuras retóricas sendo o elocutio ou decoratio, o
momento privilegiado para o fazer. As figuras retóricas são meios de reforço e
ornamentação do discurso, para obter uma comunicação mais eficaz e persuasiva para
com o ouvinte.

Memoria – a memória é importante para quem executa/ interpreta música, recorrendo a


sistemas mnemónicos para melhor a assimilar. No processo composicional (musical), a
memória não é considerada importante.

98
Anexos

Pronuntiato – representação/ ação/ execução da composição musical. Está mais


relacionado com a interpretação musical propriamente dita do que com o processo
composicional.

99

Você também pode gostar