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Universidade Federal de Minas Gerais

Instituto de Geociências
Geografia Econômica
Aluna: Ana Luísa de Souza Silva

Unidade V – Neoliberalismo, subdesenvolvimento e globalização


I) Introdução
Visando explorar as ideias do notável geógrafo economista Giovanni Arrighi em seu livro
Adam Smith em Pequim: origens e fundamentos do século XXI, publicado em 2007, o
presente estudo trata de compreender as diferentes vertentes teóricas dentro de sua singular
análise. O braudeliano irá discutir nessa obra a ascensão chinesa no atual século, bem como os
desdobramentos que podem ocorrer com a mudança hegemônica no sistema capitalista.
Nesse sentido, este texto inicialmente traz breves informações sobre o referido autor para a
posteriori adentrar na primeira parte do livro de Arrighi. Com enfoque nos ciclos
hegemônicos e a ascensão chinesa, propõe-se também o diálogo entre outros diferentes
autores.

II) Adam Smith em Pequim

Giovanni Arrighi (1937-2009) é pensador basilar da Geografia Econômica e da Geopolítica


na atualidade. O economista italiano participou na década de 1960 da geração de cientistas
sociais que trabalharam na África e se empenharam no estudo do desenvolvimento econômico
da periferia do capitalismo. Nas décadas seguintes, Arrighi volta sua atenção e se especializa
na crise hegemônica norte-americana, as transformações na política mundial e no crescimento
da China nessa conjuntura.
Pensador ímpar, Arrighi tem Fernand Braudel como sua referência máxima. É de Braudel
que vem a sobreposição dos longos séculos, a ascensão e declínio, expansão e hegemonia
mundial. O economista rejeita análises simplistas e, apesar de historicista, aceita influências
de outras linhas teóricas e traz para sua obra os conceitos de Adam Smith e Karl Marx, por
exemplo. Considerando as contribuições anteriores, Arrighi constrói seu próprio pensamento
baseado no método de descrição e observação histórica.
Em Adam Smith em Pequim, o italiano sintetiza o pensamento liberal, marxista e historicista
para explicar o século XXI e a realidade chinesa. Na primeira parte de seu livro Arrighi
investiga o que Ken Pomeranz chamou de Grande Divergência e reconstrói as teorias do
desenvolvimento de Marx e Shumpeter em comparação com a teoria de Smith. Este último é,
de forma especial, de grande valia para a compreensão de mercados não capitalistas, segundo
Arrighi (2008). de grande valia para a compreensão de mercados não capitalistas, segundo
Arrighi (2007).
Antes de progredir para o entendimento dos ciclos hegemônicos e sua mudança em curso,
cabe destacar alguns pontos sobre capitalismo e mercado e sobre as particularidades do
Ocidente e Oriente. Assim como visualiza Fernand Braudel, Arrighi admite que capitalismo é
diferente de mercado, sendo apenas uma camada superior da estratificação da economia. O
capitalismo é superestrutural, marítimo, expansivo, constrói relação entre centro e periferia e
naturalmente tem uma cidade poderosa. Ainda se tratando de capitalismo, este só pôde existir
porque os capitalistas se juntaram com o Estado e mais tarde o dominaram. Por ter esses
traços ele se desenvolveu no Ocidente, que conseguiu atingir sua fase hegemônica com a
Revolução Industrial.
Como defende Smith, Giovanni Arrighi pontua que o Mercado, a longo prazo, é benéfico
para a sociedade, a China é prova dessa ideia. Diferente da Europa, no Oriente o Estado
nacional territorialista não deixa as forças econômicas se tornarem superiores e dessa forma o
Estado domina a economia. O Territorialismo, típico do Oriente, é estatal, continental,
estrutural baixo, é ligado ao território e voltado ao local, portanto tem um desenvolvimento
autocentrado.
Suas convergências com Marx são menos visíveis nessa obra. Arrighi considera simplista o
entendimento de que os mercados são iguais a capitalismo. Além disso, afirma que o autor
d’O Capital não tem vocação para explicar todo o globo, uma vez que tem uma perspectiva
ocidental e eurocêntrica, sendo necessário recorrer a outros teóricos marxistas para a análise
do Oriente e da periferia do capitalismo.
O problema é que O Capital trazia ideias importantíssimas sobre o conflito de classes;
mas os pressupostos de Marx sobre o desenvolvimento do capitalismo em escala
mundial não resistiam ao exame empírico. (ARRIGHI, 2008, p. 36)
Se em alguns aspectos Arrighi desconsidera o pensamento de Marx, no que tange o conflito
de classes, o alemão é fundamental. Arrighi concorda com o alemão que há ciclos de luta de
classes e que elas levam a mudanças históricas. É nesse sentido que, incorporando Marx,
Lenin e interseccionando Braudel e Smith, o historicista vai tratar do padrão dos ciclos de
acumulação e seus desdobramentos.

III) Os ciclos de acumulação

Estudando os séculos XVI a XX, Arrighi observou que ao longo do desenvolvimento do


capitalismo houve a formação de Ciclos de Acumulação. Em cada um deles uma nação
hegemônica liderou a conjuntura, com características econômicas, políticas e tecnológicas
distintas, próprias da fase capitalista em que estavam inseridas.
Quanto ao funcionamento dos ciclos, tem-se inicialmente a ascensão de um Estado
hegemônico, a apropriação das produções e uma fase de expansão material. Com a crescente
acumulação e desenvolvimento, ocorre a imitação do Estado hegemônico pelas potências
concorrentes e assim, cresce a rivalidade entre os Estados e a competição entre os países. A
fase de expansão material é seguida pela fase de expansão financeira, é quando surgem novos
monopólios. É nesse contexto que vai se intensificar a luta de classes, os conflitos sociais,
guerras e caos sistêmico. Em crise, os capitalistas passam a aplicar as finanças em outros
países e dessa forma acontece o deslocamento de capital. Com a apropriação das produções
pelo capitalismo, ocorre uma nova fase de expansão material e um outro ciclo hegemônico se
inicia.
O primeiro dos ciclos de acumulação foi observado entre o fim do período medieval e o
moderno. Ocorreu em Gênova, na Itália com a expansão e o declínio comercial dos séculos
XIII e XIV continuado pela expansão das finanças. Foi seguido pela hegemonia holandesa,
que depois foi superada pela Inglaterra. O ciclo britânico ocorreu com as Revoluções
Industriais e marcou o surgimento de novas tecnologias, além dos novos conceitos de Smith
de livre mercado, autorregulação e mão invisível.
O presente ciclo é liderado pelos Estados Unidos e, como observa Arrighi, já está em crise
terminal. Com a Terceira Revolução Industrial, o novo momento surgiu baseado num intenso
aparato tecnológico, competitividade internacional e domínio do capital financeiro. A
potência americana, porém, dá sinais de crise desde os choques de petróleo da década de 70,
além da derrota na Guerra do Vietnã e o desastre no Iraque. Mais recentemente, a crise
econômica de 2008 que atingiu o mundo e começou em solo estadunidense, também assinalou
essa possível mudança hegemônica. Arrighi pontua:
A origem da turbulência é atribuída à acumulação excessiva de capital em um contexto
global marcado pela revolta contra o Ocidente e outros levantes revolucionários da
primeira metade do século XX. O resultado foi a primeira crise profunda da hegemonia
dos Estados Unidos no fim da década de 1960 e no início da década de 1970 que
chamarei de “sinalizadora da crise” da hegemonia norte-americana. Os Estados Unidos
reagiram essa crise competindo agressivamente pelo capital do mercado financeiro
global intensificando a corrida armamentista com a União Soviética, na década de 80.
(ARRIGHI, 2008, p. 24)
O economista, porém, não crava o futuro da hegemonia, mas abre possibilidades para o
futuro. Ainda não está de todo perdido o império global centrado no Ocidente, podendo haver
a permanência desta hegemonia. Há também a possibilidade de um caos mundial
interminável. Fato é que também aumentaram as chances da formação de uma sociedade de
mercado mundial voltado para o Oriente e a China como a Nova Ordem Mundial.

IV) Ascensão chinesa

Assim como os anteriores, o século XXI segue padrão dos ciclos de acumulação, porém
agora indica que está migrando para Pequim e pode ser dominado por um Estado socialista, a
China. A ascensão chinesa pode ser entendida por meio de dois processos, o primeiro deles é
a acumulação do da Era Mao, em que houve reformas de base e a industrialização no campo.
Mas, o ponto de virada do país foi com Deng Xiaoping em 1978 com as reformas e certa
abertura, com o objetivo de criar uma economia de mercado socialista. Ainda com o mercado
sob o controle do Estado, abriu-se o comércio, houve um pesado investimento público e
tecnológico, a mão de obra rural migrou para a indústria e com os investimentos estrangeiros
observou-se um controle estatal em setores estratégicos. O resultado foi uma onda de
industrialização, urbanização e desenvolvimento econômico.
Sem embarcar nas políticas neoliberais, China manteve o gradualismo e os investimentos
para preservar o emprego. Com população ativa e um mercado gigantescos, a Revolução
Industriosa, modelo Oriental que utiliza demasiada mão de obra qualificada e pouco capital,
alavancou o gigante asiático. Tratando do ressurgimento econômico asiático, Arrighi diz que
este se deveu pela fusão do caminho ocidental de desenvolvimento e caminho asiático e traz a
visão de Sugihara:
A Revolução Industrial que ano durou o caminho ocidental, afirma ele, foi um “milagre
de produção” que expandiu enormemente a capacidade produtiva de uma pequena parte
da população mundial. A Revolução Industriosa, que inaugurou o caminho da Ásia
Oriental, por sua vez, foi um “milagre de distribuição” que criou a possibilidade de
difundir os benefícios do milagre da produção para uma vasta maioria da população
mundial por meio da de uma industrialização que faz uso intensivo de mão-de-obra e
pouca energia. (ARRIGHI, 2008, p. 51)

V) Conclusão

A obra de Giovanni Arrighi “Adam Smith em Pequim: origens e fundamentos do século


XXI”, é de grande importância para entender a atual conjuntura mundial e do sistema
capitalista. A interação entre as três abordagens teóricas, liberal, marxista e historicista, em
sua obra, gerou uma visão holística quanto ao caso chinês e foi capaz de criar uma teoria rica
e bem fundamentada.
Sua observação sobre os ciclos de acumulação é interessante e mostra as contradições
capitalistas e a dialética do sistema, bem como os conflitos de classe sendo motor de grandes
transformações. Mostra também que as crises são inerentes a esse modo de produção.
Buscando traçar o que virá no futuro, o pensamento de Arrighi é útil. O que o autor recupera
da história chinesa é fundamental para entender a sua realidade atualmente. Ao que indica,
depois do caos sistêmico, um novo ciclo acumulação pode despontar neste século, colocando
Pequim como o centro da economia mundial e recuperando a hegemonia do Ocidente depois
de três séculos de domínio Ocidental.

Referências bibliográficas:
ARRIGHI, Giovanni. Adam Smith em Pequim: origens e fundamentos do século XXI,
Boitempo, 2008, Prefácio. São Paulo.

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