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Trabalho de Direito das Obrigações

Caso JEFRAN
1- Qual será o pedido dos lesados na acção principal?
a) As casas?
b) Uma renegociação do contrato?
c) Ou a resolução e consequente indemnização?
R: O pedido dos lesados na acção principal será a resolução e consequente indemnização, por
intermédio de uma acção declarativa de condenação, porque visa, além da declaração da
existência do seu direito e da sua violação pela contraparte, o autor pede ao tribunal que ordene
ao réu a realizar uma prestação de uma coisa ou de um facto, com vista à reparação do seu direito
violado.

2- Qual é a fronteira entre a burla e o incumprimento contratual?


R: A burla consubstancia-se no acto criminoso levado a cabo por quem, visando o
enriquecimento próprio ou de terceiro, induzir, por meio do engano ou erro, outra pessoa a
praticar actos que lhe causem prejuízo patrimonial; e integra os seguintes elementos:
- Intenção do agente de obter para si ou para terceiro enriquecimento ilegítimo;
- Por meio de erro ou engano sobre factos que astuciosamente provocou;
- Determinar outrem à prática de actos que lhe causem, ou causem a outrem, prejuízo
patrimonial.
Já o incumprimento contratual compõe-se sempre que o devedor não realiza a prestação a que
está adstrito. Em sentido amplo, o incumprimento contratual abrange:
- O incumprimento definitivo;
- A mora do devedor, que desdobra-se no atraso da realização da prestação, sendo esta ainda
possível;
- E o cumprimento defeituoso ou imperfeito, que é aquele que ocorre quando há uma violação do
direito de crédito que não integra a hipótese de mora nem de incumprimento definitivo,
nomeadamente quando o devedor realiza a prestação a que está adstrito com irregularidades ou
deficiências.
Até aqui chegado é mister reconhecer que as linhas diferenciadoras entre as figuras acima
apresentadas são tênues e passíveis de serem confundidas e até mesmo um contrato comum pode
ser usado para encobrir e concretizar a burla. A ser assim, para que um contrato possa configurar
um crime de burla é necessário que, no momento da sua celebração, o agente tenha já a intenção
de não cumprir, servindo-se dele, exclusivamente, para levar o ofendido à disposição
patrimonial, isto quer dizer que para a astúcia própria do crime de burla não basta qualquer
mentira, é imperioso que se tenha uma mentira qualificada. Ou seja, a linha divisória entre a
burla e o incumprimento contratual está no momento da aparição da vontade de incumprimento:
se o ânimo de não cumprir existe “ab initio” haverá burla, se surge posteriormente, só pode haver
incumprimento contratual.

3- Quais são as regras de defesa de consumidores aplicáveis ao negócio imobiliário?


R: As regras de defesa do consumidor aplicáveis ao negócio imobiliário em caso de
incumprimento contratual é a de multa e a suspensão da actividade económica da referida
empresa, com base no artigo 26º da Lei nº 15/03 de 22 de Julho – Lei de Defesa do Consumidor.
Porém, há outros artigos que também oferecem uma especial protecção, nomeadamente os
artigos 10º, 18º, 11º, 15º nº1, todos da referida lei.

4- Quais são os argumentos dos lesados?


R: A luta e a procura pelo bem estar e por melhores condições de vida começa pela moradia e os
serviços oferecidos ao seu redor, por isso o sonho da casa própria é um dos mais vendidos e que
motiva milhões de angolanos a trabalhar sem freios para conseguir pagar por eles. E foi com o
obejctivo de realizar este sonho que muitos cidadãos acreditaram e aderiram ao projecto
habitacional elaborado pela JEFRAN, concretamente mais de 400 famílias. Ora, os mais antigos
vêem os seus processos datados de 2015, onde celebraram um contrato de pagamento de renda
resolúvel para a aquisição da moradia dos sonhos, e desde então só se registou um
incumprimento atrás do outro pela construtora.
O pleito das partes encontra substancial amparo na legislação vigente. O ordenamento jurídico
angolano protege o património material e moral do indivíduo contra acções e omissões de
terceiros. A obrigação é um vículo jurídico pelo qual uma pessoa fica adstrita perante a outra à
realização  de uma prestação e uma das fontes das obrigações é o contrato e conforme resulta do
artigo 406.º do  Código Civil este deve ser pontualmente cumprido, e só pode modificar-se ou
extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos por Lei.
Por conseguinte, o caso em apresso desdobra-se no âmbito do contrato-promessa, artigo 410.º,
411.º, 412.º, 413.º conjugado com os artigos 440.º, 441.º 442.º e 830.º. O contrato-promessa
realizado foi o  de compra e venda que é um documento escrito, assinado por quem promete
vender (promitente-vendedor) e por quem promete comprar (promitente-comprador) com o
objectivo de se vincularem a celebrar um novo contrato, futuro e definitivo, num determinado
prazo, ou quando verificados certos pressupostos. Mormente, vimos que as partes pagaram uma
parcela do valor total, como estabelecido no contrato, o artigo 442.º refere que quem dá um sinal
para aquisição de um bem, neste caso o imóvel, se não for cumprida a obrigação de dar o imóvel
em tempo acordado, o mesmo que deu o sinal tem direito de exigir o dobro do que pagou,  sem
descurar a respectiva indemnização em dinheiro e a reparação dos danos morais e patrimoniais
conforme garante os artigos 566.º e 496.º, em virtude dos danos resultantes do incumprimento da
JEFRAN e aqui também chamamos à colação o facto de que o 798.º assegura que o devedor que
falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável para o prejuízo que causa
ao credor.
Por fim, as partes alegariam que o incumprimento constitui uma situação de locupletamento que
consiste no acréscimo de bens que, em detrimento de outrem, se verificou no património de
alguém, sem que para isso tenha havido fundamento jurídico e n.º2, em fine, refere que há
obrigação de restituir, por enriquecimento sem causa, quando não se verificou um efeito visado.
Poderiam ainda trazer a acolação os argumentos do artigo 437º, nº1 CC, com epígrafe condições
de admissibilidade, como fundamento para a resolução do contrato por alteração das
circunstâncias.

5- Quais são os argumentos da empresa de construção?


R: Os argumentos de facto apresentados pela JEFRAN na voz do seu dono, Francisco Silva,
referem  que  em virtude da desvalorização da moeda e consequente inflação, a empresa, como
as demais organizações, teve dificuldades em honrar as suas obrigações e tiveram que
reorganizar o seu plano de actuação e nenhuma organização ficou isenta de reformas, apontando
até o OGE. Por conseguinte, não baixou a guarda e muito menos cruzou os braços e manteve
contacto com alguns clientes que estão na lista de espera para a devolução dos seus dinheiros,
porém os mesmos não aceitaram, pois pedem o dobro dos valores. Contudo, continua a reafirmar
que quer resolver essas questões com dialogo, prudência e ponderação monstrando-se flexível e
lamentando que a crise que assola o mundo devastou o seu principal objectivo de vida que é a
realização do sonho da casa própria dos angolanos e proporcionar-lhes melhores condições de
vida. Por outro lado, Francisco Silva contou que já foram construídas pelo projecto da JEFRAN
mais de cinco mil casas, ou seja, cinco mil sonhos realizados. A construtora referiu, ainda, que
parou de entregar as casas por causa de um grupo de mais de 250 clientes que perderam o poder
de compra e não estão a pagar a renda das casas que já foram entregues e deu a conhecer que está
com um prejuízo avaliado em 58 milhões de dólares e se  tirar as casas vai gerará outro problema
e não tenciona proceder deste modo alocado a isto está o facto de que tinha sido enganado por
alguns dos seus  colaboradores, porquanto alguns lesados na ânsia de verem o sonho da casa
própria realizado transferiram quantias avultadas em dinheiro numa conta que não pertencia a
empresa.
No escapeuliza dos factos, Francisco Silva alega ter desonrado os seus comprimissos por
consequência do não cumprimento dos pagamentos pelos clientes que já adiquiriram os imóveis
e bem como pelos colaboradores que o enganavam, neste afã, urge a necessidade de sabermos se
estaríamos perante uma situação de eficácia externa da obrigação, ou seja, eficácia perante
terceiros.
Ora, o entendimento que se deve ter desta teoria faz surgir uma querela doutrinária que
passaremos a expor:
- O Prof. Cunha Gonçalves defende que os direitos de crédito nunca podem ser violados por
terceiros, já que, sendo direitos relativos, os terceiros não têm o dever de os respeitar. Assim, os
direitos de crédito só poderiam ser violados pelo devedor, não tendo o terceiro qualquer
responsabilidade pela sua frustração. Esta solução resultaria do art. 406º, n.º 2 e da distinção
entre a responsabilidade delitual e a responsabilidade obrigacional (já que o art. 483.º, relativo à
violação de direitos absolutos, sujeita à responsabilidade civil, com a consequente obrigação de
indemnizar, a sua violação culposa por qualquer pessoa, enquanto o art. 798.º, relativo à violação
do direito de crédito, restringe ao devedor a responsabilidade obrigacional).
- Para os Professores Galvão Telles e Gomes da Silva o entendimento parti pelo respeito ao
dever geral que a todos assiste de não lesar os direitos alheios, também abrangeria os direitos de
crédito, que consequentemente teriam tutela delitual (artigo 483.º do CC);
- Na visão do Prof. Menezes Leitão, que assumi uma posição intermédia, embora não aceite a
existência de um dever geral de respeito dos direitos de crédito, admite alguma oponibilidade dos
créditos perante terceiros, através da aplicação do princípio do abuso de direito (334.º do CC).
Ou seja, o terceiro poderia ser assim responsabilizado nos casos em que a sua actuação lesiva do
direito de crédito se possa considerar como um exercício inadmissível da sua liberdade de acção;
- O Prof, Pedro Romano Martinez é de opinião que pelo facto de o devedor retirar benefícios da
actuação dos terceiros, deve suportar os prejuízos inerentes ubi commoda ibi incommoda. Por
outro lado, o credor não deverá sofrer as consequências da atuação de terceiros que colaboram na
realização do cumprimento, pois ele deverá ficar em situação idêntica à que estaria se a prestação
tivesse sido cumprida na totalidade pelo devedor. De facto, o credor tem direito a exigir um
cumprimento diligente, quer o mesmo seja realizado pelo devedor ou por quem este utilize no
cumprimento das suas obrigações.
No conseguinte, perfilhamos da ideia que na maioria dos casos o terceiro que contrata com o
devedor não deve ser responsabilizado pelo facto de este violar as suas obrigações, uma vez que
faz parte da autonomia privada de cada um a possibilidade de contrair sucessivas obrigações
mesmo que não esteja em condições de as cumprir, ou seja, não existe um requisito de
legitimidade de constituição de obrigações. Em casos excepcionais, a responsabilização do
terceiro poderá ser adimitida, sempre que ele contratar em termos tais que este acto seja
considerado um exercício inadmissível de posições jurídicas quando constituir uma situação de
abuso de direito artigo 334.º do CC
Mormente, a empresa, pode também, nos termos do artigo 437º nº2 CC, opor-se ao pedido,
declarando aceitar a modificação do contrato nos termos do nº1 do mesmo artigo.

6- Qual é a natureza da intervenção do ministério público?


R: Conforme resulta  da Lei n.º 15/03 o Ministério Público tem legitimidade para intentar acções
com vista a defesa dos direitos e interesses dos consumidores consagrado no artigo 28.º
conjugado com o 34.º da presente Lei.
Os actuais Estados de Direito respeitam a autonomia dos particulares mas sem deixar de ter
mecanismos para proteger os mesmos que apesar de vigora o princípio da igualdade entre as
partes e da liberdade contratual, muitas são as situações da vida quotidiana que se revelam
iníquas e proporcionadores de instabilidade social, por isso no âmbito da sua autoridade e da sua
política social, e com vista os fins do direito, procure velar pelos interesses dos privados. No
caso em apresso, o ministério público actua como assistente do ofendido.

7- Para que serve o arresto que foi decretado e porque motivos terá sido decretado?
R: O arresto decreta-se no momento em que o cumprimento da dívida torna-se exigível
judicialmente , ela foi tomada para impedir que o devedor disponha ou venha a colocar os seus
bens à disposição de terceiros, e assim não cumprir com a obrigação a que está adstrito.
O arresto que foi decretado serve para prevenir o perecimento da coisa, e impedir que o devedor,
a fim de eximir-se da obrigação, aliene os bens que possui ou transfira-os para nome de terceiros.
Para que seja concedido o arresto é indispensável que o credor apresente prova documental da
intenção do devedor em não cumprir com sua obrigação, ou estando a agir de má fé. Conforme
texto tornado público, denúncias vindas de fontes “fidedígnas”, dão conta que o sócio maioritário
do grupo JEFRAN, Francisco Simão da Silva, terá passado, entre Fevereiro e Abril de 2019, as
acções das suas empresas em nome de parentes e amigos próximos, razão pela qual acreditados
terem sido estes os motivos pelos quais o arresto foi decretado. Os artigos 817º conjugado com o
artigo 610º ambos do código civil, servem como fundamento para esta acção.

8- Quais as consequências da eventual violação dos contratos pela empresa?


R: As consequências da eventual violação dos contratos pela empresa, isto é, em caso de
incumprimento contratual , são todas as previstas no artigo 26º nº 1, da Lei nº 15/03 de 22 de
Julho – Lei de Defesa do Consumidor. Outros artigos aplicáveis são os 10º, 18º, 11º, 15º nº1,
todos da referida lei.

9- Os lesados (sendo cada caso um caso) serão credores ou titulares de direitos reais?
R: Serão credores, aqueles que não tenham feito o pagamento de todas as prestações, à luz do
art. 413º, pois o contrato-promessa teria eficácia real caso as partes assim o estipulassem e se os
imóveis estivessem sido registro. A estes lesados chamaremos de credores quirografários em
virtude de não serem possuidores de um direito real ou outra causa legítima de preferência, como
refere o n.º1 do artigo 604.º.
Outrossim, serão titulares de direitos reais aqueles que já tenham feito o pagamento da totalidade
das prestações, com fundamento na al c) do artigo 879º de epígrafe “efeitos essenciais” CC, que
atribui pela obrigação de pagar o preço a realização dos efeitos da compra e venda, ou seja,
através do pagamento de todas as prestações, os clientes adquiriram os títulos de propriedade
sobre os imóveis. Diferente dos lesados acima mencionados, estes são denominados de credores
pignoratícios, pois guardam para si a garantia do penhor de coisa móvel, ou seja, têm preferência na
adjudicação dos benefícios deste penhor, conforme vem previsto no artigo 670° do CC.

10- Assumindo que a empresa está não apenas sem capacidade de honrar os seus
compromissos face aos clientes, mas também de pagar salários aos trabalhadores, e deve
IRT, imposto industrial à AGT, bem como as contribuições para a segurança social ao
INSS, como será o concurso de credores, uma vez que as dívidas excedem o património
disponível? Com o que poderão contar ficar os lesados?
R: A esta questão a resposta encontraremos no artigo 601º CC, que consagra o princípio geral da
garantia das obrigações, que visa assegurar o cumprimento das obrigações, através da penhora de
todos os bens do devedor susceptíveis a esta. Por conseguinte, o nº1 do artigo 604º, consagra a
regra do concurso de credores que visa colocar-lhes em pé de igualdade. Entretanto, no caso em
apresso há causas legítimas de preferência, conforme resulta do nº 2 do mesmo artigo. Segundo o
critério de preferência, passaremos a ter a seguinte hierarquia:

1º Os titulares de direitos reais: encontraremos os credores pignoratícios que representam os


casos em que o credor obtém direitos reais de garantia, os quais atribuem ao seu titular a
faculdade de ser pago à frente dos demais credores em relação ao bem objecto do seu direito;
2º Pagamento dos salários aos trabalhadores, a dívida de IRT, a segurança social ao INSS e o
imposto industrial à AGT;
3º Os credores: aqui teremos os credores quirografários por serem detentores de direitos de
créditos pelo facto de não terem primazia face aos demais e, por outra, não nos devemos
esquecer que entre estes credores não há hierarquização, por isso far-se-á o rateio entre os
credores quirografários porquanto já se fez o pagamento dos credores privilegiados. Conforme
resulta da convocação de credores e verificação dos créditos, no artigo 864º do código de
processo civil.
De antemão, reconhecemos que, em muitos casos, o património do devedor apresenta-se como
insuficiente para saldar os créditos que não se encontram munidos de uma preferência conforme
alerta o Prof. Pedro Martinez.
REPÚBLICA DE ANGOLA
MINISTÉRIO DO ENSINO SUPERIOR
UNIVERSIDADE AGOSTINHO NETO - FACULDADE DE DIREITO

Trabalho de Direito das Obrigações


“Caso JEFRAN”

Regente: Orlando Fernandes


Prof. Itiandro Simões
Prof: Prof. Abílio Osvado
Prof: Nuno Chaves

Grupo: VIII
Luanda, 20 de Outubro de 2020

INTEGRANTES DO GRUPO

 Letícia Vaz Melo


 Nazareth Samara Monteiro
 Marina Edith de Andrade
 Ortense Etelvina. Saiminho
 Sidney Leandro do Nascimento

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