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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

Faculdade de Direito

Tópicos em Sociologia Jurídica

Professora Marcella Furtado Gomes

Grupo 3:
Johaber Higor Mendonça
Lucas Vaz
Lucas Gelape
Moisés Silvério
Rayhanna Fernandes
Rodolpho Porto

“The Militarization of Urban Marginality: lessons from the Brazilian Metropolis” (“A
Militarização da Marginalidade Urbana: lições das metrópoles brasileiras”) – Loic
Wacquant

1. Introdução

Loic Wacquant traz em seu artigo uma análise sobre o funcionamento institucional e os
efeitos sociais das formas de penalização da marginalidade, implementadas pelas autoridades
brasileiras desde a última década do século XX. Suas constatações, baseadas em dados
empíricos, estão imersas no auge da política neoliberal no mundo e seus reflexos no contexto
brasileiro. Viu-se um Estado atrofiado quanto às áreas sociais, um distanciamento entre as
políticas estatais e a população, principalmente de baixa renda, e, por outro lado, um aumento do
aparato militar, reforçando a criminalização dos mais pobres.
O afastamento deste Estado gera a sua própria crise, haja vista que o aumento da
marginalidade, do descontrole social e econômico coloca em dúvida qual o seu papel. Nesse
ponto, se reforça o Estado enquanto mantenedor da ordem social, o que leva a legitimação da
força bruta contra o “inimigo” social. O emprego dessa lógica, porém, esteve (e ainda está)
situado dentro das comunidades e aglomerados, onde se encontram aqueles marginalizados de
qualquer inclusão de direitos.
O sociólogo, portanto, analisa esse contexto de criminzalização sob três aspectos. No
primeiro momento trata da relação entre a extrema desigualdade e da pobreza em massa, classe e
descriminação. No segundo momento, analisa a situação catastrófica do sistema carcerário
brasileiro e suas fragilidades, como a superlotação dos presídios, as más instalações e uma
ausência de prestação jurídica efetiva e serviços de assistência médica nesses locais. Por fim,
Loic Wacquant traça um paralelo entre o Brasil e os Estados Unidos, ao explicitar … (continuar).

2. Desigualdade, Pobreza e a Cor da Violência (Inequality, Poverty and the Color of


Violence)

Loic Wacquant constata que após a década de 80, marcada principalmente pela
estagnação econômica e deterioração constante dos indicadores sociais, implementou-se no
Brasil uma série de reformas sociais e econômicas que reduziram drasticamente o papel do
Estado e abriram a economia para o comércio exterior. As disparidades sociais, serviços públicos
ineficientes - quando não inexistentes - desemprego galopante em uma economia urbana
polarizada e um sistema judiciário corrupto alimentaram o vertiginoso crescimento da violência
criminal nas grandes cidades brasileiras.
Esse crescimento da criminalidade aliada a pouca separação espacial entre ricos e pobres
nas cidades brasileiras fez crescer a indústria privada da segurança. Prédios e condomínios
passaram a se tornar verdadeiras fortificações com os mais diversos aparatos de segurança para
proteger indivíduos ricos e suas famílias.
O aumento espetacular da repressão policial também se mostra ineficaz para combater a
criminalidade, haja visto que a própria polícia se envolve envolve com o tráfico de drogas, venda
de armas, sequestro, extorsão e toda sorte de atividades ilegais, pelo que são tão temidos e
desprezados pelos moradores dos bairros mais pobres quanto os próprios bandidos.
O uso rotineiro de força letal pela PM, aliado a métodos desumanos para obtenção de
confissões em investigações, bem como execuções sumárias e desaparecimentos inexplicáveis
mantêm um clima de terror entre a classe baixa, que é seu alvo principal. Prova disso é a
estatística apresentada pelo sociólogo, na qual em 1992, enquanto as polícias de NY e Los
Angeles mataram, respectivamente, 24 e 25 civis, a polícia de São Paulo matou 1470 civis no
mesmo ano.
Para ele, outro fator que agrava ainda mais a situação é a estreito alinhamento entre a
classe hierárquica, a estratificação racial e a discriminação de cor endêmica na polícia e
judiciário brasileiros. Três quartos dos moradores das grandes cidades concordam que negros e
mulatos são mais visados pela polícia do que brancos. A percepção negativa das pessoas de pele
mais escura contamina e influencia o funcionamento de toda a gama de instituições encarregadas
de gestão crime, de vigilância policial e apreensão, realização de investigações e a apresentação
de acusações, a condenação, a sentença, e a administração de punição. Resultado disso, os
estabelecimentos prisionais brasileiros são predominantemente negros e mulatos.
O autor do artigo apresenta dados estatísticos de 1994 segundo os quais no estado de São
Paulo 52% dos encarcerados eram afro-brasileiros, enquanto seu peso demográfico era de apenas
22% à época. Além disso, condenados de pele escura são submetidos à condições de detenção
mais severas e sofrem violência carcerária mais grave, isso apenas pelo fato de ter suas origens
nas frações mais pobres e vulneráveis da classe trabalhadora. A penalização da pobreza equivale
aqui a uma invivibilização da questão da cor e reforça a dominação etno-racial, concedendo-lhe
o aval do Estado.
A violência no Brasil também encontra uma outra poderosa raiz em uma cultura política
que permanece marcada por violenta repressão estatal nas disputas agrárias e lutas da classe
trabalhadora, bem como pelas cicatrizes do regime militar. Sob tais condições, a implantação do
Estado penal para responder às desordens geradas pela desregulamentação da economia, a
dessocialização do trabalho assalariado, e a pauperização relativa e absoluta de seções do
proletariado urbano, alargando os meios, o alcance e a intensidade da a intervenção do aparelho
policial e judicial equivale a reestabelecer uma verdadeira ditadura sobre os pobres.
O autor do artigo encerra a seção do artigo dizendo ser impossível não enxergar que, na
ausência de garantias mínimas de direitos, o recurso punitivo das técnicas law-and-order e
políticas ''made in USA'' são, fundamentalmente, a antítese do estabelecimento de uma sociedade
pacificada e democrático, cuja base deve ser a igualdade de todos perante a lei e as suas agências
penalizadoras. e aponta o atual funcionamento da polícia e dos tribunais brasileiros, tão
ineficiente, deficiente e caótico, do ponto de vista estritamente jurídico, que teria de ser
reorganizada de cima para baixo, a fim de ser levado até as normas mínimas estipuladas pelo
convenções internacionais, e incapaz de garantir padrões básicos de uniformidade e justiça para
além das diferenças de classe e cor.

RELATAR OS DADOS
* Sociedade extremamente desigual e aproximação espacial entre ricos e pobres
* Insegurança ampliada pela atuação das forças de segurança.
* Hierarquia de classe – estratificação racial – discriminação de cor (tanto pela polícia quanto
pelas autoridades judiciais)

3. Catástrofe Carcerária e o “beco sem saída” da punição

Wacquant realizou diversos estudos sobre o sistema carcerário brasileiro, fazendo não
somente uma análise sobre os dados estatísticos, como também uma observação da situação
fática de nossas unidades prisionais. Após realizar essas pesquisas, o autor diz ser forçoso
reconhecer que de acordo ao observado do aparelho carcerário brasileiro, este não estaria
resolvendo o aumento da criminalidade, bem como da marginalidade urbana no país, pelo
contrário. Sendo que os presídios estariam servindo a qualquer uma das finalidades punitivas
como a de neutralizar os indivíduos, ou seja, retirá-los do convívio social, ou a retributiva, ou
seja, dar lhes uma punição para compensar sua prática criminosa, deixando totalmente de lado a
função de reabilitação desses cidadãos.
De acordo com o autor o sistema carcerário brasileiro tem as características das piores
prisões do terceiro mundo, mas com uma escala digna de primeiro mundo, devido as dimensões
e enraizamento urbano deste. No início dos anos 90 o Brasil ostentava uma população carcerária
de 126.000 pessoas, três vezes maior que a da França, sendo que a média nacional ocultava as
disparidades regionais, onde nos grandes centros urbanos se encarcerava bem mais que nas
outras regiões. Na década que se seguiu, o Estado brasileiro reagiu ao aprofundamento da
desigualdade social e ao crescimento da marginalidade nas grandes cidades dobrando o número
de encarcerados, chegando ao número de 284.000 em 2003. A característica predominante a essa
massa de encarceirados se constituia em estes serem homens jovens, com um baixo grau de
escolaridade, desprovidos de recursos, sendo que os principais crimes cometidos eram: furto e
roubo.
Com as dimensões ocidentais contemporâneas, segundo o autor, os estabelecimentos
carcerários brasileiros sofrem de males típicos das masmorras feudais. Insalubridade, estrutura
em ruínas, esgoto correndo ao aberto sem ser corretamente canalizado são umas das
caracteríticas da estrutura dos presídios nacionais, sendo as condições de vida abominável, com
uma higiene catastrófica, falta de espaço, ar, água e as vezes comida.
Devido a essas péssimas condições, a situação relativa a saúde desses detentos também
não é boa. Doenças graves se proliferam rapidamente entre eles e praticamente não há uma
assistência médica, sendo que a maioria dos medicamentos que chegam até eles é proveniente da
doação de familiares. Aliado a essa questão, a assistência jurídica também é muito baixa, os
presos não recebem orientações neste âmbito, e muitos deles estão detidos sem ter uma
condenação judicial, ou mesmo já cumpriram o tempo da pena recebida.
Dado a essas condições, e principalmente à superlotação, a violência entre os detentos é
muito alta. Em razão da falta de espaço e segurança, eles provocam mortes entre si, sendo essas
causadas por brigas entre grupos ou mesmo para reduzir o número de presos naquele disputado
espaço. Porém pior que essa violência, é a institucionalizada, onde os agentes estatais os
torturam constantemente no cotidiano, havendo inclusive execuções sumárias e assassinatos em
massa quando, por exemplo, acontecem rebeliões, resultando o fatídico caso do Carandiru onde
houverem 111 presos assassinados. O despreparo e o mau treinameto desses agentes esta
diretamente ligado a este fenômeno, Isso aliado a má estrutura dos presídios, falta de
equipamentos, pequeno número de agentes por quantidade de presos, contribuem para este
quadro. A má remuneração de muitos destes agentes, além de ser parte das causas dos problema
acima relacionados, ensejam um elevado grau de corrupção, onde se é cobrado dos presos que
podem pagar quantias em dinheiro para que esses tenham acesso a melhores condições dentro do
presídio, tais como acesso a comida e medicamentos, bem como celas com mais espaço,
enquanto os outros permanecem em péssimas condições.
Diante do observado ao estudar o sistema carcerário brasileiro o autor concluiu que este
só tem servido para concentrar a violência e alimentar a criminalidade, por sua violação
constante e manifesta de lei e direitos humanos. Autoridades como juízes, promotores e
delegados, que deveriam fiscalizar esses aspectos, estão indiferentes a todas essas barbáries, isso
tudo tem contribuído para agravar os males pelo qual o Brasil passa para o estabelecimento de
sua democracia, que segundo essa situação tem sido mais do que uma mera fachada, isso tendo
em vista a deslegitimação de muitas instituições da lei e da justiça, a escalada da criminalidade
violenta e tanto abuso policial, o criminalização dos pobres, um aumento significativo no apoio a
medidas ilegais de controle, a obstrução generalizada do princípio da legalidade e da distribuição
desigual e irregular dos direitos do cidadão.

* Situação catastrófica e aumento da população carcerária


* Composição social majoritária da população carcerária: jovens, com baixa escolarização,
pobres.
* Dificuldades das autoridades que lidam com os presidiários no Brasil: salários baixos, que
facilitam a corrupção; altos níveis de violência; indiferença das autoridades judiciais.

4. Em direção à militarização das clivagens urbanas


Neste tópico Wacquant discorre sobre as similaridades dos contextos estruturais traçadas
a partir do paralelo que pode ser identificado entre os métodos de contenção punitiva tanto nas
metrópoles do Brasil quanto dos Estados Unidos – mesmo considerando haver um abismo
econômico e grandes diferenças burocráticas e tecnológicas entre ambos. O autor compara os
modelos às políticas de hiper-encarceramento inicialmente elaboradas para dar conta do contexto
Africano-Americano, mas que foram estendidas para cuidar também da presença de migrantes
pós coloniais nas prisões europeias.
A estigmatização do rebaixamento de bairros, que posteriormente se tornam principais
alvos de ação policial violenta é um dos pontos abordados no texto. O autor trás diagnósticos que
demosnstram como os moradores de locais que se inserem neste contexto de vulnerabilidade
social são constantemente submetidos à situações que afrontam os direitos humanos e suprimem
direitos e garantias individuais previstos no próprio texto Constitucional. E pior, tudo isso
promovido por condutas organizadas e promovidas pelo próprio Estado (presentados pelos
policiais militares).

Uma série de outros abusos relacionados a esta incursões podem ser constatados também
no Judiciário – muitos dos presos são mantidos em custódia por tempo indeterminado e, tudo
isto, em nome de uma higienização urbana que pode ser relacionada aos tormentos a que se
submetem os estadunidenses que moram em cidades da periferia ou habitações públicas. Para o
autor, em ambos os casos – do Brasil e dos EUA - trata-se do esvaziamento de direitos
constitucionais básicos sob o discurso de “restauração de ordem”, por trás do qual o Estado
busca legitimar sua atuação e justificar sua própria existência. Entretanto as mesmas condutas,
claro, jamais poderiam ser toleradas frente a bairros de classe média ou alta.
Uma segunda semelhança se relaciona ao fato de a indústria Fordista ter forçado uma
reorganização drástica na forma de vida de sistemas locais. A contração e desregulamentação do
mercado de trabalho se combinaram com uma retração social e urbana de desinvestimento por
parte do Estado, especialmente nesses bairros. Consequentemente, os moradores dessas regiões
foram empurrados para a economia informal, determinando-lhes em uma inequação que, mais
uma vez, aumenta sua marginalização.
Por fim, o autor tece comentários acerca dos impactos causados pelas divisões
étnico-raciais que se originaram na época da escravidão africana, que desempenharam (e
continuam desempenhando) um papel decisivo na implantação das políticas do Estado Penal
altamente sensíveis até os dias de hoje. A clivagem, neste caso, transpõe outras regras para se
enraizar categoricamente na criação de uma “linha de cor”, praticamente “inflexível e
intransponível”, nas palavras do próprio autor. Pesquisas demonstraram que as diferenças de
fenótipo (tom de pele, textura do cabelo e características faciais) são fatores muito determinantes
quando avaliados tanto no espectro de desigualdade social quanto no direcionamento do aparelho
repressivo do Estado – em todas as eferas de poder, inclusive no Judiciário.

* Bairros estigmatizados e abandonados são os principais alvos das ações policiais repressivas. -
UPPs
* Mudança do emprego industrial para o do setor de serviços força uma mudança radical na
estrutura social das regiões mais afetadas.
* Divisões étnicas e raciais advindas da escravidão tem papel importante (ainda que diverso) na
criação desses Estados penais.
* As regiões marginalizadas são combinadas com atuações policiais agressivas, sistema judicial
repressor e a “prisionização” do seu tecido social.

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