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|Núcleo de Estudantes de Direito da Universidade Lusíada do Porto| Contencioso do Poder Público

A JUSTIÇA ADMINISTRATIVA EM PORTUGAL

Do corporativismo ao estado democrático:

A 25 de Abril de 1974 iniciou-se um processo de democratização social destinado a


substituir o modelo corporativo de um estado por outro que integra um Estado de direito.
Durante o processo democrático, o Estado passa a ser compreendido com uma condição do
exercício da liberdade do Homem.
A partir de 1982, o aprofundamento da democracia participativa torna-se um objecto
fundamental e mobilizador de toda a sociedade, começa-se assim por reconhecer que a
participação directa dos cidadãos na vida política constitui uma condição fundamental da
consolidação do sistema democrático (art. 109º da CRP) e logo se consagra os princípios da
descentralização administrativa (art. 267º da CRP) bem como se cria o Conselho económico e
social dotado de poderes económicos e sociais. Também a revisão constitucional de 1989
consagra, ou garante, a participação dos trabalhadores e, impede que a estrutura da
administração se faça sem a participação dos interessados na sua gestão efectiva através das
associações públicas, das organizações de moradores e outras formas de representação
democrática.
Finalmente, a revisão constitucional assegura a participação dos cidadãos na formação
das decisões e deliberações administrativas que lhes digam directamente respeito.

A justiça do poder e a justiça administrativa:

A todos é constitucionalmente garantido o acesso aos tribunais para defesa dos seus
direitos e interesses legítimos afectados por quaisquer actos de particulares ou do poder
estadual, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos (art. 20º da
CRP). Trata-se de uma protecção jurisdicional ampla, que impede a existência de actos
insusceptíveis de controlo por parte dos tribunais – princípio da Legalidade (a administração
tem o poder, que a constituição reconhece, está previsto na lei).
No âmbito da administração a garantia de acesso aos tribunais é individualizada tal
como vem previsto nos arts. 212º, nº 3 da CRP e art. 268º, nº 4 da CRP, os quais abrangem os
recursos fundados na ilegalidade dos actos administrativos independentemente da sua forma que
lesem direitos ou interesses legalmente protegidos e a tutela efectiva dos direitos e interesses
(art. 2º do CPTA).
A independência e a imparcialidade dos tribunais administrativos encontra-se hoje
salvaguardado, bem como a força jurídica das sentenças proferidas pelos tribunais. A
Constituição garante, ainda a responsabilidade das entidades públicas, como dos seus titulares,
órgãos, funcionários ou agente, por acções ou omissões praticados no exercício das suas funções
(art. 271º da CRP).

Jurisdicização da administração:

Ao executar a lei, a administração fica impedida de cometer qualquer abuso ou


arbitrariedade, deixa de haver liberdade para a administração no exercício do seu poder
discricionário, não só a sua competência, como o se fim (interesse público) estão fixados na lei,
bem como a administração tem de querer o mais justo e adequado para o fim que pretende
alcançar.
A administração pública está assim subordinada à lei e a todos os princípios
consagrados nos art. S 3º e SS. do CPA.
O art. 266º da CRP dispõe que a administração pública visa a prossecução do interesse
público e subordina os órgãos e agentes administrativos à constituição e à lei.
A sujeição da actividade administrativa aos princípios gerais consagrados no CPA, não
conduz necessariamente à justiciabilidade das suas decisões.

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Cabe à lei determinar os interesses públicos que constitui o fim da actividade


administrativa, bem como a repartição de competências entre órgãos administrativos, qualquer
que seja a modalidade da actuação.
A lei tem por função assegurar o primado do poder legislativo sobre o poder
administrativo – citação do livro de direito administrativo, volume II, de Freitas do Amaral.

A administração e os tribunais administrativos:

Os tribunais são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em


nome do povo (art. 202º da CRP), assegurando a defesa dos direitos e interesses dos particulares
e dirimindo os conflitos de interesses públicos e privados.
A revisão constitucional de 1982 perdeu a criação de tribunais administrativos e fiscais
dotados de uma estrutura própria e competência especializada conforme o disposto no art. 212º
da CRP.
A consagração de o modelo de organização judiciária administrativa própria acentua a
autonomia dos tribunais administrativos e fiscais em relação aos tribunais comuns.

Princípio da justiça administrativa:

A consagração nos textos constitucionais de princípios jurídicos respeitantes à justiça


administrativa começou na vigência da constituição de 1933. Entre os vários direitos e garantias
dos cidadãos consagrou-se o recurso contencioso de actos administrativos definitivos e
executórios.
A constituição de 1976, manteve esta a garantia mínima dos administrados e autorizou,
por outro lado, a Assembleia da República a criar tribunais administrativos com vista a
assegurar uma maior defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos.
As sucessivas revisões constitucionais consagraram vários princípios de justiça administrativa:

o Princípio do acesso dos cidadãos aos tribunais: consagrado pelo art. 20º, 268º, nº 4 e
5 da CRP;

o Princípio da efectividade da tutela jurisdicional dos direitos e interesses dos


particulares: igualmente consagrado pelos mesmos artigos. Este princípio envolve a
previsão de meios processuais suficientes para a protecção dos direitos e interesses dos
particulares postos em causa por actos e comportamentos (acções e omissões) da
administração pública. O que significa que o particular tem de dispor de meios de
defesa subjectivos e não unicamente de meios para a protecção da legalidade objectiva.
Este princípio determina também que o processo contencioso assegure que a decisão
final seja proferida num prazo razoável. A última consequência do princípio da
efectividade da tutela jurisdicional diz respeito à execução da sentença, o legislador tem
de prever os meios necessários que permitem uma plena execução das sentenças nos
tribunais.

o Princípio da plena jurisdição: os tribunais administrativos são competentes para


dirimir os litígios resultantes das relações jurídico-administrativas em total e plena
autonomia face aos tribunais comuns – art. 209º e 212º, nº 3 da CRP.

o Princípio da autodiceia: princípio sobre o qual as partes da relação jurídico-


administrativas em conflito podem decidir de recorrer a um tribunal arbitral para a
resolução do seu litígio – art. 209º, nº 2 e art. 180º do CPTA.

o Princípio da prossecução do interesse público e respeito dos direitos e interesses


dos particulares: a justiça administrativa é uma exigência do estado de direito
democrático, por um lado exige a obrigação da administração pública, prosseguir o

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interesse público de acordo com o ordenamento jurídico e por outro lado respeitar os
direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos (art. 266º da CRP).

Âmbito do contencioso administrativo:

O contencioso administrativo pode ser definido como o sistema de normas jurídicas,


que regulam a orgânica dos tribunais administrativos e o seu processo próprio de agir na
resolução das pretensões administrativas (citação de Rui Machete).
O Prof. Freitas do Amaral considera por um lado as normas orgânicas que regulam a
organização da administração pública, por outro lado, as normas funcionais que regulam o
modo de agir específico da administração pública e finalmente as normas relacionais que
regulam as relações entre a administração e os particulares.
Essas normas vêm definidas no CPA e noutros diplomas avulsos, todas as questões
litigiosas emergentes das relações jurídico-administrativas, constitui o contencioso
administrativo e formam assim o âmbito do procedimento e processo administrativo.

A justiça administrativa em sentido material:

Os tribunais administrativos são competentes para apreciar os litígios emergentes das


relações jurídico-administrativas que vêm consagradas no art. 4º, nº 1 do Estatuto do tribunal
administrativo e fiscal (ETAF); por outro lado, estão excluídas da competência dos tribunais as
questões que relevam do art. 4º, nº 2 e 3, al. d) do ETAF.
A lei atribui expressamente aos tribunais administrativos o julgamento de questões
relativas a actos, contratos, normas e outras questões consagradas no art. 4, nº 1 do ETAF. Não
releva da competência dos tribunais administrativos a apreciação de litígios que tenham por
objecto a impugnação de actos legislativos, políticos, actos relativos à instrução criminal, etc. –
art. 4º, nº 2 e 3 do ETAF.

A justiça administrativa em sentido funcional:

A justiça administrativa não engloba todo e qualquer tipo de resolução de controvérsias


administrativa, referindo-se apenas aqueles processos que implicam o exercício da função
jurisdicional, isto é, os litígios que se apresentam como questões jurídicas a solucionar pelo
tribunal.

A justiça administrativa em sentido orgânico-processual:

A justiça administrativa compreende as questões de direito administrativo atribuídas à


ordem judicial dos tribunais administrativos e por essa via sujeita-se ao processo especial de
julgamento.
A revisão constitucional de 1082 veio consagrar uma ordem judicial administrativa no
sentido de uma jurisdição própria, distinta dos tribunais comuns. Essa ordem judicial
administrativa prevê um conjunto de normas processuais consagradas no CPTA que visam
apreciar as questões jurídico-administrativas.

Os modelos de contencioso administrativo:

Alternatividade ou complementaridade entre os modelos objectivista e subjectivista?

A justiça administrativa apresenta dois modelos:

o O modelo objectivista;
o O modelo subjectivista.

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Através do modelo subjectivista visa-se a defesa da legalidade e do interesse público ou da


tutela dos direitos dos particulares. Pelo objecto do processo visa-se controlar a legitimidade do
exercício do poder administrativo, ou a lesão das posições jurídicas subjectivas do administrado.
A opção por um lado ou outro modelo tem certas consequências ao nível da legitimidade da
iniciativa processual dos meios ao acesso do contencioso, bem como dos efeitos das sentenças.
Para apreciar os modelos de justiça administrativa é necessário ter em conta o modelo como se
concede a vinculação da administração à lei e a divisão dos poderes entre a administração, o
legislador e o juiz, e ainda observar a sujeição da administração pública ao interesse público e a
garantia dos direitos e interesses dos particulares.

Os modelos organizativos e processuais do contencioso administrativo:

Modelos organizativos:

Na história do contencioso administrativo distingue-se três modelos organizativos:

• O modelo administrativista;
• O modelo judiciarista;
• O modelo judicialista.

O modelo administrativista baseia-se na separação de poderes e visa reconhecer aos


tribunais a competência para julgar e a administração competência para administrar. Neste
modelo a decisão final dos litígios administrativos compete aos órgãos superiores da
administração, também chamado de modelo jurisdição reservada ou de autotutela.

O modelo judiciarista é um modelo em que a resolução dos litígios relativos à


administração, cabe aos órgãos administrativos independentes, distintos dos tribunais. É um
modelo intermédio entre o modelo administrativista e o modelo judicialista.

O modelo judicialista, parte do princípio de que a decisão das questões jurídicas


administrativas cabe aos tribunais integrados numa ordem judicial própria. É o nosso actual
modelo de justiça administrativa.

Os modelos processuais:

No continente europeu predominou o modelo francês de justiça administrativa, o


contencioso entre a administração e os particulares relevava da competência de órgãos
administrativos independentes ou quase tribunais, era e é o caso do conselho de estado francês.
Com a influência do modelo anglo-saxónico emergiu a ideia de protecção judicial efectiva dos
administrados. Toda a fiscalização da actividade administrativa revertia para a competência dos
tribunais, o momento de apreciar os direitos e interesses dos cidadãos.
O modelo anglo-saxónico assentava nos aspectos subjectivista de justiça administrativa.

Em conclusão, os modelos actuais de justiça administrativa variam entre o objectivista e


subjectivista, o primeiro oferece garantias de defesa da legalidade, na medida em que tende a
alargar o acesso aos tribunais; o subjectivista fornece uma protecção mais intensa aos
administrados perante a administração.
Dado a insuficiência de modelos objectivista para assegurar a protecção judicial efectiva
dos direitos dos particulares, a preferência aponta no sentido de uma subjectivização do
contencioso administrativo.

A EVOLUÇÃO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO EM PORTUGAL

A evolução dos modelos organizativos e processuais

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Modelos organizativos:

Há três grandes fases importantes na evolução do contencioso administrativo:

o 1ª fase – corresponde à época liberal de 1832/1924,


o 2ª fase – modelo autoritário cooperativo de 1930/3 – 1974/1976;
o 3ª fase – inicia-se a revisão constitucional de 1989.

A 1ª fase está associada ao modelo administrativista, ao nível local verifica-se a existência


de conselhos de prefeitura e de conceitos de distritos e também dos tribunais administrativos
distritais a partir de 1886. Vigorou um modelo judiciarista de justiça administrativa ao nível
central verifica-se a existência de um modelo administrativista mitigado em que os órgãos
superiores da administração, mas implicam a intervenção consultiva obrigatória de órgãos
administrativos independentes, que é o conselho de estado e a partir de 1860, o superior tribunal
de justiça.

2ª fase – verifica-se ao nível local a existência de auditorias administrativas e ao nível


central, a existência dos STJ, isto é, de órgãos independentes não integrados orgânica dos
tribunais comuns. Vigorou o modelo judicialista mitigado em que as sentenças dos tribunais não
têm força executiva ou têm força executiva limitada perante a administração, na medida em que,
dependem da boa vontade da administração em executar essas sentenças.

3ª fase – iniciou o modelo judicialista de justiça administrativa com a criação de verdadeiros


tribunais administrativos e fiscais e com a criação do conselho superior dos tribunais fiscais e
administrativos.

Modelo processual de justiça administrativa

Há quatro grandes fases na evolução do modelo processual de justiça administrativa:

• 1ª fase – 1832/1982;
• 2ª fase – inicia-se a partir de 1984 e 1985;
• 3ª fase – 1989;
• 4ª fase – 2002/2003.

1ª fase – foi marcado pela adopção do modelo francês da justiça administrativa, em que o
contencioso é regra se consubstancia no recurso de anulação de actos administrativos,
admitindo-se o contencioso de plena jurisdição em certas matérias como acção de
responsabilidade e certos recursos eleitorais. A jurisdição administrativa é concedida como uma
jurisdição limitada, quer no plano dos meios de acesso aos tribunais, que no plano da tutela dos
direitos dos particulares, quer no meio dos poderes jurisdicionais.
Nesta época, os particulares enfrentaram a posição dominante da administração, as limitações
dos meios de prova e os obstáculos à execução de sentenças.

2ª fase – inicia-se com a revisão constitucional de 1982 e alteração da legislação


processual de 1984 e 1985. São criados os ETAF de 1984 e a LPTA (lei de processo de
tribunais administrativos de 1985) com a entrada em vigor do ETAF e LPTA o sistema
administrativo vai sofrer modificações significativas no plano substancial, processual e
funcional.

No plano substancial: a nova legislação processual procedeu ao alargamento dos meios


de acesso aos tribunais administrativos, prevendo a nova acção de reconhecimento de direitos e
interesses legítimos e reafirmando o recurso contencioso contra actos administrativos como

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contencioso regra. Em 1984, o legislador optou para efeitos de delimitação do âmbito da justiça
administrativa por um sistema que conjuga uma cláusula geral e uma enumeração meramente
exemplificativa das matérias da competência dos tribunais administrativos.

No plano processual: a reforma de 84/85 introduz algumas alterações, no sentido de


aperfeiçoar a tutela judicial dos cidadãos, em especial no âmbito do recurso contra actos
administrativos. É assim, que por ex., o art. 25º do LPTA (lei de processo dos tribunais
administrativos, hoje em dia é o CPTA) permite o recurso contra actos contidos em diploma
legislativo ou regulamentar. Como outra alteração significativa, é de acrescentar a existência de
novos meios acessórios, como a intimação para a consulta de documentos e passagem de
certidão, destinados a garantir o acesso à informação procedimental para efeitos de impugnação.

No plano funcional: verifica-se uma intensificação dos juízes administrativos no plano


dos meios impugnatórios, o juiz tem assim por obrigação de motivar os seus actos, de
especificar as operações de execução das sentenças anulatórias. O juiz tem ainda a possibilidade
de dirigir a administração, sentenças condenatórias, intimações e injunções decorrentes das
novas acções e dos novos meios processuais.

3ª fase – revisão constitucional de 1989: veio instituir uma verdadeira jurisdição


administrativa e um novo regime de contencioso administrativo. Considerando que a jurisdição
administrativa não pode ser uma jurisdição diminuída em relação aos tribunais comuns, os
tribunais administrativos devem ter todos os poderes para dirimir os litígios emergentes de
relações jurídico-administrativas. A revisão constitucional de 1989, confirmada pela alteração
do art. 268º da CRP consagra o princípio da tutela jurisdicional efectiva dos direitos e interesses
dos cidadãos. O sistema de justiça administrativa vai assim evoluir no sentido de um
aperfeiçoamento as garantias dos cidadãos, no respeito do interesse público.

4ª fase – na sequência da revisão constitucional de 1989, é aprovado o novo ETAF, lei


nº 13/ 2002 de 19 de Fevereiro, alterada pela lei nº4ª/ 2003 de 19 de Fevereiro e o CPTA, lei nº
15/2002 de 22 de Fevereiro, alterada pela lei nº 4ª/2003 de 19 de Fevereiro. Esta nova reforma
do contencioso administrativo define o âmbito da justiça administrativa (art. 4º do ETAF),
alarga os meios processuais distinguindo as acções administrativas comuns das acções
administrativas especiais /art. 37º e 46º do CPTA) e alarga os poderes do juiz administrativo
sobre a administração pública (art. 162º e ss do CPTA).
Conclusão: toda a lógica do contencioso administrativo gravita em torno da tutela
judicial, plena e efectiva dos direitos dos particulares, sendo em razão deste princípio que
devem ser organizados os diferentes meios processuais, sejam eles destinados ao
reconhecimento de direitos e interesses, a impugnação de actos, a condenação da administração
ou a acautelar direitos dos sujeitos. Hoje passam a ser os diferentes meios processuais que giram
em volta do princípio da tutela plena e efectiva dos direitos dos particulares e não o contrário.

OS LIMITES MATERIAIS E FUNCIONAIS DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO

Limites materiais

Natureza da relação jurídico-administrativa:

A nossa constituição define o âmbito das relações jurídico-administrativas,


nomeadamente, as garantias dos cidadãos, perante a administração. A relação jurídico-
administrativa supõe da distinção entre os conceitos de personalidade jurídica, de órgão
administrativo e de titular ou membro desse órgão. A dificuldade resulta da complexidade da
organização administrativa e da dificuldade em determinar as posições jurídicas substantivas
dos particulares, face às posições jurídicas da administração. Por um lado devemos considerar a
existência de relações jurídico-administrativas internas entre órgãos administrativos de outra
mesma pessoa colectiva, e por outro lado as relações entre relações jurídicas externas, entre a

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administração e os particulares. Destas relações resultam litígios que se integram no âmbito do


contencioso administrativo (art.4º, nº 1, al. J) do ETAF).
Os litígios entre órgãos de uma mesma pessoa colectiva estão na origem de algumas
particularidades processuais que convém ter em conta. Em 1º lugar, nas acções propostas por
um órgão contra outro órgão, a legitimidade passiva não pertence aqui à pessoa colectiva
pública, mas ao próprio órgão em si (art. 10º, nº 2 e 6 do CPTA). Em 2º lugar, os órgãos
envolvidos no processo poderão ser representados por um advogado ( art. 11º, nº 2, do CPTA).

As posições jurídicas dos particulares em face da administração:

Os particulares ocupam posições jurídicas face à administração que consistem nos


direitos e interesses legítimos protegidos dos particulares face aos poderes públicos da
administração.
Temos por uma lado, direitos subjectivos, interesses legítimos ou legalmente protegidos e
interesses simples ou de facto.

Nota: o direito subjectivo caracteriza-se na possibilidade de satisfação do interesse


próprio do titular, razão pela qual lhe é conferido uma protecção jurídica directa.

Nota: o interesse legítimo não possibilita a satisfação de interesse próprio, mas a


satisfação de um interesse público que por conseguinte, pode acartar a satisfação de um
interesse privado.

Nota: o interesse simples ou de facto representa vantagens genéricas para o


administrado ou para determinadas pessoas que são vistas como vantagens ocasionais em
relação à situação concreta do administrado.

Posições jurídicas da administração:

A administração pública dispõe de poderes públicos para a prossecução de interesses


objectivos, isto é, do interesse público.
A administração pública exerce os interesses que prosseguem, são variáveis e podem
consistir na prevenção de danos, no fornecimento de bens/serviços, coordenação das actividades
económicas, atribuição de subsídios, etc.
A administração pública visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos
direitos e interesses legítimos dos particulares e em conformidade com a lei (princípio da
legalidade).
A administração pública passa a ser primeira organização que prossegue interesses
económicos, sociais, culturais e de justiça com finalidades gerais e no respeito dos interesses
dos particulares.

Limites funcionais:

A actividade exercida pelos tribunais sofre limites funcionais face ao poder


administrativo. É assim proibido aos tribunais controlar a actividade da administração, pois está
reservado aos órgãos administrativos o julgamento das questões administrativas e aos tribunais
os litígios resultantes das relações jurídico-administrativas. Existe um limite à actividade dos
tribunais face à actividade administrativa da administração. Este limite consiste na distinção
funcional entre fiscalização e autoria, isto é, a distinção entre a actividade de fiscalização e a
actividade de controlo. O processo de decisão difere do procedimento fiscalizador, na medida
em que ele é mais exigente, e mais completo e prevê uma certa responsabilidade para quem tem
o poder/dever de decidir. A função de decidir exige um conhecimento completo da situação de
facto e de direito. O outro limite decorre do princípio de que a fiscalização judicial da actividade
administrativa, limita-se ao controlo do cumprimento das normas jurídicas, não se admitindo,

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aqui, um juízo dos tribunais sobre a oportunidade e conveniência das decisões da administração
pública. A administração pública deve encontrar a melhor solução para a realização do interesse
público legalmente definido a actuar em conformidade com os princípios jurídicos consagrados
no CPA. Cabe aos tribunais não interferir nos assuntos internos da administração pública, sob
pena de coimas num estado dos juízos, pois o juiz não pode determinar aquilo que a
administração deve fazer, quando está em causa um acto de autoridade devendo limitar-se a
uma condenação genérica, a partir dos meios que a lei lhe reconhece.

ORGANIZAÇÃO JUDICÁRIA ADMINISTRATIVA

A reforma da justiça administrativa introduzida em 2002 teve um especial impacto na


organização judiciária. Esta reforma tornou-se indispensável devido à acumulação de processos,
ao aumento do nº de recursos e ao afogamento do tribunal central administrativo de Lisboa. Este
aumento de processos obrigou a uma duplicação do nº dos tribunais administrativos e a sua
reorganização territorial. Foram assim criados vários tribunais administrativos de círculo, o
tribunal central administrativo do Porto como 2ª instância ao nível da organização judiciária.
Mantém-se o supremo tribunal administrativo como tribunal supremo da organização judiciária/
administrativo.

Tribunais administrativos de círculo:

Ao nível da 1ª instância o ETAF consagra uma separação formal entre os tribunais


administrativos de círculo e os tribunais tributários de 1ª instância (art. 8º, al. C) do ETAF).
Apesar disso, nos termos do art. 9º, nº 3 do ETAF estes tribunais podem funcionar de forma
agregada sempre que tal se justifica, designadamente por questões de gestão de espaço físico e
de recursos humanos. Quando essa agregação acontece o tribunal agregado assume a designação
de tribunal administrativo e fiscal.
O aspecto mais relevante do ponto de vista da organização judiciária administrativa é o
aumento do nº de TAC.s que foram criados em todo o país.
O decreto-lei nº 325/2003 de 29 de Dezembro veio consagrar a área de jurisdição dos
novos tribunais, nos termos da lei, os TAC passam para lei e foram declarados a partir de 1 de
Janeiro de 2004 (portaria nº 1418/2003 de 30 de Dezembro).
Prevê-se ainda a possibilidade de estes tribunais serem desdobrados em juízos, podendo
funcionar em local diferente da sua sede, mas dentro da sua área de jurisdição (art. 9º, nº 1 do
ETAF).
Os juízes são regra geral afectos a cada um dos processos, quer administrativos, quer
tributários, também os tribunais administrativos de círculo funcionam com juiz singular,
cabendo ao juiz o julgamento de facto e de direito dos processos que lhe sejam distribuídos (art.
40º, nº 1 do ETAF).
Nas acções administrativas comuns o julgamento da matéria de facto é feito em tribunal
colectivo, se tal for requerido por qualquer das partes (art. 40, nº 2 do ETAF).
No caso das acções administrativas especiais, de valor superior à alçada, os TAC.s funcionam
em tribunal formado por três juízes, competindo-lhe o julgamento de facto e de direito (art. 40º,
nº 3 do ETAF).
Poderá haver, contudo, intervenção de todos os juízes quórum de 2/3, quando se
coloque uma questão de direito nova que suscite dificuldades sérias e se possa vir a colocar
noutros litígios, cabendo então ao presidente do tribunal determinar que o julgamento, se faça
com a intervenção/presença de todos os juízes do tribunal.
Este procedimento terá obrigatoriamente lugar quando esteja em causa uma situação de
processos em massa (art. 93º do CPTA).

ACÇÃO ADMINISTRTIVA

 Acção administrativa especial:

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 Impugnação do acto administrativo, impugnação de uma norma – art.


46º CPTA.

 Acção administrativa comum:

 Tem por objecto litígios cuja apreciação se inscreva no âmbito da


jurisdição administrativa – art. 35º CPTA

Nota: alçada – num valor inferior a esse montante não se pode recorrer – art. 40º, nº 3 ETAF.

o Tribunais Centrais Administrativos

Os tribunais Centrais Administrativos transformaram-se com a reforma 2002 em segunda


instância da jurisdição administrativa e fiscal. Hoje existe o tribunal administrativo do norte e o
tribunal com sede no Porto, e um tribunal Central Administrativo, com sede em Lisboa. Estes
dois tribunais foram declarados e instalados a partir de 1 de Janeiro de 2004, cada “tribunal
Central Administrativo” tem uma secção de contencioso administrativo e uma secção de
contencioso tributário, sendo que o julgamento em cada secção cabe ao relator e outros dois
juízes. – art. 1º do ETAF.

o Supremo Tribunal Administrativo

O STA tem a sua sede em Lisboa, mas é competente com todo território nacional – art. 11º
do ETAF. O STA compreende duas secções, a secção do Contencioso administrativo e a secção
do Contencioso Tributário, funcionando cada uma delas em formação de 3 juízes, isto é, o
relator e mais dois juízes, ou funcionando em Pleno da secção, isto é, o relator e pelo menos 2/3
dos restantes juízes da secção. O STA, também funciona em Plenário, sendo este composto pelo
Presidente, pelos Vice-presidentes e pelos três juízes mais antigos de cada uma das secções –
art. 48º do ETAF.

O STA através do Pleno e o Plenário, apenas conhecem matéria de Direito, conforme dispõe
o art. 12º, nº 3 do ETAF. A secção de contencioso administrativo conhece matéria de direito nos
recursos de revista – art. 12º, nº 4 do ETAF e conhece matéria de facto nos recursos de apelação
ou nos casos em que é competente para decidir em primeira instância – art.12º, 28º, 25º do
ETAF.

O pleno do supremo vai apreciar recursos para uniformização com vista a obter uma decisão
coerente.

Quando há um recurso de apelação?


- Há quando existe matéria de facto.

Quando há um recurso de direito?


- Há quando existe matéria de revista – art. 12º, nº3 e 4º ETAF.

TRIBUNAIS ARBITRAIS

Ao lado dos tribunais permanentes o novo ETAF prevê a criação de tribunais arbitrais e
centros de arbitragem – art. 180º do CPTA.

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O tribunal arbitral pode funcionar para resolver litígios com o Estado ou com outras
pessoas colectivas de direito público, é assim que os tribunais arbitrais podem ser constituídos
para o julgamento de questões respeitantes a contratos, incluindo a apreciação de actos
administrativos, relativos à execução desses mesmos contratos, de questões relativas à
responsabilidade civil extracontratual, de questões relativas a actos administrativos que possam
ser revogados sem fundamento na sua invalidade.
Estes tribunais apreciam em geral a globalidade das questões jurídicas, pelo que se
podem pronunciar, quer sobre as questões de legalidade, quer sobre as questões de mérito.
Também o ETAF estabelece que, o interessado, que pretende recorrer à arbitragem, pode exigir
da administração, a celebração de um compromisso arbitral, estabelecendo assim uma
arbitragem forçada (Mário Aroso de Almeida).

Apesar da letra do art. 182º do CPTA, fica a dúvida de saber se esta exigência (aceitar
que o caso seja julgado pelo tribunal arbitral) de recurso à arbitragem voluntária, por parte da
entidade envolvida. Acontece que, a lei não prevê sanções para as entidades administrativas que
recusam a outorga do compromisso arbitral. A aplicação desta norma dependerá da percepção
das entidades públicas há cerca das vantagens desta solução (João Caupers).

O ETAF prevê ainda no art. 9º, nº 4, a possibilidade de vir a ser criados tribunais
administrativos especializados, bem como secções especializados nos tribunais superiores.

REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS ENTRE OS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS

A reforma de 2002 trouxe significativas alterações à distribuição da competência em


razão da matéria. A competência territorial está estabelecida no art. 16º do PTA, sendo os
processos em primeira instância intentados no tribunal da residência habitual ou da sede do
autor, ou da maioria dos autores.
Procedeu-se a uma distribuição das competências entre os TACs, como tribunais de
primeira instância, os TACs, como tribunais de segunda instância e STA, como tribunais de
revista.

AS COMPETÊNCIAS DO STA:

A competência da secção do Contencioso Administrativo do STA encontra-se definida


no art. 24º do ETAF. Este tribunal conhece processos em primeira instância, em matéria
administrativa relativos a acções ou omissões do Presidente da República, da AR e seu
Presidente, Primeiro-ministro (art. 24º, nº 1,al. A) do ETAF).
Contudo, o STA deixa de conhecer em primeiro grau de jurisdição a generalidade dos
actos administrativos, dos membros do Governo, mas é da sua competência conhecer os
processos relativos a eleições previstas nos arts. 19º do ETAF e art. 33º, nº 3 do ETAF.
Os pedidos de adopção de providências cautelares relativos a processos da sua competência, os
pedidos relativos à execução das suas decisões (art. 24º, nº 1, al. D) do ETAF). As acções de
regresso (al. F) fundadas em responsabilidades por dados no exercício das suas funções e dos
conflitos de competência entre tribunais administrativos.
Quanto ao seu fundamento em segunda instância, o STA é competente para conhecer
dos recursos, dos acórdãos, que aos TACs caibam proferir em primeiro grau de jurisdição (art.
24º, nº 1, al. G) do ETAF).
Com esta repartição de competências assiste-se a um diminuição do número de recursos
jurisdicionais a apreciar pelo STA, a outra razão da diminuição do número de recursos tem a ver
com a introdução do mecanismo das alçadas na justiça administrativa. Agora, memo nos casos
em que os TACs sejam competentes em primeira instância, o recurso para o STA dependerá do
valor da causa. Também a reforma do contencioso veio atribuir à secção de contencioso
administrativo do STA competência para conhecer dos recursos de revista (art. 24º, nº 2 do

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ETAF), sobre matéria de direito, interpostos de acórdãos do TACs e das decisões dos TACs,
através de recurso per saltum (art. 151º do CPTA).

No caso de revista das decisões dos TACs ou de revista das decisões dos TACs através
do recurso per saltum, a revista só pode ter como fundamento a violação da lei substantiva ou
processual. Apenas sendo conhecida matéria de direito, considerando-se fixada a matéria de
facto.
Por outro lado, a secção de contencioso administrativo do STA é competente para
conhecer dos conflitos de competência entre tribunais administrativos, bem como de outros
processos cuja apreciação lhe seja deferida por lei (art. 24º, al. H e I do ETAF).
Compete ainda ao STA conhecer dos recursos de acórdãos proferidos pela secção em primeiro
grau de jurisdição e dos recursos para uniformização de jurisprudência (art. 25º do ETAF e art.
152º do CPTA).

Compete também ao pleno da secção do STA pronunciar-se relativamente ao sentido


em que deve ser resolvida por um tribunal administrativo de círculo, a questão de direito nova
que suscite dificuldades sérias e se possa vir a colocar noutros litígios (art. 25º, nº 2 do ETAF).
Este mecanismo está previsto no art. 93º do CPTA.

Conclusão sobre o STA:

O STA desempenha funções de uniformização de jurisprudência, de resolução de


conflitos de competência e de jurisdição, de decisão de recurso (s) de revista e de decisão de
questões de direito nova, que possam suscitar dificuldades sérias e cuja relevância faça prever a
possibilidade de vir a ser suscitadas noutros litígios.

TRIBUNAIS CENTRAIS ADMINISTRATIVOS:

Os TACs funcionam como tribunais de segunda instância nos termos do art. 37º do
ETAF, compete à secção de contencioso administrativo do tribunal central administrativo,
conhecer dos recursos das decisões proferidas por tribunal arbitral sobre matéria do contencioso
administrativo, segundo o art. 186º do CPTA, as decisões proferidas pelo tribunal arbitral
podem ser anuladas pelo TCA.
Os TACs também têm uma competência em primeira instância na medida em que eles
podem conhecer das acções de regresso, fundadas em responsabilidade por danos resultantes do
exercício das suas funções – art. 37º, al. C do ETAF.

Os tribunais centrais administrativos conhecem da matéria de facto e de direito,


conforme dispõe o art. 31º, nº 3 do ETAF.

AS COMPETÊNCIAS DO TACs

Nos termos do art. 44º do ETAF compete aos tribunais administrativos de círculo
conhecer em primeira instância de todos os processos do âmbito da jurisdição administrativa,
com excepção daqueles cuja competência em primeiro grau de jurisdição esteja reservada aos
tribunais superiores e da apreciação dos pedidos que nestes processos sejam cumulados (art. 4º
do CPTA – princípio da cumulação de pedidos).
As medidas da competência dos TACs resultam do âmbito da jurisdição dos tribunais
administrativos e fiscais (art. 4º do ETAF).

A ALÇADA DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS:

Uma das alterações importantes da reforma de 2002 traduziu-se no estabelecimento das


alçadas para os tribunais administrativos e fiscais. Estas determinam que a possibilidade de

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recurso jurisdicional de uma decisão em primeira instância e a fixação do tipo de recurso,


podem estar dependentes do valor da causa.
Também dependem do valor da alçada, a definição da forma de processo, a submissão
do julgamento a tribunal singular ou a informação de três juízes (art. 31º do CPTA).

Dois tipos de acções:

- a acção administrativa comum (art. 37º)

- a acção administrativa especial (art. 46º)

Nota: o valor da causa é importante para determinar a forma do processo.

A alçada é importante por dois motivos:

1- Efeitos de recurso;

2- Fixação do tipo de recurso.

A introdução de alçadas reveste uma importância fundamental para a resolução do problema


de excessos de trabalho nos tribunais superiores. Hoje admitem o recurso jurisdicional rodas as
decisões que têm conhecido em primeiro grau de jurisdição o mérito da causa (art. 142º, nº 1 do
CPTA) desde que se trate de processo de valor superior à alçada do tribunal de que se recorre
(art. 142º, nº 1 CPTA), contudo, será independente do valor da causa o recurso das decisões de
improcedência de pedidos de intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias, de
decisões proferidas em matéria sancionatória, de decisões proferidas como jurisprudência
uniformizada pelo Supremo tribunal administrativo, ou de decisões que ponham termo ao
processo sem se pronunciar sobre o mérito da causa – art. 142, nº 2 CPTA.
Intimação: art. 109º do CPTA.

Nos termos do art. 6º do ETAF a alçada dos tribunais administrativos de círculo (TACs)
corresponde aquela que se encontra estabelecida pelos tribunais judicias de primeira instância,
que é de 3740, 98€ (art. 24 da lei orgânica dos tribunais judicias). Quando os TACs ou STA
exercem competências em primeira instância, a sua alçada corresponde os dos TACs (art. 6º, nº
5 do ETAF).

O art. 6º, nº 4 do ETAF (remissão para o art. 43º, nº 1 e 2 do CPTA) faz corresponder à
alçada dos TACs à alçada estabelecida para tribunais da relação, ou seja, 14.963.94€. quando os
tribunais centrais administrativos decidem em primeira instância, a admissibilidade do recurso
para o segundo grau de jurisdição depende da alçada dos TACs (art. 6º, nº 5 do ETAF).

Importa aqui salientar que o valor da alçada definido no art. 6º, nº 4 do ETAF não foi
previsto para servir de critério de acesso ao duplo recurso para o STA, mas apenas para definir
as situações que os processos submetidos à acção administrativa comum sigam o processo
ordinário ou sumário (art. 43º, nº 1 e 2 do CPTA).

Nos casos normas de procedimento o processo a ser seguido (com valor muito baixo é a
forma sumaríssima: art. 43º, nº 3 CPTA).
Conclusão: a fixação de alçadas, para que se determine se cabe o recurso ou não da
sentença proferida em primeira instância (art. 31º, nº 2 do CPTA) a forma de processo na acção
administrativa comum art. 31º, nº 3 do CPTA, ou se o processo na acção administrativa especial
deve ser julgado em tribunal singular ou formação de três juízes (art. 31º, nº 2 do CPTA)
obrigou o legislador a estabelecer critérios para a fixação do valor da causa (art. 32º, 33º, 34º do
CPTA).

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“Toda a causa tem um valor”

Art. 32º do CPTA


Critério geral: para determinar o valor da causa por exemplo é – o pagamento da quantia certa.

Ex: art. 33º CPTA


Critério especial: alínea a).

Competências
Outras questões acerca da competência dos tribunais administrativos.

O CPTA regula os recursos jurisdicionais nos art. 140º e ss, o código faz referência ao
recuso de revista dos TACs para o STA – art. 150º do CPTA – ao recurso per saltum dos TACs
para o STA – art. 151º do CPTA – e ao recurso para uniformização9 de jurisprudência – art.
152º do CPTA. Os recursos previstos podem ser de apelação ou de revista, no primeiro caso o
tribunal conhece matéria de facto e de direito, enquanto que no segundo caso, o fundamento do
recurso é apenas a violação da lei substantiva ou processual, conhecendo apenas matéria de
direito considerando-se aqui fixado a matéria de facto – art. 150º, nº 3 e 4 e art. 151º, nº 3 do
CPTA.

O recurso de apelação está previsto no art. 149º do CPTA, o Prof. Vieira de Andrade
chama-lhe recurso ordinário comum, entre os recursos ordinários, contam-se os recursos
ordinários excepcional ou recurso de revista dos TACs para o STA, o recurso ordinário especial,
ou recurso de revista per saltum dos TACs para o STA e finalmente o recurso para
uniformização de jurisprudência, além dos recursos das sentenças transitadas em julgado, que se
pode ser dirigido ao tribunal que proferiu a sentença, art. 154º do CPTA e art. 771 e ss do
Código do processo civil. São fundamentos deste recurso extraordinário a revista de sentença a
falsidade de documentos essencial ou decisivo, falta ou nulidade da citação.

Temos dois tipos de recurso no âmbito do processo civil:

Recurso ordinário – diz respeito ao recurso de revista (TACs para STA).

Recurso extraordinário – Recurso de revista (art. 154º do CPTA)


Falta de citação

Considera-se que este recurso é extraordinário e não ordinário, visto que não se trata de
conhecer em segundo grau de jurisdição de uma sentença ainda não transitada em julgado.

Depois da reforma da justiça administrativa, os recursos passaram a ser de reexame


decidindo sempre acerca do objecto do litígio, obtendo-se por isso, nova decisão que substitui a
anterior deixando assim de ser apenas recursos de revisão, nos quais não se poderia conhecer
nova matéria que não tivesse sido julgada na primeira instância.

Poderá inclusivamente decidir com base em novas provas, como no caso de recurso de
apelação onde também se conhece matéria de facto (art. 149º, nº 1 CPTA), tendo tribunal de
recurso os mesmos poderes do que o tribunal que decidiu em primeira jurisdição. Nos recursos
de revista e no recurso para uniformização da jurisprudência, onde só se colocam questões de
direito, considerando-se fixados a matéria de facto, o tribunal define o regime jurídico aplicado.
Uma das outras modalidades dos recursos jurisdicionais prende-se com a possibilidade de
recurso que agora é conferida a qualquer das partes nos processos impugnatórios, mesmo que a
sentença lhe tenha sido favorável – art. 141º do CPTA.

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COMPETÊNCIAS DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS (continuação)

Destaca-se ainda a possibilidade que a lei atribui no art. 148º do CPTA aos presidentes
dos TACs e STA de determinar que no julgamento de recurso intervenham todos os juízes da
secção quando tal se revela necessário para assegurar a uniformidade da jurisprudência,
designadamente quando se verifica a possibilidade de vencimento da solução jurídica em
oposição com a jurisprudência anteriormente firmada o domínio da mesma legislação e sobre a
mesma questão fundamental de direito.
O CPTA (lei) qualifica esta possibilidade como julgamento ampliado do recurso (art.
148º do CPTA).
Este julgamento ampliado do recurso acontece para prevenir uma solução de oposição
velando antecipadamente pela uniformização de jurisprudência (art. 152º CPTA), as decisões
jurisdicionais já foram tomadas pretendendo-se aqui resolver as contradições existentes sobre
uma mesma questão fundamental de direito entre acórdãos do STA ou entre um acórdão dos
TCAs e um acórdão do STA.

Alguns mecanismos de agilização processual relevantes para as competências dos


tribunais administrativos:

Um dos mecanismos consiste na previsão de centros de arbitragem permanentes por


forma a libertar os tribunais administrativos da apreciação de alguns processos (art. 187º
CPTA).
Como outro mecanismo é de referir o relativo aos processos em massa, previsto no art.
48º do CPTA.
O tribunal pode, se assim o entender e desde que exista uma relação jurídica entre os
vários processos, determinaram as regras a adoptar no caso de existir mais de vinte processos
que digam respeito à mesma relação jurídica material (art. 48º, nº 1 do CPTA).
Um outro mecanismo de agilização processual está previsto no art. 161º do CPTA,
trata-se da extensão dos efeitos da sentença transitada em julgado. Assim, os efeitos de uma
sentença transitada em julgado, que tenha anulado um acto administrativo desfavorável ou
reconhecido uma situação jurídica favorável a uma ou várias pessoas, podem ser entendidos a
outras que se encontrem numa mesma situação jurídica, quer tenham recorrido ou não a via
judicial e desde que quanto a estas não exista sentença transitada em julgado.
Para tal, os casos devem ser perfeitamente idênticos e dizer respeito ao domínio do
funcionalismo público e no domínio dos concursos públicos.
A extensão da sentença dá-se a pedido do interessado dirigido à entidade administrativa
que haja sido demandada no processo de cuja sentença se pretende beneficiar. O interessado terá
um ano para o requerer contado da data da última notificação de que tenha sido parte no
processo (nº 3, art. 161º).

As formas de processo:

O CPTA apresenta duas grandes formas de acções, a acção administrativa comum (art.
37º a 45º do CPTA) e a acção administrativa especial (art. 46º a 96º do CPTA). Embora a acção
administrativa comum corresponde ao processo de declaração (declarativo) regulado no código
de processo civil (CPC) nas formas ordinária, sumária e sumaríssima (art. 35º do CPTA) e a
acção administrativa especial tenha uma tramitação especial regulada nos art. 78º e ss do CPTA.
As diversas fases consagradas no CPTA são iguais àquelas que no processo civil estão
estabelecidas para as acções declarativas; o que significa que nestas duas formas de acções
administrativas o processo estrutura-se conforme as seguintes fases, a primeira fase é a fase dos
articulados em que as partes apresentam as suas alienações sobre os factos que entendem ser
relevantes. A segunda fase é a fase da condensação, nesta fase todos os actos são praticados
pelo juiz ou pela secretária e traduzem-se na verificação da legalidade e regularidade de todos
os actos praticados pelas partes. Cabe por ex ao juiz seleccionar as questões de facto e de

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direito, que entende serem úteis para uma boa decisão da causa final. A terceira fase, da
instrução – esta fase inicia-se com a notificação das partes do despacho saneador que contém
toda a matéria que terá de ser provado em julgamento. Por isso, as partes terão de praticar todos
os actos para levar ao processo as provas de que dispunham e para requerer ao juiz as provas
que pretendam fazer. Por fim, a quarta fase, a fase da discussão e do julgamento – cabe aqui ao
tribunal decidir por sentença ou por acórdão e finalmente ordenar a notificação desta às partes.

A função do processo:

A função do processo tem a ver com as espécies de acções (declarativa e executiva e o


fim que cada uma visa prosseguir). Nos termos do art. 35º do CPTA prevê-se que os processos
podem seguir as formas ordinárias, sumária e sumaríssima, conforme previsto no código de
processo civil (CPC). A acção administrativa comum caracteriza-se por admitir a dedução
genérica de pedidos de condenação, de mera apreciação e constitutivos sempre que não tenha
sido emitido um acto administrativo ou uma norma.
A acção de condenação prevista no art. 37º, nº 2 do CPTA tem por função a condenação
do réu na prestação de uma coisa ou de um facto.
Na acção declarativa de simples apreciação, o requerente exige que se declare a
existência de um direito, ou de um facto, ou a inexistência desse mesmo direito ou facto
(apreciação positiva no primeiro caso, apreciação negativa no segundo caso). Aqui o tribunal
limita-se a reconhecer a existência ou inexistência do direito ou do facto.
Na acção constitutiva pede-se ou requer-se a alteração de uma situação jurídica e o
tribunal cria, modifica ou extingue direitos ou deveres.
No que se refere à acção administrativa especial, ela tem uma função declarativa de
anulação ou de condenação. A função é declarativa sempre que se requer a apreciação de
invalidade do acto administrativo ou a declaração da sua nulidade ou inexistência jurídica.
A anulação verifica-se nos casos em que se requer directamente à anulação do acto
administrativo e a condenação verifica-se nos casos em que se pretende a condenação da
administração à prática de um acto legalmente devido (art. 66º).

A acção administrativa comum integra as seguintes subespécies:

As acções declarativas, as acções constitutivas e as acções de condenação. Qualquer


uma delas pode assumir a forma ordinária, sumária e sumaríssima.

As acções administrativas especiais integram as seguintes subespécies:

As acções impugnatórias de anulação de actos administrativos, as acções impugnatórias


declarativas da ilegalidade de normas e depois as acções condenatórias para a omissão de actos
e normas administrativas.

Para além destas acções é de acrescentar as acções urgentes que integram várias
subespécies:

As acções impugnatórias urgentes de contencioso eleitoral e pré-contratual (art. 105º e


ss CPTA) e as de intimação (art. 104º e ss CPTA).

A ACÇÃO ADMINISTRATICA COMUM

Direitos fundamentais do processo:

o Princípio relativo à disciplina da acção: a disciplina da acção é necessária para a boa


marcha processual e para assegurar a igualdade das partes no processo;

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o Princípio dispositivo: o princípio dispositivo é um dos princípios basilares do direito


processual que prevê a auto-responsabilidade das partes impondo-lhes o dever de
dinamizar o processo com a prática de actos processuais legais ou judicialmente
impostos e indispensáveis para o efeito;

o Princípio da estabilidade da instância: este princípio pressupõe a inalterabilidade do


pedido a partir do momento em que a parte demandada tenha sido citada para a acção.
A instância fica assim estável a partir desse momento;

o Princípio contraditório: o processo implica que cada uma das partes tenha de ser
convidado a alegar as suas razões de facto ou de direito, e oferecer as provas
necessárias para demonstrar a veracidade dos factos, bem como a controlar as provas
oferecidas pela outra parte e a pronunciar-se sobre ela (art. 84º CPTA ;art. 260º do
CPC);

o Princípio da igualdade das partes: esta igualdade não deve ser apenas uma igualdade
formal, mas também deve ter uma dimensão substancial e efectiva (art. 6º do CPTA).

O regime geral da legitimidade processual

Resulta do art. 9º do CPTA, o princípio da legitimidade activa, esta legitimidade não se


encontra apenas regulada no art. 9º, mas também no art. 40º; 55º, nº 1, al F); 57º; 68º e 73º do
CPTA.

O regime da legitimidade activa está consagrado no art. 9º, nº 1 do CPTA, corresponde


ao que estabelece o art. 26º do CPC, que dispõe que são considerados titulares do interesse
relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tanto como é
configurada pelo autor. O autor é parte legítima quando tem interesse directo em demandar, o
réu é parte legítima quando tem interesse directo em contradizer.
Artigo 9º, nº 2 do CPTA – corresponde ao art. 26º, al. A) do CPC que fala de acções
para a tutela de interesses difusos. “Tem legitimidade para propor e intervir nas acções e
procedimentos cautelares destinados designadamente a defesa da saúde pública, do ambiente, da
qualidade de vida, do patriotismo cultural e do domínio público, bem como a protecção do
consumo de bens e serviços, qualquer cidadão, as associações e fundações, defensoras dos
interesses em causa, as autarquias locais e o Ministério Público”.

AS FORMAS DE PROCESSO ADMINISTRATIVO:

A acção administrativa comum (art. 37º do CPTA) tem por objecto a fiscalização do
exercício dos poderes administrativos e visa dirimir os litígios emergentes de relações jurídico-
administrativas. Esta acção com o tradicional contencioso das acções de responsabilidade civil
extracontratuais, as acções sobre contratos, o reconhecimento de direitos ou interesses perante a
administração e outras acções propostas contra os particulares e acções propostas por entidades
públicas.

A acção de responsabilidade:

O art. 4º, nº 1, al. G) do ETAF confere aos tribunais administrativos uma competência
genérica para apreciar as questões de responsabilidade civil extra-contratual das pessoas
colectivas de direito público. Trata-se de litígios emergentes de actuações da administração
pública, no entanto, fica excluído do âmbito da jurisdição administrativa a apreciação das
acções de responsabilidade por erro judiciário (art. 4º, nº 3, al.A) do ETAF) cometido por
tribunais pertencentes a outras jurisdições.

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A acção sobre contratos:

Os tribunais administrativos têm o poder de apreciar as questões relativas à validade,


interpretação e execução e contratos públicos (art. 4º, nº 1, al. E) do ETAF).

O reconhecimento de direitos ou interesses perante a administração:

Trata-se apenas de obter o reconhecimento de situações jurídicas subjectivas (art. 37º, nº


2, al. A) do CPTA) de qualidades ou preenchimento de condições.

A acção propostas contra particulares:

No âmbito da acção administrativa comum, o art. 37º, nº 3 do CPTA, admite que os


particulares cujos direitos ou interesses sejam ofendidos, possam demandar perante os tribunais
administrativos outros particulares, por estes estarem a violar normas de direito administrativo
ou obrigações contratualmente assumidas pedindo que eles sejam condenados a adoptar ou a
absterem-se de certo comportamento.

A acção proposta por entidades públicas:

Também revestem a forma da acção administrativa comum os processos intentados por


entidades públicas, seja para demandar outras entidades públicas (art. 37º, nº 2, al. J) do CPTA),
seja para demandar particulares em ordem a obter a condenação, a adopção ou abstenção de
comportamentos (art. 37º, nº 2, al. C) do CPTA).

A ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL

O CPTA reúne um conjunto de disposições, relativos à impugnação de normas


administrativas (art. 72º e ss); a condenação da administração à prática de actos administrativos
(art. 66º e ss) e a declaração de ilegalidade por omissão de normas administrativas (art. 77º do
CPTA).

O regime da impugnação de actos administrativos

O art. 51º do CPTA prevê a impugnação de actos administrativos susceptíveis de lesar


direitos ou interesses legalmente protegidos. São impugnáveis os actos administrativos com
eficácia externa, isto é, actos que produzem efeitos na esfera jurídica do particular. O CPTA
utiliza o critério da eficácia externa, como critério para a impugnabilidade do acto
administrativo. Também o CPTA prevê a impugnabilidade de actos administrativos,
independentemente da sua forma (art. 52º CPTA). É de referir ainda, a impugnação de actos
meramente confirmativos (art. 53º) e de actos administrativos ineficazes (art. 54º do CPTA):

O art. 53º do CPTA considera que uma impugnação só pode ser rejeitada com
fundamento no carácter meramente confirmativo, do acto impugnado, quando o acto anterior
tenha sido impugnado pelo autor, tenha sido objecto de notificação ao autor ou tenha sido
objecto de publicação.

No que diz respeito à impugnação de actos ineficazes só podem ser objecto de


impugnação os actos administrativos que produzem efeitos jurídicos.
No entanto, o acto administrativo pode ser impugnado ainda que não tenha começado a
produzir efeitos jurídicos sobretudo quando seja provável que o acto produza efeitos.
Os prazos para impugnação vêm previstos no art. 58º do CPTA, o qual estabelece uma
diferença entre prazos de impugnação de actos anuláveis, e o prazo de impugnação de actos
nulos (art. 133º e 135º do CPA).

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O regime de condenação à prática de actos administrativos devidos (art. 66º do


CPA)

Resulta do art. 66º do CPTA que não está aqui apenas em causa a condenação da
administração à prática de actos administrativos, mas também a fixação de um prazo
determinado dentro do qual esses actos devem ser praticados, o código prevê as várias situações
ou pressupostos de condenação à prática do acto devido: a primeira situação de inércia ou
omissão está previsto no art. 67º, nº 1, al.a) do CPTA; a segunda situação está prevista no art.
67º, nº 1, al.b) do CPTA e, é aquela em que, tenha sido indeferida a pretensão do administrado
através da recusa expressa da prática do acto requerido. Trata-se aqui dos actos administrativos
de indeferimento. A terceira situação está prevista no art. 67º, nº 1, al. C) do CPTA e diz
respeito às situações em que tenha sido recusada a própria apreciação do requerimento. Trata-se
aqui, de actos de recusa de apreciação de requerimentos.

Conclusão:

A introdução no contencioso administrativo da possibilidade de existência de processos


de condenação da administração à prática de actos administrativos devidos, mesmo quando
tenham sido emitidos actos administrativos de indeferimento. Tem um alcance maior do que o
processo de impugnação de actos administrativos, pois na verdade este processo não é
delimitado por referência aos concretos fundamentos, em que se possa ter baseado o acto
proferido, art. 66º, nº 2 do CPTA.

A ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL

O contencioso das normas administrativas – art. 72º do CPTA

O CPTA prevê um conjunto de disposições nos art. 72º e ss, relativos à impugnação de
normas e a declaração de ilegalidade por omissão.
Em primeiro lugar, no que diz respeito à impugnação de normas administrativas o
código prevê a impugnação de normas, no caso de vícios resultantes desta norma (art. 72º, nº 1
do CPTA).
No que diz respeito à declaração de ilegalidade por omissão, esta declaração de
ilegalidade pode ser pedida por quem seja prejudicado pela aplicação da norma, ou, possa ainda,
vir a selo no futuro.
O código admite a possibilidade de o lesado poder requerer a desaplicação da norma,
com efeitos circunscritos ao caso em concreto – art. 73º, nº 2 do CPTA. Neste caso, o tribunal
desaplicando a norma ilegal, anula ou declara nulo o acto administrativo que nele se tenha
baseado.
Em princípio a declaração de ilegalidade com força obrigatória geral produz efeitos
retroactivos - art. 76º, nº 1 do CPTA.
Ficam, no entanto, ressalvadas as situações previstas no 76º, nº 3 que são as situações
consolidadas, que o código identifica como sendo os casos julgados e os actos administrativos
que já não possam ser inimpugnáveis.

Processos urgentes

O CPTA prevê quatro tipos de situações em que reconhece existir a necessidade de


obter com urgência uma decisão de fundo sobre o mérito da causa. Para o efeito estão previstos
quatro formas e processo especiais: o contencioso eleitoral, contencioso pré-contratual,
intimações para a prestação de informações (art. 104º), consulta de processo ou passagem de
certidões. A intimação para a protecção de DLG’s.

Contencioso eleitoral

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No contencioso eleitoral está muitas vezes em causa a prática de actos eleitorais


anteriores ao acto eleitoral, que podem ser objecto de impugnação, no prazo de sete dias e que
são, regra geral, actos relativos à exclusão, omissão de eleitores, nos cadernos eleitorais – art.
98º do CPTA.
A impugnação de actos administrativos em matéria eleitoral está ao alcance de qualquer
eleitor ou pessoa elegível, na eleição em causa – art. 98º, nº 1 do CPTA.
A tramitação a seguir é a da acção administrativa especial – art. 78º e ss do CPTA, com
algumas especificidades com o art. 99º do CPTA.

Contencioso pré-contratual

Trata-se de actos administrativos praticados durante o procedimento de formação de


contratos celebrados pela administração pública – art. 100º do CPTA. São por ex: susceptíveis
de impugnação directa, o caderno de encargos, o programa de recurso ou outro documento
relativo ao contrato, com o fundamento na sua ilegalidade.
O prazo previsto para a impugnação é de um mês, nos termos do art. 101º do CPTA,
também tal como sucede com o contencioso eleitoral a tramitação a seguir é a da acção
administrativa especial, com as especificidades do art. 102º.

Intimações para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de


certidão

O processo da intimação funciona como um meio principal com vista a proporcionar em


condições de celebridade à tutela dos direitos dos interessados à informação e ao acesso aos
documentos da administração.
Este processo baseia-se no direito dos interessados à informação previsto no art. 61º do
CPA.
Resulta do art. 104º e ss do CPTA, que o processo de intimação pode funcionar como
um meio autónomo ou acessório do principal (art. 105º - prazo de intimação).

Intimação para protecção de DLG’s – art. 109º do CPTA

A intimação para protecção de DLG’s pode ser requerida com vista à adopção de uma
conduta positiva ou negativa, necessária para assegurar o exercício efectivo de um DLG e por
não ser possível ou suficiente, o decretamento de uma providência cautelar, segundo o disposto
no art. 131º, nº1 do CPTA. Por ex: é o caso quando está em causa a obtenção de autorização
para a realização de uma manifestação, por ocasião da deslocação a Portugal de uma
personalidade estrangeira. Nesta situação, não faz sentido uma providência cautelar,
antecipatória, porque a realização da manifestação não pode ser autorizada a título provisório.
Neste caso, é necessário obter com carácter – consciência uma decisão definitiva sobre a
questão de fundo.
Do ponto de vista da tramitação o modelo comporta várias possibilidades previstas no
art.110º, nº 1 e nº2 que corresponde ao modelo normal – art. 110º, nº 3 – modelo mais lenta do
que de o normal, art. 11º, nº 1 do CPTA, corresponde às situações de especial urgência.

PROCESSOS CAUTELARES

Considerações gerais

Até 1985 o único tipo de providência cautelar que se encontrava consagrado no nosso
contencioso administrativo, era o Instituto da suspensão da eficácia de actos administrativos.
Hoje o CPTA admite para além das providências cautelares consagradas no art. 112º, nº 2 do
CPTA, as providências específicas do código de processo civil com as adaptações que se
justifiquem no âmbito do contencioso administrativo.

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Tipos de providências cautelares

Se tiver sido emitido um acto o problema resolve-se com a suspensão da eficácia do


acto previsto no art. 112º, nº 2, al. A) do CPTA e art. 128º e 129 do CPTA.
Nas demais situações a tutela cautelar concretiza-se na imposição provisória de uma
ordem no sentido da administração não realizar certa actividade ou porventura cessar essa
actividade, isto pode acontecer quando o interessado pretende que a administração se abstenha
de realizar operações materiais que não resultam directamente da execução do acto(s)
administrativo(s) ou quando a providência cautelar se destina a complementara suspensão da
eficácia do acto administrativo, por ex: no caso de não promoção de um funcionário, enquanto
está pendente a definição da situação do seu concorrente directo.
O outro domínio de aprofundamento da tutela cautelar envolve as situações em que o
interessado pretende obter uma prestação administrativa, a adopção de medidas por parte da
administração, que podem envolver ou não a prática de um acto administrativo. Temos por ex:
medidas cautelares necessárias para antecipar a título provisório o resultado pretendido num
processo principal, como por ex: o art. 112º, nº 2 do CPTA, a administração provisória em
concurso e exames, a permissão provisória da utilização de um bem, a imposição da adopção de
certos comportamentos, etc.

Critérios gerais

As providências cautelares tanto podem ser requeridas antes, como simultaneamente, ou


mesmo, depois da propositura da acção principal (art. 114º, nº 1 CPTA). A legitimidade para
requerer a adopção de providências cautelares, não pertence apenas aos particulares que
decorrem a justiça administrativa em defesa dos seus direitos e interesses, mas também ao
Ministério público e as pessoas que actuam no exercício da acção popular (art. 52º, nº 3 da
CRP).

Regime de atribuição das providências cautelares

O art. 120º do CPTA fixa os critérios relativos à atribuição das providências cautelares.
O código distingue:

A providência cautelar conservatória (art. 120º, nº 1, al. B); da providência cautelar


antecipatória (art. 120º, nº 1, al. C).

A primeira destina-se a manter o status quo (manter as coisas como estão), não
permitindo que a situação se altere. No segundo caso, as providências cautelares antecipatórias,
têm em vista alterar precisamente o status quo, para gerir os direitos e interesses do
administrado. (art. 120º, al. B e C).

Importa aqui referir a introdução no art. 121º do CPTA, da possibilidade de antecipação


do juízo sobre o método da causa, atendendo a gravidade dos interesses envolvidos.

As providências relativas a procedimentos de formação de contratos


administrativos:

O art. 132º do CPTA estabelece um conjunto de disposições respeitantes à adopção de


providências cautelares, em matéria de formação de contratos administrativos. Estas
providências destinam-se a corrigir alguma ilegalidade no momento da formação dos contratos,
é o caso por ex, do programa de concurso público que proíbe o acesso a candidatos de origem
comunitária.

OS RECURSOS JURISDICIONAIS – art. 140º CPTA

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Enquadramento

O art. 140 estabelece duas regras:

- os recursos ordinários das decisões proferidas pelos tribunais administrativos, regem-se pelo
disposto no CPC;
- esses recursos são processados como os recursos de agravo.

Também o CPTA estabelece que os recursos ordinários podem ser, recursos de apelação
e recursos de revista, nos termos dos art. 149º e 150º do CPTA:

Legitimidade para recorrer

Nos termos do art. 141º do CPTA tem legitimidade para recorrer não só quem tenha
ficado vencido, mas também o Ministério público com fundamentos, na violação de disposições
ou princípios constitucionais ou legais. Assim, qualquer das partes nos processos impugnatórios
podem recorrer de uma sentença desfavorável.

As decisões que admitem recurso

De acordo com o art. 142º as decisões sobre o mérito da causa que os tribunais proferem
em primeiro grau de jurisdição, não são possíveis de recurso jurisdicional se o valor da causa a
que se reportam e a fixar segundo os critérios estabelecidos nos arts. 32º a 34º do CPTA por
suprir ao valor da alçada dos tribunais administrativos de círculo.

Recursos com efeito meramente devolutivo

Regra geral os recursos têm efeito suspensivo da decisão resolvida.


Os recursos interpostos de intimações para protecção de Direitos, Liberdades e
Garantias e de decisões respeitantes à adopção de providências cautelares, tem efeito meramente
devolutivo – art. 143º do CPTA e art. 693º do CPC.

O julgamento ampliado de recursos – art. 148º. Este artigo introduz a figura do


julgamento ampliado dos recursos em moldes idênticos àqueles que se encontram previstos para
o recurso de revistar. Repara-se que o art. 148º não tem apenas em vista os recursos de revista
do STA, mas também os recursos de apelação para os TCAs.
Embora vise promover a uniformidade de jurisprudência. O que está em causa é
permitir que a título preventivo que evite a multiplicação de decisões contraditórias. A iniciativa
pode partir das partes - art. 148, nº 2 e o acórdão que venha a ser proferido será publicado no
diário da república.

Recurso de apelação – art. 149º

Todas as decisões que dão provimento a recursos jurisdicionais não se limitam a


eliminar a decisão recorrida, mas julgam também o mérito da causa do mesmo acórdão. Isto
vale, fundamentalmente para o recurso de apelação previsto no art. 149º do CPTA e que é
interposto das decisões de primeira instância que tenham sido proferidas pelos TACs.

O recurso de revista para o STA está previsto no art. 150º e 151º do CPTA. Em
princípio das decisões que os TACs passam a proferir em sede de recurso de apelação, não cabe
recurso de revista para o STA, no entanto, o art. 150º admite a possibilidade de interposição de
um recurso de revista para o STA das decisões proferidas em segunda instância pelos TCAs.

Recurso para uniformização de jurisprudência – art.. 152º

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Este recurso é dirigido ao TA que se verifique ma contradição entre dois acórdãos do


TCA, entre um acórdão do TCA e outro do STA, ou dois acórdãos do STA. Estes acórdãos são
também publicados no diário da república – art. 152º, nº 4.

A revisão das sentenças transitadas em julgado

O art. 154º ao 156º prevêem a revisão de sentenças transitadas em julgado – art. 155º, o
qual remete a aplicação deste recurso, ou seja, sendo subsidiariamente aplicável o CPC.

PROCESSOS EXECUTIVOS

Considerações gerais

O CPTA regula a matéria dos processos executivos, nos arts. 157º a 179º do CPTA. São
instituídos três formas de processo:

O processo de execução para prestação de factos ou de coisas (art. 162º);


O processo para pagamento de quantia certa (art. 170º);
O processo de execução de sentenças de anulação de actos administrativos (art. 173º).

Processo de execução para prestação de factos ou de coisas:

A administração deve executar as sentenças dos tribunais administrativos que a


condenam à prestação de factos ou à entrega de coisas. Todas as entidades públicas estão
obrigadas a prestar a colaboração que lhes foi requerida, sob pena de crime de desobediência
(art. 167º, nº 4). No entanto, existem causas legítimas de inexecução, em caso de grave prejuízo
para o interesse público na execução das sentenças (art. 163º, nº 1).
O CPTA admite ainda a possibilidade de adopção de providências necessárias para a
execução das sentenças (art. 167º).

Processo para pagamento de quantia certa.

Este processo que vem regulado nos art. 170º e ss do CPTA começa pela dedução do
pedido, que no caso de a administração não ter dado cumprimento espontâneo, ao dever de
pagar uma quantia a que tinha sido condenada. O credor pode formular perante o tribunal
administrativo, que proferiu a sentença condenatória e no qual o credor pode solicitar a adopção
de providências de execução, tal como vem previsto no art. 170, nº 2, al. a) e b).

Aqui também o código admite a possibilidade de oposição à execução para pagamento


de quantia certa (art. 171º).

A primeira das providências consiste em decretar a compensação do crédito do


interessado com eventuais dívidas que a oneram para com a mesma pessoas colectiva (art. 170º,
nº 2, al. A).
A segunda das providências consiste em emitir uma ordem de pagamento por conta de
uma dotação orçamental que deve estar escrita à ordem do Conselho superior dos tribunais
administrativos e fiscais (art. 170º, nº 2, al b).
No caso de se avançar para esta segunda alternativa, mas o conselho superior se vir
impossibilitado de emitir a tal ordem de pagamento, o processo pode prosseguir se o exequente
o desejar, com vista a penhora e venda dos bens penhoráveis – art 172º, nº 8.

Processo de execução de sentenças de anulação de actos administrativos

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Este processo é um processo específico que visa a execução de anulação de actos, por
parte da administração que tem por obrigação de reconstituir a situação que existiria se o acto
não tivesse sido aplicado.
A administração tem o dever de praticar actos dotados de eficácia retroactiva que não
envolvam a imposição de deveres à aplicação de sanções ou a restituição de direitos legalmente
protegidos. Em suma, os deveres que a administração tem são o de reconstituir a situação que
existiria, de cumprir os deveres que não cumpriu, durante a vigência do acto ilegal e de
substituir eventualmente o acto ilegal sem evidentemente reincidir nas ilegalidades cometidas.
Ex: é o caso da recolocação ou reintegração de um funcionário na categoria, no lugar
equivalente aquele em ele deveria ter sido colocado, ou não sendo possível, a primeira vaga que
venha a surgir na categoria correspondente, cabendo-lhe exercer transitoriamente funções fora
do quadro até à integração neste quadro.

PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS

Conceito
Os “pressupostos processuais” são as condições de interposição do recurso, isto é, as
exigências que a lei faz para que o recurso possa ser admitido.
Importa não confundir condições de interposição, ou pressupostos processuais, com
condições de provimento:
- As condições de interposição, ou pressupostos processuais, são os requisitos que têm
de verificar-se para que o Tribunal possa entrar a conhecer do fundo da causa;
- As condições de provimento são aquelas que têm de verificar-se para que o Tribunal,
conhecendo do fundo da causa, possa dar razão ao recorrente.

Competência do Tribunal

O principal factor determinante da competência dos Tribunais Administrativos no âmbito


dos recursos contenciosos é a categoria do autor do acto recorrido. A natureza da questão
controvertida passou a constituir também factor relevante em 1996, tendo passado a existir um
Tribunal Central Administrativo que, no âmbito do recurso contencioso, possui competência
especializada em função da matéria, nas questões relativas ao funcionalismo público.
· Competência do Supremo Tribunal Administrativo (art. 26º/1-c ETAF);
· Competência do Tribunal Central Administrativo (art. 40º-b ETAF). Dos recursos de
actos administrativos ou em matéria administrativa praticados pelo Governo, seus
membros, Ministros da República e Provedor de Justiça, todos quando relativos ao
funcionalismo público, pelos órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas e seus
membros, pelo Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, pelos Chefes de
Estado-Maior dos três ramos das Forças Armadas, pelos órgãos colegiais de que algum
faça parte, com excepção do Conselho Superior de Defesa Nacional, bem como por
outros órgãos centrais independentes ou superiores do Estado de categoria mais elevada
que a de director-geral;
· Competência dos Tribunais Administrativos de círculo (art. 51º/1-a - d2):
a) Dos recursos de actos administrativos dos directores-gerais e de outras autoridades da
administração central, ainda que praticados por delegação de membros do Governo;

a') Dos recursos de actos administrativos de órgãos das Forças Armadas para cujo
conhecimento não sejam competentes o Supremo Tribunal Administrativo e o Tribunal Central
Administrativo;

a”) Dos recursos de actos administrativos de governadores civis e de


assembleias distritais;

b) Dos recursos de actos administrativos dos órgãos de serviços públicos dotados de


personalidade jurídica e autonomia administrativa;

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c) Dos recursos de actos administrativos dos órgãos da administração pública regional ou local e
das pessoas colectivas de utilidade pública administrativa;

d) Dos recursos de actos administrativos dos concessionários;

d1) Dos recursos de actos administrativos dos órgãos de associações públicas;

d2) Dos recursos de actos de que resultem conflitos de atribuições que envolvam órgãos
de pessoas colectivas públicas diferentes;

Determinação da competência territorial (art. 52º ETAF), o Tribunal Administrativo de


círculo territorialmente competente é o da residência habitual ou sede do recorrente.
Regime de incompetência do Tribunal (art. 4º LPTA), a circunstância de o pedido ser
dirigido ao Tribunal Administrativo incompetente não determina a perda do prazo de recurso e,
se a incompetência for apenas em razão do território, o processo é oficiosamente remetido ao
Tribunal competente.

Recorribilidade do Acto

Para que o Tribunal possa receber o recurso contencioso de anulação é necessário que o
acto impugnado seja um acto recorrível.
E para que um acto seja recorrível é necessário, que se trate de um acto administrativo
externo, definitivo e executório (art. 25º/1 LPTA será inconstitucional por superveniência do
art. 268º/4 CRP?).

Significa isto que não são recorríveis:


1) Os actos que não sejam actos administrativos;
2) Os actos administrativos internos;
3) Os actos administrativos não definitivos;
4) Os actos administrativos não executórios.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem admitido, a título excepcional, a


possibilidade de se interpor recurso contencioso destes actos, que embora juridicamente não
sejam executórios, de facto foram executados.
Após a revisão constitucional de 89, a supressão da referência a actos definitivos e
executórios no actual n.º 4 do art. 268º, abriu caminho a uma orientação doutrinária que, com
maior ou menor amplitude, admite que se possa recorrer de actos que não satisfaçam as
exigências de definitividade e executoriedade, desde que apresentem a característica da
lesividade (de direitos subjectivos ou interesses legítimos).
O DL 134/98 de 15 de Maio, permite o recurso contencioso de actos administrativos
relativos à formação da Administração Pública, que prescindindo de qualquer requisito de
definitividade e executoriedade, limitando-se a exigir que tais actos lesem direitos ou interesses
legalmente protegidos (art. 2º/1).

Os Actos Irrecorríveis.

Segundo o art. 4º /1 do ETAF:

1. Estão excluídos da jurisdição administrativa e fiscal os recursos e as acções que tenham


por objecto:

a) Actos praticados no exercício da função política e responsabilidade pelos danos


decorrentes desse exercício;
b) Normas legislativas e responsabilidade pelos danos decorrentes do exercício da função
legislativa;

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c) Actos em matéria administrativa dos Tribunais judiciais;


d) Actos relativos ao inquérito e instrução criminais e ao exercício da acção penal;
e) Qualificação de bens como pertencentes ao domínio público e actos de delimitação
destes com bens de outra natureza;
f) Questões de Direito Privado, ainda que qualquer das partes seja pessoa de Direito
Público;
g) Actos cuja apreciação pertença por lei à competência de outros Tribunais.

Este preceito legal representa afinal de contas, na linha tradicional do nosso Direito
Administrativo, a aplicação concreta dos seguintes princípios:

- Há recurso contencioso de todos os actos administrativos;


- Não há recurso contencioso de actos que não sejam administrativos (ressalva a
recorribilidade, expressamente ditada pelo ETAF, dos actos administrativos das
entidades referidas no art. 26º/1 alíneas b), c) e d))

Impugnação de Actos Administrativos Praticados sob a Forma Regulamentar e


Legislativa

Cabe recurso contencioso contra qualquer acto administrativo definitivo e executório ilegal,
mesmo que formalmente incluído numa lei, num decreto-lei ou num diploma regulamentar.

O Problema dos Actos Políticos ou de Governo

Os actos políticos ou de governo são outra categoria de actos irrecorríveis.


Desde sempre se considerou que há certos actos do poder executivo que, sendo embora
actos concretos e porventura ofensivos dos direitos individuais, não devem ser objecto de
recurso contencioso de anulação, ainda que ilegais.
Isto porque, os Tribunais Administrativos se destinam a apreciar o contencioso
administrativo, e este abrange os litígios emergentes do exercício da função administrativa – e
não as questões que surjam do exercício da função política.
O único critério possível, é o das funções do Estado, definidas por um critério material: são
actos políticas os actos praticados no desempenho da função política, tal como são actos
legislativos os praticados no desempenho da função legislativa, actos administrativos os
praticados no desempenho da função administrativa e, enfim, actos jurisdicionais os praticados
no desempenho da função jurisdicional.
Deste modo, o problema transfere-se para outro, que é o de saber como se define a função
política e em que é que ele se distingue, nomeadamente, da função administrativa.

Algumas categorias de actos políticos ou de governo:


a) Actos diplomáticos;
b) Actos de defesa nacional;
c) Actos de segurança do Estado;
d) Actos de dinâmica constitucional;
e) Actos de clemência.

Todos estes actos, são actos característicos da função política: como tais, merecem a
qualificação de actos políticos ou de governo e, nessa qualidade, são insusceptíveis de recurso
contencioso de anulação, ainda que porventura sejam ilegais.
Os actos administrativos podem ter consequências políticas, mas nem por isso se
transformam em actos políticos: só são actos políticos os que correspondem ao conceito de
função política.
É este o critério que deve considerar-se consagrado na lei portuguesa, nomeadamente no art.
4º/1-a do ETAF que considera irrecorríveis “os actos praticados no exercício da função
política”.

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O critério é pois, um critério objectivo e material: se o acto corresponde a função política é


um acto político, se corresponde a função administrativa é um acto administrativo.
O Estado de Direito exige que a categoria dos actos políticos seja reduzida ao mínimo – e,
nomeadamente, que não seja alargada para além dos limites específicos da função política.

Observações Complementares

Impugnação de um acto tácito: se o particular, por engano, dirige um requerimento a um


certo órgão da Administração, mas este está privado do exercício da sua competência porque a
delegou, o deferimento ou indeferimento tácito é imputado, para efeitos de recurso contencioso,
ao delegado, mesmo que este não tenha sido remetido inicialmente o requerimento (art. 33º
LPTA).
Isto significa que o erro de escolha da entidade a quem enviar o requerimento não obsta à
formação de acto tácito. O recurso contencioso deve nestes casos ser interposto contra o acto do
delegado, e não do delegante.
Acto expresso confirmativo de acto tácito: o acto expresso confirmativo de acto tácito é
contenciosamente impugnável, desde que o recorrente, que impugnou o acto tácito, requeira, no
prazo de um mês a contar da notificação ou publicação do acto expresso, que este último seja
acrescentado ao acto tácito (ampliação do objecto de recurso) ou tome o lugar do acto tácito
(substituição do objecto de recurso), art. 51º/1 LPTA.
Cumulação de recursos: o recorrente pode no mesmo recurso cumular a impugnação de
dois ou mais actos administrativos recorríveis, desde que eles se encontrem entre si numa
relação de dependência ou de conexão (art. 38º/1: o recorrente pode cumular a impugnação de
actos que estejam entre si numa relação de dependência ou de conexão LPTA). Esta regra
comporta algumas excepções (art. 38º/3: a cumulação e a coligação não são admissíveis:

a) Quando a competência para conhecer das impugnações pertença a Tribunais de


diferente categoria;
b) Quando a impugnação dos actos não esteja sujeita à mesma forma de processo).

Legitimidade das Partes

A “legitimidade das partes” é o pressuposto processual através do qual a lei selecciona os


sujeitos de direito admitidos a participar em cada processo levado a Tribunal.
Por remissão sucessiva dos arts. 5º do ETAF e 2º da LPTA, as regras relativas à
legitimidade processual continuam a constar basicamente dos arts. 46º do RSTA e 821º do
Código Administrativo.
A legitimidade processual é uma posição das partes em relação ao objecto do processo,
posição tal que justifica que elas possam ocupar-se em juízo desse objecto.
No recurso contencioso de anulação, há três espécies de legitimidade processual: a
legitimidade dos recorrentes, a legitimidade dos recorridos, e a legitimidade dos assistentes.
Comecemos pela legitimidade dos recorrentes. Há três tipos de recorrentes com
legitimidade para interpor o recurso contencioso de anulação: 1) os interessados; 2) o Ministério
Público; 3) os titulares da acção popular.

A Legitimidade dos Recorrentes: Os Interessados

Aquele em que um particular recorre de um acto administrativo inválido que o prejudica.


E quem é que se pode considerar interessado? É a lei que dá a resposta a esta pergunta, nos
arts. 46º do RSTA e 821º do CA.
Para ter legitimidade processual, o particular que queira recorrer de um acto administrativo
tem que demonstrar, por um lado, que é titular de um interesse na anulação desse acto, e por
outro, que esse interesse reúne as seguintes características: é um interesse directo, é pessoal, e é
legítimo.

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A pessoa pode dizer-se interessada quando espera obter da anulação desse acto um
benefício e se encontra em posição de o receber. Portanto, “interessado” é aquele que espera e
pode obter um benefício da anulação do acto.
O interesse diz-se “directo” quando o benefício resultante da anulação do acto recorrido
tiver repercussão imediata no interessado. Ficam, portanto, excluídos da legitimidade processual
aqueles que da anulação do acto recorrido viessem a retirar apenas um benefício mediato,
eventual, ou meramente possível.
O interesse diz-se “pessoal” quando a repercussão da anulação do acto recorrido se
projectar na própria esfera jurídica do interessado.
O interesse diz-se “legítimo” quando é protegido pela ordem jurídica como interesse do
recorrente.
A aceitação do acto recorrido (ou ilegitimação processual daqueles que aceitaram o acto):
para que o interesse subsista é, no entanto, ainda preciso que o interessado não tenha aceitado o
acto em causa, arts. 47º RSTA, 827º CA e 3º/1 DL 134/98.
Em consequência, quem aceitar o acto administrativo não tem legitimidade para recorrer
dele – o que aliás bem se compreende, porque a aceitação equivale à perda do interesse no
recurso.
Citação dos Contra-interessados: os contra-interessados, são aquelas pessoas titulares de
um interesse na manutenção do acto recorrido, oposto portanto ao do recorrente. São os demais
recorridos, a que se refere o art. 49º da LPTA, ou os interessados a quem o provimento do
recurso possa directamente prejudicar, referidos no art. 36º/1-b LPTA.
Coligação de recorrentes: podem coligar-se no mesmo recurso vários recorrentes quando
todos impugnem, com os mesmos fundamentos jurídicos, actos contidos num único despacho
ou noutra forma de decisão (art. 38º/2 LPTA). Esta regra conhece algumas excepções (art. 38º/3
LPTA).

A Acção Pública

Além dos interessados, isto é, dos titulares do interesse directo, pessoal e legítimo, pode
também interpor recurso contencioso o Ministério Público (arts. 219º/1 CRP; 69º ETAF; 27º
LPTA).
Existem agentes do Ministério Público junto dos Tribunais Administrativos – e esses
podem, se assim o entenderem, recorrer contenciosamente dos actos administrativos inválidos
de que tenham conhecimento.
Ao direito que ao Ministério Público assiste de recorrer de um acto administrativo chama-se
Acção Popular: portanto, o Ministério Público é titular do direito de acção popular.
Os arts. 821º/1 CA e 46º/2 RSTA, estabelecem as condições em que esse direito pode ser
exercido pelo Ministério Público: como e quando o entender, segundo o seu exclusivo critério,
quer tenha conhecimento pelos seus próprios meios da existência de um acto administrativo
inválido, quer esse conhecimento lhe tenha sido trazido por qualquer pessoa.
Para além desta possibilidade de que goza o Ministério Público, assiste-lhe ainda a
faculdade de prosseguir com o recurso contencioso se este, tendo sido interposto por um
particular interessado, estiver ameaçado de extinção pelo facto de o recorrente particular desistir
do recurso; o Ministério Público assume a posição de recorrente, art. 27º-e LPTA.

A Acção Popular

Finalmente, o recurso contencioso de anulação pode ser interposto pelos titulares do direito
de acção popular. A esta figura refere-se o art. 52º CRP. É no art. 822º do CA, que se ocupa da
acção popular no âmbito do contencioso local.
A Constituição, no art. 52º/3, apontou no sentido da reelaboração de um conceito de
legitimidade “altruísta”, com o alargamento do âmbito de aplicação da acção popular, por
forma a abranger as situações correspondentes à ideia de tutela de interesse difusos.
A Constituição foi objecto de concretização legislativa através do Capítulo III da Lei n.º
83/95 de 31 de Agosto.

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A acção popular passa, com esta lei, a abranger a acção popular civil e a acção popular
procedimental administrativa, podendo esta última servir-se da via do recurso contencioso ou da
via da acção administrativa (art. 12º/1).
A Acção Popular significa a possibilidade de qualquer cidadão, residente numa certa
circunscrição administrativa, ou contribuinte colectado nessa área, tem de impugnar
contenciosamente actos administrativos definitivos e executórios das autarquias locais ou de
outras entidades, arvorando-se, assim, em defensor do interesse público e da legalidade
administrativa.
Esta figura da acção popular tem bastante interesse do ponto de vista do Estado de Direito,
na medida em que, por um lado, atribui a todos os membros de um certa autarquia local, desde
que recenseados ou contribuintes, o direito de fiscalizarem a legalidade administrativa,
independentemente de estarem ou não interessados no caso, e na medida em que, por outro lado,
permite a esses mesmos cidadãos recorrer contenciosamente, nessa qualidade, sempre que
possam demonstrar a titularidade de um interesse directo, pessoal e legítimo.
Há no entanto uma prevenção a fazer: não se deve confundir esta acção popular – que se
chama, em linguagem técnica, Acção Popular Correctiva, uma vez que visa corrigir os efeitos
de um acto ilegal da Administração – com uma outra modalidade de acção popular, chamada
Acção Popular Supletiva.
A situação aqui é bastante diferente daquela que está pressuposta na primeira figura da
acção popular.
Com efeito, na Acção Popular Correctiva, a situação é a seguinte: um órgão da
Administração pratica um acto administrativo inválido, e o particular vai recorrer
contenciosamente desse acto administrativo para obter, através do recurso, a reintegração da
ordem jurídica violada.
Diferentemente, na Acção Popular Supletiva, a situação é a seguinte: a autarquia local é
titular de certos direitos civis, designadamente, direitos de propriedade ou posse sobre certos
bens; um terceiro violou esses direitos, por exemplo apossando-se de bens que são património
autárquico; há um cidadão, residente no território dessa autarquia, que dando-se conta disso,
alerta os órgãos autárquicos para essa situação, mas porque, estes nada fazem, o particular,
arvorando-se em defensor dos interesses da autarquia, propõe uma acção civil para fazer valer
os direitos dela contra o terceiro que os violou.
Neste caso, estamos fora do contencioso administrativo: só a primeira figura da acção
popular, isto é, a acção popular correctiva, é uma figura própria do contencioso administrativo.

A Legitimidade dos Recorridos

Quanto ao recorrido público, ou autoridade recorrida, não há nada de especial a assinalar:


tem legitimidade, a esse título, o órgão da Administração Pública que tiver praticado o acto
administrativo de que se recorre.
Quanto aos recorridos particulares, ou contra-interessados, a lei define quem são ou quais
entre eles têm legitimidade. Segundo o art. 36º/1-b, são aqueles “a quem o provimento do
recurso possa directamente prejudicar” (LPTA). Quer dizer: os contra-interessados, são os
particulares que ficaram directamente prejudicados se o recurso tiver provimento e, portanto, se
o acto recorrido for anulado.

A Legitimidade dos Assistentes

Finalmente, e pelo que respeita à legalidade dos assistentes, a matéria vem regulada no art.
49º RSTA, onde se estabelece que, uma vez tomada a iniciativa de interpor recurso contencioso
por quem tenha para tanto interesse directo, pessoal e legítimo, podem outras pessoas “vir em
auxílio do recorrente ou de algum dos recorridos”, para reforçar a posição processual destes,
ajudando-os a triunfar.
O requisito da legitimidade é, neste caso, o de que o assistente tenha um interesse legítimo
no triunfo da parte principal que quer coadjuvar; esse interesse deverá ser idêntico ao da parte
assistida, ou pelo menos com ele conexo.

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A posição do assistente no recurso é a de parte acessória, auxiliar e subordinada.

Oportunidade do Recurso. Prazos

Trata-se de um pressuposto processual exclusivo dos actos anuláveis, uma vez que os actos
nulos podem ser impugnados a todo tempo (art. 134º/2 CPA).
A regra geral no nosso Direito é a de que o recurso contencioso de anulação tem de ser
interposto dentro de um certo prazo, sem o que será rejeitado por extemporâneo ou inoportuno.
Há, todavia casos excepcionais em que o recurso contencioso pode ser interposto
independentemente de prazo.
O recurso contencioso normalmente, tem por objecto um acto administrativo anulável, e a
anulabilidade tem de ser invocada perante o Tribunal competente dentro de um certo prazo, sob
pena de se produzir a sanação do acto e, portanto, a eliminação da invalidade.
A matéria vem regulada no art. 28º/1 LPTA. Temos pois, que o prazo geral para o recurso
contencioso de anulação interposto contra actos expressos por particulares residentes em
Portugal é de dois meses.
Além desta regra geral existem três regras especiais: se o recorrente residir em Macau ou no
estrangeiro, o prazo é de quatro meses; se o recorrente não for um particular mas o Ministério
Público, o prazo é de um ano; e se o acto recorrido não for um acto expresso mas um
indeferimento tácito, o prazo é de um ano.
A título excepcional, existem casos em que o recurso contencioso pode ser interposto a todo
o tempo, isto é, sem competência de prazo.
Esses casos são aqueles em que o recurso tenha por objecto actos administrativos nulos ou
inexistentes, precisamente porque a nulidade e a inexistência podem ser declaradas a todo o
tempo.
Desde quando se começam a contar os prazos para o recurso contencioso?
Para o caso de o acto recorrido ser um acto expresso, responde-nos o art. 29º LPTA.
Registe-se que, em relação aos actos sujeitos a publicação ou a notificação, se antes destas
ocorrerem for iniciada a execução do acto, o particular pode, se quiser, interpor recurso antes da
publicação ou notificação do acto (art. 29º/2 LPTA): como se trata, porém de uma faculdade, o
interessado também pode, se o preferir, esperar pela publicação ou notificação.
Quanto aos actos tácitos, o prazo para recorrer deles conta-se obviamente a partir do dia
seguinte àquele em que terminar o prazo de produção do acto tácito.

O art. 30º da LPTA, enuncia os requisitos da publicação ou notificação suficiente, que são
os seguintes:
a) Autor do acto;
b) No caso de delegação ou subdelegação de poderes, em que qualidade o autor decidiu,
e qual ou quais os actos de delegação ao abrigo dos quais decidiu;
c) A data da decisão;
d) O sentido da decisão e os respectivos fundamentos, ainda que por extracto.

No caso de a publicação ou notificação serem insuficientes – que por falta dos elementos
referidos acima, quer por não contarem a “fundamentação integral” da decisão –, pode o
interessado (no prazo de um mês a contar da notificação insuficiente) requerer ao autor do acto
a notificação dos elementos que tenham sido omitidos, ou a passagem de certidão que os
contenha (art. 31º/1 LPTA).
Se o interessado usar desta faculdade, o prazo para o recurso contencioso só começará a
correr a partir da data desta última notificação, ou da entrega da certidão requerida (art. 31º/2
LPTA).
Sob o ponto de vista da sua natureza, há dois tipos de prazos: os prazos substantivos e os
prazos processuais.
Os prazos substantivos, contam-se nos termos do art. 279º do CC, e incluem os Sábados,
Domingos e feriados.

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Os prazos processuais, contam-se nos termos do art. 144º do CPC, e excluem os Sábados,
Domingos e feriados.

A TRAMITAÇÃO DOS PROCESSOS ADMINISTRATIVOS

A tramitação da acção administrativa comum

A acção administrativa comum segue, o processo de declaração do Código do Processo


Civil, com algumas, poucas, especificidades.

Momentos fundamentais da marcha do processo de declaração ordinário (artigos 467º e ss


do CPC), que é aplicável, quando o valor da causa exceder a alçada dos TCA:

a) Pagamento prévio da taxa de justiça inicial (artigo 467º, nº 3);


b) Petição inicial (artigo 467º);
c) Contestação (artigo 486º);
d) Réplica e tréplica (artigo 502º);
e) Articulados supervenientes (artigo 506º);
f) Audiência preliminar e saneador (artigo 508º a 512º-A);
g) Instrução do processo (artigo 513º a 645º);
h) Discussão e julgamento da causa (artigo 646º ss);
i) Sentença (artigo 658º e ss).

O processo de declaração sumário está regulado nos artigos 783º e seguintes e o processo de
declaração sumaríssimo nos artigos 793º e seguintes, todos do CPC – as diferenças
fundamentais consistem na dispensa de alguns trâmites, na fixação de prazos mais curtos e no
carácter oral de toda a audiência de discussão e julgamento.

PRINCÍPIOS RELATIVOS À PROMOÇÃO OU INICIATIVA PROCESSUAL

Princípio da necessidade do pedido:

Este princípio decorre de uma característica estrutural-funcional do poder judicial,


enquanto poder do Estado – os tribunais são órgãos indiferentes, imparciais e inoficiosos
quando dirimem um litígio.
Assim, o tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a acção pressupõe sem
que a resolução lhe seja pedida por uma das partes.

Princípio da promoção alternativa, particular ou pública:

No processo administrativo, a iniciativa cabe normalmente aos particulares, interessados


na proposição das acções destinadas a salvaguardar e a promover os seus direitos e interesses
(princípio do dispositivo).
Contudo a esta iniciativa particular soma-se a iniciativa popular. Seja individual, seja
colectiva, para defesa de determinados valores, bens ou interesses comunitários, bem como, no
que respeita aos processos mais típicos (as acções administrativas especiais), o poder geral de
iniciativa do Ministério público, na sua veste de magistratura encarregada da defesa da
legalidade administrativa (princípio da oficialidade).
A iniciativa dos processos pode pertencer ainda às entidades e aos órgãos
administrativos, que podem surgir nos processos na qualidade de autores, quer para defesa dos
direitos e interesses que lhes cumpra defender quer como autoridades fiscalizadoras da
legalidade.

PRINCÍPIOS RELATIVOS AO ÂMBITO DO PROCESSO (ou à determinação do thema


decidendum et respondendum)

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Princípio da resolução global da situação litigiosa

Uma das preocupações normativas do processo administrativo reformado é a de, na


perspectiva de uma tutela judicial plena, permitir que sejam considerados no mesmo processo
todos os aspectos de uma citação litigiosa, mesmo que complexa, a fim de assegurar uma
decisão que satisfaça inteiramente os interesses das partes. Essa preocupação relativa ao âmbito
do processo poderá ser formulada como um princípio, ou vários afloramentos normativos.
Nesta linha se inscreve, por exemplo, a amplitude com que é admitida a cumulação de pedidos –
não só originária, mas também sucessiva, através da modificação objectiva da instância –
mesmo quando lhes correspondam diferentes formas de processo e devam ser dirigidos a
tribunais diversos ou da franqueza com que é ordenada a apensação de processos.
Também o conhecimento oficioso dos vícios no âmbito dos processos de impugnação de actos
administrativos, para além de constituir uma excepção à limitação do juiz pelo pedido, se
justificará como tentativa de resolver de uma vez a questão sobre a legalidade do acto.

Princípio da vinculação do juiz ao pedido (princípio da congruência ou da


correspondência entre a decisão e o pedido)

Este princípio clássico, que decorre, da neutralidade judicial, pretende assegurar a


correspondência entre o pedido e a decisão que vai ser tomada, num duplo sentido: o tribunal
não pode apreciar ou decidir no processo senão aquilo que lhe é solicitado pelas partes,
devendo, por outro lado, apreciar todas as questões pertinentes que as partes submetam à sua
apreciação.

Princípio da limitação do juiz pela causa de pedir (princípio da substancialização)

Afirma-se agora a limitação do juiz pela causa de pedir, de modo que o tribunal só
possa basear a sua decisão em factos invocados no processo como fundamentos concretos do
efeito jurídico pretendido (factos principais).

Princípio da estabilidade objectiva da instância

É uma manifestação tradicional do princípio do dispositivo, segundo o qual o pedido e a


causa de pedir – que, juntamente com o objecto, delimitam a instância – são, em regra,
determinados no início do processo, designadamente na petição inicial, mantendo-se a partir do
despacho liminar de aceitação até à decisão final.
Este princípio, contudo, tal como não é um princípio absoluto no processo civil,
também não vale inteiramente no processo administrativo, sofrendo limitações importantes,
designadamente nos processos que seguem a forma da acção administrativa especial.

PRINCÍPIOS RELATIVOS À PROSSECUÇÃO PROCESSUAL (decurso, condução e


extinção do processo)

Princípio da tipicidade, da compatibilidade processual e da adequação formal da


tramitação

O princípio da tipicidade dos trâmites processuais constitui uma manifestação do


princípio da tipicidade das formas processuais, impondo que os trâmites e a respectiva
sequência sejam fixados por lei, diferentemente do que é característico do procedimento
administrativo, em regra mais flexível.

Princípio do dispositivo ou da auto-responsabilidade das partes

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Este princípio determina, no que respeita à condução do processo, que compete às


partes interessadas a dinamização do processo.
O princípio está sujeito, porém, a limitações e compressões diversas, designadamente
nos processos impugnatórios que integram a acção administrativa especial.

Princípio da igualdade das partes, da cooperação e da boa fé processual

A lei, para além de regular o processo administrativo em termos de um processo de


partes, determina, como princípio, que o tribunal assegure um estatuto de igualdade efectiva das
partes no processo, tanto no que se refere ao exercício de faculdades e meios de defesa, como no
plano da aplicação de cominações ou de sanções processuais, designadamente por litigância de
má fé (artigo 6º).

Princípio da audiência e do contraditório

O princípio do contraditório impõe, em geral, que seja dada oportunidade de


intervenção efectiva a todos os participantes no processo, com a finalidade de permitir ao juiz
uma decisão imparcial e fundada, atendendo às razões de ambas as partes litigantes.

Princípio da devolução facultativa ou da suficiência discricionária

Nos processos administrativos, o juiz, em face de uma questão prejudicial que seja da
competência de um tribunal de outra jurisdição, pode escolher livremente entre sobrestar na
decisão até que o tribunal competente se pronuncie, ou então decidir a questão com base nos
elementos de prova admissíveis e com efeitos restritos àquele processo.

Princípio do favorecimento do processo (ou princípio pro actione)

Trata-se de um corolário normativo ou de uma concretização do princípio constitucional


do acesso efectivo à justiça, que aponta para uma interpretação e aplicação das normas
processuais no sentido de favorecer o acesso ao tribunal o8 de evitar as situações de denegação
de justiça, designadamente por excessivo formalismo.

Princípio da economia e da celeridade processual

Segundo o princípio da economia processual, entendido no seu sentido mais amplo, o


processo há-se ser, tanto quanto possível, em função do seu objectivo, eficiente e célere,
devendo evitar-se trâmites desnecessários ou excessivamente complicados, comportamentos
dilatórios e decisões inúteis.

PRINCÍPIOS RELATIVOS À PROVA (ou à instrução)

Princípio da investigação (do inquisitório ou da verdade material)

O princípio vale logo na aquisição dos factos necessários para a decisão, de modo que –
ao contrário do que acontece num modelo processual caracterizados pelo princípio da discussão,
da contradição ou da verdade formal – os fundamentos da decisão do juiz não tem de se limitar
aos factos carreados pelas partes.

Princípio da universalidade dos meios de prova

A partir da reforma, o princípio da verdade material só sofre no processo administrativo


a limitação dos meios de prova decorrentes das proibições de prova determinadas por normas
constitucionais, designadamente pelas relativas aos direitos, liberdades e garantias.

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Princípio da aquisição processual

Trata-se de uma decorrência normal do princípio da verdade material, em cujos termos


o tribunal deve tomar em consideração todas as provas produzidas, de modo que as emanadas
de uma das partes podem aproveitar à parte contrária, sendo os factos considerados adquiridos
para o processo, mesmo que operem as consequências desfavoráveis para quem os alegou
(artigo 515º do CPC).

Princípio da livre apreciação das provas

É o princípio fundamental em matéria de prova e estabelece que o que torna provado


um facto é a íntima conexão do juiz, formada de acordo com as suas experiências da vida, e não
a aplicação de tábuas de valores pré-fixadas na lei.

Princípio da repartição do ónus da prova objectivo (“material” ou “de averiguação”)

Das considerações precedentes – isto é, dos princípios do inquisitório e da livre


apreciação da provas – já se conclui que não vale no processo administrativo um ónus da prova
subjectivo, formal ou de produção, pelo menos no seu sentido mais rigoroso, que implicaria que
o juiz só pudesse considerar os factos alegados e provados por cada uma das partes interessadas.
Mas há sempre um ónus da prova objectivo, na medida em que se pressupõe uma repartição
adequada dos encargos de alegação, de modo a repartir os riscos da falta de prova – a decisão
há-de naturalmente desfavorecer quem não veja provados os factos em que assenta a posição
por si sustentada no processo.

PRINCÍPIOS RELATIVOS À FORMA PROCESSUAL

Princípio da forma escrita e princípio da oralidade

Tradicionalmente, o processo administrativo organiza-se através de peças escritas, não


valendo aqui os princípios da imediação e da oralidade, típicos dos outros processos,
concretizados designadamente na audiência de discussão e julgamento.
A situação altera-se agora, desde logo no que respeita à acção administrativa comum,
que segue a tramitação do CPC, de modo que há lugar a audiência de discussão e julgamento,
que é oral, quer relativamente aos aspectos de facto, quer relativamente aos aspectos jurídicos
da causa.

Princípio da publicidade das decisões

Além da notificação às partes, estão sujeitas a publicação no Diário da República, as


sentenças que declarem a ilegalidade de normas com força obrigatória geral ou concedam
provimento à impugnação de actos aí publicados (artigo 30º, nºs 7 e 8).
A generalidade dos acórdãos dos tribunais superiores estão sujeitos a uma publicidade
especial, seja a publicação em apêndice ao Diário da República, seja a divulgação informática
em bases de dados.

Princípio da fundamentação obrigatória das sentenças

As sentenças administrativas também carecem de fundamentação, que há-se discriminar


as razões de facto e de direito da decisão, isto é, os factos provados e a indicação, interpretação
e aplicação das normas jurídicas correspondentes 8artigos 94º do CPTA, 158º CPC e 205º, nº 1
da CRP).

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OS EFEITOS DAS SENTENÇAS ADMINISTRATIVAS

A Sentença no Recurso Contencioso de Anulação


A sentença é o acto final do processo.
O recurso contencioso é um verdadeiro processo de natureza jurisdicional, através do qual o
Tribunal exerce a função jurisdicional do Estado e, por isso, culmina no acto jurisdicional
típico, que é a sentença.
Se o Tribunal conclui que o recorrente não tem razão, nega o provimento ao recurso.
Se o Tribunal entende o contrário, isto é, que o recorrente tem razão, concede provimento
ao recurso. E das duas uma:
- Ou o acto recorrido é anulável, e o Tribunal anula-o;
- Ou o acto recorrido é nulo ou inexistente, e o Tribunal declara a sua nulidade ou
inexistência.
A sentença anulatória tem a natureza jurídica de uma sentença constitutiva; a sentença que
declara a nulidade ou a inexistência tem a natureza jurídica de uma sentença meramente
declarativa.

Os Efeitos da Sentença: Efeitos processuais, o Caso Julgado

Os efeitos processuais, definem-se precisamente nos termos em que são definidos em


processo civil. Dentre os efeitos processuais, o mais importante é o caso julgado ou efeito de
caso julgado.
“Caso julgado” é a autoridade especial que a sentença adquire quando já não é susceptível
de recurso ordinário. A sentença transitada em julgado é como se fosse verdade: res judicata
pro veritate habetur.

As principais características do caso julgado, são sete:

a) Imodificabilidade: uma sentença que constitui caso julgado não pode ser alterada por
modificação do critério do juiz;
b) Irrepetibilidade não se pode propor uma nova causa sobre o mesmo assunto;
c) Imunidade: o caso julgado é imune às modificações impostas por lei, ainda que
retroactiva (art. 282º/3 CRP);
d) Superioridade: se houver duas ou mais decisões de autoridade em conflito, prevalece
aquela que revestir força de caso julgado (art. 205º/2 CRP);
e) Obrigatoriedade: o que tiver sido decidido por sentença com força de caso julgado é
obrigatório para todas as autoridades púbicas e privadas, e deve ser respeitado (art. 205º/
2 CRP);
f) Executoriedade: se o conteúdo da sentença for exequível, o que nela se tiver decidido
deve ser executado, sob pena de sanções contra os responsáveis pela inexecução (art.
210º/3 CRP);
g) Invocabilidade: o caso julgado pode ser invocado a favor de todos aqueles que dele
beneficiem e contra todos aqueles a quem seja oponível.

De entre os vários problemas que se suscitam acerca da eficácia objectiva do caso julgado,
dois há que merecem referência especial.
Em primeiro lugar, “o que constitui caso julgado é a decisão e não os motivos ou
fundamentos dela”. Porque a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em
que julga (art. 673º - Alcance do caso julgado CPC:
A sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga: se a parte
decaiu por não estar verificada uma condição, por não ter decorrido um prazo ou por não ter
sido praticado determinado facto, a sentença não obsta a que o pedido se renove quando a
condição se verifique, o prazo se preencha ou o facto se pratique).

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Em segundo lugar, a imutabilidade da decisão só abrange a causa de pedir invocada e


conhecida pelo Tribunal.
Em relação a que pessoas é que a sentença tem autoridade de caso julgado (eficácia
subjectiva)?

Esta questão tem duas respostas possíveis:

a) O caso julgado só tem eficácia em relação às pessoas que participaram no processo


como partes: é a solução da eficácia “inter partes”;
b) O caso julgado tem eficácia não apenas entre as partes mas em relação a todas as
pessoas que possam ser beneficiadas ou prejudicadas com a decisão jurisdicional: é a
solução da eficácia “erga omnes”.

Efeitos Substantivos

Os efeitos substantivos, variam naturalmente conforme o tipo de sentença.


Se a sentença nega o provimento ao recurso, o seu efeito é o de confirmar a validade do acto
administrativo recorrido. É aquilo a que se pode chamar o efeito confirmativo.
Se a sentença concede provimento ao recurso, de duas uma:
- Ou declara a nulidade do acto e estamos perante o efeito declarativo;
- Ou anula o acto e produz o chamado efeito anulatório, que consiste na eliminação
retroactiva do acto administrativo. Isto é, os efeitos da sentença retroagem ao momento
da prática do acto administrativo;
- Juntamente com o efeito declarativo ou anulatório, produz-se ainda um outro efeito da
maior importância: o efeito executório: da sentença que conceda provimento ao recurso
resulta, nos termos da lei, para a Administração activa, o dever de extrair todas as
consequências jurídicas da anulação ou declaração de nulidade ou de inexistência
decretada pelo Tribunal ou, por outras palavras, o dever jurídico de executar a sentença
do Tribunal Administrativo.

O Dever de Executar

O DL n.º 256-A/77, de 17 de Junho, cujos arts. 5º a 12º regulam minuciosamente esta


matéria.
O problema da execução da execução das sentenças dos Tribunais Administrativos, num
sistema como o nosso, que é um sistema de administração executiva ou de tipo francês, e
sobretudo pelo que toca à execução das sentenças anulatórias em recurso de anulação, é difícil e
complexo, e da sua boa ou má solução depende a existência ou inexistência do Estado de
Direito.

É um problema difícil e complexo por duas ordens de razões:

- O contencioso administrativo está organizado neste tipo de sistema como um


contencioso de anulação, ou seja, como um contencioso que se limita a anular os actos
ilegais, sem que o Tribunal deva ou possa extrair dessa anulação qualquer consequência.
O Tribunal, no caso de considerar o acto ilegal ou inválido, limita-se a anular o acto.
- É a Administração, que perdeu o recurso, quem vai ter de, com boa fé e boa vontade,
executar uma sentença contra si própria.
Aqui transparecem as dificuldades deste problema:
- Dificuldade jurídica: que consiste em apurar quais são as consequências jurídicas da
execução de uma sentença de anulação de um acto administrativo;
- Dificuldade prática: que consiste em não poder usar da força pública contra o poder
executivo, a Administração.

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O problema da execução das sentenças dos Tribunais Administrativos desdobra-se em cinco


aspectos fundamentais:

1) A quem compete executar as sentenças dos Tribunais Administrativos;


2) Qual o conteúdo do dever de executar;
3) Em que casos é legítimo a inexecução;
4) De que garantias dispõem os particulares contra a inexecução ilícita;
5) Como assegurar a plena eficácia destas garantias.

Titularidade do Dever de Executar

O dever de executar compete à Administração activa, ao poder executivo. A este dever de


executar corresponde, do lado do particular que obteve vencimento no recurso contencioso de
anulação, um Direito Subjectivo, que é o direito à execução. O particular tem o direito de exigir
à Administração Pública a execução da sentença proferida a seu favor. O particular é, aqui,
titular de um Direito Subjectivo, e não de um simples interesse legítimo.
Do preceituado no art. 5º/1 e 2 DL 256-A/77 resulta que a regra geral e a de que o dever de
executar recai sobre o órgão que tiver praticado o acto anulado.
Este dever de executar nasce para Administração Pública no momento do trânsito em
julgado da sentença. A lei ordena ao órgão ou órgãos competentes que cumpram
espontaneamente esse dever no prazo de trinta dias a contar do trânsito em julgado da sentença
(art. 5º/1 DL 256-A/77).
Quando a lei diz que esses órgãos devem cumprir a sentença espontaneamente isto significa
que eles têm o dever de a cumprir mesmo que o particular não requeira esse cumprimento.
Pode, contudo, acontecer que a Administração não cumpra espontaneamente o dever de
executar a sentença. Neste caso, o particular interessado, aquele que obteve o vencimento no
recurso, pode requerer ao órgão competente que execute a sentença, e dispõe de um prazo
bastante longo para o fazer: três anos a contar do trânsito em julgado da sentença (art. 96º/1
LPTA). E a partir do momento em que fizer, a Administração tem 60 dias para cumprir
integralmente a sentença, salvo se entender que está dispensada de o fazer por causa legítima de
inexecução (art. 6º/1 DL 256-A/77).

Conteúdo do Dever de Executar

O dever de executar consiste no dever de extrair todas as consequências jurídicas da


anulação decretada pelo Tribunal. É um dever que se traduz para a Administração activa na
obrigação de praticar todos os actos jurídicos e todas as operações materiais que sejam
necessárias à reintegração da ordem jurídica violada.
Em que consiste essa reintegração da ordem jurídica violada?

A este respeito, existem duas concepções:

1) A Concepção tradicional: a reintegração da ordem jurídica violada consistiria no dever


de repor o particular na situação anterior à prática do acto ilegal.
2) A concepção mais recente: a reintegração da ordem jurídica violada tem de traduzir-
se, não no dever legal de repor o particular na situação anterior à prática do acto ilegal,
mas sim no dever de reconstituir a situação que actualmente existiria se o acto ilegal não
tivesse sido praticado. É o que se chama a reconstituição da situação actual hipotética.

A reintegração da ordem jurídica violada consiste, não na reconstituição da situação


anterior à prática do acto ilegal, mas sim na reconstituição da situação actual hipotética.

O conteúdo da execução de uma sentença anulatória se consubstancia sempre em três


aspectos:

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1. A substituição do acto anulado por outro que seja válido, sobre o mesmo assunto;
2. A supressão dos efeitos do acto anulado, sejam eles positivos ou negativos;
3. A eliminação dos actos consequentes do acto anulado.

Actos consequentes são os actos praticados ou dotados de certo conteúdo em virtude da


prática de um acto administrativo anterior.
Os actos consequentes são nulos por efeito automático da anulação do acto-base. Uma vez
anulado um determinado acto administrativo, automaticamente caducam todos os actos dele
consequentes. Quer dizer, o particular que obteve a anulação do acto-base não necessita de
interpor recurso contencioso de todos os actos consequentes, uma vez que eles caducam
automaticamente por força da lei.

Causas Legítimas de Inexecução

O dever de executar uma sentença anulatória cessa quando se esteja perante uma causa
legítima de inexecução.
As causas legítimas de inexecução, são situações excepcionais que tornam lícita a
inexecução de uma sentença, obrigando, no entanto, a Administração a pagar uma indemnização
compensatória ao titular do direito à execução.
O art. 6º/2 do DL 256-A/77, diz o seguinte: “Só constituem causa legítima de inexecução a
impossibilidade e o grave prejuízo para o interesse público no cumprimento da sentença”.

Temos, portanto, dois casos em que a Administração Pública pode legitimamente não
executar uma sentença anulatória de um acto ilegal:

a) A situação em que se verifica que o cumprimento da sentença é impossível;


b) A situação em que se verifica que do cumprimento da sentença decorreria um grave
prejuízo para o interesse público.

A primeira das situações referidas justifica-se por razões óbvias: se a execução é


impossível, obviamente não se pode executar a sentença. Como diziam os romanos, “ad
impossibilia nemo tenetur” – ninguém é obrigado a fazer aquilo que é impossível.
A segunda excepção é ditada por razões pragmáticas e de bom senso. Há casos em que a
Administração Pública não deve executar uma sentença por mais que isso corresponda
logicamente a uma exigência do princípio da legalidade.
Em determinadas situações melindrosas é necessário, por razões pragmáticas, deixar aberta
uma porta para a inexecução de certas sentenças, embora com a obrigação de indemnizar o
lesado.
Deve-se notar que o DL 256-A/77 estabelece no art. 6º/5, que quando a execução da
sentença consiste no pagamento de quantia certa não é invocável causa legítima de inexecução.
Nos termos do art. 7º do mesmo diploma, se o particular não concordar com a invocação
feita pela Administração de que existe uma causa legítima de inexecução, pode dirigir-se ao
Tribunal competente pedindo que aprecie o caso e declare a inexecução. Se o particular
concordar com a invocação feita pela Administração de que existe causa legítima de
inexecução, pode requerer ao Tribunal Administrativo competente para que lhe fixe a
indemnização a que tem direito por não executar a sentença.
O prazo para pedir ao Tribunal a declaração de inexistência de causa legítimas de
inexecução, ou para pedir a fixação da indemnização, é de dois meses ou de um ano, conforme a
Administração invoque ou não causa legítima de inexecução (art. 96º/2 LPTA).

Garantias Contra a Inexecução Ilícita

Para que se verifique a inexecução ilícita de uma sentença, é necessário:

a) Que a Administração Pública não cumpra, não execute a sentença;

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b) Que não exista, naquele caso, nenhuma causa legítima de inexecução.

Está-se, portanto, perante uma inexecução ilícita. Neste caso, as garantias que a ordem
jurídica pode pôr ao serviço do particular são os três tipos, embora no nosso Direito só duas
delas estejam consagradas:

a) O poder jurisdicional de substituição:

O poder que a lei dá ao Tribunal de se substituir à Administração Pública e de praticar, ele,


os actos devidos pela Administração.
No nosso Direito, este poder de substituição não existe, e não existe porque o nosso sistema
administrativo é um sistema de administração executiva ou de tipo francês, em que os Tribunais
não podem substituir-se à Administração praticando os actos da competência desta.
Em todo o caso, há que chamar a atenção para o art. 9º/4 DL 256-A/77.
Por conseguinte, o Tribunal, embora não possa substituir-se à Administração activa, pode
ordenar às autoridades que tenham poder hierárquico ou tutelar sobre o órgão competente, que
exerçam os seus próprios poderes de substituição.

b) Em segundo lugar, vem o chamado poder jurisdicional de declaração dos actos


efectivos:

É o poder que consiste em o Tribunal fixar quais os actos que a Administração Pública fica
obrigada a praticar em cumprimento da sentença.
A lei dá ao Tribunal o poder de declarar por sentença os actos devidos, para que a
Administração Pública não possa alegar mais dúvidas. É o que se passa nos casos previstos no
art. 9º/2 DL 256-A/77.

c) A terceira garantia dos particulares é a responsabilidade disciplinar, civil e penal


dos órgãos ou agentes da Administração sobre quem recai o dever de executar:

Se eles persistem em não executar uma sentença que têm o dever de executar, ficam
pessoalmente responsáveis, tanto do ponto de vista disciplinar, como civil e penal.

Eficácia das Garantias

Em última análise, se a Administração Pública teimosamente se colocar na posição de não


cumprir a sentença, mantendo a situação de inexecução ilícita, só há uma saída para isto:
justamente porque a Administração Pública é a detentora da força e “não se pode usar o
machado de guerra contra quem o traz à cintura”, só há uma solução possível, que é aquela
que existe também do Direito das Obrigações quando não se cumpre uma obrigação que seja
insusceptível de execução específica – a responsabilidade civil, isto é, o pagamento de uma
indemnização.
O DL 256-A/77, veio determinar no seu art. 6º/5 o seguinte:
“ Quando a execução da sentença consistir no pagamento de quantia certa, não é invocável
causa legítima de inexecução”.
Não há, pois, para a Administração, o direito de não pagar indemnizações a que seja
condenada pelos Tribunais – e, nomeadamente, indemnizações devidas em consequência da
inexecução ilícita das sentenças dos Tribunais Administrativos.

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