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ATERRAMENTO DE TORRES DE TELECOMUNICAÇÃO

JOSÉ OSVALDO SALDANHA PAULINO-EEUFMG

OUTUBRO 1993
SUMÁRIO

Introdução
1-A descarga atmosférica
2-A torre e a descarga
2.1-Tensões induzidas por descargas laterais
2.2-Descargas diretas
3-A malha de aterramento
3.1-O valor da resistência
3.2-O desenho da malha - equipotenciais
3.3-Tratamento químico
3.4-O material da malha
4-O pára-raios
5-O cabo de descida
6-A proteção do equipamento
6.1-A blindagem eletromagnética
6.2-Os protetores
6.3-O arranjo da fiação
7-A proteção do cabo de áudio
8-Proposta de critérios para projeto de malhas
8.1-Estatística de valores de resistividade do solo em Minas Gerais
8.2-O valor da resistência da malha de aterramento
8.3-Malha de aterramento proposta
9-Aterramento do protetor do telefone

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Introdução

A utilização de torres em altos de morros com o objetivo de propiciar meios para

telecomunicações é uma prática usual e que tende a aumentar. Hoje são utilizadas torres

para microondas, para telefonia celular, para rádios monocanal, etc.

Devido a sua localização elevada geralmente tais torres são bastante expostas aos efeitos

das descargas atmosféricas, sejam descargas que caem diretamente na torre, quanto

descargas que caem nas proximidades.

Para se minimizar os efeitos destas descargas é usual se projetar e instalar uma boa

malha de aterramento na base da torre na tentativa de se propiciar um caminho preferencial

para as correntes de descarga atmosférica e assim garantir uma proteção eficaz para os

equipamentos e para o pessoal que transita no local.

A definição de uma boa malha de aterramento é feita geralmente a partir do valor da

resistência da malha medida em baixa frequencia. A maioria das companhias brasileiras

considera que se a malha tiver um valor de resistência abaixo de um valor normalizado a

malha está boa.

Tentaremos mostrar neste estudo que tal critério não é suficiente além de que muitas

vezes é impossível se atingir os valores sugeridos nas normas. A proteção, seja do


equipamento, seja das pessoas, demanda alguns outros critérios além do valor da resistência

da malha. O estudo das equipotenciais, o arranjo adequado da fiação do sistema bem como
a instalação de dispositivos protetores adequados às vezes são mais importantes que a

manutenção de um baixo valor de resistência apenas.

No caso do estado de Minas Gerais, onde a resistividade do solo é alta, às vezes são

encontradas instalações onde se gastou muito na malha e as malhas são tão grandes que

provavelmente irão cair mais raios na malha do que na torre.

Os resultados aqui apresentados são referentes aos projetos das malhas considerando-se

o fenômeno descarga atmosférica. Este não é o único fator a se considerar no projeto da

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malha, muitas vezes as instalações são alimentadas por redes elétricas de alta tensão o que

obriga o projetista a levar em consideração a presença deste sistema no projeto da malha.

Acreditamos que os conceitos e critérios aqui apresentados irão na maioria dos casos

satisfazer as outras exigências além das descargas atmosféricas.

1- A descarga atmosférica

Estudos e medições dos parâmetros associados às descargas atmosféricas vem sendo

feitos há bastante tempo e em varias regiões do planeta.

Apesar do volume de dados obtidos muitas dúvidas permanecem. Os parâmetros e a

descrição do fenômeno apresentados a seguir retratam um conjunto de dados que

representam uma média dos valores obtidos.

Um descarga para a terra processa-se em várias etapas, começando sob a forma de

pequenas descargas originadas na nuvem e em direção a terra, que seguem um percurso

tortuoso geralmente ramificando-se. Estas descargas não são contínuas mas se processam

em etapas de algumas dezenas de metros e com intervalo de repouso de algumas dezenas de

microsegundos. Estas primeiras descargas são chamadas descargas piloto.

Quando a descarga piloto se aproxima da terra, outras descargas que se originam na terra
sobem ao encontro daquela que vem da nuvem, formando assim a descarga principal, ou

seja, uma canal ionizado entre a nuvem e a terra. Neste instante é formada uma corrente de
grande intensidade, denominada corrente de retorno.

Os valores de correntes envolvidos na descarga piloto são de baixa intensidade e no


entanto a corrente de retorno é da ordem de quilo amperes, atingindo às vezes centenas de

quilo amperes.
Uma vez formada a primeira descarga é comum a formação de descargas subsequentes,

que utilizam o mesmo canal ionizado formado na primeira descarga, o que caracteriza as
chamadas descargas ou raios múltiplos.

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A maioria das descargas nas regiões tropicais são de polaridade negativa, cerca de 95 %,

ou seja, a nuvem se carrega negativamente em relação à terra e a corrente de retorno é uma

corrente de cargas negativas da nuvem para a terra. A duração da corrente de retorno é da

ordem de algumas dezenas de microsegundos. A forma de onda típica de uma descarga

atmosférica é mostrada na figura 1.

Figura 1-Forma de onda típica de uma corrente de descarga atmosférica.


A tabela 1 mostra os valores, usualmente utilizados em projetos, dos principais

parâmetros de uma descarga atmosférica: Valor de pico e tempo de pico.

Ipico Tpico % das descargas


(kA) (µs) abaixo dos valores
3.5 1.0 1.0
12.0 2.0 10.0
19.0 3.0 20.0
25.0 5.0 30.0
29.5 6.0 40.0
34 7.0 50.0
39 7.9 60.0
43.5 8.2 70.0
50.0 10.0 80.0
66.0 11.5 90.0
102.0 30.0 99.0
200.0 40.0 100.0

Tabela 1-Valores típicos dos parâmetros da descarga atmosférica

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2-A torre e a descarga

Estruturas elevadas sobre o plano de terra tem "o poder de atrair descargas atmosféricas".

Tal afirmação é baseada em observações e experimentos realizados com bastante critério.

Dizemos então que uma estrutura de determinada altura tem um "raio de atração". Isto

significa que uma descarga que fosse cair em um ponto dentro do volume de proteção

definido pelo raio de atração será atraida pela estrutura.

Figura 2-Raio de atração

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Várias teorias foram propostas para o cálculo do raio de atração e do volume protegido.

Usaremos neste estudo a teoria proposta por Erickson, que foi baseada em uma série de

resultados experimentais obtidos em um projeto realizado na África do Sul.

Tal teoria estabelece:

Ra ≈ 4,0.h

Onde Ra é o raio de atração e h é a altura da Torre.

Todos os raios que cairiam na área "S" (fig.2) serão atraídos pela torre. Se utilizarmos os

dados medidos pela CEMIG sobre o número de descargas para a terra por km2 por ano para

o estado de Minas Gerais teremos:

Ng ≈ 0,1.T

Ng - densidade de descargas para terra (descargas por quilómetro quadrado por ano)

Td - Nível ceraúnico (Número de dias de trovoada por ano)

Conforme dados da CEMIG:

Td max = 120 dias de trovoada por ano Ng = 12 descargas por km2 por ano

Td Médio = 70 dias de trovoada por ano Ng = 7 descargas por km2 por ano

Para uma torre de 10 m de altura teremos:

0,035 descargas por ano (valor médio)

Para uma torre de 20 m de altura teremos:


0.140 descargas por ano (valor médio)

Este cálculo foi feito supondo que as torres estão instaladas em terreno plano. Para o

caso de torres instaladas em altos de morro a incidência de descargas será maior.

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É importante observar que um raio que caia nas proximidades da torre também poderá

provocar efeitos perigosos. Descargas que caiam até vários quilometros da torre ou dos

cabos que chegam até a torre são suficientes para induzir tensões perigosas nos cabos e nos

equipamentos. Estas tensões induzidas apesar de terem valores menores que as tensões

provocadas por descargas que caem diretamante na torre ou nos cabos são bastante

importantes devido à sua elevada frequência de ocorrência.

2.1- Tensões induzidas por descargas laterais

Os valores das tensões induzidas por descargas que caem perto do sistema dependem

basicamente do comprimento dos cabos, da distância da descarga aos cabos, do valor da

corrente de descarga e dos valores das resistências de aterramento.

Para um cabo de comprimento muito grande e sem aterramento teremos,

aproximadamente:

Vind = 30.Io.h / y

h - altura do cabo
Io - valor de pico da corrente de descarga

y - distância da descarga ao cabo

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Figura 3

Para:

Io = 2 kA (menor valor de corrente de descarga)

h = 7.0 m e

y = 800 m

V ind = 500 v

Io = 34 k A (50 % das descargas)

h = 7.0 m

Y = 12 km

Vind = 500 v

Io = 100 kA (1% de probabilidade de ocorrência)

h = 7.0 m

y = 40 km

Vind = 500 v

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Figura 4

Se tivermos um ponto de aterramento na linha a tensão induzida será aproximadamente:

V'ind = (30 .Io h / y) . ( 2R/(Z+2R)) = Vind .(2R/Z+2R)

Vind - Tensão induzida sem aterramento

V'ind - Tensão induzida com aterramento

R - Valor da resistência de aterramento

Z - Valor da impedância de surto da linha

Para uma linha de 7.0m de altura e cabo com diâmetro de d = 5 mm teremos:


Z = 60.ln (4h/d) ≈ 400 Ohms.

O fator k = 2R/Z+2R, representa o fator de atenuação propiciado pelo aterramento.


Se : R = 0 k=0

R = 10 k = 0.05

R = 50 k = 0.20

R = 100 k = 0.33

R = 400 k = 0.71

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Vemos pois que o valor da tensão induzida é bastante influenciado pelo valor da

resistência de aterramento.

Calcularemos agora o valor das correntes que circulam pelos cabos devido às tensões

induzidas. Tomemos como exemplo uma torre de 20 m de altura de onde saem um cabo de

áudio e um cabo de alimentação AC, ambos a 7.0 m de altura. Consideraremos os cabos

ligados diretamente a torre (isto se deve ao fato de com a atuação dos protetores de áudio e

AC todos os cabos são aterrados, via protetor ).

Figura 5

O pior caso de tensão induzida será o de uma descarga de 100 kA caindo a 50 m da torre,

pois se a descarga fosse cair mais perto a mesma seria atraída pela torre e seria uma

descarga direta. A tensão induzida nos cabos será:

Vind = (30 Io h/y).( 2R/Z+2R)

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O circuito equivalente será:

Figura 6

A corrente que passa pela malha de aterramento será:

I r = V' ind / R

A corrente nos cabos será:

Ic = Ir / 2

Para:

R = 10 Ohms Vind = 20 kV
Ir = 2 kA

Ic = 1 kA
R = 100 Ohms Vind = 139 kV

Ir = 1.4 kA
Ic = 0.7 kA

Os valores das correntes são utilizados para a especificação dos protetores.

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2.2 - Descargas diretas

Inicialmente analisaremos um sistema constituído de uma torre aterrada da qual saem um

cabo de AC e um cabo de áudio sem aterramentos e infinitos. Para o caso de uma descarga

na torre o circuito equivalente será o da figura 7.

Figura 7

Para torres de até 20.0 m de altura podemos desprezar a presenca da torre e o circuito se

reduz ao circuito da figura 8.

Figura 8

Ir = [Z / (Z+2.R)].Io

Ic = [R / (Z+2.R)].Io

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para :

R = 10 Ohms Ir = 0.95 Io

Ic = 0.023 Io

R = 50 Ohms Ir = 0.80 Io

Ic = 0.10 Io

R = 100 Ohms Ir = 0.67 Io

Ic = 0.17 Io

R = 400 Ohms Ir = 0.33 Io

Ic = 0.33 Io

Vemos que quanto maior o valor da resistência de aterramento maior será o valor da

corrente que será injetada nos cabos.

As tensões desenvolvidas na malha de aterramento e aplicada nos cabos serão:

V = R . Ir

Consideraremos agora a presença do telefone do usuário, ou seja, no final do cabo de


áudio teremos uma malha de aterramento (aterramento do protetor do telefone). A figura 9

apresenta o circuito equivalente.

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Figura 9

Neste caso a resolução do circuito é mais difícil pois teremos reflexões das ondas de
corrente entre as malhas de aterramento (lembremos que a corrente de descarga atmosférica

é uma corrente de frequência elevada e isto implica em que os cabos se comportaram como

linhas de transmissão de alta frequência). Para a resolução do circuito foi utilizado o

programa para cálculo de transitórios eletromagnéticos EZ-TRAN desenvolvido pela equipe

da EEUFMG. Neste circuito o comprimento do cabo de áudio e o valor da resistência de

aterramento do protetor do telefone irão influenciar bastante os resultados.A figura 10

apresenta o circuito e a forma de onda utlizada e a tabela 2 apresenta os resultados.

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Figura 10

Caso R1(Ω) R2(Ω) Ic(amperes) V2(volts)


L(m) L(m)
100 1000 100 1000
1 10 15 0.29 0.11 4.5 1.7
2 20 15 0.45 0.20 6.8 3.0
3 50 15 0.65 0.36 9.8 5.5
4 100 15 0.77 0.50 11.6 7.6
5 300 15 0.88 0.70 13.2 10.0
6 10 50 0.14 0.08 7.1 4.0
7 20 50 0.25 0.14 12.2 7.1
8 50 50 0.45 0.30 21.7 14.0
9 100 50 0.58 0.41 29.1 21.0
10 300 50 0.76 0.60 37.9 31.0
11 50 50 0.71 0.38 7.1 3.8

Tabela 2

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3- A malha de aterramento

3.1- O valor da resistência

O principal parâmetro que caracteriza uma malha de aterramento é o seu valor ôhmico.

Este valor é medido pelo "megger" que utiliza uma frequência perto de 100 Hz

(geralmente 108 Hz). A utilização desta frequencia se deve ao fato de que ela é

suficientemente afastada de 60 Hz para se evitar interferências das correntes do sistema de

energia elétrica no circuito de medição. Não se utiliza corrente contínua devido ao fato de

como a terra se comporta como um eletrólito a utilização de corrente contínua implicaria

numa polarização da terra o que levaria a erros de medição. Como a frequência utilizada

pelo "megger" é baixa o valor medido é praticamente igual ao valor da resistência em

corrente contínua da malha (em 100 Hz o valor da resistência da malha predomina sobre os

valores de sua indutância e de sua capacitância).

As correntes de descarga atmosférica tem a forma impulsiva e a forma de onda

característica é mostrada na figura 1.

Se esta onda for decomposta através da técnica de Fourier veremos que a frequência

dominante é da ordem de 5 Khz, ou seja, a medição feita em 100 Hz pelo "megger" é boa
para analisar o comportamento da malha para correntes de 60 Hz mas é muito ruim para

analizar a malha para correntes de descarga atmosférica. O ideal seria medirmos a


impedância da malha em 5 Khz e não a sua resistência.

Sendo a corrente de descarga atmosférica uma corrente de "alta frequência" a malha de


aterramento se comporta como uma impedância, ou seja, além da resistência da malha

temos de considerar as componentes indutivas e capacitivas da malha. Um modelo mais


completo para representar a malha seria o da figura 11.

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Figura 11

Para exemplificar, analisaremos uma malha de aterramento constituída de cabos

enterrados no solo a 0.5 m de profundidade, na posição horizontal conforme mostrado na

figura 12. Estudaremos a variação dos valores da resistência (medida com o "megger") e a

variação da impedância (medida com corrente de forma igual à mostrada na figura 1).

Figura 12

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Vemos que sempre que aumentamos o comprimento do cabo enterrado o valor da

resistência diminui o que não acontece com a impedância.

Outro fator importante é que devido aos valores muito elevados das correntes de

descarga atmosférica ocorre no solo um fenômeno de ionização. A corrente de descarga

circulando nos cabos e hastes da malha cria no solo um campo elétrico muito elevado o que

provoca uma série de arcos elétricos dos cabos e hastes para solo, tornando de certa maneira

o solo em torno dos cabos da malha um bom condutor. É como se o diâmetro dos cabos e

hastes aumentasse, o que provoca uma boa redução no valor da impedância da malha.

Várias malhas foram ensaiadas no LEAT-EEUFMG e o figura 13 abaixo mostra a variação

do valor da impedância da malha com valor de corrente aplicado.

Z - Impedância da malha

R - Resistência da malha

Figura 13

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Outro dado importante é que o valor da resistência medida com o "megger" é função

direta do valor de umidade contida no solo. Isto significa que a resistência da malha varia

ao longo do ano, em função da quantidade de chuva. Em um conjunto de malhas de

aterramento construídas no campo de teste da EEUFMG, foram feitas medições ao longo de

um ano e meio e os valores de resistividade do solo e da resistência da malha variaram da

forma mostrada na figura 14.

Figura 14

A conclusão de tudo isto é que o valor medido com o "megger" não é uma garantia de

que a malha de aterramento apresentará um bom desempenho frente a descargas


atmosféricas.

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3.2 - O desenho da malha - Equipotenciais

Uma das funções da malha de aterramento é drenar o maior valor de corrente de

descarga para a terra, minimizando os valores de corrente injetados nos cabos e

consequentemente as correntes que irão passar nos dispositivos protetores. Pelos valores de

corrente calculados no item 2.2 vemos que quanto menor o valor da resistência da malha

melhor será o seu desempenho.

Outra função bastante importante da malha é garantir segurança para o equipamento

instalado sobre a mesma e garantir segurança ao pessoal que transita sobre a malha.

Pelos valores de tensão calculados no item 2.2 vemos que mesmo para valores baixos de

resistência os valores de tensão desenvolvidos na malha e nos cabos são muito elevados.

Por exemplo, tomemos uma malha de 10 Ohms de resistência na qual cai uma descarga

com uma corrente de 100 kA. Teremos uma tensão de 1.000.000 V desenvolvida na malha

e aplicada nos cabos. Esta tensão aparece da malha para um ponto muito distante dela.

Podemos traçar curvas mostrado como esta tensão é aplicada no solo. Usaremos valores

calculados para corrente contínua, porque isto facilitará os cálculos,mas as conclusões são

perfeitamente estendidas para correntes de descarga atmosférica.

A figura 15 ilustra os conceitos de potencial de toque (Vt) e potencial de passo (Vp).


Potencial de passo é a tensão que irá ser aplicada entre os pés de uma pessoa quando circula

corrente pela malha e potencial de toque é a tensão que irá ser aplicada entre a mão da
pessoa que toca a torre e os seus pés.

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Figura 15

Como nos caso de descarga atmosférica os valores de corrente são muito elevados,

mesmo se a malha de aterramento tem um baixo valor de resistência, as tensões de passo e

toque sempre serão muito elevadas.

Se a malha fosse constituida de uma placa metálica não teríamos tensões de passo

perigosas desenvolvidas na malha.

Neste caso a malha seria uma equipotencial perfeita: todos os pontos da malha tem o

mesmo potencial e se circular uma corrente pela malha nenhuma diferença de potencial será

aplicada entre os pés de uma pessoa sobre a malha.

Mesmo a malha sendo uma equipotencial quase perfeita poderemos ter alguns problemas

de potencial de toque no caso de descargas atmosféricas. Tomemos o seguinte exemplo:

uma torre aterrada sobre uma placa de cobre (figura 16).

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Figura 16

Se a corrente que circula pela torre fosse uma corrente contínua, a tensão aplicada na
pessoa seria desprezivel, o valor desta tensão seria igual a:

V = Rt.I

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onde Rt e o valor da resistência ôhmica da torre entre o ponto onde a pessoa toca a torre e o

solo. Como este valor de resistência é muito baixo e a tensão V será desprezível. No caso

de um corrente de descarga atmosférica como a corrente é de alta frequência a tensão

aplicada na pessoa será:

V = Z.I

onde Z é o valor da impedância da torre.

Na prática esta impedância será apenas a indutância da torre, pois a resistência e a

capacitância da torre podem ser desprezadas. Considerando apenas a indutância a tensão

será:

V = L dI/dt

onde L é a indutância da torre e dI/dt é a taxa de variação da corrente. Conforme medições

realizadas com descargas reais esta taxa de variação esta compreendida entre:

2.0 kA/µs e 100 kA/µs.

O valor da indutância depende basicamente do diâmetro da torre, um valor típico seria:


1.0 µH/m.

Tomando-se uma pessoa tocando a torre a 1.0 m de altura as tensões serão:

V = 2.0 kV ( dI/dt = 2.0 kA/µs)


V = 100 kV ( dI/dt = 100 kA/µs)

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Mesmo se reduzirmos bastante o valor da indutância da torre ainda teremos tensões

elevadas.

Vemos portanto que mesmo com uma malha de aterramento perfeita poderemos ter

tensões perigosas desenvolvidas na torre.

O fato de utilizarmos uma placa de cobre como malha praticamente elimina o problema

das tensões de passo, garantido segurança para pessoas sobre a malha e afastadas da torre.

A utilização de uma placa como malha de aterramento é uma solução economicamente

inviável. A solução usualmente adotada é a utilização de uma malha compondo uma rede.

Quanto menor for o afastamento entre os condutores da rede, mais esta malha se aproxima

de uma placa.

Outra solução adotada para minimizar os efeitos das tensões de passo e revestir o solo

por cima da malha com materiais tais como o concreto e a brita. Este material de cobertura

não diminui os valores das tensões de passo mas diminui o valor das correntes que

circulariam pela pessoa.

3.3 - Tratamento químico

A utilização de tratamento químico do solo com o objetivo de reduzir o valor da


resistência da malha de aterramento é um alternativa polêmica. Algumas normas rejeitam

tal solução e algumas normas permitem o tratamento do solo com materiais tais como o
concreto e a bentonita (espécie de argila).

3.4 - O material da malha

As malhas usualmente utilizadas são compostas de cabos dispostos na horizontal e

hastes cravadas na vertical.

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A escolha do tipo de material utilizado depende basicamente de critérios químicos e

mecânicos. Do ponto de vista elétrico não existe nenhuma diferença na utilização de cobre,

aço ou qualquer outro metal, uma vez que que o valor da resistência da malha é função

direta do valor da resistividade do solo. O cobre e o aço tem um valor de resistividade tal

que quando comparados com o valor da resistividade do solo (vários ohms.metro chegando

a milhares de ohms. metro) são totalmente despreziveis.

Do ponto de vista mecânico é interessante que os cabos sejam suficientemente grossos

para suportar eventuais pancadas de enxadas ou outras ferramentas.

Do ponto de vista químico o fator importante é a corrosão . A utilização de cobre ou de

cabos e hastes de aço revestidos de cobre ou de zinco (galvanizados) tem sido uma solução

bastante satisfatória. É importante ressaltar a necessidade de utilização de apenas um tipo

de material na malha, pois a utilização de materiais diferentes tais como o cobre e o aço

galvanizado provocam no ponto de união dos materiais um processo de corrosão bastante

intenso.

Considerando-se todos estes critérios as normas em geral recomendam a utilização de

cabos com bitola mínima de 50 mm2.

4- O pára-raios

As torres em geral tem um pára-raios instalado em sua extremidade superior. A função


deste pára-raios é proteger a antena e o sistema de sinalização (balizamento) contra a queda

de raios diretos. Se a torre for metálica e não tiver sinalização, poderemos eliminar o pára-
raios desde que a antena seja instalada abaixo da ponta da torre (figura 17).

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Figura 17

Se a torre for de madeira é necessário sempre a instalação do pára-raios. O pára-raios

protege a antena porque o mesmo está mais alto que a mesma. O tipo de ponta do pára-

raios não influencia em nada, sendo que a utilização de pára-raios de três pontas somente

propicia alguma vantagem estética (alguns acham mais bonito o pára-raios de mais de uma

ponta!).

5- O cabo de descida

É usual a interligação do pára-raios com a malha de aterramento através de um cabo de


cobre.

Em torres de madeira isto é uma prática obrigatória. Em torres metálicas muitas vezes tal
cabo é desnecessário. Nas torres metálicas a função do cabo de interligação e proteger o

cabo de HF, que interliga a antena ao rádio e os cabos do sistema de balizamento. Sendo a

torre metálica e de diâmetro muito maior que o diâmetro do cabo de interligação a maior

parte da corrente de descarga irá descer pela torre. Sendo a torre muito alta a queda de

tensão na mesma provocada pela circulação de corrente poderá atingir valores elevados

(figura 18).

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Figura 18

A tensão

V = R.I

será aplicada entre o cabo de HF e a extremidade superior da torre. Se esta tensão for

superior ao valor suportável pelo isolamento do cabo de HF, teremos a formação de um

arco elétrico entre a torre e o cabo, provocando um dano permanente no cabo.A colocação

de um cabo de cobre em paralelo com a torre garante menores valores de tensão porque a

resistência do cabo de cobre é menor que a resistência da torre de aço.

Muitas vezes este cabo de interligação é isolado da torre por pequenos isoladores de

porcelana ou resina. Do ponto de vista elétrico tais isoladores são ineficazes, pois não

suportam as tensões impostas pela descarga atmosférica e além disto não teríamos nenhuma

vantagem em isolar o cabo da torre. Do ponto de vista mecânico eles evitam choques e

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atrito do cabo com a torre e do ponto de vista de corrosão eles evitam o contato entre metais

diferentes ( cabo de cobre e torre de aço galvanizado).

6- A proteção do equipamento

Do ponto de vista de segurança pessoal vimos que a solução mais adequada é adotar uma

malha equalizada e mesmo assim alguns riscos ainda existem.

A proteção dos equipamentos depende basicamente de três fatores: instalação de

protetores nos cabos, blindagem eletromagnética dos equipamentos e arranjo da fiação.

6.1- A blindagem eletromagnética

Vimos no item 2.1 que mesmo descargas que caem longe do sistema induzem tensões

elevadas. O rádio ou equipamento está sujeito aos campos eletromagnéticos criados pelas

descargas que caem na torre e também descargas que caem nas proximidades. O princípio

básico da lei de Faraday estabelece que os campos eletromagnéticos não penetram em um

volume metálico fechado, desde que a espessura da parede seja adequada. Baseado neste

princípio podemos afirmar que se os equipamentos fossem colocados em caixas metálicas


eles seriam imunes a estes campos criados pela descarga ( lembremos do caso dos aviões

que são regularmente atingidos por raios, não apresentando problemas e não tendo malha de
aterramento).

A utilização de armários para a instalação dos equipomentos é a solução ideal. No caso


de equipamentos de pequeno porte isto é viável. Para equipamentos maiores a prática usual

é instala-los em prédios de alvenaria. Tais construções precisam ser dotadas de algum tipo
de blindagem. Mesmo considerando-se que os equipamentos individuais são encapsulados

em caixas metálicas, tais caixas são interligadas por fiação e esta fiação será submetida aos

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campos criados pelas descargas provocando o aparecimento de tensões induzidas nos

equipamentos.

6.2- Os protetores

Se os equipamentos pudessem ser instalados em um armário metálico fechado não

precisariamos pensar em mais nenhum critério de proteção. Entretanto tais equipamentos se

comunicam com o exterior do armário através de cabos de alimentação e cabos de

comunicação. Tais cabos serão submetidos a tensões e correntes impostas pelas descargas

atmosféricas e podem transmitir estas tensões e correntes diretamente aos equipamentos. É

importante pois evitar que as tensões aplicadas aos cabos sejam transmitidas aos

equipamentos e isto é conseguido através da instalação de dispositivos protetores nos

pontos onde os cabos penetram no armário onde está instalado o equipamento. Excetuando-

se o cabo de aterramento todos os demais cabos que chegam ao equipamento devem ser

protegidos.

A especificação do protetor é feita segundo dois critérios básicos: a máxima tensão que o

protetor deixa chegar ao equipamento e o valor de corrente que o protetor deve suportar.

A tensão na qual o protetor deve atuar é função da máxima tensão que o equipamento
suporta.

O valor de corrente que o protetor deve suportar é função principalmente do valor da


resistência de aterramento da torre. Vimos até agora que para a proteção do equipamento o

valor da resistência de aterramento só interessa na especificação da corrente suportavel


pelos protetores. Vimos no item 2.2, que quanto maior o valor da resistência de

aterramento, maiores serão os valores de corrente que circulam pelos cabos e


consequentemente pelos protetores.

No circuito da figura 19 temos:

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Figura 19

Na ocorrência de uma descarga na torre os protetores irão atuar e a corrente irá se dividir

entre a malha de aterramento e os cabos.

6.3- O arranjo da fiação

Sabemos pela Lei de Faraday que uma corrente variável no tempo induz tensão em uma

espira aberta e corrente em uma espira fechada (figura 20).

Figura 20

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Sabemos também que quanto maior for a variação da corrente no tempo e quanto maior

a área da espira maiores serão os valores das correntes e tensões induzidas.

A taxa de variação da corrente de descarga atmosférica é um parâmetro sobre o qual não

temos controle e atinge valores bem elevados tais como 200 kA/µs. Se não podemos

controlar a taxa de variação da corrente podemos controlar a área das espiras que existem

nos equipamentos e no circuito formado pela fiação .

Tomemos o exemplo da figura 21:

Figura 21

Vemos que no caso 2 a área "S" é muito menor que no caso 1, o que implica que a tensão
que aparecerá entre os cabos será bem menor no caso 2 que no caso 1.

Outro exemplo é dado na figura 22.

32
Figura 22

No caso 2 a tensão entre os cabos de AC e áudio será bem menor que no caso 1.

Como regra geral temos :

- Evitar "loops" entre e nos cabos;

-Todos (todos mesmo) os cabos devem entrar no armário juntos em um mesmo orifício.

7- A proteção do cabo de áudio

Vimos no item 2.2 que a ocorrência de uma descarga na torre provoca a circulação de

correntes elevadas pelo cabo de áudio e o valor desta corrente dependente diretamente do

valor da resistência de aterramento da torre. Estas correntes circulando no cabo provocam o

aparecimento de tensões elevadas do cabo para a terra o que pode provocar disrupções entre

o cabo e os postes de sustentação (figura 23).

33
Figura 23

Se o comprimento do cabo for grande e a resistência da malha também for elevada é

necessário a instalação de proteção ao longo do cabo. Esta proteção pode ser feita através da

utilização de cabos blindados, cabos com cabo mensageiro, cabos em dutos metálicos ou

protetores instalados nos postes. A pesquisa que está sendo conduzida pelo pessoal da

Universidade Federal de Juiz de Fora está levantando uma estatística de danos em

instalações com torres em alto de morro. Em função dos dados coletados, assim que os

mesmos estiverem disponíveis, será feita uma recomendação mais específica sobre

proteção do cabo de áudio.

8- Proposta de critérios para projeto e instalação de malhas de aterramento de

torres visando proteção contra descargas atmosféricas.

Os comentários até aqui apresentados são um resumo dos estudos realizados pela equipe

EEUFMG desde 1987. Baseado nestes conceitos é sugerido um critério para aterramento de

torres, que acreditamos estar em concordância com os critérios adotados em paises mais

desenvolvidos e adequados à realidade brasileira .

34
8.1- Estatística de valores de resistividade do solo em Minas Gerais

Foram analisados dados obtidos em uma série de localidades de Minas Gerais onde

foram feitas medições do valor da resistividade do solo. Foram selecionados 163

localidades, onde a medição foi feita com bastante critério. Foi feita uma análise estatística

dos valores medidos e a tabela 3 apresenta os resultados obtidos.

ρ(Ω.m) Número de % %

localidades Acumulado

0-1000 20 12.3 12.3

1000-5000 89 54.6 66.9

5000-10000 31 19.0 85.9

> 10000 23 14.1 100.0

Total 163 100.0

Tabela 3

8.2-O valor da resistência da malha de aterramento

Quanto menor for o valor da resistência da malha da torre melhor será o desempenho da
proteção elétrica e mais garantida estará a segurança pessoal.

As normas internacionais propõem valores que variam de :

2,5 Ω (norma Holandesa) a

50 Ω (norma Sul-africana).

Não existe um valor "mágico" para o valor da resistência da malha. Malhas equalizadas

garatem a segurança do pessoal e do equipamento.

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Propomos neste estudo um valor máximo de 50 Ω para o valor da resistência de

aterramento da malha da torre.


Nos casos onde este valor não for alcançado, sugerimos que seja feito um estudo

particular. Nestes casos pode-se adotar o tratamento químico ou então se adotar protetores

de maior capacidade de corrente no cabo AC e no cabo de áudio, bem como instalar

protetores ao longo do cabo de áudio e se adotar uma malha de aterramento equalizada no

protetor do telefone do assinante.

8.3.-Malha de aterramento proposta

São propostas três configurações básicas de malhas de aterramento.

8.3.1-Configuração 1

Figura 24

36
A configuração da figura 24 garante uma boa equalização de potencial. Em cerca de 15%

dos casos esta malha terá valor de resistência inferior a 50 Ω (solos com valor de

resitividade inferior a 1500 Ω.m).

8.3.2-Configuração 2

Figura 25

A adoção de cabos radiais irá contribuir para a redução do valor da resistência da malha.

Sugerimos um valor máximo de 20 m para o comprimento dos cabos radiais. A adoção de

cabos com comprimentos maiores só se justifica em instalações ou situações específicas.

37
A configuração da figura 26 deve fornecer valores de resistência de aterramento

inferiores a 50 Ω em cerca de 60 % dos casos (solos com valor de resitividade inferior a

3000 Ω.m).

8.3.3-Configuração 3

Nos casos onde a torre será instalada em locais com circulação permanente de pessoas,

recomenda-se uma malha de aterramento com um maior grau de equalização, como a

mostrada na figura 27. Recomenda-se também a cobertura da malha com concreto ou então

uma camada de britas.

Figura 26

38
9-O aterramento do protetor do telefone

Como as instalações que utilizam torres estão sujeitas a uma grande incidência de

descargas atmosféricas é recomendável que o aterramento do protetor do telefone do

assinante seja também feito com bastante critério.

A adoção de uma malha de aterramento equalizada seria uma excelente alternativa. O

envolvimento da casa do assinante por um anel , enterrado a 0,5 m de profundidade, garante

uma boa equalização de potencial (figura 27).

Figura 27

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