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INTRODUÇÃO
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Estabelecidas as bases teóricas, o item final do estudo demonstra o
entrelaçar das amarras da autonomia privada (representada no negócio
jurídico) e a específica convenção arbitral. Nessa senda, procura-se destacar
que a autonomia privada não se verifica sem limitações, ao mesmo tempo em
que permite a realização da liberdade das partes na autorregulamentação dos
seus interesses privados e, na especificidade da convenção arbitral, encontra
espaço de manifestação ao permitir não somente e eleição do foro para a
resolução dos conflitos, mas, também, a constituição do próprio órgão
decisório, incumbido de restabelecer o equilíbrio em caso de injusto
desnivelamento.
Atentando-se à contemporaneidade das relações privadas, para os
casos de celebração de pactos adesivos, nos quais o espaço de atuação da
autonomia privada encontra-se reduzido, esclarece-se que a precaução com a
convenção arbitral deve exigir expressa manifestação de vontade a esse
respeito. Trata-se de situação na qual o ordenamento regula para menor o
espaço de autonomia privada, em claro atuar contendor do poder negocial,
dada a ausência de liberdade na contratação adesiva, especialmente em casos
de relações de consumo.
Nesse sentir, observa-se um movimento pendular da autonomia
privada: se houve progressiva limitação com as imposições decorrentes do
próprio ordenamento jurídico, ao admitir-se a celebração de uma convenção de
arbitragem para a solução dos conflitos que surgem da vida das relações
interprivadas, reaviva-se a expressão do poder jurídico dos indivíduos para a
regulamentação dos próprios interesses.
Para as relações nas quais a adesividade e a ausência de liberdade na
contratação impõem, entretanto, a celebração de pactos padronizados, não
cabe clamar pela flâmula da autonomia privada, pois nesses casos, não a face
da liberdade, mas a dos limites, recebe as luzes do ordenamento e
resplandece na proteção dos indivíduos, evitando-se a sobreposição da força
econômica à vulnerabilidade e hipossuficiência dos contratantes.
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1.1 Construção teórica de um conceito: delimitação do espaço volitivo no
negócio jurídico
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A partir de então, as relações passaram a ser reguladas levando-se em
conta a vontade e a liberdade das partes, sem a possibilidade de interferência
do Estado nas relações privadas, até mesmo como uma forma de impedir a
onipotência do príncipe.
Negócio jurídico, em tal momento, espelha um simples instrumento da
autonomia da vontade, o meio através do qual os particulares perseguem os
próprios interesses privados, ainda que em detrimento do resguardo aos
interesses sociais.
O elemento volitivo reflete o caráter principal do negócio jurídico.
Foi possível, a partir da concepção de Von Bullow, perceber que a
ordem jurídica atribuía diferentes graus de valorização à vontade
humana, no sentido de os particulares poderem conformar tais atos e
seus efeitos construindo-se, a partir daí, a moderna teoria dos
negócios jurídicos e a sua divisão escalonada, segundo a valorização
da vontade, em negócios jurídicos (onde é totalmente valorizado o
processo volitivo, seja no momento da criação do ato e na
conformação de seus efeitos) em atos jurídicos em sentido estrito
(onde é valorizada a vontade de praticar o ato, decorrendo seus
efeitos, todavia, de prévia disposição legal) e em atos-fatos (onde não
é valorizada nem a vontade de praticar o ato nem é possível a
conformação de seus efeitos) (MARTINS-COSTA, 1992, p.149).
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(‘cognitionis poenam nemo patitur’), sino que se requiere sea exteriorizada o
manifestada”.
Para a existência do negócio jurídico, portanto, deve haver a
coincidência das duas vontades – interna e declarada –, para que àquela
vontade possa ser atribuído um valor pelo Direito.
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Os juristas continuam a considerar as complexas relações das
sociedades de massas a partir da vontade individual. Essa, no entanto,
somente pode ser vista como a fonte, a força determinante do negócio jurídico,
considerada como elemento que impulsiona a formação do negócio. Após tal
impulso, há o abandonar de cena da vontade individual e o protagonismo da
vontade do grupo ou do Estado regulando e disciplinando aquele negócio
jurídico e seus efeitos (LÔBO, 1986, p.11-12).
A vontade, portanto, continua a determinar o conteúdo e os efeitos dos
negócios jurídicos firmados. Entretanto, tal vontade sofre limitações pelo
ordenamento, na busca de garantir a satisfação dos interesses das partes sem
que os interesses sociais sejam prejudicados. Além disso, a reformulação do
conceito de negócio jurídico decorre, além dos ideais sociais assumidos pelo
Estado social, das alterações sofridas nas próprias relações sociais e
econômicas, massificadas e impessoais, que restringem sobremaneira o papel
da autonomia da vontade na celebração dos negócios jurídicos.
Plena no liberalismo, à autonomia da vontade foram impostos limites
quando se verificou a necessidade de estabelecer um maior equilíbrio e uma
real igualdade entre as partes, o que, todavia, não a anulou, mas a reforçou.
Ana Prata define autonomia da vontade como “o poder „reconhecido‟ pela
ordem jurídica ao homem, prévia e necessariamente qualificado como sujeito
jurídico, de juridicizar a sua actividade (designadamente, a sua actividade
económica), realizando livremente negócios jurídicos e determinando os
respectivos efeitos” (PRATA, 1982, p.11).
Para a caracterização dos negocios jurídicos a autonomia da vontade,
vista como pedra fundamental, permissiva para as partes a ampla
determinação do seu conteúdo e efeitos, não mais pode ser vislumbrada no
contexto da sua criação. Ao contrário, impõe-se a determinação de limites que
busquem contextualizá-la à nova teoria contratual originada das alterações dos
fatores econômicos e sociais que lhe deram origem. No atual contexto, às
partes não mais é permitido exercer a ampla liberdade na determinação dos
efeitos do negócio jurídico com vistas à satisfação de seus interesses.
Como consequência, constatou-se a mitigação do conceito de
autonomia da vontade, uma vez que esta enfoca precipuamente a vontade
interna e psicológica do agente, consagrando, sobretudo, a ideia de
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autorregulamentação dos interesses e dos efeitos no negócio jurídico
estabelecido entre os contratantes.
Dessa forma, no atual cenário em que se insere a autonomia privada
não há a crença de existência de uma vontade do indivíduo ilimitadamente na
formação do negócio jurídico. Ocorre, outrossim, uma reestruturação da
concepção de autonomia da vontade, o que implica no preestabelecimento, de
limites que disciplinem a atuação das partes na formação do negócio jurídico.
Isso não significa que a autonomia da vontade haja desaparecido ou tende a
desaparecer, sobrevém o seu renascer e necessidade de regulação de acordo
com as exigências de cada época.
Tal justificativa foi muito bem esclarecida por Giovanni Ettore Nanni:
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interés); y a la autodeterminación le sucede la autorregulación de los
intereses recíprocos, lo que implica no sólo la selección de la
operación jurídica, sino, además, dotarla de contenido (STIGLITIZ,
1992, p.14-15).
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A autonomia da vontade, como liberdade concedida às partes para o
estabelecimento dos negócios jurídicos, sempre foi limitada pelo ordenamento,
ora com menor rigor, como ocorreu no Estado liberal, no qual os limites
impostos eram estabelecidos unicamente pela ordem pública e bons costumes,
ora de forma mais intensa, como passou a ocorrer a partir da maior intervenção
estatal nas relações interprivadas. As partes sempre puderam estabelecer
livremente o conteúdo e efeitos nas suas relações negociais, assim, a
modificação do princípio ocorreu somente no sentido de reduzir este espaço
deixado às partes, de acordo com a preponderância dos interesses públicos e
sociais agasalhados de forma peculiar pelo Estado.
A autonomia privada poderá ser exercida com base nos limites impostos
pelo ordenamento jurídico, o qual, visando à proteção do interesse público e
ressaltando o princípio da dignidade humana, impõe os delineamentos dentro
dos quais poderão os particulares estabelecer seus negócios jurídicos.
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As balizes à autonomia privada alteram-se conforme as ideologias e os
sistemas econômico-políticos de cada momento histórico, influindo tais
ideologias e sistemas no grau de intervenção estatal na disciplina dos negócios
firmados entre os particulares e, consequentemente, na disciplina da
autonomia privada.
O Estado, dessa forma, estabelece limites à atuação dos contratantes,
sobretudo visando à proteção dos interesses e direitos sociais.
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Nesse sentido também, Avelino León Hurtado, considera que, apesar das leis restritivas, a
autonomia da vontade continua sendo “el resorte” que impulsiona o direito privado, sendo a
expressão da personalidade humana e que conseqüentemente, não poderá jamais
desaparecer. – tradução livre. (HURTADO, 1979, p. 63). Diz Karl Larenz que o indivíduo só
pode existir socialmente como personalidade quando lhe seja reconhecida pelos outros não
apenas a sua esfera da personalidade e da propriedade, mas também quando, além disso,
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formação do negócio jurídico, seja possível considerá-la presente „se‟ e
„quando‟ dentro dos limites permitidos pelo ordenamento jurídico.
possa em princípio regular por si mesmo as suas questões pessoais e, na medida em que com
isso seja afetada outra pessoa, possa regulamentar as suas relações com ela com caráter
juridicamente obrigatório mediante um acordo livremente estabelecido. – tradução livre.
(LARENZ, 1958, p. 65).
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Isso porque, segundo esse instituto, cabem às partes acordar que
determinada controvérsia será resolvida por decisão de um árbitro. Análise
perfunctória conduziria à conclusão de se tratar de contrato típico, restrito ao
campo da autonomia privada.
De outro norte, atentando-se efetivamente à atividade desempenhada
pelo árbitro, exsurge o questionamento: se somente ao Estado cabe exercer a
função jurisdicional, não possuiria também a arbitragem essa natureza, na
exata medida em que também soluciona interesses conflitantes de indivíduos?
Não teria a arbitragem, assim, caráter público?
Essa contraposição de ideias gerou inclusive discussão acerca da
constitucionalidade da Lei de Arbitragem, por suposto malferimento ao princípio
da inafastabilidade do controle jurisdicional. Refere-se ao julgamento do Agravo
Regimental em Sentença Estrangeira nº 5206/Espanha, de relatoria do
Ministro Sepúlveda Pertence, julgado em 12/12/2001. Naquela oportunidade, o
Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do diploma legal.
Veja-se a gravidade da questão. A investigação proposta se encontra
adstrita a um dos pontos basilares de estudos jurídicos. Basilar e complexo.
Investiga-se, aqui, a natureza jurídica do instituto.
Investigar a natureza jurídica apresenta-se como tarefa complexa porque
impõe alto grau de abstração, com o fim de se encontrar o núcleo essencial do
objeto estudado. Após encontrar-se a essência, inicia-se a missão topográfica,
ou seja, parte-se à tentativa de categorização em um dos institutos jurídicos já
existentes.
No caso da arbitragem, enfrentam-se ainda outras duas dificuldades
conceituais para se alcançar a natureza jurídica do instituto. A primeira, porque
o estudo demanda análise e mesmo uma reconceituação do que é,
efetivamente, a jurisdição. Já a segunda, porque se adentra em terreno no qual
predomina um antigo paradigma do Direito: a distinção entre o público e o
privado.
Ao se referir à arbitragem, podem-se aludir três aspectos distintos do
instituto. Os dois primeiros não ensejam maiores dúvidas da doutrina. Trata-se
da análise da arbitragem como (a) uma convenção feita pelas partes ou como
(b) um método de solução de conflitos de interesse. Sendo uma convenção, a
arbitragem aqui é vista como um contrato típico, por demandar um acordo de
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vontades em que as partes resolvem submeter a lide ao tribunal arbitral.
Enquanto método de solução de conflitos, por seu turno, a arbitragem se
assemelha ao processo judicial na medida em que cria uma relação jurídica
entre as partes e o árbitro (CREMASCO; SILVA, 2011, p. 371).
A dificuldade conceitual referida concentra-se no terceiro aspecto do
instituto: considerar-se a arbitragem como a atividade desenvolvida pelo
tribunal arbitral. Note-se o foco no termo “atividade”, justamente um dos traços
distintivos do conceito de jurisdição.
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A Corte decidiu que uma sentença arbitral estrangeira possuía o mesmo valor de uma
sentença judicial estrangeira, sedimentando a equivalência da arbitragem à jurisdição. O caso
envolveu o Estado da Rainha Maria Cristina da Espanha, na qual se discutiu qual lei nacional
se aplicaria à demandada. No caso, definiu-se que a lei aplicável à ré, a Princess Del Drago,
era a do Estado Pontifício, já que a princesa pertencia por direito de matrimônio à Casa Papal
(RUBINI-SAMARTANNO, 2014, p. 11).
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O foco desse conceito – o exercício da jurisdição –, não está limitado à
figura do Estado somente, podendo ser desempenhada por terceiro imparcial.
A abertura conceitual proposta permite se vislumbre a adequação, aos moldes
delimitados, da arbitragem como legítima integrante do conceito de jurisdição,
porquanto seria ela também um método de modificação e solução de situações
jurídicas, realizado por pessoa alheia às partes em litígio. A diferença
substancial repousa no fato de que, nesse caso, o Estado autoriza e regula o
exercício desse poder por particular, por meio de lei própria, a Lei de
Arbitragem.
Entendido dessa forma, o conceito de jurisdição não implicaria em
rompimento da noção básica de que ela é monopólio do Estado. Afirma-se
sempre “a jurisdição é monopólio do Estado, mas não é correto dizer há
monopólio de seu exercício” (DIDIER JR, 2010, p. 81). A soberania estatal
restaria, assim, preservada.
Por essa definição, a arbitragem não poderia sequer ser entendida como
um “equivalente jurisdicional” ou “substutivo de jurisdição”: casos da autotutela,
autocomposição e mediação. Seria o próprio exercício da jurisdição.
A doutrina especializada procura por em relevo a circunstância de que
diversos outros atributos da arbitragem reforçam o seu caráter jurisdicional. O
fato de a sentença arbitral só poder ser revisada quanto aspectos de validade
(art. 33, da Lei nº. 9.307/96), e não de mérito, é um deles.
Outro ponto que pode ser invocado como sustentáculo dessa posição
reside no procedimento de homologação de sentenças arbitrais estrangeiras
pelo Superior Tribunal de Justiça. Se a sentença arbitral não fosse produto de
uma atividade jurisdicional, por qual motivo se condicionaria a eficácia de um
suposto contrato ao crivo daquela Corte? Se assim se faz, há uma razão: dotar
aquela sentença arbitral de autorização para produzir efeitos em território
nacional pelo crivo da soberania do Estado Brasileiro (CREMASCO; SILVA,
2011, p.376).
Aspecto polêmico acerca do tema reside na limitação executória da
sentença proferida pelo tribunal arbitral. Afirma-se que, após eventual decisão
condenatória, caberia à parte interessada ingressar na Justiça para executar a
sentença arbitral, por constituir ela título executivo judicial (art. 475-N, IV, do
Código de Processo Civil).
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Questionados sobre esse ponto, os adeptos da teoria jurisdicional
argumentam que a jurisdição, quanto ao tribunal arbitral, não goza de
plenitude. Isso não retira, porém, a sua natureza de órgão de administração da
Justiça; há apenas a limitação em sua extensão.
Relevância também se atribui a outro debate, consistente na
necessidade de renúncia à jurisdição quando se opta pelo procedimento
arbitral. Nesse ponto, a doutrina observa não se tratar de renúncia à jurisdição,
mas somente à jurisdição estatal. Inexistiria o sacrifício mencionado pela teoria
contrária, portanto.
O foco principal desse ramo doutrinário reside, no entanto, no tipo de
atividade desempenhada pelos árbitros. Nas próprias palavras do
processualista Nélson Nery Júnior (1997, p. 1300):
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O silogismo a partir de tais premissas apresenta a conclusão
aparentemente lógica, marcada mesmo pela obviedade. Contudo, não foram
poucos os argumentos lançados a fim de construir o momento conclusivo.
O primeiro pilar da teoria privada reside no fato de, em tese, o exercício
da jurisdição se apresentar como prerrogativa única do Estado, que delega a
função àqueles devidamente qualificados via concurso público. O monopólio
para a solução de controvérsias por essa via é somente estatal, não podendo o
árbitro ser considerado uma extensão desse conceito só porque desempenha
atividade assemelhada.
A questão, aqui, é de competência: só juízes podem e exercem
jurisdição. É do núcleo fundamental do seu conceito que somente autoridades
públicas, de livre acesso por qualquer cidadão, possam “dizer o direito” com
base no ordenamento jurídico interno.
Em continuidade, põe-se em relevo a existência de cláusula expressa,
quando da convenção de arbitragem, da escolha do juízo arbitral e a renúncia à
jurisdição. Deparando-se com essa circunstância, argumenta-se que se há
renúncia à jurisdição, à obviedade, não poderia a arbitragem ser, em si,
jurisdição.
A opção “arbitragem” consigo implica o afastamento de três outros
princípios afetos à jurisdição estatal e que a definem. O primeiro, da
inevitabilidade do controle jurisdicional, segundo o qual a autoridade dos
órgãos jurisdicionais “impõe-se por si mesma, independentemente da vontade
das partes ou de eventual pacto para aceitarem os resultados do processo”
(CINTRA, DINAMARCO; GRINOVER, 2008, p. 155).
Nesse sentir, destaca-se que a inevitabilidade inerente ao controle
jurisdicional não é compartida pela arbitragem, que depende do pacto das
partes para que ocorra. Sem o pacto, não se instala a jurisdição arbitral.
O segundo princípio não observado pela arbitragem é o do juiz natural,
previsto no art. 5º, XXXVII, da Constituição Federal. Afinal, o árbitro não é juiz
independente e imparcial, aleatoriamente designado. Do contrário, é
previamente escolhido pelas partes. Evidencia-se, portanto, que carece a
arbitragem da higidez prévia à relação que poderá resultar em conflito, como se
encontra na análise da jurisdição estatal.
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Ulteriormente, argumenta-se que a arbitragem deixa evidente o conflito
em face do princípio da unidade da jurisdição, fundado na ideia de que a
jurisdição não comporta divisões (SZNAJDER, 2014, p. 2), pois se admitir o
contrário implicaria no reconhecimento de que o Estado possui mais de uma
soberania.
Por fim, ainda se invoca a impossibilidade de execução das decisões
pelo árbitro como marco distintivo do procedimento à esfera privada. Apesar de
alcançar definitivamente uma solução ao litígio, o tribunal arbitral não possui o
condão de executar a sentença por si. Para tanto, conferiu-se à sentença
arbitral caráter de título executivo (art. 31 da Lei nº 9.307/93 c/c art. 475-N do
Código de Processo Civil). Ou seja, se o árbitro sequer pode dar eficácia à sua
decisão, como poderia se reconhecer qualquer espécie de natureza
jurisdicional ao seu serviço? Apesar de haver resposta da teoria jurisdicional a
esse ponto, os adeptos da teoria privatista invocam o distanciamento existente
que seria compatível com a essência da jurisdição. Ela é plena, não
comportaria limitação.
A doutrina, portanto, apoiando-se em tais argumentos, vergasta a
sustentação primordial da corrente jurisdicional, qual seja, a arbitragem vista
como um instrumento de pacificação social. Sustenta-se que o termo é
genérico e não reflete o núcleo do conceito de jurisdição. Pacificação social
“não decorre necessariamente de uma decisão justa”. Inúmeras atividades
privadas poderiam conduzir ao mesmo fim e “ninguém jamais ousou qualificá-
las como jurisdicionais somente por esse motivo” (MARINONI, 2014, p. 15).
A jurisdição é também a medida de todas as coisas segundo esse ramo
doutrinário. Afasta-se, porém, o argumento de que a similaridade dos
processos judiciais e arbitrais os definiriam como iguais. Um é privado, pago
pelas partes e influenciado por fatores alheios. O outro, público e influenciado,
portanto, pelos valores democraticamente eleitos, mediante processo público
específico para tanto (concurso). Dessa forma, não haveria qualquer
possibilidade de uni-los, justiça e arbitragem, no mesmo conceito.
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Aristotélica é a lição de que entre dois extremos, deve-se escolher o
meio termo.
No debate acerca da natureza da jurisdição arbitral há os que invocam,
ao que parece, a concepção do filósofo grego e defendem o meio termo entre
os opostos contendores.
Como opção ao embate clássico, autores surgiram com opções
doutrinárias diversas. Adveio primeiro a Teoria Sincrética, Intermediária ou
simplesmente Mista, que de maneira geral concede à arbitragem as duas
naturezas, contratual e jurisdicional. Contratual, seria, em sua origem, mas
jurisdicional em sua atividade. Constitui a posição defendida por Sérgio Pinto
Martins, ancorado na posição de Sauser-Hall (CREMASCO; SILVA, 2011,
p.374).
Além da conciliação entre as duas teorias anteriores, ousou-se propor
leitura distinta, como terceira via.
A partir da Teoria Intermediária surgiu a defesa de uma posição
nominada de Autônoma ou Sui Generis da arbitragem, definindo-a como um
procedimento especialíssimo, dotado de elementos comuns ao contrato e à
jurisdição, mas ainda assim único. Mais afirmada no ramo do Direito
Internacional e em países liberais (Suíça, por exemplo), essa teorização retira
qualquer vínculo da arbitragem com o Estado. O enfoque é diverso por residir
muito mais no plano jurídico e comercial em que se encontra inserida a
negociação do que nas leis do país de origem da avença (CREMASCO; SILVA,
2011, p.374).
Entende-se, contudo, que as posições acima não se aplicariam ao
presente trabalho. A primeira, porque não observa a separação metodológica
feita no início deste item capitular. Naquela oportunidade, enumeraram-se
diversos enfoques possíveis à arbitragem, sendo três em específico, quais
sejam, a arbitragem como convenção, método ou procedimento. Demarcou-se
que a investigação recairia somente quanto ao ponto último, já que os demais
não ensejariam maiores delongas; são contratuais. Portanto, uma teoria mista
somente confundiria esses possíveis enfoques, afastando o debate proposto
acerca da essência da arbitragem enquanto atividade. Nesse ponto, não há
como conceder à atividade natureza mesclada: ou é jurisdicional, ou contratual.
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No que tange à teoria autônoma, não se verifica a viabilidade de
aplicação ao ordenamento jurídico brasileiro, que determina, para sentenças
arbitrais internacionais, a homologação pelo Superior Tribunal de Justiça a fim
de produzir efeitos. Como advertido, essa teorização é típica de países mais
liberais. Indubitável que, no Brasil, a lei do local é relevantíssima para a
determinação da natureza jurídica da sentença arbitral.
O conflito remanesce, portanto, entre o público e o privado. A conclusão
é evidente. No fundo, a divergência entre aquelas correntes reside não na
natureza jurídica da arbitragem em si, mas sim no próprio conceito de
jurisdição. Essa não é uma das tarefas mais fáceis e, provavelmente, o embate
permanecerá por um longo tempo.
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Outro ponto relevante da arbitragem reside no comando do juízo
decisório revestido de iguais efeitos da decisão jurisdicional, sendo assim, a
decisão arbitral impositiva às partes.
A consideração acerca da natureza jurídica contratual, mista ou
procedimento especialíssimo da jurisdição arbitral, como abordada
anteriormente, oportuniza, através da observação da arbitragem voluntária e
referente às questões de direito privado, especificamente, análise do que, para
fins do estudo, se convencionou nominar de modulação da autonomia privada
em sede de contratos individuais e contratos coletivos.
Nessa esteira, define-se a releitura da autonomia privada para retomar
a tensão pendular sobre os limites impostos ao poder das partes de
autorregulamentação de seus interesses particulares. Indubitavelmente, poder
que, sofre limites decorrentes do próprio ordenamento jurídico que, de outra
parte, o assegura e defende por ser vital à tutela dos interesses privados em
sede de negócio jurídico.
Não há autonomia privada sem limites, como também não há autonomia
privada sem liberdade. Instigante, por vezes, observar as modulações da
autonomia privada, para mais ou para menos, se assim pode ser expresso, em
certas condições e circunstância.
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A discussão em relação à autonomia privada manteve-se conformada
pela tradição da teoria negocial ao plano material, sendo as referências feitas à
imposição de limites, ou não, voltadas para essa textura e materialidade.
Considerando o perfil de relevo da autonomia privada “enquanto
liberdade de modelação da própria esfera jurídica, sendo justamente o poder
de fazer escolhas e diferenciações, e de fazê-las, não segundo critérios
objetivos de conveniência econômica, de razoabilidade, de igualdade social,
mas antes segundo o livre arbítrio do sujeito”, tal liberdade implicada no
princípio da autonomia privada que prevalece sobre estes critérios, não
valendo, em regra, o princípio da igualdade, em toda sua extensão, no domínio
privado – em particular no domínio jurídico-negocial. Isto, por força de outro
princípio fundamental, constitutivo do direito privado. Sem tal atenuação, se o
tratamento desigual (p.ex. a recusa de contratar) das contrapartes – ou das
potenciais contrapartes – implicasse em violação do princípio da igualdade, a
autonomia privada seria destruída, e a vida jurídico-privada deparar-se-ia com
uma “extrema rigidez”, inautenticidade e irrealismo, de todo os pontos
indesejáveis” (MOTA PINTO, 2010, p. 316).
A questão nuclear em relação à autonomia privada está assentada não
mais e somente nos limites necessários à autorregulamentação, e sim na
modelação de expressão desta autonomia, objetivando a proteção da liberdade
e igualdade de contratar assegurando a execução dos contratos de forma a
equilibrar a materialidade das obrigações, adequada à realização dos seus
efeitos.
O respeito à autonomia privada representa limites assegurados pela
ordem pública como cláusula geral representando notáveis imprecisões na
hora de fazê-la concreta. (LORENZETTI, 2004, p.94).
Como cláusula geral dirigida ao poder negocial, principalmente, dos
grandes contratantes, mas não só destes, diga-se, em relação ao poder
econômico e ao poder dos mercados globais, a autonomia privada enfrenta a
necessidade, de um lado, da imposição de certos e bem definidos limites,
dirigidos à ação dos chamados “senhores do poder” por expressar domínio
negocial em relação à economia mundializada e, de outro, uma extensão de
liberdades e igualdades para garantir o respeito ao contrato, um dos ícones do
Estado de Direito, na atualidade. A problemática em pauta ainda enfrenta no
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polo oposto dos interesses privados, na contramão das pretensões dos donos
dos mercados, a atuação desmedida de Estados, excessivamente,
intervencionistas.
A intervenção estatal é histórica, existente na Monarquia Absolutista e
pelo Estado Liberal na versão de Estado Moderno (BONAVIDES, 2004, p.41).
De observar que no Estado liberal, a intervenção era mínima, prevalecendo o
individualismo econômico e negocial marcado pela liberdade contratual plena.
O Estado neoliberal define-se, entre outros fundamentos, pela interferência
equilibrada na ordem econômica e nas relações privadas, objetivando, dentre
outros fins, a garantia do contrato e democratização dos pactos.
A iniciativa privada, e com ela a autonomia privada, frente às ações
econômicas formadas por certas pressões públicas, enfrentam oscilações de
conformidade com a política intervencionista de cada Estado afetando o
desenvolvimento e crescimento econômico com a desaceleração da economia,
fuga do capital estrangeiro e crise econômica acentuada, no mais das vezes,
como ocorre com países vizinhos da América Latina.
Lorezentti, ao tratar dos deveres de proteção da ordem pública em
relação à organização econômica do Estado, preleciona:
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a) consentimento pleno, vinculado à liberdade de contratar e a liberdade
contratual;
b) proteção da parte fragilizada, em regra, o aderente, sujeito vulnerável
ao desequilíbrio contratual movido pela presença de cláusulas abusivas em
descompasso com o principio da boa fé objetiva.
c) efetividade da autonomia privada de ambas as partes, asseguradas
pelo ordenamento jurídico, tendo em conta a condição socioeconômica das
partes e o tipo de contrato a ser celebrado;
d) garantia do conhecimento do que se contrata pautada pela segurança
jurídica negocial e dever de informação, ponto essencial referente à
transparência dos pactos;
e) controle da licitude, referência direta à moralidade das partes
contratantes, objeto dos pactos, fins visados pelas partes, fundados na boa-fé
objetiva e na tradição dos usos e costumes.
f) organizar economicamente a sociedade, tarefa constitucional do
Estado implicando em limitar poderes e, ao mesmo tempo, assegurar tais
poderes, observando que a ordem publica de coordenação é pressuposto da
ordem publica de direção.
Nesse palco e cena, divididos entre interesse público e privado, mantém-
se a persecução da tutela adequada para resguardar a conexão inevitável
entre o respeito ou a violação do contrato, individual ou por adesão, protegendo
ou limitando, por indispensável, a autonomia privada das partes contratantes.
Assim, a autonomia privada, feita de liberdades, assegura às partes o
poder de autorregulamentação, enquanto que a mesma autonomia privada,
feita de limites, assegura às partes a igualdade refletida na equivalência
material das obrigações. A liberdade contratual materializa-se no encontro de
vontades livres para estabelecer o conjunto de interesses que devem nortear o
pacto, enquanto a boa-fé objetiva garante a tutela da confiança, elemento
integrante da moralidade da relação negocial. Por esse percurso, a modulação
da extensão da autonomia privada oportuniza a calibração do poder negocial
ao mesmo tempo em que assegura e limita o poder de autorregulação de
ambas as partes, conjugando liberdade e igualdade no encontro do
consentimento pleno ou adesivo do acordo de vontades, conforme os
interesses econômicos e sociais de cada um dos contratantes. Se assim não
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for, a autonomia privada restará desconstruída para dar margem à exploração
do mais fraco pelo mais forte, com o que não se pode comungar.
Nesse contexto de modulações necessárias, a autonomia privada
recebe da legislação arbitral espaço expressivo e importante para conceder à
parte contratante, na modalidade de pacto individual a liberdade para eleger
meio alternativo de solução de controvérsia, retirando da apreciação do poder
judiciário a apreciação de conflitos, quando e se houver, tudo nos limites da
legislação aplicável.
Sem dúvida, a arbitragem como concebida, além de representar avanço
expressivo como “outro meio” para solução de controvérsias, assegurou,
através da jurisdição arbitral, a competência para decidir questão de interesse
privado, reservando ao juízo decisório privado a apreciação de divergências
negociais por meio deste procedimento alternativo de decidibilidade de
conflitos. A opção disponibilizada ampliou as condições de possibilidade da
autonomia privada, antes restrita pelo poder negocial conferido às partes, à
textura material dos pactos. As partes passam a poder eleger, além do foro de
competência para resolução de conflitos, a câmara arbitral ou arbitro que
melhor atenda à natureza do conflito. A ritualística processual alternativa, muito
distinta daquela determinada pelo direito processual e a submissão dos
conflitos ao Judiciário, cinge-se na autorregulação, bastando a opção de
consenso das partes pela arbitragem e eleita através da inclusão da cláusula
compromissária nos contratos, podendo ser feita, ainda, por instrumento em
separado.
Por este percurso, a modulação da autonomia privada apresenta-se
como opção para conjugar limites e condições de possibilidades de forma a
assegurar caminho de condução à metódica do justo meio, condizente com a
proteção da autorregulação equilibrada dos interesses privados dos
contratantes.
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meios materiais e processuais para proteção da parte mais débil na relação
negocial, fazendo a contenção do poder negocial enquanto autorregulação.
Constata-se, neste seguimento, a modulação da autonomia privada
limitando o poder negocial para proteger a parte hipossuficiente, impedida pelo
regime contratual adesivo de expressar o consentimento pleno em relação à
garantia do que contrata e com quem contrata e de conformidade com o
princípio da boa-fé objetiva, em vista da segurança jurídica negocial.
O Art. 3º da Lei de Arbitragem dispõe: “as partes interessadas podem
submeter a solução de seus litígios ao juízo arbitral mediante convenção de
arbitragem, assim entendida a cláusula compromissória e o compromisso
arbitral”.
As “partes interessadas”, como referidas pela dicção do Art. 3º, devem
ser compreendidas somente aquelas que, nos contratos individuais, possam,
livremente, fazer a opção pelo juízo arbitral. Não se afirma com isso que a
arbitragem não possa ser utilizada nos contratos de consumo, o que se discute
é a determinação unilateral da cláusula arbitral em desfavor do aderente e em
decorrência da manifestação de vontade única do contratante que oferta o
contrato, em regra, a parte mais forte.
O Art. 4º da Lei de Arbitragem dispõe:
26
via sentença judicial, com um só árbitro (que pode ser da confiança
do contratante mais forte, ou por este remunerado); logo, se imposta
em contrato de adesão ao consumidor, esta cláusula transforma a
arbitragem “voluntária” em compulsória, por força da aplicação do
processo arbitral previsto na lei”. (2004, p. 635).
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de diferentes graus de especificidade: (i) a regra geral, que obriga a
observância da arbitragem quando pactuada pelas partes, com
derrogação da jurisdição estatal; (ii) a regra específica, contida no art.
4º, § 2º, da Lei nº 9.307/96 e aplicável a contratos de adesão
genéricos, que restringe a eficácia da cláusula compromissória; e (iii)
a regra ainda mais específica, contida no art. 51, VII, do CDC,
incidente sobre contratos derivados de relação de consumo, sejam
eles de adesão ou não, impondo a nulidade de cláusula que
determine a utilização compulsória da arbitragem, ainda que
satisfeitos os requisitos do art. 4º, § 2º, da Lei nº 9.307/96. [...] 4.
Recurso especial a que se nega provimento. REsp 1169841 / RJ
Recurso Especial 2009/0239399-0. Relatora Ministra Nancy Andrighi
.T3 - Publicação:14/11/2012. RDDP vol. 119 p. 171 RIOBDCPC vol.
80 p. 154. Acesso em 02.10.2014.
4. CONCLUSÃO
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O negócio jurídico pode ser conceituado como o instrumento
através do qual podem as partes, através do exercício da autonomia privada,
disciplinar seus interesses, bem como os efeitos práticos e jurídicos
decorrentes, com base nos limites impostos pelo ordenamento.
A circunstância de definir-se negócio jurídico como um ato decorrente da
autonomia privada não significa adesão à teoria preceptiva ou normativa, uma
vez que a autonomia privada nesse caso, refere-se ao espaço deixado às
partes para tão somente estabelecerem o conteúdo e os efeitos da relação
dentro do que permite o ordenamento jurídico. Assim sendo, a possibilidade de
regulamentar interesses nas relações privadas não implica, necessariamente,
na criação de preceitos ou normas individuais.
No modelo liberal, a ideologia pregada era a da ampla liberdade de
iniciativa, tendo por fundamento o respeito à autonomia da vontade, a partir da
plena liberdade concedida aos particulares de regulamentar seus interesses,
através de negócios jurídicos, defendendo-se a ideia da mínima, se não
inexistente, intervenção estatal nas relações privadas, sendo neste contexto a
autonomia da vontade somente limitada pela ordem pública e bons costumes.
Posteriormente, o Estado social, passa a criar limites à autonomia
privada, para que seja atendido o interesse geral e cumprimento dos direitos
sociais, culturais e econômicos.
O percurso histórico do direito negocial revela ter se chegado a um
ponto em que a liberdade ilimitada era capaz de malferir direitos basilares do
sujeito. Nesse ponto, a pouco e pouco foram sendo criados limites à liberdade
negocial, tarefa que coube ao Direito realizar.
Com o surgimento de novos princípios, como o da função social do
contrato, o da boa-fé e o da supremacia da ordem pública, que são princípios
de segunda e terceira geração, a liberdade absoluta, que é um princípio de
primeira geração e decorre dos ideais revolucionários do Séc. XVIII, é posto de
lado.
Isso não significa que a liberdade negocial tenha sido abolida. Ela foi
qualificada, no sentido de ser interpretada à luz da nova principiologia. A
liberdade é um princípio e, por isso, é digna de proteção. O que não se admite
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é a natureza absoluta com que, no passado, tão ao gosto da burguesia, ela foi
sustentada.
Nesse sentido, discute-se a natureza da convenção arbitral à luz da
teoria dos negócios jurídicos, especialmente sua principiologia.
A eleição voluntária do juízo arbitral como meio para solução de
controvérsias, evidencia a modulação da autonomia privada para mais,
assegurando a liberdade e o poder das partes neste sentido, reforçando a
teoria da natureza contratual da arbitragem. A proteção da autonomia privada
está vinculada aos pactos onde a inequívoca manifestação da vontade possa
ser expressa pelas partes, sem quaisquer restrições, tendo por lastro os
princípios da liberdade e da igualdade. A preservação da autonomia privada é
compromisso dos estados democráticos em relação ao respeito aos contratos,
em defesa do trânsito jurídico privado, afastando a tutela rígida e nefasta da
intervenção estatal excessiva. Em relação ao juízo arbitral cabe reconhecer a
extensão em relação à dimensão processual.
Contrário sensu, a imposição do juízo arbitral no contrato de adesão, em
detrimento de parte hipossuficiente exige a modulação da autonomia privada
para menos, observando a impossibilidade do exercício do consentimento
pleno, limitando o campo de poder para impor limites à contraparte,
consideradas as condições e circunstância da proteção indispensável ao
aderente. Sem limitação que tal, o princípio da igualdade e da proteção da
parte débil restariam comprometidos, refletindo-se, no mais das vezes, no
desequilíbrio material das obrigações.
Não há autonomia privada sem limites, como também não há
autonomia privada sem liberdade.
Constituem núcleos fundamentais para assegurar os pilares do contrato,
indispensáveis ao trânsito negocial: o consentimento pleno, a proteção da parte
fragilizada, a efetividade da autonomia privada de ambas as partes, garantia do
conhecimento do que se contrata pautada pela segurança jurídica negocial e
dever de informação, controle da licitude, referência direta à moralidade dos
pactos e organização econômica da sociedade, tarefa constitucional do Estado
implicando em limitar poderes e assegurar tais poderes para resguardar o
respeito e manutenção do contrato, individual ou por adesão, protegendo ou
limitando, por indispensável, a autonomia da vontade e autonomia privada.
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A modulação da autonomia privada permite conjugar limites e condições
de possibilidades, de forma a assegurar a operabilidade metódica, própria da
lógica do justo meio, condizente com a defesa da autorregulação lastreada pela
liberdade e igualdade em benefício dos interesses privados dos contratantes
individuais ou coletivos.
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5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DIDIER JR, Fredie. Curso de direito processual civil: teoria geral do processo e
processo de conhecimento. 12 ed. v 1. Bahia: Editora JusPodivm, 2010.
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____________, Instituciones, Orden Público Y Función Contratual. In
TEPEDINO, G. e FACHIN, L. E. (orgs). Obrigações e Contratos. Coleção
Doutrinas Essenciais. Vol. III. Revista dos Tribunais, 2011.
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RUGGIERO, Roberto de. Instituições de direito civil. Trad. Paolo Capitanio.
Campinas: Bookseller, 1999. v. 1.
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