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ISOLADA COMEÇANDO DO ZERO

PROCESSO CIVIL DE ACORDO COM O NOVO CPC


AULAS 01 E 02

CURSO DE PROCESSO CIVIL


COMEÇANDO DO ZERO

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ISOLADA COMEÇANDO DO ZERO
PROCESSO CIVIL DE ACORDO COM O NOVO CPC
AULAS 01 E 02

JURISDIÇÃO

1. NOÇÕES GERAIS E CONCEITO

O primeiro instituto fundamental do Processo Civil é a jurisdição. Mas, para


entendê-la, é necessário compreender o significado de temas como interesse,
pretensão e lide.
Pois bem, o interesse pode ser definido como o elo que une uma pessoa a
determinado bem. Desde os primórdios das civilizações a relação de interesse entre
pessoas e objeto sempre existiu. O problema é que os bens sempre foram escassos,
existindo em quantitativo menor às pessoas. Daí ser muito comum o conflito de
interesses, representado pela existência de mais de um interesse sobre o mesmo bem
da vida.
Nas civilizações primitivas, todos aqueles que se vissem envolvidos em
conflitos de interesses acabavam por utilizar a força como forma de solver dita
conflituosidade. É o que hoje se denomina “autotutela”.
Num segundo estágio (um pouco mais avançado, portanto), a autotutela fora
paulatinamente substituída pela arbitragem facultativa, ou seja, os conflitos passaram
a ser resolvidos mediante a intervenção de um terceiro, imparcial, devidamente eleito
pelos envolvidos. A doutrina aponta que fora este um “embrião” do sistema
jurisdicional hoje vigente.
Mais à frente, a arbitragem tornou-se obrigatória, sendo que a escolha do
árbitro passou a ser efetuada por um representante Estatal, o qual fixava as condições
e regras processuais a serem seguidas.
Somente com o surgimento do Estado e, posteriormente, do estado de direito
(expressão que indica a divisão de funções precípuas do estado - legislativa, executiva
e jurisdicional - a diversos órgãos, com o fito de evitar a arbitrariedade) tornou-se
latente a necessidade de outorgar a tarefa de solver conflitos de interesses

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intersubjetivos ao Estado, por intermédio dos representantes do poder judiciário


(juízes e tribunais).
Perceba que o Estado passou a ditar as leis (regras de convivência) aos seus
súditos e, acaso houvesse o descumprimento de algum comando normativo,
importando na lesão de direito alheio, nasceria para a vítima a pretensão, definida
como a exigência de submissão do interesse alheio ao próprio.
Se, por exemplo, Maria tivesse a posse de bem imóvel e João viesse invadi-
lo, esbulhando a posse da titular, nasceria para a vítima a pretensão, ou seja, a
exigência de submissão de interesse alheio ao seu. Destarte, se o violador da posse
não desejasse devolvê-lo (resistindo a pretensão de Maria), estaríamos diante de uma
lide, qualificada por uma pretensão resistida.
Ultrapassada a concepção de que a consecução do bem da vida estaria
atrelada ao uso da força pelo pretenso autor, o surgimento do estado de direito acabou
por fazer com que os sistemas de autotutela e arbitragem facultativa cedessem lugar
à modalidade heterônoma de resolução de conflitos, agora atribuída ao poder público,
denominada “jurisdição”.
O termo jurisdição vem das expressões “juris” (direito) e “dictio” (dizer), ou
seja, “dizer o direito”, função hoje pertencente ao Estado, o qual é representando pelo
poder judiciário. O artigo 16 do Código de Processo Civil aponta que “a jurisdição será
exercida pelos juízes e tribunais em todo o território nacional, conforme as disposições
deste Código”.
Definimos, portanto, a jurisdição como sendo “a parcela de poder Estatal que
tem a função de aplicar a lei, com vistas a solucionar as lides que lhe são submetidas.”

2. CARACTERÍSTICAS

Características são atributos, traços marcantes, os quais ensejam a


identificação de um sujeito num dado contexto. Pode-se afirmar que a função
jurisdicional não se confunde com as demais funções exercidas pelo Estado
(legislativa e administrativa), sendo marcada pelos seguintes caracteres:
a) Substitutividade: a jurisdição substitui a atividade das partes em conflito,
pondo a sua vontade acima das mesmas. Se Maria tem um débito para com João, por

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exemplo, não pode este, por força própria, ir até o patrimônio de Maria e retirar bens
para quitar o débito, sob pena de incidir em crime contra a administração da justiça
(artigo 345, CP). É necessário que ele proponha demanda contra a devedora para que
o judiciário (representante da jurisdição), uma vez reconhecido o direito, possa praticar
atos de expropriação dos bens de Maria (veja que o judiciário “substitui” a atividade
de João), com o objetivo de saldar a dívida. O artigo 16 do CPC aponta que “A
jurisdição civil é exercida pelos juízes e pelos tribunais em todo o território nacional,
conforme as disposições deste Código.”
.
b) Inércia: a jurisdição não se movimenta sem prévia provocação. O artigo 2º,
CPC, aponta que “o juiz não prestará a tutela jurisdicional senão quando provocado,
salvo as exceções”. Se fosse permitido ao magistrado iniciar um processo judicial,
certamente que o mesmo não julgaria com base nas provas constantes dos autos,
mas, sim, de acordo com o sentimento que lhe motivou a abrir a relação processual,
comprometendo, por consequência a sua imparcialidade.
c) Imparcialidade: significa que o órgão julgador é o sujeito desinteressado
da relação, não podendo estar pré-intencionado a um dado julgamento. O juiz é
considerado como o sujeito imparcial da relação processual. É justamente por isso
que o legislador disciplinou situações as quais seria impossível ou mesmo
desaconselhável a participação do magistrado em certos processos: são os casos de
impedimentos e suspeição, disciplinados, respectivamente, nos artigos 144 e 145,
CPC.
Perceba, também, que o artigo 139, I, CPC determina, como primeiro dever
do magistrado, “assegurar às partes igualdade de tratamento”.
d) Definitividade: a atividade jurisdicional é marcada pela indiscutibilidade.
Após esgotados os meios recursais e ocorrente o fenômeno da coisa julgada, não há
que se falar em nova discussão daquilo que fora objeto da decisão emitida, salvo
exceções legalmente previstas, tal como ocorre com a ação rescisória, capitulada nos
artigos 966 e seguintes do CPC.
É por isso que, não obstante determinada relação jurídica tenha sido decidida
no âmbito administrativo (ex: discussão quanto à existência de débito tributário), fato
é que a decisão em questão não impossibilita o suposto lesado a socorrer-se da via
jurisdicional para sanar a lesão em questão.

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COMPETÊNCIA

1. DEFINIÇÃO

A jurisdição é a parcela de poder atribuída ao Estado para dizer o direito. Dito


poder é exercido sobre os jurisdicionados de todo o território nacional, por diversos
órgãos do judiciário, motivo pelo qual se faz mister repartir as tarefas, mediante alguns
critérios.
Assim, a competência é definida como o instituto que visa definir o âmbito de
atuação, mediante critérios específicos, dos órgãos encarregados da prestação
jurisdicional.

2. CRITÉRIOS DE FIXAÇÃO DE COMPETÊNCIA: MATERIAL, FUNCIONAL, EM


RAZÃO DO VALOR E TERRITORIAL

Dentre os critérios utilizados pelo nosso sistema jurídico, é preciso destacar:


a) Material: a competência é fixada em razão da natureza da lide posta em
juízo. O CPC estabelece que a competência material será regida mediante normas de
organização judiciária. Assim, é possível que uma lei estadual crie varas
especializadas (vara de família, vara de sucessões, órfãos e interditos, vara de feitos
comerciais, vara de execuções extrajudiciais, etc.) para o julgamento de matérias
específicas.

b) Funcional: diz respeito à função exercida pelo órgão jurisdicional no


processo. O critério atenta tanto para a função dos tribunais quanto para a função dos
juízos de primeiro grau.
Quanto aos tribunais, terão eles competência para funcionar originariamente
(ex: processamento, pelo STF, de mandado de segurança contra ato de Presidente da
República; Processamento, pelo TRF, de mandado de segurança contra ato de juiz

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federal; Mandado de segurança impetrado junto ao TJ contra ato de Governador de


Estado, etc.) ou a nível recursal, também conhecida como “competência hierárquica”
(ex: processamento e julgamento de recurso de apelação pelo TJ ou TRF;
processamento e julgamento de Recurso Especial pelo STJ, etc.). Os tribunais
também terão competência funcional para processar as execuções das causas de sua
competência originária (artigo 516, I, CPC).
Quanto ao juízo de primeiro grau, este terá competência para funcionar
originariamente (a maior parte das ações é de competência originária dos juízos de 1º
grau!), e nas execuções das causas de sua competência pois, ainda que a causa vá
parar nas instâncias superiores, uma vez esgotados os meios recursais, os autos
retornarão ao juízo de origem para o cumprimento de sentença, a teor do preceituado
no artigo 516, II, CPC.
c) Em razão do valor da causa: o valor da causa pode constituir fator
determinante para a fixação de competência. Assim como é possível que norma de
organização judiciária local crie varas especializadas para o conhecimento e
julgamento de causas com matérias específicas (competência material), é, também,
possível a criação de varas com competência para processar e julgar ações de até
certo montante (30, 40, 50 salários, etc.). Tal critério, conforme afirmado, é disciplinado
por normas de organização judiciária.
Cabe, ainda, ressaltar que a Lei federal nº 9.099/95 impôs a criação dos
chamados juizados especiais cíveis, cuja competência leva em consideração, dentre
outros critérios, o valor da causa, o qual não pode ultrapassar o patamar de 40
(quarenta) salários mínimos.
d) Territorial: este critério leva em consideração o exercício da função
jurisdicional segundo a limitação geográfica. Assim, o Supremo Tribunal Federal (STF)
e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) possuem competência para processar
demandas oriundas de todas as partes do país; o Tribunal Regional Federal (TRF)
possui jurisdição sobre alguns estados; o Tribunal de Justiça, por sua vez, possui
jurisdição no respectivo estado.

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As regras relativas à competência territorial dos juízes de primeiro grau foram


fixadas pelo Código de Processo Civil, em seus artigos 46 e seguintes. É importante
atentarmos para as seguintes regras:
 Ação fundada em direito pessoal e a ação fundada em direito real sobre
bens móveis: serão propostas, em regra, no foro do domicílio do réu (art. 46, CPC).
Considerando que, até que seja provado em contrário, ninguém pode ser considerado
culpado, o legislador quis dar a “comodidade” ao réu de responder a demanda em seu
domicílio.
Tendo mais de um domicílio, o réu será demandado no foro de qualquer deles.
Havendo dois ou mais réus, com diferentes domicílios, serão demandados no foro de
qualquer deles, à escolha do autor.
E se o réu não tiver domicílio nem residência no Brasil? neste caso,
excepcionalmente, a ação será proposta no foro do domicílio do autor.
 Ações fundadas em direito real sobre imóveis: é competente o foro da
situação da coisa (art. 47, CPC). Pode o autor, entretanto, optar pelo foro de domicílio
do réu ou pelo foro de eleição se o litígio não recair sobre direito de propriedade,
vizinhança, servidão, divisão e demarcação de terras e de nunciação de obra nova.
A ação possessória imobiliária também será proposta no foro de situação da
coisa, cujo juízo tem competência absoluta (art. 47, § 2o, CPC).

 Ações de inventário, a partilha, a arrecadação, o cumprimento de disposições


de última vontade, impugnação ou anulação de partilha extrajudicial e todas as ações
em que o espólio for réu, ainda que o óbito tenha ocorrido no estrangeiro: serão
propostas no foro do domicílio do autor da herança, no Brasil. Se o autor da herança
não possuía domicílio certo, será competente o foro da situação dos bens; havendo
bens imóveis em foros diferentes, a demanda poderá ser proposta em qualquer
destes. Não havendo bens imóveis, o foro do local de qualquer dos bens do espólio.

 A ação em que o incapaz for réu: será processada perante o foro do


domicílio de seu representante ou assistente (art. 50, CPC).
Aqui o enunciado é bem fácil de ser entendido: a regra geral é a de que a ação
deve ser proposta no foro do domicílio do réu. Pois bem, como o artigo 76, parágrafo
único, do CC preceitua que o domicílio necessário do incapaz é o do seu
representante legal, logo, a ação deve ser proposta no foro do domicílio do

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representante (que acaba sendo, em último caso, o foro do domicílio do réu ou


incapaz).
 Causas em que haja a participação da União: se a mesma estiver na
qualidade de autora, serão aforadas na seção judiciária onde tiver domicílio o réu;
estando na qualidade de ré, poderão ser aforadas na seção judiciária em que for
domiciliado o autor, naquela em que tiver ocorrido o ato ou fato que deu origem à
demanda ou onde esteja situada a coisa, ou ainda, no distrito federal.

 Ação em que se pedem alimentos: será proposta no foro do domicílio ou


da residência do alimentando (art. 53, II, CPC).
Esta regra foi criada tendo em vista a necessidade do alimentando, o qual
teria dificuldades em propor demanda em domicílio distinto do seu.

ATENÇÃO!
Em se tratando de ação de investigação de paternidade cumulada com
alimentos, a competência será da regra especial, ou seja, foro do domicílio do
alimentando (Súmula 1, STJ).

 Ação de reparação do dano: deve ser proposta no lugar do ato ou fato.


 Nas ações de reparação do dano sofrido em razão de delito ou acidente de
veículos, inclusive aeronaves: será competente o foro do domicílio do autor ou do local
do fato (art. 53, V, CPC).
 Ações de divórcio, separação, anulação de casamento e reconhecimento
ou dissolução de união estável: serão propostas no foro de domicílio do guardião de
filho incapaz. Não havendo filho incapaz, a demanda será proposta perante o foro do
último domicílio do casal. Se nenhuma das partes residir no antigo domicílio do casal,
será proposta no foro do domicílio do réu (art. 53, I, alíneas “a”, “b” e “c”, CPC). Em se
tratando de ação movida por vítima de violência doméstica e familiar, nos termos da
Lei nº 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), deverá a mesma ser proposta no foro do seu
domicílio. É o que dispõe o artigo 53, I, “d”, com redação dada pela Lei nº 13.894/2019.

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3. REGIME JURÍDICO: COMPETÊNCIA ABSOLUTA E RELATIVA

Cabe ressaltar, primeiramente, que os critérios de fixação de competência,


tratados no item anterior, foram criados com um dos seguintes objetivos: 1) proteção
do interesse público, no sentido de proporcionar uma melhor organização e divisão
de tarefas entre os diversos órgãos do judiciário; 2) proteção do interesse privado
da parte, no sentido de dar comodidade àquele que necessite, quando tiver de
propor/responder a uma demanda.
No primeiro caso, o legislador utilizou os critérios material e funcional para o
atendimento do interesse público; no segundo, valeu-se dos critérios em razão do
valor e território para a consecução do interesse particular.
Os critérios eleitos para o atendimento do interesse público (material e
funcional) são absolutos, no sentido de serem atendidos, queiram ou não as partes,
sob pena de nulidade processual. Outrossim, os critérios eleitos para o atendimento
do interesse privado das partes (valor da causa e território) são relativos, no sentido
de que, se não forem atendidos de imediato, poderão ser relevados ou deixados de
lado.
Feitas estas considerações preliminares, notamos que o regime jurídico
acerca da competência irá variar conforme a sua natureza.
Sendo relativa, a infração da regra de competência deve ser alegada pela
parte, sob pena de preclusão e consequente prorrogação de competência, tornando-
se competente o juízo que, até então, não o era (Súmula 33, STJ). O réu arguirá o
vício na própria contestação, através de preliminar (arts. 64 e 337, II, CPC).
Questão interessante é a que diz respeito à cláusula de eleição de foro. Nos
contratos em geral (independentemente de ter natureza de adesão!) haverá a
possibilidade de o magistrado declarar a sua incompetência territorial quando se
deparar com cláusula abusiva de eleição de foro, remetendo os autos para o foro do
domicílio do réu. Tal declaração, entretanto, deverá ser feita ANTES da citação. Se a
citação JÁ FOI realizada, caberá ao réu alegar a abusividade, sob pena de preclusão
(art. 63, §§ 3o e 4º do CPC). A incompetência territorial também poderá ser declarada

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de ofício no âmbito dos juizados especiais cíveis, a teor do disposto no enunciado 89


do Fórum Nacional do Juizados Especiais (FONAJE).
A infração à regra de competência de natureza absoluta (em razão da matéria
ou hierarquia), por estar apoiada em regras de ordem pública, acaba por gerar vício
insanável, o qual poderá ser arguido a qualquer tempo e grau de jurisdição (ex oficio
ou mediante preliminar de contestação). É mister salientar, inclusive, que, não sendo
o vício declarado pelo juiz ou arguido pelas partes, a coisa julgada não terá o condão
de estabilizar-se. É que o artigo 966, II, CPC autoriza a instauração de rescisória na
hipótese de incompetência absoluta.

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