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DIREITO CIVIL II

PLANO DE VALIDADE
Prof. PEDRO ANTONIO RIBEIRODE ANDRADE
DEFEITOSDO NEGÓCIO JURÍDICO: DOLO

COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. IMÓVEL OCUPADO POR TERCEIRO E COM


DÉBITOS FISCAIS. OMISSÃO DOLOSA DO PROMITENTE VENDEDOR QUANTO A
ESSES ASPECTOS. ART. 147, DO CC/02. ANULAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO POR
DOLO SUBSTANCIAL (ART. 145, DO CC/02). INDENIZAÇÃO. DIREITO. I- Ação de
anulação do negócio jurídico, cumulada com o ressarcimento da quantia paga. Compromisso de
Compra e Venda de um terreno em Angra dos Reis, ocupado por terceiro e com débitos fiscais. II-
Acervo probatório que corrobora a tese autoral, no sentido de que houve silêncio sobre tais
informações no momento da contratação. Silêncio intencional de uma das partes quanto a aspecto
relevante do contrato, que configura dolo, na forma do art. 145, do Código Civil. III- Desprezo ao
princípio da boa fé e silêncio sobre circunstância que a natureza do negócio exigia fosse
conhecida, que impõe a anulação do contrato e a restituição do valor comprovadamente pago. IV-
Danos morais caracterizados. Conduta que afronta a legítima expectativa criada no promitente
comprador. V - indenização fixada em obediência ao critério do lógico-razoável, não merecendo
modificação. VI - Recurso a que nega seguimento, nos moldes do art. 557, caput, do C.P.C.(TJ-RJ
- APL: 00156305420048190066 RJ 0015630-54.2004.8.19.0066, Relator: DES. RICARDO
COUTO DE CASTRO, Data de Julgamento: 09/10/2014, SÉTIMA CAMARA CIVEL, Data de
Publicação: 13/10/2014 00:00)

1. CONCEITO
Segundo CLÓVIS BEVILÁQUA, “dolo é o emprego de um artifício ou expediente astucioso para induzir
alguém à prática de um ato que o prejudica e aproveita ao autor do dolo ou a terceiro. Consiste em sugestões ou
manobras maliciosamente levadas a efeito por uma parte, a fim de conseguir da outra uma emissão de vontade que
lhe traga proveito, ou a terceiro”. Essa manobra astuciosa (macchinatio) pode sugerir o falso ou suprimir o
verídico, mediante mentiras (allegatiofalsi) ou omissões. Já Carvalho Santos e Larenz não concordam com a
referência ao prejuízo como elemento conceitual do dolo, sendo suficiente para sua configuração que haja um
artifício que induz alguém a efetuar negócio jurídico, que de outra maneira não seria realizado, sem que,
necessariamente, tenha o propósito de causar dano ao enganado, pois a lei civil aplicável ao caso não protege o
patrimônio, mas a liberdade de decisão.
Parece-nos, contudo que a razão está com Clóvis, pois além de que, na prática, ocorre uma
correspondência entre a vantagem auferida pelo autor do dolo e um prejuízo patrimonial sofrido pela outra parte,
há, virtualmente, um prejuízo moral pelo simples fato de alguém ser induzido a efetivar negócio jurídico por
manobras maliciosas que afetaram sua vontade. (DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 28 ed.
São Paulo: Saraiva, p. 497)
Para FLÁVIO TARTUCE “O dolo pode ser conceituado como sendo o artifício ardiloso empregado para
enganar alguém, com o intuito de benefício próprio. Segundo ORLANDO GOMES “o dolo consiste em manobras ou
maquinações efetuadas com o propósito de obter uma declaração de vontade que não seria emitida se o declarante
não fosse enganado”.

DOLO é diferente de ERRO

No dolo a ideia falsa resulta de malícia alheia, em prejuízo do outro contratante. Ao passo que no erro a
ideia falsa é do próprio agente.
O dolo difere do erro porque este é espontâneo, no sentido de que a vítima se engana sozinha, enquanto o
dolo é provocado intencionalmente pela outra parte ou por terceiro, fazendo que aquela também se equivoca.

DOLO CIVIL é diferente de DOLO CRIMINAL

O dolo civil não se confunde com o dolo criminal, que a intenção de praticar um ato que se sabe contrário
à lei. No Direito Penal, diz-se doloso o crime quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo
(Art. 18, I). Dolo civil, em sentido amplo, é todo artifício empregado para enganar.
Também não se pode confundir o dolo-víciodo negócio jurídico com o dolo da responsabilidade civil:

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Dolo - Responsabilidade Civil Dolo - Vício do Negócio
Não está relacionada com um negócio jurídico, não Está relacionado com um negócio jurídico, sendo a única causa da
gerando qualquer anulabilidade. sua celebração (dolo essencial).
Se eventualmente atingir um negócio, gera somente o Sendo o dolo essencial ao ato, causará a sua anulabilidade, nos
dever de pagar perdas e danos, devendo ser tratado como dolo termos do artigo 171, II, do CC, desdeque proposta ação no prazo de 4
acidental (art. 146 do CC) anos da celebração de negócio, pelo interessado (Art. 178, II, do CC)

2. ESPÉCIESDE DOLO
2.1. DOLOPRINCIPAL
Dispõe o Art. 145 do CC/02:
Art. 145. São os negócios jurídicos anuláveis por dolo, quando este for a sua causa.
Somente o dolo principal, como causa determinante da declaração de vontade, vicia o negócio
jurídico. O dolo principal configura-se quando o negócio é realizado somente porque houve induzimento malicioso
de uma das partes. Não fosse o convencimento astucioso e a manobra insidiosa, a avença não se teria concretizado.
Segundo DANIEL EDUARDO CARNACCHIONI “é aquele capaz de ser a causa do negócio jurídico, sem o
qual este não se teria concluído. Atinge essencialmente o consentimento.”
Exemplo1: Uma pessoa, proprietária de umimóvel, o qual não está a venda, acaba sendo convencida a
vendê-lo por valor abaixo do que realmente vale, isto porque o comprador, agindo ardilosamente, a fez acreditar
que ao lado do imóvel seria construído um cemitério, quando na realidade tal fato não era verdade.
Neste caso a venda não teria sido realizada se o comprador não tivesse se utilizado de ardil para enganar a
vendedora, logo o dolo presente é principal, o que enseja a anulação do negócio jurídico.
Exemplo2: sujeito pretende adquirir uma motocicleta preta metálica e quando a recebe percebe que, foi
enganado pelo vendedor que entregou uma de cor azul escuro. O dolo seria principal, porque o comprador só se
interessaria pela cor preta metálica.
2.2 DOLO ACIDENTAL
Dispõe o Art. 146, do CC/02:
Art. 146. O dolo acidental só obriga à satisfação das perdas e danos, e é acidental quando, a seu
despeito, o negócio seria realizado, embora por outro modo.
Dolo acidental é o artifício empreendido despido do poder de alterar o consentimento da vítima, cuja
pessoa, de qualquer maneira, teria celebrado o negócio, embora de maneira diversa, razãopela qual obriga apenas à
satisfação das perdas e danos.
Acidental é o dolo que, a seu despeito, o negócio se realizaria embora de outro modo, ou seja, o
doloacidental, diferentemente do principal, não é causa determinante para a realização do negócio, pois
independentemente doseu implemento o negócio se realizaria. Entretanto, se o vício, namodalidade acidental, for
implementado, o negócio se realiza de modo menos vantajoso para o declarante.
O negócio seria realizado independentemente da malícia empregada pela outra parte ou por terceiro,
porém em condições favoráveis ao agente. Por esta razão, o dolo acidental não vicia o negócio e só obriga à
satisfação das perdas e danos.
Exemplo1: Uma pessoa, proprietária do imóvel, o qual está à venda, acaba sendo convencida a vendê-lo
por valor abaixo do que realmente vale, isto porque o comprador agindo ardilosamente, a fez acreditar que ao lado
do imóvel seria construído um cemitério, quando na realidade tal fato não era verdade.
Pode-se até pensar que este exemplo é semelhante ao anterior quando se explicou dolo principal. No
entanto, existe um fator fundamental que diferencia um do outro. No exemplo acerca do dolo principal, não era
intenção do declarante vender o imóvel, o que se fez apenas por força do dolo principal implementado pela outra
parte. Note-se que no exemplo dado acerca do dolo acidental, o imóvel está à venda, logo o declarante venderia
ainda que não fosse implementado o dolo que o fez vender por valor inferior ao real, o que lhe dá direito, não de
anular o negócio, mas a ser ressarcido pelas perdas e danos.
Exemplo2: imagine que eu pretenda lhe vender um carro e afirme que o carro tem determinadas
características. O comprador se interessa pelo veículo e pergunta se o mesmo pode ser entregue em Ariquemes. O
vendedor fala que é possível fazer a entrega, mas chega no dia seguinte e a entrega não é feita, sendo que o
vendedor já sabia que não seria possível. A depender da analise do caso concreto esse dolo pode ser meramente

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acidental, pois o carro ainda pertence ao comprador, que terá, por exemplo, que mandar alguém buscar o carro na
outra cidade e pleitear perdas e danos do vendedor.
2.3. DOLO NEGATIVOOU OMISSIVO
Dispõe o Art. 147, do CC/02:
Art. 147. Nos negócios jurídicos bilaterais, o silêncio intencional de uma das partes a respeito de fato
ou qualidade que a outra parte haja ignorado, constitui omissão dolosa, provando-se que sem ela o negócio não
se teria celebrado.
Dolo negativo (ou omissivo) é o dolo praticado por omissão (conduta negativa), situação em que um dos
negociantes ou contratantes é prejudicado. Também é conhecido por reticência acidental ou omissão dolosa.
Exemplo ocorre nas vendas de apartamentos decorados, em que não se revela ao comprador que os móveis são
feitos sob medida, induzindo-o a erro (publicidade enganosa por omissão). O art. 147 do CC traz previsão expressa
quanto à omissão dolosa, caracterizada por eventual silêncio intencional de uma das partes, a respeito de fato ou
qualidade que a outra ignorava. Para a caracterização desse dolo omissivo é preciso que o prejudicado prove que
não celebraria o negócio se a omissão não ocorresse.
Tal dispositivo encontra estribo no Princípio da Boa-fé nos Contratos, que encontra letra legal no Art. 422
que dispõe: “Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução,
os princípios de probidade e boa-fé”.

COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. IMÓVEL OCUPADO POR TERCEIRO E COM DÉBITOS FISCAIS. OMISSÃO
DOLOSA DO PROMITENTE VENDEDOR QUANTO A ESSES ASPECTOS. ART. 147, DO CC/02. ANULAÇÃO DO NEGÓCIO
JURÍDICO POR DOLO SUBSTANCIAL (ART. 145, DO CC/02). INDENIZAÇÃO. DIREITO. I- Ação de anulação do negócio jurídico,
cumulada com o ressarcimento da quantia paga. Compromisso de Compra e Venda de um terreno em Angra dos Reis, ocupado por terceiro e
com débitos fiscais. II- Acervo probatório que corrobora a tese autoral, no sentido de que houve silêncio sobre tais informações no momento
da contratação. Silêncio intencional de uma das partes quanto a aspecto relevante do contrato, que configura dolo, na forma do art. 145, do
Código Civil. III- Desprezo ao princípio da boa fé e silêncio sobre circunstância que a natureza do negócio exigia fosse conhecida, que
impõe a anulação do contrato e a restituição do valor comprovadamente pago. IV- Danos morais caracterizados. Conduta que afronta a
legítima expectativa criada no promitente comprador. V - Indenização fixada em obediência ao critério do lógico-razoável, não merecendo
modificação. VI- Recurso a que nega seguimento, nos moldes do art. 557, caput, do C.P.C.(TJ-RJ - APL: 00156305420048190066 RJ
0015630-54.2004.8.19.0066, Relator: DES. RICARDO COUTO DE CASTRO, Data de Julgamento: 09/10/2014, SÉTIMA CAMARA
CIVEL, Data de Publicação: 13/10/2014 00:00)

Na Lição de HARILSONDA SILVA ARAÚJO, “como exemplo, tomo-se a seguinte situação: Titus outorga
poderes a Crasso para que este realiza a compra de um cavalo cujo valor pensa ser R$ 10.000,00, o negócio a ser
realizado com Fúlvio. Ao encontrar Fúlvio, Crasso entrega-lhe um cheque de Titus no valor de R$ 10.000,00.
Entretanto, o valor do animal não é R$ 10.000,00, mas R$ 7.000,00. Mesmo assim, Fúlvio, maliciosamente omite
tal fato e recebe o pagamento. Neste caso, a conduta de Fúlvio, maliciosamente omite tal fato e recebe o
pagamento. Neste caso, a conduta de Fúlvio foi intencionalmente a de omitir o fato do preço do animal ser menor
para receber o pagamento a maior. Neste sentido a jurisprudência já decidiu que “O silêncio intencional em relação
ao exato valor dos bens, não conhecido do vendedor, constitui omissão dolosa, que autoriza a anulação do
contrato.
2.4. DOLO POSITIVOOU COMISSIVO
Dolo positivo (ou comissivo) é o dolo praticado por ação (conduta positiva). Exemplo é a publicidade
enganosa por ação: alguém faz um anúncio em revista de grande circulação pela qual um carro tem determinado
acessório, mas quando o comprador o adquire percebe que o acessório não está presente.
2.5. DOLODE TERCEIRO
Dispõe o Art. 149, do CC/02:
Art. 148. Pode também ser anulado o negócio jurídico por dolo de terceiro, se a parte a quem aproveite
dele tivesse ou devesse ter conhecimento; em caso contrário, ainda que subsista o negócio jurídico, o terceiro
responderá por todas as perdas e danos da parte a quem ludibriou.
Na didática de HARILSONDA SILVA ARAÚJO, “a ação dolosa que vicia o negócio pode ser praticada por
um dos negociantes ou por terceira pessoa estranha ao negócio. A solução nos caos em que o dolo foi
implementado por terceiro, leva emconsideração a ciência daquele que se beneficiou com o dolo, em relação à
conduta do terceiro que o implementou.
a) Beneficiado ciente do dolo de terceiro

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Nos termos do dispositivo citado, o negócio é anulável se o dolo é praticado por terceiro em relação a
uma das partes e a outra, que dele se beneficia, sabe ou devesse saber do seu implemento.
Exemplo de caso em que o dolo de terceiro enseja a anulação do negócio é o seguinte: Mélvio(M) é
convencido por Tício (3º), que age maliciosamente e em combinação com Crasso (C), a vender para este um
terreno que não estava à venda e ainda por preço inferior ao realmente atribuído ao bem. Neste caso nasce para
Mélvio(M) o direito de anular o negócio.

ANULAÇÃO O terceiro (3º)


“C” comprou
casa de por meio de
“M”ciente DOLOfez “M”
doDOLO do vender imóvel
terceiro (3º) a “A”

C Negócio Jurídico M

CIÊNCIA DOLO


TÍCIO
b) Beneficiado sem ciência do dolo de terceiro
Se o dolo é praticado por terceiro e aquele que dele se beneficia não sabe ou não devia saber do seu
implemento, o negócio não é anulado, restará mantido, nascendo para a vítima do dolo o direito de ressarcimento
por perdas e danos contra o terceiro implementador do vício.
Como exemplo temos a seguinte situação: Mélvio é convencido por Tício, que age maliciosamente,
avender para Crasso um terreno que não estava à venda e ainda por preço inferior ao realmente atribuído ao bem.
Tal negociação foi realizada sem que Crasso soubesse da ação dolosa de Tício. Neste caso, frente à boa-fé de
Crasso, Mélvio não poderá anular o negócio, tendo direito apenas a exigir de Tício ressarcimento por perdas e
danos.

O terceiro (3º)
“C” comprou por meio de
casa de “M”.“C” DOLOfez “M”
Não está ciente vender imóvel
do DOLO do a “A”
terceiro do (3º)
C Negócio Jurídico M

NÃO TEM DOLO


CIÊNCIA DO
DOLO

PERDAS E DANOS


TÍCIO

2.6. DOLO PRATICADO PELO REPRESENTANTEDA PARTE


Dispõe o Art. 149, do CC/02:

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Art. 149. O dolo do representante legal de uma das partes só obriga o representado a responder
civilmente até a importância do proveito que teve; se, porém, o dolo for do representante convencional, o
representado responderá solidariamente com ele por perdas e danos.
A manifestação de vontade pode ser feita pessoalmente pelo declarante ou por uma pessoa com poderes
para isto, chamada de representante ou mandatária.
A representação pode se dar por força determinante dalei (representante legal) ou por vontade do
representado que voluntariamente outorgar poderes a alguém para representá-lo (representação convencionada).
Existe o dolo praticado pelo representante legal e o dolo praticado pelo representante convencional.
a) Dolo do representante legal
Se o dolo é praticado pelo representante legal (pai, tutor, curador) o representado responde até o limite do
benefício que auferiu com a ação dolosa do seu representante.
Assim, se o tutor, agindo em nome de seu tutelado, implementando dolo para ludibriar pessoa com quem
celebra negócio jurídico, transmite para o representado benefício na proporção de 20% do prejuízo causado ao
ludibriado, este só poderá exigir do representado o ressarcimento pelos prejuízos no limite do seu proveito, ou seja,
20% do prejuízo que sofreu.
Tal regra respeita o fato de que, na representação legal não é o representado quem escolhe a pessoa de seu
representante, logo, não se podia atribuir culpa in eligendo sobre ele, haja vista que não foi a sua escolha que
definiu a pessoa que, lhe representando agiu dolosamente. Assim, nada mais justo do que limitar a responsabilidade
do representado ao limite de seus proveitos com a ação dolosa de seu representante, motivo pelo qual se ele em
nada se beneficiar, por nada responderá a título de ressarcimento.
Exemplo: O pai de Augusto, seu representante legal, vende o apartamento que Augusto herdou da mãe,
e que é barulhento, afirmando para o comprador que o local era silencioso. Imaginemos que todos os requisitos
configuradores do dolo estão presentes. O comprador; um jornalista, deixa de escrever um artigo, pelo qual teria
recebido R$ 1.000,00. Se o ato vier a ser anulado, e o preço restituído ao jornalista, seu direito à indenização pelo
prejuízo material que sofreu dependerá de que Augusto tenha obtido algum proveito com o negócio desfeito. Por
exemplo, se até a anulação do ato o preço recebido tiver rendido a Augusto R$ 900,00 (em razão da aplicação em
um fundo de investimento), Augusto terá de indenizar esse montante (lucro que teve com o negócio) ao jornalista.
b) Dolo do representante convencional
Se o dolo é praticado pelo representante convencional (mandatário) o representado responde
solidariamente1 com ele pelas perdas e danos causados à parte inocente.
Assim, se o mandatário que recebe aoutorga de poderes mediante procuração, no exercício regular do
mandato, ou seja, arguindo em nome do mandante (representado) sem exceder os poderes outorgados, procede com
dolo nos negócios realizados com terceiros, estes poderão exigir tanto do representante (mandatário) quanto do
representado (mandatário) quanto do representado (mandante) a responsabilidade integral pelos prejuízos sofridos.
Aqui leva-se em conta a responsabilidade do representado na escolha do seu representante e fiscalização
de sua ações. Ora, se podendo escolher a pessoa que irá lhe representar, o representado escolhe mal, outorgando
poderes à pessoa de índole ardilosa, e não é diligente quanto saber das ações do mesmo, certa é a solução legal para
estas situações.Neste sentido, SÍLVIO VENOSA esclarece que “Desse modo, a culpa in eligendoou in vigilando do
representado deve ter por consequência responsabilizá-lo solidariamente pela reparação do dano...”.

2.7.DOLO RECÍPROCOOU BILATERAL


Dispõe o Art. 150, do CC/02:
Art. 150. Se ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo para anular o negócio, ou
reclamar indenização.
Dolo recíproco ou bilateral – é a situação em que ambas as partes agem dolosamente, um tentando
prejudicar o outro mediante o emprego de artifícios ardilosos. Em regra, haverá uma consagração da regra pela qual
ninguém pode beneficiar-se da própria torpeza (Nemo auditurpropriamturpitudinemallegans), inclusive se
presente de forma recíproca. Segundo o Art. 150 do CC/2002, não podem as partes alegar os dolos concorrentes,

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Solidária é a responsabilidade que pode ser exigida no todo ou em parte de qualquer um dos responsabilizados, pois todos respondem
igualmente pela integralidade da obrigação

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permanecendo incólume o negócio jurídico celebrado, não cabendo inclusive qualquer indenização a título de
perdas e danos. Exemplificando, se duas ou mais pessoas agirem com dolo, tentando assim se beneficiar de uma
compra e venda, o ato não poderá ser anulado. O dolo bilateral (de ambas as partes) é também denominado
dolocompensado ou doloenantiomórfico.
Flamulando os princípios de direito erigidos pelos romanos no sentido de que Nemo
auditurpropriamtupitinemallegans (“ninguém será ouvido, quando alega própria torpeza”) e si duo dolo malo
fecerint, invicem de dolo non agent (“se duas pessoas agissem comdolo mau, não podiam agir com ação de dolo
uma contra a outra”).
Tal disposição(Art. 150) não pode ser entendida como compensação de dolo. Em verdade a lei vem
desprezar a conduta dolosa de ambas as partes, pois caso tal alegação fosse admitida, a anulação do negócio em
desfavor de uma das partes estaria acolhendo o dolo da outra o que em direito é inadmissível.
JOÃO MANUELDE CARVALHO SANTOS, citado por CARLOS ROBERTO GONÇALVES, ensina que tal regar
se aplica ainda que os dolos implementados por cada uma das partes sejam de natureza diversa, ou seja, não
importa se uma agiu comdolo principal e a outra com dolo acidental, pois ambas sãoespécies de dolo execradas
pela lei, que ilidem qualquer boa-fé.
2.8. DOLO BONUS
Dolusbonus (dolo bom) – pode ser concebido em dois sentidos. Inicialmente, é o dolo tolerável, aceito
inclusive nos meios comerciais. São exageros feitos pelo comerciante ou vendedor em relação às qualidades de um
bem que está sendo vendido, mas que não têm a finalidade de prejudicar o comprador. O negócio em que está
presente esta modalidade de dolo não é passível de anulação, desde que não venha a enganar o consumidor,
mediante publicidade enganosa, prática abusiva vedada pelo Art. 37, § 1º, da Lei 8078/1990 (Código de Defesa de
Consumidor). Em suma, a lábia do comerciante, inicialmente, é exemplo de dolusbonus. Entretanto, se o vendedor
utilizar artifícios de má-fé para enganar o consumidor, o ato poderá ser anulado. Por outro lado, haverá também
dolusbonus no caso de uma conduta que visa a trazer vantagens a outrem, como por exemplo, a de oferecer um
remédio a alguém alegando ser um suco, para curar essa pessoa, caso em que também não se pode falar em
anulabilidade. Pode-se citar, ainda, como exemplo que se enquadra nos dois conceitos, o espelho colocado em uma
loja, que emagrece o comprador. Trata-se de um artifício tolerável que faz até bem à pessoa.
Obs: o direito romano consagrou clássica distinção entre dolusbonus e dolusmalus, que traduz o artifício,
o engodo, o ardil. O dolusbonus não invalida o negócio, porque não é defeito, sendo socialmente aceito (consiste no
fato de um vendedor elogiar exageradamente o seu produto, realçando em demasia suas qualidades, não atuando de
forma maliciosa. Não pode extrapolar o limite do razoável. São exemplos as técnicas publicitárias possíveis, como
nas propagandas de creme dental, de shampoo).

2.9. DOLO MALUS


Dolusmalus(dolo mau) – este sim consiste em ações astuciosas ou maliciosas com o objetivo de enganar
alguém e lhe causar prejuízo. Quando se tem o dolo mau, o negócio jurídico poderá ser anulado se houver prejuízo
ao induzido e benefício ao autor do dolo ou a terceiro. Como ressaltado, exemplo ocorre na publicidade enganosa
(Art. 37, §1º, CDC), seja ela por ação ou por omissão, em que se promete uma vantagem decorrente de um produto
que o consumidor não recebe após a compra.

BIBLIOGRAFIA

CARNACCHIONI, Daniel Eduardo. Curso de Direito Civil. Institutos Fundamentais. 1ª ed. Rio de Janeiro
LumemJuris. 2011.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 18 ed. vol. I. São Paulo: Saraiva, 2010.

FIUZA, Cesar. Direito Civil. Direito Civil, Curso completo.17 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. 11 ed. vol. I. São Paulo:
Saraiva, 2010.

MEIRELLES, Ana. PAMPLONA, Rodolfo. Tutela Jurídica do Nascituro à Luz da Constituição Federal. Texto
extraído do EVOCATI Revista.
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O Estudo da Sabedoria Nunca Termina. Ao estudo da sabedoria jamais havereis de pôr termo; não
acabe ele antes de acabada a vossa vida. Em três coisas cumpre ao homem pensar e exercitar-se
enquanto viva: em saber bem, em bem falar e em bem obrar.Desterra dos teus estudos a arrogância;
não fiques presumido pelo que sabes, porque tudo quando sabe o mais sábio homem do mundo nada é
em comparação com o muito que lhe falta saber. Mui escasso é, e muito obscuro e incerto, tudo
quanto os homens alcançam nesta vida; e os nossos entendimentos, detidos e presos neste cárcere do
corpo, estão oprimidos por grandíssima escuridão, trevas e ignorância, e o corte ou fio do engenho é
tão cego que não pode cortar, nem passar-lhe de raspão sequer, coisa alguma.Afora isto, a
arrogância faz com que não possas tirar proveito do estudo; creio que terá havido muitos que não
chegaram a sábios e que poderiam tê-lo sido se não dessem a entender que já o eram.Deveis guardar-
vos, também, de porfias, de competências, de menosprezar ou amesquinhar o que os outros sabem ou
não sabem, de desejar vanglórias. Para isto, principalmente, servem os estudos: para nos ensinarem
a fugir de tais vícios e de outros semelhantes.

Juan Luis Vives, in "Introdução à Sabedoria"

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