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DIREITO CIVIL I

Prof. PEDRO ANTONIO RIBEIRO DE ANDRADE


PLANO DE VALIDADE
DEFEITOS DO NEGÓCIO JURÍDICO
CONCEITO

Na lição de DANIEL EDUARDO CARNACHIONI “O pressuposto fundamental do negócio Jurídico é a


declaração ou exteriorização consciente da vontade do agente, em conformidade com a norma legal. No negócio
Jurídico, os efeitos jurídicos são escolhidos pelos agentes em razão da autonomia privada (o negócio jurídico é o
instrumento da autonomia privada). A autonomia privada é o poder da vontade".
A validade do negócio jurídico depende da exteriorização de uma vontade sem vícios e completamente
livre. Os vícios incidentes sobre a vontade são regulados pelo Código Civil sob a denominação de “defeitos do
negócio jurídico”. Tais “defeitos” estão relacionados a um momento específico do negócio jurídico, qual seja, a
formação ou a origem do negócio jurídico.
Os defeitos do negócio jurídico são causas contemporâneas ou anteriores à formação do negócio jurídico.
Integram o plano de validade do negócio jurídico e, caso haja a caracterização de alguns desses defeitos, podem
levar à invalidação do negócio jurídico. Portanto, “defeitos” ou “vícios” do negócio jurídico atuam no plano da
validade.
O negócio jurídico poderá ser invalidado se o vício ou defeito for contemporâneo ou anterior à origem do
negócio. Se o vício ou defeito for superveniente à formação do negócio, não é a parte geral a responsável em tutelar
a situação e sim a teoria do inadimplemento tratada na parte especial (obrigações).
Há duas categorias de “defeitos” ou “vícios” capazes de prejudicar a validade do negócio jurídico: os
primeiros prejudicam a própria manifestação ou exteriorização da vontade, perturbando a sua elaboração. Estes
atuam, intensamente, sobre o próprio consentimento. Portanto, são denominados de VÍCIOS DE CONSENTIMENTO,
influem no momento em que se exterioriza a deliberação do agente.
Os demais defeitos repercutem diretamente no negócio jurídico, mas retratam a desconformidade do
resultado com o imperativo da lei. Nessas situações, como é o caso da FRAUDE CONTRA CREDORES e da
SIMULAÇÃO (atualmente na teoria das invalidades), o negócio reflete a vontade real dos agentes. Estes, desde o
início, visam exteriorizar a vontade em direção contrária e oposta ao mandamento legal.
Nessa segunda hipótese, não há divergência entre a vontade real e a exteriorizada, mas sim entre a
vontade do agente e a ordem legal. Estes são os denominados VÍCIOS SOCIAIS, porque não há desarmonia entre o
querer do agente e a sua manifestação externa, mas uma violação ou não cumprimento das exigências legais, no
que tange ao resultado desejado.
Tanto os vícios de consentimento quanto os vícios sociais formam a “teoria dos defeitos dos negócios
jurídicos”.
O fundamento do negócio jurídico é a vontade. Esta exteriorizada sem vícios e de forma livre, por meio
de uma declaração, produz o nascimento, a modificação ou a extinção das relações jurídicas.
Nas lições de FRANCISCO AMARAL, defeitos do negócio jurídico são as imperfeições que nele podem
surgir, decorrentes de anomalias na formação da vontade ou na sua declaração.
Concluindo, se a declaração de vontade for compatível com a vontade íntima ou desejada e também
com o ordenamento jurídico, o negócio é válido e apto a produzir efeitos jurídicos pretendidos. Se houver
divergência da vontade íntima com a declarada ou a norma legal, o negócio jurídico será defeituoso.
O desequilíbrio na atuação da vontade relativamente à própria declaração (como ela se exterioriza) –
vícios relacionados ao consentimento – ou às exigências da ordem legal – vícios sociais, podem invalidar o negócio
jurídico.
O atual Código Civil alterou a sistemática em relação aos defeitos do negócio jurídico. Além de
incorporar ao sistema dois novos “vícios”, quais sejam, a LESÃO e o ESTADO DE PERIGO, ainda passou a
considerar a simulação como causa de nulidade e não mais de anulação. A simulação continua sendo um gravíssimo
defeito ou vício relacionado à origem ou ao processo de formação do negócio jurídico. Também é causa de
invalidação. No entanto, o atual Código Civil apenas alterou o regime jurídico da simulação. Agora, tal defeito se
submete ao regime jurídico das nulidades e não da anulação.

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No Código Civil de 1916, a sanção era mais branda, pois a simulação apenas violava interesse privado
e, por isso, era causa de anulação, dependendo de requerimento do interessado ou prejudicado. No atual sistema, a
simulação viola o interesse público e, por conta disso, é causa de nulidade, podendo ser reconhecida de ofício
pelo juiz. Por isso, houve significativa mudança na simulação em relação à sanção prevista na lei.
O fato de a simulação estar no capítulo da teoria das invalidades e não no capítulo dos defeitos do
negócio jurídico não retira da simulação a condição de ser um vício ou defeito do negócio jurídico. Agora, passa a
ser considerado vício tão grave, causa de nulidade do negócio jurídico simulado em qualquer circunstância (Art.
167 do CC/02).
São VÍCIOS DE CONSENTIMENTO (há um descompasso entre a vontade íntima e a manifestada)
a) ERRO (nulidade relativa);
b) DOLO (nulidade relativa);
c) COAÇÃO (nulidade relativa);
d) LESÃO (nulidade relativa);
e) ESTADO DE PERIGO (nulidade relativa).
Ao se enganar (ERRO); ao ser maliciosamente enganado (DOLO); ao ser obrigado (COAÇÃO); ao agir por
necessidade de salvar-se ou a familiar e ainda em alguns casos de terceiros, assumindo prestação por demais
onerosa (ESTADO DE PERIGO); ao agir por necessidade ou inexperiência contratando com desproporção
prestacional que lhe seja prejudicial (LESÃO), o agente teve o seu consentimento viciado, o que impediu que sua
declaração de vontade refletisse realmente o que desejava manifestar. Nessas situações o negócio é defeituoso pela
presença de Vícios de consentimento.
São VÍCIOS SOCIAIS, (não há descompasso ou divergência entre o íntimo querer do agente e a sua
declaração, mas é exteriorizada com a intenção de prejudicar terceiros):

a) SIMULAÇÃO (nulidade absoluta); e


b) FRAUDE CONTRA CREDORES (nulidade relativa).
Na mesma linha, se a vontade foi manifestada conscientemente ou presumidamente com o intuito de
prejudicar terceiros credores do declarante (FRAUDE CONTRA CREDORES) ou enganar fazendo parecer real algo
que em verdade não é (SIMULAÇÃO), ter-se-á um negócio defeituoso pela presença de VÍCIOS SOCIAIS.
Segundo CARLOS ROBERTO GONÇALVES “os defeitos do negócio jurídico, exceto a fraude contra credores
e a simulação, são chamados de vícios do consentimento porque provocam uma manifestação de vontade não
correspondente com o íntimo e verdadeiro querer do agente. Criam uma divergência, um conflito entre a vontade
manifestada e a real intenção de quem a exteriorizou.
A fraude contra credores não conduz a um descompasso entre o íntimo querer do agente e a sua
declaração. Mas é exteriorizada com a intenção de prejudicar terceiro. Por essa razão é considerada vício social. A
simulação, que é igualmente chamada de vício social, porque objetiva iludir terceiros ou violar a lei”.

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DIREITO CIVIL I – Parte Geral
Prof. PEDRO ANTONIO RIBEIRO DE ANDRADE
PLANO DE VALIDADE
DEFEITOS DO NEGÓCIO JURÍDICO: ERRO OU IGNORÂNCIA – Arts. 138 a 144 do CC

CIVIL - AÇÃO ANULATÓRIA DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA - DEFEITOS


DO NEGÓCIO JURÍDICO VERIFICADOS - COAÇÃO E ERRO SUBSTANCIAL -
ANULAÇÃO DO CONTRATO QUE SE IMPÕE - RETORNO AO 'STATUS QUO ANTE'.
I - Os defeitos do negócio jurídico, correspondentes aos vícios de consentimento,
corrompem o ato praticado e, dessa forma, afetam a validade do pacto celebrado, impondo-
se, dessa forma, a sua anulação, devendo as partes retornar à situação anteriormente
ocupada; II - No caso dos autos, imperiosa a anulação do contrato de compra e venda em
discussão, já que verificada a mácula ainda antes da sua celebração, quando o requerido,
mediante coação, conseguiu obter procuração para atuar em nome dos proprietários do
imóvel tratado nos autos, e, através de terceira pessoa, adquiriu o referido bem, à revelia
daqueles, que foram induzidos a erro substancial na sua manifestação de vontade; III -
Recurso conhecido e desprovido. (TJ-SE - AC: 2009202864 SE, Relator: DESA.
MARILZA MAYNARD SALGADO DE CARVALHO, Data de Julgamento:
28/07/2009, 2ª.CÂMARA CÍVEL).

CONCEITO

O erro ou a ignorância pode ser definido como falsa percepção da realidade (erro) ou total desconhecimento
a respeito das circunstâncias do negócio jurídico (ignorância), conduzindo a uma declaração de vontade
desconforme com o que deveria ser, se o agente tivesse conhecimento dos seus verdadeiros pressupostos fáticos
(CAIO MÀRIO DA SILVA).
É a ausência de concordância entre a vontade real e a vontade declarada. O Código Civil trata
indistintamente do erro e da ignorância.
No erro, o agente é levado a exteriorizar uma vontade que certamente não exteriorizaria se ele tivesse
noção perfeita da realidade fática. A percepção equivocada da realidade fática conduz o agente a declarar uma vontade
que certamente não declararia se tivesse plena ciência das circunstâncias fáticas relacionadas ao negócio jurídico
desejado.
O erro, portanto, é a causa determinante da exteriorização da vontade, sendo o elemento impulsionador da
vontade. É a “causa determinante” justamente porque é o erro ou falsa percepção da realidade fática o elemento
condutor da vontade. Se não fosse o erro ou a falsa percepção da realidade fática, o agente não teria realizado o
negócio. Se o erro ou a ignorância é indiferente para o agente, o erro não é qualificado como defeito ou vício do negócio
jurídico. Para viciar o negócio jurídico, o erro deve ser a causa principal, o motivo único a levar o agente a declarar
a vontade.
Em razão do desconhecimento do negócio ou de uma falsa percepção, a pessoa atua de forma diferente daquela
que seria sua vontade se tivesse percepção exata completa e perfeita da realidade fática.
No erro existe uma divergência entre a vontade real, desejada intimamente e a vontade declarada. Tal
divergência é espontânea, ou seja, o agente é levado a realizar um negócio que não desejava porque, ele próprio, sem a
contribuição da outra parte, não teve a perfeita noção da realidade fática.
Se a outra parte, de qualquer forma, seja por ação ou omissão, contribuiu, ainda que minimamente, para
o erro, não é mais erro e sim outro defeito do negócio jurídico, como o dolo, por exemplo.
Mas qual erro terá força para anular o negócio jurídico? Qualquer erro? A resposta é negativa e envolve duas
linhas de pensamento.
O erro, para invalidar o negócio jurídico, necessariamente, deve ser SUBSTANCIAL, ou ESSENCIAL. Além
disso, deve ser a causa determinante do negócio jurídico.
Há duas espécies de erro: SUBSTANCIAL; e ACIDENTAL.
Erro SUBSTANCIAL (anula o negócio jurídico): é aquele que recai sobre circunstâncias e aspectos
relevantes do negócio. Há de ser a causa determinante, ou seja, se conhecida a realidade, o negócio não seria celebrado.
Se o agente reconhecesse a verdade, não manifestaria vontade de concluir o negócio.

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Erro ACIDENTAL (não anula o negócio jurídico): é o que se opõe ao substancial, porque se refere a
circunstâncias de somenos importâncias e que não acarretam efetivo prejuízo, ou seja, recai sobre qualidades
secundárias do objeto ou da pessoa. Se conhecida a realidade, mesmo assim o negócio seria realizado.
Requisitos necessários para o erro ser considerado capaz de invalidar o negócio jurídico:
1º) Erro substancial: em relação a esse requisito não há divergência entre os doutrinadores.
Segundo o Art. 138 do CC
“São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro
substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das
circunstâncias do negócio”. (destacou-se)
Assim, sendo, para ser considerado causa de anulabilidade do negócio jurídico, deve ser ESSENCIAL ou
SUBSTANCIAL.
O Código Civil não deixa sob a responsabilidade do intérprete a caracterização do erro substancial. A própria
Lei Civil já traz as diretrizes do erro substancial.
Mas o que é erro substancial ?
O artigo 139 do CC define o erro substancial. Só o erro substancial pode levar à anulação do Negócio
Jurídico.
Art. 139. O erro é substancial quando:
I - interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da declaração, ou a
alguma das qualidades a ele essenciais;
II - concerne à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a quem se
refira a declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo
relevante;
III - sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o
motivo único ou principal do negócio jurídico.
SUBSTANCIAL é o erro que diz respeito à natureza do negócio (se alguém faz doação, supondo estar
vendendo); Substancial é erro que recai sobre o objeto principal da declaração (se alguém adquire uma tela de um
pintor, imaginando que é de um pintor famoso ou o que compra a casa de número 45 e consta no contrato a casa 54, que é
na mesma rua); Substancial é erro que recai sobre qualidade essencial do objeto (pessoa que compra uma estátua de
marfim, quando na verdade é de osso ou a pessoa que adquire um relógio achando que é de prata quando na verdade é de
lata), tudo nos termos do art. 139, I, do CC.
Ainda pode ser anulado o negócio, quando o erro substancial recair sobre a identidade ou à qualidade
essencial da pessoa a quem se refira a declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo relevante
(Art. 139, II, do CC). Tal erro ocorre, por exemplo, quando alguém faz uma doação em favor de outra que supõe ter-lhe
prestado auxílio e, depois, descobre que o beneficiário da liberalidade não foi que generosamente lhe atendeu no
momento de dificuldade.
Finalmente, também pode anular o negócio o erro de direito. A grande novidade do Código Civil em relação ao
erro substancial é considerar como tal o erro de direito ao lado do erro de fato. Dessa forma, não apenas a falsa percepção
da realidade fática, como a falsa percepção da norma jurídica, desde que sejam as causas determinantes da
exteriorização e, por isso, capazes de invalidar o negócio jurídico.
2º) Causa determinante: em relação a esse requisito, também não há divergência na doutrina.
O erro ou a ignorância, para fundamentar a invalidação do negócio jurídico, deve ser a causa determinante, ou
seja, a causa impulsionadora e motivadora da vontade. O agente somente realiza o negócio jurídico porque erra. O erro foi
a causa que determinou a vontade. Se não fosse o erro, a vontade não teria sido declarada.
Assim segundo o mestre CAIO MÁRIO, para que o negócio se torne defeituoso e, pois, anulável, o erro há de
ser a causa determinante (conduz a vontade do agente e influencia na sua deliberação de maneira imediata, falseando a
verdade).
A CAUSA DETERMINANTE DEVE SER CONSIDERADA DA SEGUINTE FORMA: SE NÃO FOSSE O
ERRO, o agente NÃO CELEBRARIA O NEGÓCIO. SE MESMO COM O ERRO, A PESSOA CELEBRA O NEGÓCIO,
O ERRO NÃO FOI A CAUSA DETERMINOU A VONTADE, não havendo que se cogitar em anulação do ato.

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3º) Erro perceptível ou cognocível: esse requisito é fonte das mais profundas divergências em relação ao erro
como causa de anulação do negócio jurídico.
O erro, para anular o negócio jurídico, além de SUBSTANCIAL (ESSENCIAL), CAUSA DETERMINANTE
DA EXTERIORIZAÇÃO DA VONTADE, deve também ser PERCEPTÍVEL.
Apenas com a junção desses três requisitos, o erro pode ser invocado pelo agente para invalidação do negócio
jurídico.
Mas em que consiste tal elemento (perceptível)?
O atual Código Civil acrescentou o elemento da “percepção” do erro, o qual até então era inexistente. Tendo em
vista a novidade do erro perceptível, surgiram divergências doutrinárias sobre esse requisito.
Segundo o Art. 138 do CC “São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade
emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias
do negócio”. O erro, para viciar a declaração de vontade e servir de fundamento para invalidação do negócio jurídico,
deve ser percebido ou um erro perceptível.
Mas “perceptível” para quem ou por quem? Pelo agente responsável pela exteriorização da vontade ou pelo
destinatário da declaração de vontade?
Considerando a injustificável omissão do Código Civil em relação à imputação dessa percepção do erro,
surgiram duas correntes na doutrina.
PRIMEIRA CORRENTE: defende a tese de que o erro deve ser percebido pelo agente responsável pela
declaração de vontade. Ou seja, a percepção do erro está relacionada à pessoa responsável pela emissão da declaração.
Tal corrente tem defensores de peso, como ORLANDO GOMES, CAIO MÁRIO e FRANCISCO AMARAL. Para estes, o erro
anula o negócio jurídico quando for essencial e escusável. Escusável é o erro perdoável, o qual está vinculado ao emissor
de declaração de vontade. O agente responsável pela declaração de vontade somente pode invocar o erro, se esse erro,
considerando o padrão médio da sociedade, for um erro perdoável ou escusável. Tal corrente foca a escusabilidade do erro
na pessoa do declarante. Para esta corrente o erro deve ser ESSENCIAL, a CAUSA DETERMINANTE DA VONTADE e
DESCUPÁVEL.
O erro é escusável (perdoável, justificável) porque qualquer pessoa poderia cometê-lo em igualdade de
circunstâncias. Depende a escusabilidade da pessoa que a oferece, bastando mencionar por exemplo que um técnico
dificilmente pode escusar-se de erro por ele praticado na área de sua especialidade.
O juiz é quem verifica, no caso concreto, se o erro é perdoável, para isso deverá analisar o nível cultural do
agente, como alcance de sua inteligência, suas qualidades profissionais, dentre outras circunstâncias.
SEGUNDA CORRENTE: sustenta a tese de que a percepção do erro não está relacionada ao declarante e
sim ao destinatário da declaração. PAULO NADER, SÍLVIO VENOSA, CRISTIANO CHAVES, GUSTAVO TEPEDINO, RENAN
LOTUFO. O fundamento dessa corrente é justamente a tutela da pessoa receptora da declaração, a qual confiou na emissão
da vontade. Se o destinatário da declaração confia nessa vontade exteriorizada e não tem condições de perceber o erro do
declarante, ainda que o erro seja essencial e a causa determinante do negócio jurídico, não pode o declarante invocá-lo
para invalidar o negócio. A tutela da confiança, como desdobramento da teoria da declaração do negócio jurídico (Art.
112 do CC), só permite a invalidação deste se o erro poderia ser percebido pelo destinatário.
O erro perceptível é aquele que poderia ser percebido pelo destinatário da declaração se ele agisse com as
cautelas e diligência normal, considerando as circunstâncias daquele negócio específico. Ou seja, o destinatário apenas
PODERIA perceber o erro do declarante, mas, efetivamente, não percebe. Se o destinatário PODERIA PERCEBER e ,
efetivamente, percebe o erro, já será outro vício do consentimento , qual seja, dolo omissivo por parte do destinatário, se
presentes os demais requisitos do dolo.
Em resumo, para essa corrente, o erro, para invalidar o negócio jurídico, deve ser SUBSTANCIAL
(ESSENCIAL), A CAUSA DETERMINANTE e possível de ser PERCEBIDO pelo destinatário da declaração, o qual, por
não agir com a devida diligência no negócio jurídico, acaba não o percebendo.
Qual a corrente mais coerente com o nosso sistema legal? A segunda corrente é a única compatível com os
princípios norteadores do atual Código Civil.
A vontade, fundamento do negócio jurídico, deve ser interpretada de acordo com aquilo exteriorizado ou
declarado pelo agente e não de acordo com as convicções íntimas do declarante. Por que isso?
Em razão da tutela da boa-fé do destinatário dessas declarações de vontade. O destinatário acredita e confia na
vontade exteriorizada. Se o agente, por falsa percepção da realidade ou ignorância, erra ao exteriorizar essa vontade, esse
erro não pode, em nenhuma hipótese, prejudicar o destinatário da declaração, cuja pessoa desconhece o erro ou a
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divergência entre a vontade real, íntima do declarante e a vontade por ele exteriorizada. O destinatário acredita e confia
que a vontade exteriorizada ou declarada corresponde à vontade desejada do destinatário.
Em resumo, a escusabilidade do erro foi superada, adotando-se, como critério de aferição, A
COGNOSCIBIBILIDADE DO ERRO pelo outro contrante, ou seja, o destinatário da declaração da vontade. Pouco
importará averiguar se o autor do erro teve, ou não, alguma culpa por ele. O importante será perceber se a pessoa, a quem
se dirigiu a declaração de vontade, tinha ou não condições de detectar o erro e de avisar o declarante de sua ideia
equivocada. Isso é assim em razão do princípio da boa fé objetiva e da probidade, que deve nortear os partícipes do ato
negocial. Se possível era a percepção do erro cognoscível pelo destinatário da declaração, anulável será o negócio, por
ferir o princípio da confiança e da boa fé objetiva.

Noutras palavras, não basta o erro ser substancial, é necessário que a outra parte tenha condições de presumir ou
perceber o equívoco do outro contratante. Assim, se configura a cognosciblidade do erro: se a outra parte, a que não
errou, pelas circunstâncias do ocorrido, pudesse presumir o erro no qual estava a incidir a parte que se equivocou.
Segundo JOSÉ FERNANDO SIMÃO, que resume a opinião de diversos autores, “o Código Civil de 2002 exigiu
apenas a cognoscibilidade e não a escusabilidade como requisito do erro, já que tendo adotado a teoria da confiança,
calcada na boa fé objetiva e na eticidade, o negócio deve ser mantido, se gerou justa expectativa no daclaratário, sendo
que tal expectativa merece proteção jurídica”.
Veja-se o enunciado nº 12, da I Jornada de Direito Civil da Justiça Federal ao interpretar o Art. 138 do CC/02:
Enunciado nº 12 CJF: “na sistemática do art. 138, é irrelevante ser ou não escusável o erro, porque o
dispositivo adota o princípio da confiança”.
Exemplo: Um jovem estudante recém-chegado do interior, que se dirige ao viaduto do Chá, no Centro de São
Paulo, e encontra um ambulante que vende pilhas com um a placa. “Vende-se”. O estudante então paga R$ 5.000,00,
supondo está comprando o viaduto, e a outra parte nada diz. No caso descrito, o erro é muito grosseiro, ou seja,
inescusável, e, pela sistemática anterior, a venda não poderia ser anulada. Mas pela nova conformação do instituto, caberá
a anulação, mormente porque a outra parte, ciente do erro, permaneceu em silêncio, recebendo o dinheiro.
4º) Erro real: CARLOS ROBERTO GONÇALVES acrescenta mais um requisito para que negócio jurídico seja
invalidado por erro. Assim sendo, o erro deve ser também real, isto é, efetivo, causador de prejuízo concreto para o
interessado. Não basta, pois, ser substancial e cognoscível. Deve ainda ser real, isto, é, tangível, palpável, importando
efetivo prejuízo para o interessado (non fatetur qui errat). Assim, por exemplo, o ano de fabricação do veículo adquirido
(2005 em vez de 2009) é substancial e real, porque se o adquirente tivesse conhecimento da realidade, não o teria
comprado. Tendo-o adquirido, sofreu grande prejuízo. No entanto, se o erro dissesse respeito somente à cor do veículo
(preto, em vez de azul-escuro, p. ex.), seria acidental, porque irrelevante para a definição do preço, e não tornaria negócio
anulável.”
O Código Civil enumerou as seguintes hipóteses de erro substancial, em seu art. 139:

a) ERRO SOBRE A NATUREZA DO NEGÓCIO (Error in negotio)


O Erro que interessa à natureza do negócio é aquele em que uma das partes manifesta a sua vontade,
pretendendo e supondo celebrar determinado negócio jurídico, e, na verdade, realiza outro diferente. É o erro sobre a
categoria jurídica.
Pretende o agente praticar um ato e pratica outro. Nessa espécie de erro, ocorre divergência quanto à espécie de
negócio, no que cada um manifestou.
Exemplos: “A” empresta uma coisa e “b” entende que houve doação.
Alienante que transfere o bem a título de venda e o adquirente o recebe como doação.
Pessoa que quer alugar e a outra supõe tratar-se de venda a prazo.
b) ERRO SOBRE O OBJETO PRINCIPAL (Error in corpore)

Segundo HARILSON DA SILVA ARAÚJO “Ocorre erro sobre o objeto quando há discrepância sobre a identidade
do objeto sobre o qual se pretende negociar. Em outras palavras, seria a aplicação do famoso jargão popular do “comprar
gato por lebre”, pois nesta espécie de erro pensa-se estar negociando sobre um certo objeto quando em verdade este seria
outro. A manifestação da vontade recai sobre objeto diverso daquele que o agente tinha em mente.

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Exemplos:1) Situação de um a pessoa que, em contato com loja de antiguidades orientais, compra um divã1
pensando adquirir uma espécie de sofá sem encosto, quando na verdade adquire uma coleção de poemas islâmicos,
sobretudo árabes e persas, que também recebe o mesmo nome; 2) Comparador que adquire um imóvel que entende
valorizado por se localizar em certo logradouro de bairro nobre, quando na verdade adquire terreno de baixo valor por
localizar-se em logradouro do mesmo nome, mas em bairro da expansão da periferia; 3) Indivíduo que se propõe a alugar
a sua casa da cidade e o outro contratante entende tratar-se de sua casa de campo; 4) Pensa-se estar adquirindo um quadro
de Portinari, quando na verdade é de outro pintor.
c) ERRO SOBRE AS QUALIDADES ESSENCIAIS DO OBJETO (Error in qualitate)
Ocorre sobre alguma das qualidades essenciais do objeto do negócio quando, manifestada a vontade, tendo
como motivação certa e determinada qualidade que deva estar presente no objeto, verifica-se posteriormente que tal
qualidade não existe. Neste caso, o erro não recai sobre a identidade do objeto, que é o mesmo que se encontrava no
pensamento do agente.
Todavia, não tem as qualidades que este reputava essenciais e que influíram em sua decisão de realizar o
negócio.
Exemplos: 1) Você adquire candelabros prateados, mas de material inferior, julgando serem de pratas; 2)
Compra de um relógio dourado, mas apenas folheado a ouro, como se fosse de ouro maciço; 3) Adquire-se cavalo de tiro
supondo ser de corrida.
d) ERRO SOBRE A QUALIDADE OU A IDENTIDADE DA PESSOA COM QUEM SE REALIZA O NEGÓCIO
(Error in persona)
Tal figura ocorre em razão de negócios intuitu personae, ou seja, os que se fazem em relação a certa e
determinada pessoa. Neste caso, erra aquele que supõe realizar negócio com certa pessoa, quando na verdade esta era
outra.
Exemplos de Erro sobre a qualidade da pessoa: são as qualidades da pessoa com quem se negocia que
motivam a manifestação da vontade, logo se elas não existem, errada foi a declaração no sentido de realizar o ato. 1) “A”
supõe que “F” é seu filho natural e deixa-lhe, por meio de testamento, um imóvel. Descobre-se, posteriormente que “F”
não é seu filho natural; 2) Se uma moça de boa formação moral se casar com homem, vindo a saber depois que se tratava
de um desclassificado ou homossexual; 3) Se alguém faz um testamento contemplando sua mulher com a meação de
todas os bens, mas, por ocasião do cumprimento do testamento, o Tribunal verificou que a herdeira instituída não é
mulher do testador incorreu em erro quanto à qualidade essencial da beneficiária; 4) Pessoa que faz doação para certa
pessoa pensando ter sido responsável pelo seu salvamento, quando em verdade não foi; 5) Aquele que constitui sociedade
civil com outrem, descobrindo depois que este é dado a atividades criminosas, sendo inclusive procurado pela polícia.
Exemplos de Erro sobre a identidade da pessoa: O erro quanto à identidade somente é considerado
substancial ou essencial (invalida o negócio) quando não se tem como apurar quem seja, realmente, a pessoa ou coisa a
que se refere à manifestação de vontade. Por exemplo: O doador ou testador beneficia o seu sobrinho Antonio. Na
realidade, não há nenhum sobrinho com esse nome. Apura-se, porém, que tem um afilhado de nome Antonio que sempre
chamou de sobrinho.
e) ERRO DE DIREITO (Error Iuris)
Erro de fato difere de erro de direito. O primeiro recai sobre circunstâncias de fato, isto é, sobre qualidades
essenciais da pessoa ou da coisa. Ao passo que o segundo recai sobre a existência de uma norma jurídica, suponde-se
exemplificativamente, que esteja em vigor quando, na verdade, foi revogada. O agente emite uma declaração de vontade
no pressuposto falso de que procede conforme a lei. O erro de direito não consiste apenas na ignorância da norma
jurídica, mas também em seu falso conhecimento e na sua interpretação errônea, podendo ainda abranger a ideia
errônea sobre as consequências jurídica do ato negocial.
Na didática de CARLOS ROBERTO GONÇALVES “é o falso conhecimento, ignorância ou interpretação errônea da
norma jurídica aplicável à situação concreta. Segundo CAIO MÁRIO, é o que se dá “quando o agente emite a declaração de
vontade no pressuposto falso de que procede segundo o preceito legal”. O art. 3º da Lei de Introdução às Normas de
Direito Brasileiro (LINDB) diz que a alegação de ignorância da lei não é admitida quando apresentada como justificativa
para o seu descumprimento. Significa dizer, inversamente, que pode ser arguida se não houver esse propósito. O
Código Civil de 2002 acolheu esse entendimento, considerando substancial o erro quando, “sendo de direito e não
1Divã 1. Espécie de sofá sem encosto. 2 Espécie de canapé que pode ser usado como cama. 3. No império Otomano, o Conselho de
Estado presidido pelo sultão, e, por ext., a sala ou edifício onde aquele se reunia. 4. Coleção de poemas islâmicos, sobretudo árabes e
persas; cancioneiro. (Aurélio Eletrônico (AE) versão integral Dicionário Aurélio – Século XXI)

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implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único ou principal do negócio jurídico” (Art. 139, III). Exemplo:
pessoa que contrata a importação de determinada mercadoria ignorando existir lei que proíbe tal importação. Como tal
ignorância foi causa determinante do ato, pode ser alegada para anular o contrato, sem com isso pretender que a lei seja
descumprida”.
DANIEL EDUARDO CARNACHIONI faz a seguinte indagação “Como seria possível compatibilizar o Art. 3º da
LINDB com o erro de direito? Como alguém pode pretender invalidar um negócio jurídico argumentando falsa percepção
da norma jurídica quando a própria lei diz que ninguém pode descumprir a lei, alegando o seu desconhecimento?
Considerando que o Código Civil equiparou o erro à ignorância, o desconhecimento da norma jurídica seria subespécie do
erro de direito e, portanto, em tese, como fundamento no Art. 139, III do CC, poderia ser invocado o desconhecimento da
lei para anulação do negócio por erro, desde que tal desconhecimento fosse a causa determinante do negócio. Como
resolver esse problema?
A aplicação ampla e irrestrita do Art. 139, III, certamente poderia prejudicar ou abalar a segurança jurídica nas
relações privadas, pois em todo negócio em tese, seria possível pretender a anulação sob o pretexto de desconhecimento
da lei. Por isso devem ser restringidos os limites do referido dispositivo, a fim de torná-lo compatível com o Art. 3º da
LINDB.
Então, qual é o erro de direito capaz de invalidar o negócio jurídico?
O próprio Art. 139, III, já impõe alguns limites, insuficientes é verdade, mas que podem ser aproveitados. O erro
de direito somente pode ser considerado substancial quando NÃO IMPLICAR RECUSA À APLICAÇÃO DA LEI e,
ainda, QUANDO FOR O MOTIVO ÚNICO OU PRINCIPAL DO NEGÓCIO JURÍDICO”.
Na lição de CRISTIANO CHAVES DE FARIAS e NELSON ROSENVALD “O princípio da obrigatoriedade, no entanto,
não é absoluto, admitindo temperamentos, em hipóteses nas quais venha a lei, expressamente, a admitir o erro de direito.
Distingue-se o erro de direito do erro de fato, uma vez que este não se refere ao conteúdo da norma jurídica em si
mesmo, mas a um acontecimento por ela regulado. Ou seja, o erro de fato (error facti) incide sobre as circunstâncias de
fato de um determinado ato, enquanto o erro de direito (error iuris) pertine à ignorância ou falso conhecimento sobre a
norma jurídica ou o seu conteúdo. Exemplificando: se alguém casa com uma mulher, sem saber que é a sua irmã, o erro é
de fato. Mas, sabendo que a noiva é sua irmã, se ainda assim casa, por desconhecer a vedação da lei, o erro é de direito.
A matéria é de grande relevo na celebração de contratos. O erro de fato é amplamente admitido enquanto motivo
da anulação de negócios jurídicos (CC, arts. 138 a 144). Já o erro de direito pode ser invocado como causa de invalidade
(anulabilidade) de um negócio jurídico quando o agente estiver de boa-fé e a ignorância da lei tiver sido a causa
determinante da declaração de vontade (CC, art. 139, III). Aqui, não se exige a escusabilidade (desculpabilidade) do erro
de direito, uma vez que Código Civil está fundado no princípio da confiança, motivo pelo qual não se cogita da
escusabilidade. Um bom exemplo pode ser apresentado com a pessoa que adquire um terreno para construir uma casa
de veraneio, em determinada cidade, sem saber que aquela área foi considerada non aedificandi (nas quais é proibido
construir) por força de uma lei municipal, que era desconhecida do adquirente. No caso exemplificado, haverá um erro de
direito que poderá ser arguido pelo comprador para anular o contrato de compra e venda. O erro de direito também pode
ser admitido para fins de reconhecimento do casamento putativo2 (CC, art. 1.561), autorizando o juiz a reconhecer a
produção de efeitos diversos para um casamento nulo ou anulável, que foi contraído de boa-fé e incidindo em erro
invencível (de fato ou de direito). É a hipótese de um irmão casar com a irmã sem saber que eram parentes (erro de fato)
ou a hipótese de irmãos que, embora soubessem ser parentes, não sabiam que era proibido o casamento entre irmãos (erro
de direito). Em ambos os casos, o juiz poderá reconhecer o casamento como putativo e emprestar efeitos jurídicos.
DO FALSO MOTIVO
Art. 140. O falso motivo só vicia a declaração de vontade quando expresso como razão determinante
Segundo CARLOS ROBERTO GONÇALVES, “o novo Código Civil corrige, assim, a impropriedade do Art. 90 do
diploma de 1916, substituindo falsa causa por falso motivo. O motivo do negócio, ou seja, as razões psicológicas que
levam a pessoa a realizá-lo, não precisa ser mencionado pelas partes.

2 O casamento putativo é o enlace matrimonial realizado com algum vício (determinado por algum fato previsto na lei) que o torne
anulável ou nulo, mas, por ter sido contraído de boa-fé de um ou de ambos os cônjuges, produz efeitos, conforme determinação do
artigo 1561 do nosso Código Civil, abaixo copiado.
Art. 1561. Embora anulável ou mesmo nulo, se contraído de boa-fé por ambos os cônjuges, o casamento, em relação a estes como aos
filhos, produz todos os efeitos até o dia da sentença anulatória.
§ 1º Se um dos cônjuges estava de boa-fé ao celebrar o casamento, os seus efeitos civis só a ele e aos filhos aproveitarão.
§ 2º Se ambos os cônjuges estavam de má-fé ao celebrar o casamento, os seus efeitos civis só aos filhos aproveitarão.

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Motivos são as ideias, as razões subjetivas, interiores, consideradas acidentais e sem relevância para apreciação
da validade do negócio. Em uma compra e venda, por exemplo, os motivos podem ser diversos: a necessidade de
alienação, investimento, edificação de moradia etc. São estranhos ao direito e não precisam ser mencionados.
Na lição de DANIEL EDUARDO CARNACCHIONI “é notório que os motivos ou as razões que levam o sujeito a
praticar determinado negócio, não o influenciam e são irrelevantes para o direito.
Ora, se os motivos são irrelevantes, como podem viciar a vontade e até fundamentar a invalidação do negócio
jurídico? O motivo foi erigido a elemento essencial do negócio jurídico?
Resposta: não. As razões psíquicas e internas do sujeito não possuem qualquer relevância jurídica para viciar a
vontade. Entretanto, se o motivo, a princípio não relevante, for inserido pelas partes como RAZÃO PRINCIPAL E
DETERMINANTE DO NEGÓCIO, caso ele seja falso, viciará o negócio jurídico.
Por exemplo: a pessoa vai alugar um imóvel para instalar um restaurante, pressupondo que em frente será
implementada uma escola, que dará movimento ao seu estabelecimento. Se tal motivo (instalação de uma escola) fosse
expresso no negócio ou contrato de locação como a razão principal e determinante no negócio (ou seja, sem esse motivo,
o negócio não se realizaria), sendo ele falso (inexistente), o negócio jurídico seria anulável.
A falsidade do motivo não implica análise da conduta das partes. A falsidade está relacionada ao fato motivador
da vontade. Se o fato impulsionador da vontade for inexistente, será falso para fins de anulação do negócio jurídico.
O motivo é razão subjetiva ou psicológica que impulsiona a exteriorização da vontade.
Finalmente, a doutrina discute se o motivo precisa estar expresso. O Art. 140 do CC parece exigir ser o motivo
expresso como razão a razão determinante do negócio. O termo “expresso” não se confunde com a exigência da
formalidade escrita. Expresso é aquilo que o sujeito exterioriza, o que ele expressa, ou seja, a expressão da sua vontade,
podendo ser escrita ou verbal. Assim, nada justifica limitar o dispositivo, exigindo a motivação escrita bastando ser
expressa. Não há dúvida que a motivação expressa, mas não escrita, dificultará a prova do motivo como razão
determinante para a invalidação do negócio com base no falso motivo. Mas isso é questão de prova e não interfere na
essência da teoria do erro-motivo”
DO ERRO NA TRANSMISSÃO DA VONTADE POR MEIOS INTERPOSTOS (Transmissão Errônea Da Vontade)
Art. 141. A transmissão errônea da vontade por meios interpostos é anulável nos
mesmos casos em que o é a declaração direta.
Se o declarante não se encontra na presença do declaratário e se vale e se vale de interposta pessoa (mensageiro,
núncio) ou de um meio de comunicação (fax, telégrafo, e-mail etc.) e a transmissão da vontade, nesses casos, não se faz
com fidelidade, estabelecendo-se uma divergência entre o querido e o que foi transmitido erroneamente (mensagem
truncada), caracteriza-se vício que propicia a anulação do negócio.
Segundo CARVALHO SANTOS, essa regra só se aplica quando a diferença entre a declaração emitida e a
comunicada seja procedente de mero acaso ou de algum equívoco, não incidindo na hipótese em que o intermediário
intencionalmente comunica à outra parte uma declaração diversa da que lhe foi confiada. Neste caso, a parte que escolheu
o emissário fica responsável pelos prejuízos que tenha causado à outra por sua negligência na escolha feita, ressalvada a
possibilidade de o mensageiro responder em face daquele que o elegeu.
DO ERRO NA INDICAÇÃO DA PESSOA OU DE COISA
Art. 142. O erro de indicação da pessoa ou da coisa, a que se referir a declaração de vontade, não viciará o
negócio quando, por seu contexto e pelas circunstâncias, se puder identificar a coisa ou pessoa cogitada.

Segundo esse dispositivo, o erro de indicação da pessoa ou da coisa, a que se referir a declaração de vontade,
não viciará o negócio quando, por seu contexto e pelas circunstâncias, se puder identificar a coisa ou a pessoa.

O artigo 1.903 da Lei Civil arrola um exemplo de erro acidental em relação à indicação da pessoa:
Art. 1.903 “O erro na designação da pessoa do herdeiro, do legatário, ou da coisa legada anula a
disposição, salvo se, pelo contexto do testamento, por outros documentos, ou por fatos inequívocos, se
puder identificar a pessoa ou coisa a que o testador queria referir-se”.
Ao elaborar um testamento, o testador pode não ser preciso em relação ao herdeiro que pretende seja
contemplado. No momento, se pelo contexto do testamento, documentos ou fatos, for possível identificar o herdeiro, não
se invalida a deixa testamentária, ou seja, preserva-se a disposição testamentária.

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O negócio jurídico deverá ser preservado quando houver equívoco na declaração, identificando a coisa ou a
pessoa correta, pelo contexto da declaração e pela análise das circunstâncias do caso. Identificada a pessoa correta ou o
verdadeiro objeto, o negócio jurídico deve ser preservado.
Isso ocorrerá quando houver equívoco em relação ao nome da pessoa, às características da pessoa, ao estado
civil da pessoa, entre outros motivos, ou qualquer das características de um objeto.
Exemplo de erro sobre a indicação da pessoa: O testador beneficia o seu sobrinho Antônio. Não realidade, não
há nenhum sobrinho com esse nome. Apura-se, porém, que tem um afilhado de nome Antônio que sempre chamou de
sobrinho.
Exemplo de erro sobre a coisa: doador ou testador beneficia alguém com um quadro (objeto), quando na
realidade é uma escultura. Se for possível identificar qual é o objeto a que, na realidade, o testador se refere, não se
invalidará o negócio.
ERRO DE CÁLCULO
Art. 143. O erro de cálculo apenas autoriza a retificação da declaração de vontade.
O erro de cálculo não serve como fundamento para invalidar o negócio jurídico. Portanto, é considerado erro
acidental. Por isso, o erro de cálculo é espécie de erro acidental, admite apenas a retificação das declarações relativas
ao cálculo equivocado.
O erro acidental é aquele que recai sobre circunstâncias secundárias do negócio jurídico, não prejudicando a
validade deste. A declaração de vontade exteriorizada com base em erro de cálculo apenas sugere a retificação da
declaração, preservando-se o negócio jurídico. Ao autorizar a retificação da declaração de vontade, fica evidente que esse
dispositivo é um desdobramento do princípio da preservação do negócio jurídico.
Tal erro de cálculo está consagrado no Art. 249 do Código Civil português e no Art. 1.430 do Código Civil
italiano.
Mas o que seria errar no cálculo? Cálculo do quê? A questão é restrita à matemática, objetivamente considerada
ou pode está relacionada à má valoração ou apreciação de uma situação fática antes de ser tomada uma decisão? Da forma
como está redigido o Art. 143 do CC e, considerando ser o erro de cálculo espécie de erro acidental, a interpretação da
expressão “cálculo” deve se restringir a números ou à matemática. Por quê? Admitir o erro de cálculo além do âmbito dos
números matemáticos poderia criar graves injustiças e insegurança nas relações privadas, pois a pessoa, a pretexto de
reverter um negócio qualquer e argumentando que não calculou bem antes de tomar a decisão, poderia pretender a
retificação da sua declaração de vontade. Assim, somente o erro em relação a números admite a retificação.
DO PRINCÍPÍO DA CONSERVAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO
Art. 144. O erro não prejudica a validade do negócio jurídico quando a pessoa, a
quem a manifestação de vontade se dirige, se oferecer para executá-la na
conformidade da vontade real do manifestante.
Exemplo bastante ilustrativo pela doutrina foi dado pela Profª MARIA HELENA DINIZ ao expor a situação em que
“João pensa que comprou o lote n. 2 da quadra A, quando, na verdade, adquiriu o n. 2 da quadra B. Trata-se de erro
substancial, mas antes de anular o negócio o vendedor entrega-lhe o lote n. 2 da quadra A, não havendo assim qualquer
desacordo com a vontade real. Se tal execução não fosse possível, de nada adiantaria a boa vontade do vendedor”.

BIBLIOGRAFIA

CARNACCHIONI, Daniel Eduardo. Curso de Direito Civil. Institutos Fundamentais. 1ª ed. Rio de Janeiro Lumem
Juris. 2011.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 18 ed. vol. I. São Paulo: Saraiva, 2010.
FIUZA, Cesar. Direito Civil. Direito Civil, Curso completo.17 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. 11 ed. vol. I. São Paulo:
Saraiva, 2010.
MEIRELLES, Ana. PAMPLONA, Rodolfo. Tutela Jurídica do Nascituro à Luz da Constituição Federal. Texto extraído
do EVOCATI Revista.

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