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DIREITO CIVIL

CP I A
1º PERÍODO 2021
TEMA 08

Tema 08:
Fato jurídico em sentido amplo. Conceito e Classificação. Fatos naturais, ordinários
e extraordinários. Fatos voluntários lícitos e ilícitos. Negócio jurídico e ato jurídico
em sentido estrito. A representação legal e voluntária no negócio jurídico. Negócio
jurídico I: teorias voluntarista e objetivista. Pressupostos. Elementos e requisitos
essenciais à existência, validade e eficácia. Reserva mental. A declaração de vontade
e o silêncio na formação do negócio jurídico. Interpretação. A relevância da boa-fé.

1ª QUESTÃO:
Paulo constitui Mário o seu bastante procurador para a venda de seu veículo, já que está
de mudança para o exterior. Mário leva o veículo à oficina de um amigo e toma
conhecimento de que o auto apresenta defeito em seu motor, estando prestes a "bater
pino", necessitando de urgente retífica. Mário, mesmo assim, promove a alienação do
veículo a Carlos, não levando o fato ao conhecimento de Paulo. Dois meses após a venda
o veículo teve fundido o seu motor, descobrindo Carlos que Mário sabia do vício. Carlos
aciona Paulo requerendo o desfazimento do negócio, além de indenização por perdas e
danos. Como juiz, resolva a questão.

RESPOSTA:
Na hipótese, agiu o mandatário com dolo por omissão, celebrando o negócio mesmo com
a ciência do defeito do bem. O adquirente, no caso, pode promover a rescisão do negócio
sob o fundamento da existência de vício oculto, ou então buscar sua anulação, em razão
do dolo do mandatário. Cuidando-se de representação voluntária, Paulo irá responder não
só pela devolução do preço pago, mas também por perdas e danos, independentemente de
não ter tido ciência do dolo, já que o dolo de seu representante acarreta sua
responsabilidade solidária. Cuida-se da aplicação do disposto no art. 149 do Código Civil.
Ao eleger Mário o seu procurador, incorre Paulo em culpa in eligendo, respondendo
solidariamente pelos danos causados, podendo, entretanto, exercer direito de regresso em
face do mandatário que agiu dolosamente.
2ª QUESTÃO:
Em relação ao estudo dos fatos jurídicos, responda:
a) Em que consiste o fato jurídico? Seria correto dizer que nem todo acontecimento
configura fato jurídico?
b) Que diferença há entre o ato jurídico (stricto sensu) e o negócio jurídico? Dê
exemplos.
c) É correto dizer que todo negócio jurídico enseja declaração de vontade?

RESPOSTA:
A) Em síntese, pode-se dizer que o fato jurídico consiste em acontecimento apto a gerar
uma relação jurídica, ou seja, a gerar consequências para o direito.
Em outras palavras, o fato jurídico é um evento que tenha relevância suficiente para
receber atenção do legislador e do ordenamento jurídico. Logo, nem todo acontecimento
poderá estar inserido nessa categoria, por exemplo: caminhar na rua, cumprimentar o
vizinho, preparar uma refeição, dentre outros.
"(...)Mas nem todo fato tem essa força jurígena. Alguns se situam no domínio dos
acontecimentos naturais, sem repercussão na órbita jurídica, e não produzem efeitos
sensíveis ao direito: a chuva que cai é um fato, que ocorre e continua a ocorrer, dentro da
normal indiferença da vida jurídica, o que não quer dizer que, algumas vezes, este mesmo
fato não repercuta no campo do direito, para estabelecer ou alterar situações jurídicas.
Outros se passam no domínio das ações humanas, também indiferentes ao direito: o
indivíduo veste-se, alimenta-se, sai de casa, e a vida jurídica se mostra alheia a estas
ações, a não ser quando a locomoção, a alimentação, o vestuário provoquem a atenção do
ordenamento legal. (Caio Mário da Silva Pereira. Instituições de Direito Civil. v.1.
Forense: 2004. Página: 457)"

B) Ambos os conceitos encontram-se contidos na ideia de ato jurídico (lato sensu), o qual,
por sua vez, também está englobado no conceito de fato jurídico.
Ocorre que, enquanto o ato jurídico ostenta efeitos legalmente estabelecidos, o negócio
jurídico permite ao particular a conjunção do ato legal com a vontade na produção de
efeitos.
São exemplos de ato jurídico (stricto sensu): confissão, notificação para constituir em
mora o devedor, etc.
São exemplos de negócio jurídico: testamento, pacto antenupcial etc.
C) "Nem todo negócio jurídico é uma declaração de vontade. Há declarações destinadas
a produzir os efeitos jurídicos pretendidos pelo declarante que não encerram um querer,
isto é, não são a opção por uma de várias alternativas possíveis. Quando alguém é
indicado autor de uma obra (Lei n. 9.610/98, gart. 13), a indicação é negócio jurídico,
mas não uma declaração de vontade. Também quando os acionistas apreciam em
assembleia as prestações de contas da administração, o voto deles é negócio jurídico, mas
não expressam uma vontade. Nesses dois casos, está-se diante de uma declaração de
verdade, quer dizer, o declarante apenas confirma a realidade de um fato. (Fábio Ulhoa
Coelho. Curso de Direito Civil. v.1. Revista dos Tribunais: 2016. Página: 295)"

"A rigor, porém, os efeitos de fatos jurídicos, sejam eles dependentes ou não da vontade
dos sujeitos de direito, ou mesmo da intenção destes, são sempre os definidos pela norma
jurídica. Quando a ordem jurídica prevê a realização dos efeitos projetados pela intenção
de um ou mais sujeitos, sempre que declarada (atendida, em alguns casos, uma forma
específica), isso se reveste de juridicidade exclusivamente em razão da norma jurídica, e
não por algum atributo inerente à vontade de homens e mulheres (...). (Fábio Ulhoa
Coelho. Curso de Direito Civil. v.1. Revista dos Tribunais: 2016. Página: 295)"
DIREITO CIVIL
CP I A
1º PERÍODO 2021
TEMA 09

Tema 09:
Negócio jurídico II: Elementos naturais e acidentais. Condição: conceito, elementos,
espécies e efeitos. Condição voluntária e condição legal. Termo: conceito, elementos,
espécies e efeitos. Encargo: conceito e aplicações práticas nos negócios jurídicos inter
vivos e causa mortis. Distinção entre encargo e condição. Distinção entre termo e
condição suspensiva.

1ª QUESTÃO:
José, com 17 anos de idade, casado nos termos do art. 1.517 do Código Civil, reside com
sua família em Petrópolis, mas por força de seu trabalho como vendedor, faz praça na
cidade de Sapucaia. Por este motivo, a empresa onde José trabalha celebra com ele um
contrato de comodato de uma de suas propriedades localizada nesta cidade. Ficou
estabelecido entre José e a Empresa que tal contrato de comodato teria duração de dois
anos, exatamente o prazo fixado para que José atuasse naquela praça.
Responda justificando:
1 - Precisa ser José assistido quando da assinatura de comodato? Explique.
2 - O contrato celebrado é sujeito a termo ou encargo? Explique a diferença entre termo
e encargo.

RESPOSTA:
1 - José não precisará ser assistido segundo o Código Civil tendo em vista que já está
emancipado legalmente, por força do seu casamento, (art.5º, §único, inc. II) sendo
plenamente capaz para os atos da vida civil.
2 - O termo consiste em elemento acidental do negócio jurídico fixado pela vontade das
partes através de evento futuro e certo - art. 131 e ss. do Código Civil. Já a condição é a
cláusula que, derivando exclusivamente da vontade das partes, subordina os efeitos do
negócio a um evento futuro e incerto (arts. 121 a 130 do Código Civil). Na hipótese em
tela, foi celebrado um contrato de comodato - empréstimo gratuito de bem infungível (art.
579 do CC) - subordinado este a termo final extintivo nos termos do art. 135, 1ª parte, do
mesmo diploma.

2ª QUESTÃO:
Alfredo Marceneiro aforou demanda em face de Carlos do Carmo, alegando que este teria
lhe prometido quantia de R$ 15.000,00, caso o autor vencesse o 23º Concurso de Projeto
Arquitetônico Mais Inovador do Município de Alfama. Alfredo Marceneiro afirma que,
por advento de lei que limitou os gastos do município, o evento foi cancelado.
Alfredo Marceneiro juntou aos autos uma entrevista que concedeu a um jornal de Alfama,
cuja capa apresentava o seguinte: "Projeto de vitória não concretizado: em que pese o
brilhantismo de Marceneiro, o arquiteto sofre com o corte de gastos e vê escapar a vitória,
que era dada como certa por especialistas". Alfredo Marceneiro afirma, ainda, ser devido
o cumprimento do prometido por Carlos do Carmo, pois, tendo em vista a condição, pré-
estabelecida e inalterável, o seu direito adquirido deve ser protegido, nos termos do art.
6º, §2º, da LINDB, em observância à boa-fé. Aduz o autor que não teve culpa pelo
cancelamento, e que o primeiro lugar era indubitável, tanto que o maior adversário,
Frederico Valério, em rede social, admitiu que dificilmente superaria "a genialidade de
Marceneiro" e que este merecia um prêmio simbólico.
Carlos do Carmo se insurge contra a posição adotada pelo autor, sob o argumento de que
a eficácia do negócio estava subordinada à condição suspensiva, que não se concretizou
e que o atual ordenamento jurídico brasileiro não permite a tese da retroatividade das
condições. A hipótese, segundo o réu, é de expectativa de direito, conforme o art. 125 do
CC, por isso, pede a improcedência, e, em caso de condenação, pede que o valor não
ultrapasse os R$ 5.000,00, uma vez que, se é certo que a culpa não pode ser atribuída ao
autor, também é certo que a culpa tampouco poderia ser ao réu atribuída.
Decida a questão, explicando se os dispositivos mencionados podem coexistir de modo
harmônico na vigente legislação.

RESPOSTA:
O pedido formulado pelo autor deve ser julgado improcedente, uma vez que o caso
consiste em hipótese de condição suspensiva. Dessa forma, tem razão o réu em suas
alegações. O art. 125 do CC dispõe que "subordinando-se a eficácia do negócio jurídico
à condição suspensiva, enquanto esta se não verificar, não se terá adquirido o direito, a
que ele visa." Em outras palavras, enquanto pende a condição suspensiva, não pode o
autor exigir o cumprimento, pois tem apenas uma expectativa de direito, isto é, não pode
conceber que o Estado-juiz será invocado para garantir a projeção dos efeitos do ato
jurídico no mundo fático. Logo, nenhum valor será devido a Alfredo Marceneiro.
O art. 6º, § 2º, da LINDB se aplica na hipótese em que o advento da lei possa ameaçar
direitos adquiridos, no entanto, os direitos adquiridos não podem ser confundidos com
mera expectativa de direito. Acontece que esse dispositivo deve ser aplicado quando a
situação aconteceu verdadeiramente (e o advento da lei pode gerar certa insegurança), o
que não confere proteção propriamente dita enquanto a condição encontra-se pendente.
Confira a lição de J.M. Leoni Lopes de Oliveira:
"Finalmente, ressalte-se não haver contradição alguma entre o teor do §2º do art. 6º da
LINDB e o texto do art. 125 do CC. (...) Citando Clóvis Beviláqua '(...) [Na LINDB] o
direito condicionado se declara adquirido, para efeito de ser respeitado pela lei nova,
porque é um elemento positivo do patrimônio do indivíduo. No art. 125 do CC, o Código
tem em vista o efeito da condição suspensiva, e declara que, enquanto não se verificar
essa condição, o direito a ela subordinado, é apenas possibilidade em via de atualizar-se.
Essa possibilidade o legislador respeita quando legislação não impende que se realize,
porque é um valor jurídico apreciável, embora ainda em formação. Se a lei nova não
respeitasse o direito condicionado, verificada a condição em seguida, o indivíduo sofreria
um prejuízo, e a lei nova teria destruído uma formação jurídica criada pela anterior'. Em
outra passagem, (...)esclarece Clóvis, [em relação ao art. 2º, §6º da LINDB], que (...) com
o advento da condição o direito se supõe existido, desde o momento em que se deu o fato
que o criou. Por isso, a lei o protege, ainda nessa fase de existência meramente dependente
de um acontecimento futuro e incerto, embora condicional já é um bem jurídico, tem valor
econômico e social, constitui elemento do patrimônio do titular'. A doutrina pe pacífica
em reconhecer a compatibilidade das normas referidas, como se verifica da lição de
Carvalho Santos."
Art. 6º, §2º, da LINDB:
Art. 6º A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o
direito adquirido e a coisa julgada. (Redação dada pela Lei nº 3.238, de 1957)
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L3238.htm>
§ 2º Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por êle, possa
exercer, como aquêles cujo comêço do exercício tenha têrmo pré-fixo, ou condição pré-
estabelecida inalterável, a arbítrio de outrem.
Art.125 do CC:
Art. 125.Subordinando-se a eficácia do negócio jurídico à condição suspensiva, enquanto
esta se não verificar, não se terá adquirido o direito, a que ele visa.

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