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DEFEITOS DO NEGÓCIO JURÍDICO

DOS DEFEITOS DO NEGÓCIO JURÍDICO


Este capítulo trata das hipóteses em que a vontade se manifesta com algum vício que
torne o negócio anulável. Nele o Código Civil brasileiro menciona e regula seis
defeitos: erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão e fraude contra credores.

No art. 171, II, diz ser anulável o negócio jurídico que contenha tais vícios. Dispõe
o art. 178 do Código Civil: “É de quatro anos o prazo de decadência para pleitear -se
a anulação do negócio jurídico, contado:
I — no caso de coação, do dia em que ela cessar;
II — no de erro, dolo, fraude contra credores, estado de perigo ou lesão, do dia em
que se realizou o negócio Jurídico.”
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■ Vícios do consentimento: os referidos defeitos, exceto a fraude contra


credores, são chamados de vícios do consentimento, porque provocam uma
manifestação de vontade não correspondente com o íntimo e verdadeiro querer do
agente. Criam uma divergência, um conflito entre a vontade manifestada e a real
intenção de quem a exteriorizou.

■ Vício social: a fraude contra credores não conduz a um descompasso entre o


íntimo querer do agente e a sua declaração, mas é exteriorizada com a intenção de
prejudicar terceiros. Por essa razão, é considerada vício social.
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Defeitos do negócio jurídico são, pois, as imperfeições que nele podem surgir,
decorrentes de anomalias na formação da vontade ou na sua declaração.
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Erro ou ignorância
Conceito
O erro consiste em uma falsa representação da realidade. Nessa modalidade de vício do
consentimento, o agente engana -se sozinho. Ou seja, em relação a uma pessoa, negócio,
objeto ou direito, que acomete a vontade de uma das partes que celebrou o negócio jurídico.

Quando é induzido em erro pelo outro contratante ou por terceiro, caracteriza -se o dolo.

O Código equiparou os efeitos do erro à ignorância. Erro é a ideia falsa da realidade.


Ignorância é o completo desconhecimento da realidade. Nesta, a mente está in albis;
naquele, o que nela está registrado é falso. Num e noutro caso, o agente é levado a praticar o
ato ou a realizar o negócio que não celebraria por certo ou que praticaria em circunstâncias
diversas, se estivesse devidamente esclarecido.
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Dolo
Conceito
Dolo é o artifício ou expediente astucioso empregado para induzir alguém à prática
de um ato que o prejudique e aproveite ao autor do dolo ou a terceiro. Consiste em
sugestões ou manobras maliciosamente levadas a efeito por uma das partes a fim de
conseguir da outra uma emissão de vontade que lhe traga proveito ou a terceiro. O
dolo difere do erro porque este é espontâneo, no sentido de que a vítima se engana
sozinha, enquanto o dolo é provocado intencionalmente pela outra parte ou por
terceiro, fazendo com que aquela também se equivoque.
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O dolo civil não se confunde com o dolo criminal, que é a intenção de praticar um
ato que se sabe contrário à lei. No direito penal, diz-se doloso o crime quando o
agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo (CP, art. 18, I).

Dolo civil, em sentido amplo, é todo artifício empregado para enganar alguém.
Distingue-se, também, do dolo processual, que decorre de conduta processual
reprovável, contrária à boa-fé e que sujeita, tanto o autor como o réu que assim
procedem, a sanções várias, como ao pagamento de perdas e danos, custas e
honorários advocatícios (CPC, arts. 79 a 81).
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Características

Já foi dito que há íntima ligação entre o erro e o dolo, porque num e noutro caso a
vítima é iludida.
Diferem, contudo, pelo fato de que, no erro, ela se engana sozinha, enquanto no dolo, o
equívoco é provocado por outrem. A rigor, portanto, o negócio seria anulável por erro e
por dolo. Todavia, como o erro é de natureza subjetiva e se torna difícil penetrar no
íntimo do autor para descobrir o que se passou em sua mente no momento da
declaração de vontade, as ações anulatórias costumam ser fundadas no dolo.
Ademais, esta espécie de vício do consentimento pode levar o seu autor a indenizar os
prejuízos que porventura tiver causado com seu comportamento astucioso .
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A coação
Conceito

Coação é toda ameaça ou pressão injusta exercida sobre um indivíduo para forçá-lo,
contra a sua vontade, a praticar um ato ou realizar um negócio.

O que a caracteriza é o emprego da violência psicológica para viciar a vontade.


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A coação

Não é a coação, em si, um vício da vontade, mas, sim, o temor que ela inspira, tornando
defeituosa a manifestação de querer do agente. Corretamente, os romanos empregavam o
termo metus (mentis trepidatio), e não vis (violência), porque é o temor infundido na vítima
que constitui o vício do consentimento, e não os atos externos utilizados no sentido de
desencadear o medo. Nosso direito positivo, entretanto, referindo-se a esse defeito, ora o
chama de coação (art. 171, II), ora de violência (art. 1.814, III).

A coação é o vício mais grave e profundo que pode afetar o negócio jurídico, mais até do
que o dolo, pois aquele impede a livre manifestação da vontade, enquanto este incide sobre
a inteligência da vítima.
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A coação

Requisitos da coação
Dispõe o art. 151 do Código Civil:
“Art. 151. A coação, para viciar a declaração da vontade, há de ser tal que incuta ao paciente fundado temor de
dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens.

Parágrafo único. Se disser respeito a pessoa não pertencente à família do paciente, o juiz, com base nas
circunstâncias, decidirá se houve coação.”
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A coação

Verifica-se, assim, que nem toda ameaça configura a coação, vício do consentimento. Para que tal ocorra, é
necessário reunirem -se os requisitos estabelecidos no dispositivo supratranscrito. Assim, a coação:

a) deve ser a causa determinante do ato;


■ b) deve ser grave;
■ c) deve ser injusta;
■ d) deve dizer respeito a dano atual ou iminente;
e) deve constituir ameaça de prejuízo à pessoa ou a bens da vítima ou a pessoa de sua família.
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O estado de perigo
Conceito
O Código Civil de 2002 apresenta dois institutos, no capítulo concernente aos defeitos do
negócio jurídico, que não constavam do Código de 1916: o estado de perigo e a lesão.
Segundo o art. 156 do novo diploma, “configurasse o estado de perigo quando alguém,
premido da necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido
pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa”.
Aduz o parágrafo único:
“Tratando –se de pessoa não pertencente à família do declarante, o juiz decidirá segundo as
circunstâncias”.
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O estado de perigo

Constitui o estado de perigo, portanto, a situação de extrema necessidade que conduz


uma pessoa a celebrar negócio jurídico em que assume obrigação desproporcional e
excessiva.
Ou, segundo Moacyr de Oliveira, constitui “o fato necessário que compele à conclusão
de negócio jurídico, mediante prestação exorbitante”.

Exemplos clássicos de situação dessa espécie são os do náufrago, que promete a


outrem extraordinária recompensa pelo seu salvamento.
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O estado de perigo – exemplos

• A doutrina menciona, ainda, outras hipóteses, como a daquele que, assaltado por
bandidos, em lugar ermo, se dispõe a pagar alta cifra a quem venha livrá-lo da violência;
• A do comandante de embarcação, às portas do naufrágio, que propõe pagar qualquer
preço a quem venha socorrê-lo;
• A do doente que, no agudo da moléstia, concorda com os altos honorários exigidos pelo
cirurgião;
• A da mãe que promete toda a sua fortuna para quem lhe venha salvar o filho, ameaçado
pelas ondas ou de ser devorado pelo fogo;
• A do pai que, no caso de sequestro, realiza maus negócios para levantar a quantia do
resgate etc.
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Estado de perigo e lesão
As diferenças entre estado de perigo e lesão são tão sutis que alguns doutrinadores sugerem
a sua fusão num único instituto. Entretanto, os referidos vícios do consentimento não se
confundem.
Só o estado de perigo ou só a lesão não bastam para coibir todas as hipóteses que se podem
configurar.
O estado de perigo ocorre quando alguém se encontra em perigo e, por isso, assume
obrigação excessivamente onerosa, como no caso da pessoa que está prestes a se afogar e
promete toda a sua fortuna a quem o salvar da morte iminente.
Já a lesão ocorre quando não há estado de perigo, por necessidade de salvar-se; a ‘premente
necessidade’ é de natureza econômica, ou seja, de obter recursos para salvar o patrimônio
do agente.
lesão
■ Conceito
O Código Civil de 2002 reintroduz no ordenamento jurídico brasileiro, de forma expressa, o instituto
da lesão como modalidade de defeito do negócio jurídico caracterizado pelo vício do consentimento.

Dispõe o art. 157 do novo diploma:


“Art. 157. Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se
obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta.

§ 1º Aprecia-se a desproporção das prestações segundo os valores vigentes ao tempo em que foi
celebrado o negócio jurídico.

§ 2º Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento suficiente, ou se a parte


favorecida concordar com a redução do proveito.”
lesão
■ Conceito
Lesão é, assim, o prejuízo resultante da enorme desproporção existente entre
as prestações de um contrato no momento de sua celebração, determinada
pela premente necessidade ou inexperiência de uma das partes. Não se
contenta o dispositivo com qualquer desproporção: há de ser manifesta.
A fraude contra credores

■ Conceito

O novo Código Civil coloca no rol dos defeitos do negócio jurídico a fraude
contra credores, não como vício do consentimento, mas como vício social,
uma vez que não conduz a um descompasso entre o íntimo querer do agente
e a sua declaração.

A vontade manifestada corresponde exatamente ao seu desejo, mas é


exteriorizada com a intenção de prejudicar terceiros, ou seja, os credores.
Por essa razão, é considerada vício social.
A fraude contra credores

Fraude contra credores é, portanto, todo ato suscetível de diminuir ou onerar


seu patrimônio, reduzindo ou eliminando a garantia que este representa para
pagamento de suas dívidas, praticado por devedor insolvente ou por ele
reduzido à insolvência.

Tendo em conta que o patrimônio do devedor responde por suas dívidas, pode-
se concluir que, desfalcando-o a ponto de ser suplantado por seu passivo, o
devedor insolvente, de certo modo, está dispondo de valores que não mais lhe
pertencem, pois tais valores se encontram vinculados ao resgate de seus débitos.

Daí permitir o Código Civil que os credores possam desfazer os atos


fraudulentos praticados pelo devedor, em detrimento de seus interesses.
Referências bibliográficas

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil 1: esquematizado – parte


geral, obrigações e contratos. 19. ed. São Paulo: Saraiva Educação,
2018. (Coleção esquematizado/ coordenador Pedro Lenza)

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Parte Geral, v.1,


19. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021.

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