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No primeiro capítulo estudaremos os títulos de créditos, o conceito de título de crédito, seus princípios,
tais como cartularidade, literalidade e autonomia que se subdivide nos princípios da abstração,
independência e inoponibilidade de exceções de terceiros de boa-fé. Passando assim para a natureza
jurídica dos títulos de crédito e sua classificação dos títulos de crédito
1.1 Conceito de Títulos de Crédito
O crédito é de suma importância para uma nação, pois deste advêm sua riqueza e faz com que exista
o capital de giro. A denominação de título de crédito mais aceita pelos doutrinadores e pelos
operadores do direito para Fábio Ulhoa Coelho (2011, p. 393 apud VIVANTE 1922, p 154- 155)
„título de crédito é o documento necessário para o exercício do direito, literal e autônomo, nele
mencionado‟. Mais adiante em sua obra propõe outro caminho para a denominação de título de
crédito, título de crédito é um documento.
Como documento, ele reporta um fato, ele diz que alguma coisa existe. Em outros termos, o título
prova a existência de uma relação jurídica, especificamente duma relação de crédito; ele constitui a
prova de que certa pessoa é credora de outra. (COELHO, 2011, p. 393).
A designação de título de crédito está ligado a confiança e ao tempo, pois o credor precisa confiar
que seu devedor vai pagar o valor devido e tempo é que a prestação é sempre futura, há a existência
de um intervalo temporal para a satisfação da obrigação.
Como afirma João Eunápio Borges (1977, p. 7) “o crédito é, pois, economicamente, a negociação de
uma obrigação futura; é a utilização dessa obrigação futura para a realização de negócios atuais”.
Borges (1977, p. 7), ainda destaca que são dois os elementos contidos na noção de crédito:
a) a confiança: quem aceita, em troca de sua mercadoria ou de seu dinheiro, a promessa de pagamento
futuro, confia no devedor. Confiança que pode não repousar exclusivamente no devedor, mas em
garantias pessoais (aval, fiança) ou reais (penhor, hipoteca, etc.) que ele ofereça em segurança da
oportuna realização da prestação futura a que se obrigou; mas, de qualquer forma, é sempre a confiança
elemento essencial do crédito;
b) o tempo, constituindo o prazo o intervalo, o periodo que medeia entre a prestação presente e atual e a
prestação futura. Em suma, título de crédito é um documento que tem efeitos no futuro, pois há a
existência de pressupostos de tempo e também é baseado na confiança, que o credor deve ter no devedor,
o título é a essência da relação de crédito, bastando por si só para produzir efeitos na esfera jurídica.
Segundo Marlon Tomazette o crédito é a atividade empresarial e, consequentemente, o próprio direito
empresarial exigem três pilares fundamentais: a rapidez, a segurança e o crédito.
A palavra crédito deriva do latim creditum, que por sua vez advém de credere, que significa confiar, ter
fé. Assim sendo, o crédito representaria a confiança que alguém desperta em outrem. Daí, dizerse que
determinada pessoa tem crédito, no sentido de que esta pessoa desperta a confiança. Tal uso da palavra
crédito pode ser entendido como sua acepção moral que, contudo, não é a única.
Além da acepção moral, não há como negar a existência de um sentido Curso de Direito Comercial - Vol.
25 Marlon Tomazette 2 econômico da palavra crédito. Luiz Emygdio da Rosa Júnior nos apresenta cinco
conceitos econômicos de crédito:
“a) crédito é a troca no tempo e não no espaço (Charles Guide);
b) crédito é a permissão de usar capital alheio (Stuart Mill);
c) crédito é o saque contra o futuro;
d) crédito confere poder de compra a quem não dispõe de recursos para realizálo (Werner Sombart);
e) crédito é a troca de uma prestação atual por prestação futura”.
Para Maria Bernadete Miranda, o crédito é a “transação entre duas partes, na qual uma delas (o
credor) entrega a outra (o devedor) determinada quantidade de dinheiro, bens ou serviços, em troca de
uma promessa de pagamento”.
Segundo Carla Eugenia Barros Crédito é um direito a uma prestação futura, fundado, essencialmente, na
confiança e no prazo; dilação temporal e boa-fé são seus elementos nucleares. Já o título de crédito é um
documento que, observadas as características legais pertinentes, representa e mobiliza o direito creditício.
É também uma cártula, a qual diz respeito, menciona uma ou mais obrigações literais ou autônomas e
habilita seu portador ao pleno exercício do crédito e as suas figuras intervenientes do crédito.
Martorano assevera que “o título de crédito se apresenta como um documento, isto é, um ato escrito, do
qual resulta a existência de uma obrigação, assumida pelo subscritor, de efetuar certa prestação a favor de
outro sujeito, mais ou menos determinado”. 5 Contudo, o próprio Martorano reconhece que essa definição
é insuficiente para embasar uma teoria geral dos títulos de crédito.
Engrácia Antunes afirma que o título de crédito é “o documento necessário para constituir, exercer e
transferir o direito literal e autônomo nele incorporada.
1.2 Princípios dos Títulos de Crédito
Para que o título de crédito tenha validade é necessário que siga normas que são princípios que dão aos
títulos características que o diferem dos demais documentos cambiais. Os princípios que norteiam os
títulos de crédito são a cartularidade, literalidade e autonomia, que se dividem em abstração,
independência e a inoponibilidade.
Uma questão de terminologia Para o estudo dos títulos de crédito, mostrase fundamental a análise da
cartularidade ou incorporação, da literalidade, da autonomia, da abstração e da independência, isto é, dos
princípios 1 dos títulos de créditos. Toda a doutrina os estuda, todavia, nem sempre com o mesmo nome.
Alguns autores os chamam de características, 2 atributos 3 ou requisitos essenciais. 4 Não vemosqualquer
equívoco nas terminologias adotadas, mas preferimos a expressão princípios.
Para Neil MacCormick, “formular os princípios de um sistema jurídico com o qual a pessoa está
comprometida envolve uma tentativa de lhe dar coerência em termos de um conjunto de normas gerais
que expressam valores justificatórios e explanatórios do sistema”., pelo qual o título se desvincula do
negócio jurídico que lhe deu origem, pode ser mitigado em razão da incidência do princípio da boafé. O
credor que não estiver de boa fé não pode se beneficiar da aplicação desse princípio, ou seja, diante de um
credor de máfé, o negócio jurídico que deu origem ao título de crédito ainda poderá ser discutido.
Cartularidade Cartularidade quer dizer que o título é o próprio direito, quem porta tem o direito de
exercer as atribuições nele contidas. Segundo Rubens Requião (2014, p. 458), “para o exercício do direito
resultante do crédito concedido torna-se essencial a exibição do documento. O documento é necessário
para o exercício do direito de crédito. Sem a exibição material não pode o credor exigir ou exercitar
qualquer direito fundado no título de crédito”. Para Eunápio Borges (1977, p. 12), “a incorporação resulta
da materialização do direito no documento, de sorte que a conexão, a compenetração de um no outro é de
tal natureza, que não se concebe o direito sem o documento”.
Literalidade O princípio da literalidade dá ao título requisitos que devem ser seguidos pelo credor e
também pelo devedor, tais como prazo, valor e local de pagamento.
“A literalidade entende-se no sentido de que, para a determinação da existência, conteúdo, extensão e
modalidades do direito, é decisivo exclusivamente o teor do título.” (BORGES, 1977, p. 13).
O conceito de literalidade para Waldomiro Bulgarelli (1998, p. 59) “é a medida do direito contido no
título. Vale, assim, o documento pelo que nele se contém, exprimindo, portanto, a sua existência, o seu
conteúdo, a sua extensão, e a modalidade do direito nele mencionado”. Portanto, para ter validade as
claúsulas do negócio que deu origem ao título de crédito devem constar expressamente nele. Segundo
Rubens Requião (2014, p. 458) o título é literal porque sua existência se regula pelo teor de seu conteúdo.
O título de crédito se enuncia em um escrito, e somente o que está nele inserido se leva em consideração;
uma obrigação que dele não conste, embora sendo expressa em documento separado, nele não se integra.
Cumpre salientar que pode haver complementação do título de crédito, conforme afirma João Eunápio
Borges (1977, p. 13) literalidade que se não deve confundir com independência, plenitude – a
completezza dos autores italianos – porque ela não exclui a possibilidade de virem a integrar a declaração
constante do título elementos estranhos ao documento e por ele invocados de modo explícitos ou
implícitos. E assim o título, embora literal, pode ser incompleto, porque a configuração do direito dele
resultante – do direito cartular – fica na dependência de elementos que 15 não figuram no título mas, por
ele invocados, ficam fazendo parte integrante da declaração cartular. Em síntese, o título de crédito é um
documento que tem validade jurídica e as obrigações nele contidas devem ser cumpridas para a extinção
do mesmo.
1.2.3 Autonomia
A autonomia é princípio fundamental para a movimentação dos títulos de crédito, pois vícios anteriores
não maculam os adquirentes de boa-fé. Segundo Fábio Ulhoa Coelho, (2011, p. 399) “pelo princípio da
autonomia das obrigações cambiais, os vícios que comprometem a validade de uma relação jurídica,
documentada em título de crédito, não se estendem às demais relações abrangidas no mesmo documento”.
Cada relação creditícia é autônoma das demais, pois o que se transfere para validar o negócio é o título de
crédito e não o direito que decorreu dele. O titulo de crédito é autônomo segundo Requião (2014, p. 458),
“porque o possuidor de boa-fé exercita um direito próprio, que não pode ser restringido ou destruído em
virtude das relações existentes entre os anteriores possuidores e o devedor. Cada obrigação que deriva do
título é autônoma em relação às demais”. O princípio da autonomia se subdivide em abstração e
independência para alguns doutrinadores.
1.2.3.1 Abstração
Os títulos de crédito podem ser abstratos quando são postos em circulação sem sua causa de emissão, são
títulos autonomos e abstratos a nota promissória e o cheque que são estudos deste trabalho de conclusão
de curso. “Quando o título de crédito é posto em circulação, diz-se que se opera a abstração, isto é, a
desvinculação do ato ou negocio juridico que deu ensejo à sua criação.” (COELHO, 2011, p. 401). São
títulos abstratos e neutros no sentido de que não se prendem legalmente a nenhuma causa certa e
determinada, podendo servir de molde para qualquer obrigação. Quaquer natureza e a origem desta,
poderá ela 16 incorporar-se no título abstrato, cuja absoluta independencia em relação à causa
desconhecida constitui fator de maior segurança e tranquilidade para os sucessivos adquirentes de títulos
(BORGES, 1977, p. 17). Para Fábio Ulhoa Coelho (2011, p. 401), “a consequência disso é a
impossibilidade de o devedor exonerar-se de suas obrigações cambiarias, perante terceiros de boa-fé, em
razão de irregularidades, nulidades ou vícios de qualquer ordem que contaminem a relação fundamental.
E ele não se exonera exatamente porque o título perdeu seus vínculos com tal relação”. Rubens Requião
(2014, p. 461) “tem um parecer bem parecido com os demais doutrinadores citados “os títulos de crédito
podem circular como documento abstratos, sem ligação com a causa a que devem sua origem. A causa
fica fora da obrigação, como no caso da letra de câmbio e notas promissórias”. Portanto, quando o título
de crédito é posto em circulação começa a agir o princípio da abstração que não aponta a causa de
emissão do título.
1.2.3.2 Independência
O subprincípio da independência traz maior formalidade ao título de crédito, eis que a forma advém da
lei, que obriga o título a seguir uma forma determinada para sua validade e também não necessita de outro
documento para completá-lo, “são títulos de crédito regulados pela lei, de forma a se bastarem a si
mesmos. Não se integram, não surgem nem resultam de nenhum outro documento. Não se ligam ao ato
originário de onde provieram.” (REQUIÃO, 2014, p. 460). Segundo João Eunápio Borges (1977, p. 16),
tais títulos são completos no sentido de se bastarem a si mesmos, sem necessidade e sem possibilidade de
qualquer apelo ou remissão a elementos estranhos a eles (...) a literalidade já é, por si mesma,
manifestação de formalismo, tal formalismo só existe em sentido técnico quando a lei, levando a
literalidade ao máximo grau, exige que todos os elementos integrantes do título devam constar
diretamente do documento. E não admitem que neles figurem outras declarações além daquelas que, nos
termos da lei. A nota promissória é um exemplo de título de crédito autônomo e independente eis que sua
formalidade está descrita na lei, não depende de outro documento para completá-la e não está ligada ao
negócio originário.
17 1.2.3.3 Inoponibilidade
Pelo subprincípio da inoponibilidade das exceções pessoais aos terceiros de boa-fé, o executado em
virtude de um título de crédito não pode alegar, em seus embargos, matéria de defesa estranha à sua
relação direta com o exequente, salvo provando a má-fé dele. São, em outros termos, inoponíveis aos
terceiros defesas (exceções) não fundadas no título. Ainda no exemplo criado para o princípio da
autonomia, nos embargos de Benedito, interpostos na execução judicial da nota promissória, a matéria de
defesa fica circunscrita apenas à relação jurídica que mantém com o exequente, Carlos. Que relação é
essa? Simples: Benedito é o devedor de uma nota promissória, de que é credor Carlos. Nada mais. Assim,
as exceções admitidas, na execução, dizem respeito somente a tal relação, ou seja, à nota promissória. Por
exemplo: a prescrição do título, a nulidade da nota por não preencher os requisitos da lei, falsificação etc.
(COELHO, 2011, p. 402).
Existem tópicos elencados na doutrina, em número de quatro critérios que classificam os títulos, são eles:
a Quanto ao modelo
a.1. Vinculados - são os títulos que atendam ao padrão exigido pela lei e pelas resoluções do Banco
Central; a.2. livres - são aqueles que podem dispor de qualquer forma e não precisam diretamente de
outro título para surgir.
Quanto à estrutura
b.1. ordem de pagamento figuras intervenientes: sacador aquele que dá a ordem; sacado aquele que a
paga; beneficiário aquele que a recebe. b.2. promessa de pagamento figuras intervenientes: promitente
aquele que promete o pagamento beneficiário.
c Quanto à emissão
c.1. causais (limitados a uma causa que lhe dê origem) c.2 não causais
d Quanto à circulação
d.1. ao portador - atualmente só o cheque até o valor de R$100,00 (cem reais) pode circular ao portador.
d.2. nominativos à ordem d.3.nominativos não à ordem - existe a identificação do credor e estes circulam
mediante a cessão civil de crédito. 16 www.pidcc.com.
.e Quanto ao conteúdo da cártula1
e.1. Títulos propriamente ditos ou próprios e.2. Títulos impropriamente ditos ou impróprios
Qualquer que seja o momento da conclusão do contrato, é certo que a inclusão dos títulos de
crédito na categoria geral dos contratos não se sustenta. O título de crédito pode e,
frequentemente, é transferido por meio do endosso. Nesta situação, como justificar a relação entre
o devedor do título e os credores subsequentes? A vontade inicialmente manifestada pelo devedor
era dirigida ao beneficiário inicial, que pode não mais ser o credor do título de crédito,
desvirtuando completamente a intenção da parte. E não se diga que a intenção do devedor é
firmar um contrato com um sujeito indeterminado, porquanto é claro que a intenção do devedor
não é essa. Quem emite o título de crédito não quer assumir uma série de vínculos
indeterminados, mas uma obrigação certa e definida. Ademais, o contrato pressupõe o encontro
imediato de duas vontades, o que não ocorre nos títulos de crédito, 3 pois a obrigação existe
independentemente da vontade do credor.
Além disso, caso se tratasse de um contrato, o terceiro adquirente do título adquiriria um direito
derivado do seu antecessor e, por isso, seria possível a oposição de exceções pessoais, o que não
ocorre nos títulos de crédito.. Embora a invalidade ou mesmo a falsidade da assinatura do seu
emitente não invalide o título e não afete as demais obrigações assumidas, é certo que a simples
aparência não tem o condão de gerar a obrigação. Assim sendo, a obrigação não surge da lei, ela é
fruto de uma declaração de vontade do subscritor do título. Ainda que na circulação do título os
eventuais vícios dessa vontade não tenham influência na validade do título em si, é certo que as
obrigações assumidas sempre terão origem em uma declaração de vontade válida de algum dos
subscritores do título.
Para Vivante, devese analisar o sentido da vontade do devedor, que não seria único. Ao emitir o
título, o devedor tem a intenção de assegurar ao credor um título idôneo à circulação e,
consequentemente, assume a eventual responsabilidade em face dos futuros titulares do crédito,
não podendo levantar exceções pessoais fundadas na relação jurídica inicial (abstração) contra
os credores de boafé. De outro lado, ao emitir o título, o devedor conservaria intacta a
possibilidade de exceções pessoais fundadas no negócio jurídico em face do credor original, ou
seja, se o título não circular, o negócio jurídico ainda pode ser fundamento da defesa do
devedor.
Diante dessa dualidade, a vontade do devedor teria uma natureza contratual na relação entre ele
e o seu credor imediato, porquanto o título de crédito não se desvincularia do negócio jurídico
subjacente, mas se uniria a ele para integrálo. A obrigação do devedor não decorreria apenas da
sua assinatura, mas sim do negócio jurídico subjacente. Para verificar se a obrigação cambial
existe, se faria necessário verificar se a obrigação contratual existe. Assim, a fonte da obrigação
cambial seria o contrato firmado entre as partes.
Já em relação aos demais credores do título, “os vícios de consentimento, de causa, inerentes à
relação contratual de onde o título saiu, não têm cabimento contra o possuidor de boafé, que
daqueles vícios não encontra algum traço no título”.
Assim, a obrigação cambial ainda existirá se o contrato não for cumprido, ou mesmo se houver
alguma nulidade no contrato. Assim sendo, o fundamento da obrigação do subscritor do título
em relação aos credores posteriores de boafé está na sua simples assinatura, sendo neste
particular uma declaração unilateral de vontade. Embora seja extremamente engenhosa, tal
teoria não ficou imune a críticas. A declaração não pode ter duplo sentido, uma vez que a
vontade é uma só, isto é, como o emitente poderia estar obrigado perante os futuros
possuidores, e eventualmente não assumir obrigações perante o tomador imediato? Além disso,
como poderia a vontade unilateral do emitente ser suficiente para obrigálo perante os credores
posteriores, mas não seria suficiente para gerar uma obrigação perante o credor imediato?
Com efeito, é muito difícil sustentar um duplo sentido na vontade do emitente, uma vez que
nada denota essa dupla intenção. Outrossim, é certo que a obrigação cambial nasce
independentemente do consentimento do credor, logo, é muito difícil sustentar um negócio
jurídico bilateral como fonte da obrigação cambiária.
Reconhecendose a vontade como fonte das obrigações cambiárias, mas afastada a natureza
contratual dessa manifestação, é certo que o melhor enquadramento para a vontade criadora da
obrigação é como uma declaração unilateral de vontade.
Desse modo, para surgir a obrigação cambiária é necessária uma vontade e apenas uma
vontade, especialmente em razão da autonomia e da
abstração que regem os títulos de crédito.
Tal teoria defendia que a letra de câmbio seria o papelmoeda dos comerciantes, o que não se
sustenta diante da realidade econômica atual. Além disso, agora com razão, tal teoria sustenta
que o título de crédito não é um simples documento probatório, mas é o portador da própria
obrigação.
Ademais, segundo essa teoria, afirmase que o título de crédito funciona separadamente do
negócio jurídico subjacente e a obrigação teria seu fundamento em uma promessa dirigida ao
público. Esta teoria também não ficou imune a críticas, como a de Vivante, para quem ela não
tinha como explicar a possibilidade de defesas baseadas no negócio jurídico nas relações entre
o emitente e o beneficiário original do título. Em resposta a estas críticas, Tullio Ascarelli
esclareceu que a possibilidade desse tipo de defesa não se baseia em uma relação contratual,
mas em uma ideia similar à da compensação.
Quando o devedor é executado, ele pode opor, ao credor do título, a existência de um crédito
em face do mesmo, de modo que as obrigações se compensem e o devedor não seja obrigado a
pagar o título. Se o crédito foi em face de outra pessoa, que não seja o credor exequente, não há
que se cogitar da compensação. De modo similar, o devedor poderia alegar uma defesa baseada
no negócio jurídico, se o credor fez parte desse negócio jurídico, assim como poderia arguir a
compensação se o credor tivesse dívidas com ele. Portanto, vêse que a declaração unilateral de
vontade consegue explicar claramente a natureza jurídica da fonte da obrigação cambiária.
Todavia, resta analisar a questão do momento do surgimento da obrigação cambiária, derivando
daí várias teorias, dentre as quais merecem especial atenção a da criação, a da emissão e a
teoria dos três momentos.
Teoria da criação
A teoria da criação, em sua concepção mais aceita, é baseada nos estudos de Kuntze.Dentro
desta teoria, surgem algumas ideias básicas. Em primeiro lugar, os títulos de crédito
representariam obrigações abstratas, na medida em que a causa não seria essencial na formação
do título. De outro lado, o título de crédito Marlon Tomazette seria um documento dispositivo e
não um simples meio de prova, de modo que a obrigação fica orgânica e idealmente vinculada
ao documento. Além disso, o título de crédito seria um título de apresentação e seria também
destinado à circulação.
Por fim, em tal teoria o credor assume um papel apenas passivo na formação da obrigação
cambiária.
Diante dessas premissas, a teoria da criação conclui que a obrigação cambiária se aperfeiçoaria
com a criação do título, isto é, com a simples assinatura do devedor. A obrigação já existe com
a simples assinatura. A forma como o título saiu das mãos do seu criador não interessa para a
teoria da criação, o que interessa é apenas a declaração da vontade da criação do título.
Assim, se o título assinado pelo emitente foi furtado e chegou as mãos de um credor, este teria
o direito de receber o título de crédito. Nesta concepção, a obrigação existe pela simples
assinatura do subscritor, mas discutese o momento da sua eficácia jurídica ou mesmo do
aperfeiçoamento do vínculo. Uma primeira linha de análise sustenta que o título já é eficaz a
partir do momento da sua assinatura, isto é, uma vez redigido e assinado o título, ele já
produziria efeitos em relação ao devedor. O fato de não ter chegado às mãos de um credor não
significaria que o título é ineficaz, mas apenas que há momentaneamente uma confusão entre a
posição do credor e do devedor. A chegada do título às mãos de um credor seria apenas a
retirada do obstáculo para o exercício do direito.
De outro lado, também se entende que a declaração de vontade é perfeita com a assinatura,
todavia, a eficácia jurídica do título de crédito ficaria subordinada à sua chegada às mãos de um
credor. Nesta interpretação, devese distinguir a perfeição do título da sua eficácia e
irrevogabilidade.
A declaração unilateral de vontade é que seria a fonte da obrigação cambiária nesta teoria,
logo, a posse do credor não poderia influir no surgimento da obrigação, mas apenas na sua
eficácia jurídica. Com a simples assinatura o título já existiria e seria válido, mas sua eficácia
estaria condicionada à posse do título por um credor.
Teoria da emissão
Em resposta à teoria da criação, surgiu a teoria da emissão, a qual também reconhece a vontade
unilateral como fonte da obrigação cambiária. Todavia, nesta teoria, a obrigação cambiária só
se concretizaria no momento da emissão, entendida como a entrega voluntária do título.
A simples assinatura do título não representaria a vontade de se obrigar. Só a vontade concreta
de entregar o título é que aperfeiçoaria a obrigação. O título de crédito representaria um
negócio jurídico composto, na medida em que dependeria de dois atos: a assinatura do
documento e sua entrega voluntária.
Para Bonfanti, a possibilidade de um título assinado jamais ser entregue a alguém e, por isso,
jamais ser exigido, demonstra a correção da teoria da emissão. A simples criação do título não
lhe daria vida. Portanto, a vida da obrigação cambiária só se iniciaria com a entrega voluntária
do título.
Na mesma linha de interpretação, Antonio Pavone La Rosa afirma que a possibilidade de
revogação da declaração de vontade firmada no documento demonstra que a simples assinatura
não seria suficiente para formar o vínculo.
Nesta linha de interpretação, o vício na emissão seria um vício na assunção da obrigação
cambial e, por isso, seria oponível a todos os possuidores do título.
Assim, se o título foi assinado pelo devedor, mas lhe foi furtado e entregue a um terceiro, a
obrigação ainda não teria sido concluída. A obrigação só nasceria quando a declaração de
vontade fosse posta em circulação. José A. Saraiva é um crítico dessa teoria ao afirmar que “o
objetivo supremo do legislador é, e deve ser a garantia da circulação rápida e fiduciária do
título”.
Tal crítica é respondida por Pavone La Rosa com a aplicação do princípio da abstração, pela
qual o título se desvincularia do negócio jurídico que lhe deu origem e, por isso, não se poderia
discutir o vício da emissão. De outro lado, a aplicação do princípio do direito real de que a
posse de boafé vale título, também seria uma forma de afastar essas críticas à teoria da emissão.
ABRÃO, Carlos Henrique. Do protesto. 3. ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2004.
_____. Cédula de crédito bancário. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2005.
ABRÃO, Nelson. Direito bancário. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
ADAMEK, Marcelo Vieira Von. Títulos de crédito incompletos (títulos típicos e atípicos).
O art. 891. In: PENTEADO, Mauro Rodrigues (Coord.). Títulos de crédito. São Paulo:
Walmar, 2004