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EXCELENTÍSSIMO (A) SENHOR (A) DOUTOR (A) JUIZ DE DIREITO DA VARA CÍVEL DA

COMARCA DE FRANCA - SP
Nome, brasileiro, viú vo, analfabeto, aposentado, com 76 anos de idade, portador do RG:
00000-00e inscrito no CPF 000.000.000-00, residente e domiciliado à Endereçobairro Sã o
Luiz II, REPRESENTADO POR SUA IRMÃ E CURADORA PROVISÓ RIA, Nome, brasileira,
casada, aposentada, portadora do RG 00000-00e inscrita no CPF 000.000.000-00, residente
e domiciliada na Endereço, Jardim City Petró polis, nesta cidade, por suas advogadas infra-
assinadas, vem respeitosamente perante Vossa Excelência com fundamento nos artigos
166, 171, e seguintes do CC e art. 560 do CPC, propor a presente:
AÇÃ O DE ANULAÇÃ O/NULIDADE DE NEGÓ CIO JURÍDICO C/C DANOS MORAIS E
MATERIAIS E LIMINAR DE REINTEGRAÇÃ O/MANUTENÇÃ O DE POSSE
Em face de RENATA NomeGABRIEL IPÓ LITO , brasileira, casada, portadora do RG 00000-
00e inscrita no CPF sob nº 000.000.000-00, residente e domiciliada na EndereçoCEP
00000-000, pelos motivos de fato e de direito que passa a expor:
Prioridade de Tramitaçã o
O requerente possui nesta data 76 anos conforme identidade em anexo. Deste modo
preenche os requisitos para tramitaçã o prioritá ria do feito segundo artigo 71 do Estatuto
do Idoso, e o inciso I do artigo 1.048 do CPC.
Justiça Gratuita
Requer a concessã o dos benefícios da justiça gratuita ao autor, uma vez que nã o pode
suportar as custas e despesas processuais sem prejuízo de seu pró prio sustento.
DOS FATOS
No dia 06 de março de 2018 o autor fez uma doaçã o de nua propriedade com reserva de
usufruto vitalício, de seu ú nico imó vel registrado sob matricula nº 48.645, situado na
cidade de Franca na Endereçoº Tabeliã o de Notas e Protestos de Letras e Títulos de Franca,
para a donatá ria e requerida RENATA NomeGABRIEL IPÓ LITO conforme documento anexo.
Acontece que o fraudulento negó cio jurídico foi celebrado em desfavor de pessoa que nã o
estava em gozo de plenas faculdades mentais, além de ser induzido por pessoa que age com
má -fé, perpetrando ilícitos para obter vantagens econô micas, conforme adiante será
esclarecido.
Em fevereiro de 2018 a requerida Nomeaproximou-se do idoso, "ofertando-lhe ajuda", e
desde entã o passou a frequentar sua residência. Segundo a Sra. Nome(irmã do autor),
Nomeé pessoa desconhecida, nã o tem qualquer ligaçã o com o idoso e que apenas há muitos
anos atrá s foi vizinha deste, mas sequer mantinham relaçã o de amizade. A idosa, apó s
encontrá -la na residência do irmã o, pediu que ela se afastasse, mas a mesma se opô s
dizendo que estava ajudando o idoso por "caridade" e que continuaria se encontrando com
o mesmo.
Ocorre que a REQUERIDA aproveitou-se da condiçã o mental do Sr. Nomepara seduzi-lo e
enganá -lo, manejando uma doaçã o eivada de vícios de seu ú nico bem, além de apropriar-se
da sua aposentadoria, do aluguel recebido de seu inquilino, em prejuízo da pró pria
subsistência do autor.
A requerida Nomelevou o idoso na Instituiçã o Bancá ria onde este recebe a aposentadoria e
lá conseguiu a emissã o de novo cartã o magnético e nova senha, e realizou saques da conta
bancá ria e usou o cartã o de débito para gastos pessoais como abastecimento de veículo,
conforme extrato anexo.
Além dos valores acima, foi dado falta de um aparelho televisor, do telefone celular do
idoso e de uma correntinha de ouro usada por este, conforme descrito no Boletim de
Ocorrência de nº 512/2018, anexo aos autos.
Desde a aproximaçã o da requerida com o autor foi observado pelos vizinhos e pela família
que esta estava agindo de má -fé, pois dificultava o contato da irmã (Nome) com o pró prio
idoso; sendo que as fechaduras do imó vel foram trocadas porque a irmã do idoso tinha as
chaves. Em uma das tentativas de visitá -lo para levá - lo a uma consulta médica, a irmã teve
que solicitar o auxílio da Policia Militar, pois o autor estava trancado dentro do imó vel
sozinho.
A Requerida também solicitou ao Inquilino de uma residência localizada nos fundos do
terreno do imó vel em questã o, que os pagamentos dos aluguéis (no valor de R$ 00.000,00)
fossem feitos somente para ela. Posto isto, os aluguéis referentes aos meses de março em
diante foram recebidos por Nomee nã o foram repassados ao idoso até a presente data.
Cumpre ressaltar, que se trata de pessoa idosa em situaçã o de vulnerabilidade, que desde a
morte de sua esposa há 8 anos reside sozinho; o mesmo nã o constitui filhos, tendo como
parente mais pró ximo somente sua irmã de 77 anos, a Sra. Nome.
Importante ressaltar que o autor é analfabeto, possui surdez considerá vel, além de fazer
tratamento para depressã o e doença degenerativa (Parkinson) desde 2014, conforme
prontuá rio clínico em anexo.
O AUTOR é acompanhado pelo CRAS com uma assistente social, que o aconselhou a morar
com a irmã Nome, mas o mesmo se recusou.
Relata a irmã do idoso que devido à idade avançada e os problemas neuroló gicos, que este
nã o possui total discernimento para os atos civis até mesmo para atos corriqueiros, como
fazer o pagamento de contas, ir ao banco e ao supermercado. Relata ainda, que a mesma o
acompanha nas consultas médicas e o auxilia na rotina da casa, mas devido a distâ ncia que
moram um do outro e pela razã o da Sra. Nometambém ser pessoa idosa, é difícil o
acompanhamento diá rio.
O idoso apresenta picos de lucidez, e relatou a irmã que se arrependeu da doaçã o e está se
sentindo enganado, pois Nomefez promessas de manter relaçõ es sexuais com ele . Diante
do arrependimento, a família o levou até o cartó rio para revogar a doaçã o, mas foram
informados da necessidade de consentimento da donatá ria Nomeou que a revogaçã o fosse
feita mediante Açã o Judicial.
Desta forma, no dia 09/04/18 o caso foi representado diretamente no Ministério Pú blico,
onde foi instaurado processo sob nº 2076/2018, representaçã o que pleiteava entre outros
pedidos, a determinaçã o de medidas protetivas ao autor em analogia a Lei Nomeda Penha,
nos seguintes termos:
1 - para o afastamento da requerida da residência do autor;
2 - a proibição da requerida em manter contato com testemunhas (vizinhos) e com a família do idoso;
3- a proibição de contato e aproximação do idoso de no mínimo 100 metros.

Acontece que a situaçã o se agravou, uma vez que a integridade física do autor estava em
risco, pois este faz uso de medicamentos controlados, e nã o se sabia se estavam sendo
ministrados corretamente. O mesmo já fora encontrado aparentemente dopado e
"babando" e em outra ocasiã o já se encontrava cada vez mais debilitado e alimentando-se
por sonda nasal.
O autor se opunha em deixar a residência justificando que "estava com medo de perder a
casa", isso tudo porque Nome, aproveitando-se de sua falta de discernimento, exerceu forte
influência sobre ele de forma a amedrontá -lo, dizendo "que se um dia deixa-se a residência
para morar com sua irmã , nunca mais seria possível a sua volta" . Tanto é, que nas
tentativas da irmã em buscá -lo, a Nomeestava sempre presente e impedia a sua saída
repetindo por vá rias vezes o que fora citado acima.
Diante da demora na concessã o das medidas protetivas para afastamento da
requerida/Nome e do grave risco que o idoso estava sofrendo, pois sua residência estava
sendo frequentada por estranhos, foi ajuizada açã o para interdiçã o civil do mesmo, sendo
concedida a curatela provisó ria a sua irmã conforme processo de nº 1008077-
48.2018.8.26.0196 e despacho em anexo.
Apó s a interdiçã o, no dia 04/06/2018 a irmã do autor foi até sua residência para buscá -lo.
Acontece que Nomeestava no local e tentou impedir que o autor fosse levado, mesmo ciente
da interdiçã o civil. Além do mais, Nomeem determinado momento foi em direçã o a Sra.
Nome, aparentando que iria empurrá -la, mas que foi contida pela nora desta. Neste
momento Nomefez ameaças dizendo: "Nã o vou fazer nada com você nã o, mas vou mandar
uns moleques na sua casa, rachar você no meio!"(sic) e "Vou te pegar" conforme Boletim de
Ocorrência anexo.
A partir desta data o autor passou a residir com sua irmã , e novo cartã o para recebimento
da aposentadoria foi retirado por esta. Ocorre que no dia 07/06/18 a requerida
acompanhada de um terceiro, esteve na porta da residência da Sra. Nome, com o intuito de
buscar o autor e de aterrorizar a Sra. Nome. Houve interferência policial que solicitou que
Nomese retirasse do local.
Cumpre ainda esclarecer que foi informado por esta promotoria, que já existe um P. A.
(5218/2015) contra Nome, na qual se requereu a anulaçã o do casamento com outro idoso
(Joã o Ipó lito) com a justificativa que esta também o teria induzido e enganado. Há também
uma açã o judicial neste sentido, que esta em segredo de justiça, conforme processo nº
1021495-24.2016.8.26.0196.
Além disso, conforme relato da pró pria promotoria, a requerida é pessoa inidô nea, que
mantém casa (bar) frequentado por prostitutas (conforme notícia anexada aos autos),
cujos antecedentes evidenciam a má -fé da aproximaçã o com o autor.
Contudo, a requerida Nomeresiste em ficar na residência mesmo apó s a saída do autor.
Resiste ainda, em devolver os documentos pessoais do autor (RG, CPF e outros) além de
dificultar que a irmã busque os pertences pessoais do deste que ainda guarnecem a
residência.
DO DIREITO

1. DA FALTA DE DISCERNIMENTO
Compreende-se como alienaçã o mental qualquer distú rbio que possa afetar a vida civil do
indivíduo, gerando uma incapacidade em razã o do seu estado psíquico. Deste modo, uma
vez constatada uma anomalia mental, o individuo pode ser considerado incapaz para os
atos da vida civil, ainda que por motivo transitó rio.
No caso em tela, a senilidade vem acompanhada de um estado mental patoló gico. Isto se
deve ao uso controlado do medicamento SERTRALINA e DIAZEPAM para o tratamento de
depressã o em conjunto do medicamento AMANTADINA para o tratamento do Parkinson
como também pela idade avançada.
Segundo os médicos, a demência se desenvolve no curso da doença de Parkinson quando já
esta estabelecida em seus estados mais graves. Conforme site oficial da Anvisa 1 , o
medicamento AMANTADINA apresenta os seguintes efeitos colaterais que afetam o estado
psíquico do paciente:
"(...) náuseas, tontura, insônias, episódios depressivos, irritabilidade, alucinações, confusão, (...) nervosismo,
alterações dos sonhos, agitação, diarreia e fadiga. (...) Outras reações adversas já relatadas incluem: Sistema
Nervoso Central: coma, estupor, delírios, diminuição dos movimentos, contratura de músculo, comportamento
agressivo, mania de perseguição, euforia, movimentos involuntários anormais, anormalidades da marcha,
formigamentos, tremores e alterações no eletroencefalograma. A interrupção abrupta do tratamento pode
desencadear alguns desses sintomas."

Além disso, o medicamento DIAZEPAM também apresenta efeitos colaterais e influencia no


estado mental do paciente, conforme o que se desprende no que dispõ e a Anvisa sobre este
medicamento:
Reações psiquiátricas e "paradoxais": reações psiquiátricas, como inquietude, agitação, irritabilidade,
agressividade, ilusão , raiva, pesadelos, alucinações, psicoses, comportamento inadequado e outros efeitos
adversos comportamentais, podem ocorrer com o uso de benzodiazepínicos. Quando isso ocorre, deve-se
descontinuar o uso da droga. Esses efeitos são mais prováveis em crianças e idosos . Amnésia: os
benzodiazepínicos podem induzir a amnésia anterógrada (incapacidade de reter fatos novos na memória, após a
ingestão do benzodiazepínico). Esta pode ocorrer com o uso de doses terapêuticas, com aumento do risco em
doses maiores. Esses efeitos podem estar associados com comportamento inapropriado. 2

In casu, é evidente que a donatá ria se beneficiou da condiçã o mental do autor para
conseguir a casa em doaçã o, além de usufruir de valores de sua aposentadoria e alugueres,
indispensá veis para sua sobrevivência. Na ocasiã o, aproveitou-se de forma oportunistas de
todas as possibilidades de enriquecer-se ilicitamente o que deflagra a nulidade do ato
jurídico em questã o.
2 Disponível em:
2 DA ANULAÇÃ O/NULIDADE DO NEGÓ CIO JURÍDICO
O idoso, analfabeto e que a época estava com 75 anos, nã o apresentava saú de mental que
lhe permitisse discernir os atos que estava praticando e suas consequências. Tanto é que o
idoso em certos momentos relata que "é o dono do imó vel" e nã o entende que passou a
propriedade do imó vel à requerida e em outros momentos, diz que se arrependeu da
doaçã o e que quer o imó vel novamente.
Conforme artigo 166 do CC, poderá ser decretada a nulidade do negocio jurídico no caso de
pessoa absolutamente incapaz:
"Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:
I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz;
II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;
III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;"

Além disso, pode ser considerado anulá vel o negó cio, conforme as seguintes hipó teses
demonstradas 3 :
• Serã o anulá veis os negó cios se:
a) praticados por pessoa relativamente incapaz ( CC, art. 4º) sem a devida assistência de seus legítimos
representantes legais ( CC, art. 1.634, V);
b) viciados por erro (RT, 555:86, 804:214), dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores ( CC,
arts. 138 a 165);
c) a lei assim o declarar, tendo em vista a situação particular em que se encontra determinada pessoa ( CC, art.
1.650).
Art. 171. Além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o negócio jurídico:

I - por incapacidade relativa do agente; II - por vício resultante de erro, dolo, coaçã o,
estado de perigo, lesã o ou fraude contra credores.
Neste sentido, já decidiu o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Sã o Paulo:
"Ação de anulação de ato jurídico cumulada com pedido de antecipação de tutela - Alegação de que o casal de
doadores não tinha capacidade para a prática do ato - Casal que estava sendo atendido pelo Creas quase um ano
antes da doação - Relatórios atestando as precárias condições em que o casal vivia indicando pouca capacidade de
discernimento - Casal que mantinha grande soma de dinheiro em conta bancária e desconhecia o poder de compra
daqueles valores - Relatório demonstrando que o casal não tinha ciência da doação mesmo após a realização do
ato - Ação de interdição ajuizada antes da doação - Realização do ato por escritura pública que não afasta a
possibilidade de avaliação da capacidade de discernimento dos doadores - Capacidade afastada - Doação
declarada nula - Sentença de procedência confirmada - Recurso não provido.
(TJ-SP 00064636320148260358 SP 0006463- 63.2014.8.26.0358, Relator: Marcia Dalla Déa Barone, Data de
Julgamento: 13/03/2018, 3a Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 13/03/2018)
Ocorre que no caso em tela, o doador e autor da presente açã o, apesar de a época do
negó cio jurídico nã o estar interditado, é nítido que estava incapacitado para prá tica dos
atos civis, uma vez que desde 2014 já apresentava a doença de Parkinson, bem como já
fazia tratamento para depressã o e utilizava medicamentos controlados (Amantadina,
Diazepam e Sertralina) . Já decidiu o STJ em caso semelhante pela retroatividade dos efeitos
da interdiçã o para anular os negó cios jurídicos realizados antes mesmo da sentença de
interdiçã o, conforme jurisprudência a seguir:
"Negócio jurídico Doação de bem imóvel - Ato realizado por idoso, octogenário, analfabeto, com surdez
importante e portador de transtornos depressivos. Posterior decreto de interdição do doador por incapacidade
absoluta . Laudo pericial que estimou o período de surgimento da doença. Causa da incapacidade já existente
quando da celebração do ato - Nulidade do negócio jurídico reconhecida por afronta a regra de ordem pública.
Decisão reformada. Recurso provido para julgar a ação procedente. Não é a interdição que retira da pessoa o
discernimento, nem é ela, portanto, que o faz incapaz. A interdição declara o que já existe, ou seja, o déficit mental
da pessoa. A nulidade dos atos praticados por pessoa incapaz pode ser decretada, esteja ou não declarada
judicialmente a interdição, desde que praticados quando já existente a causa da incapacidade civil. (Agravo de
Instrumento nº 0025137-10.2002.8.26.0003.Orgão julgador: 3º Câmara de Direito Privado. Data do julgamento:
27/09/2011.Fonte: STJ)"

O efeito ex tunc já foi reconhecido para nulidade de Escritura Pú blica de Doaçã o, de pessoa
idosa acometida de doença degenerativa, em perfeita sintonia com a hipó tese dos autos,
conforme jurisprudência a seguir:
EMENTA: DUPLO RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATO JURÍDICO
(ESCRITURAS PÚBLICAS) C/C REINTEGRAÇÃO DE POSSE COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA .
INCAPACIDADE ABSOLUTA DO AUTOR. DOENÇA MENTAL DEGENERATIVA INCURÁVEL (MAL DE ALZHEIMER).
CONTEXTO PROBATÓRIO. PROVA DA INCAPACIDADE ANTERIOR À SENTENÇA DE INTERDIÇÃO.
CONTEMPORANEIDADE DOS ATOS JURÍDICOS E A INCAPACIDADE ABSOLUTA . EFEITO EX TUNC. NULIDADE
PARCIALMENTE RECONHECIDA DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS. PRESERVAÇÃO DO INTERESSE DE TERCEIROS À ÉPOCA
MAIS REMOTA. PRINCÍPIOS DA BOA FÉ E DA SEGURANÇA JURÍDICA. AUSÊNCIA DE PROVA INEQUÍVOCA, ROBUSTA
E CONVINCENTE DA INCAPACIDADE DO INTERDITADO. SIMULAÇÃO NÃO COMPROVADA. RECURSOS CONHECIDOS
E DESPROVIDOS. SENTENÇA INTACTA.
1. Os negócios jurídicos celebrados por pessoa absolutamente incapaz são nulos, ainda que não decretada
judicialmente sua interdição. Como a incapacidade preexiste, possível intentar ação anulatória dos atos praticados
anteriormente à sentença, devendo-se, no entanto, provar a incapacidade àquela época. Extrai-se do contexto
probatório, provas contundentes que o interditado, desde então, não detinha condições cognitivas plenas de gerir
seus bens e sua pessoa, corroborado por laudo médico atestando o comprometimento de seu juízo crítico. 2. Das
provas documentais coligidas, de fato, o Autor era absolutamente incapaz, à época em que celebrou os negócios
jurídicos em questão, porquanto estes foram realizados à época da constatação de sua debilidade psíquica e
decretação de interdição. Tem, portanto, eficácia ex tunc. 3. Há necessidade de se resguardar o direito de terceiros
de boa-fé, atento ao princípio da segurança jurídica, frente à negativa de reconhecimento de nulidade dos demais
negócios jurídicos, praticados à época mais remota à sentença de interdição, o que in casu, reclama prova
inequívoca, robusta e convincente da incapacidade do interditado, estas, ausentes nos autos. Precedentes do STF e
STJ. RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS. APELAÇÃO CÍVEL Nº 3092-88.2010.8.09.0040 (201090030924)

COMARCA EDÉ IA RELATOR Desembargador Nome. Data do Julgamento 24/09/18.


2.1 DA NULIDADE DA DOAÇÃ O SEM RESERVA DE BENS E RENDAS
A doaçã o com usufruto é feita justamente para garantir renda e moradia a alguém. Pois
bem, no caso verifica-se que os frutos do bem doado (aluguel da casa dos fundos) sequer
foram revertidos em benefício do doador, o que lhe causou grave prejuízo a sua
subsistência, e neste caso é nula a doaçã o feita sob estas circunstâ ncias, conforme prevê o
artigo 548 CC, in verbis:
Art. 548. É nula a doação de todos os bens sem reserva de parte, ou renda suficiente para a subsistência do
doador.

A finalidade da norma restritiva é da proteçã o do doador, para afastar qualquer privaçã o


que possa vir a sofrer devido à doaçã o. Nã o basta para tanto, mera indicaçã o na escritura
pú blica assegurando-lhe esse direito (usufruto vitalício), pois somente é atingida esta
finalidade se de fato é lhe reservado esse direito.
No caso concreto, resta nítido que o recebimento de aposentadoria no valor líquido
aproximado de R$ 00.000,00mensais é insuficiente para subsistência do doador
configurando a tipificaçã o da doaçã o universal.
Além do mais, o autor sendo usufrutuá rio tem por direito consagrado no ordenamento
jurídico, a posse, o uso, a administraçã o e percepçã o dos frutos conforme artigo 1.214 do
CC"O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar, aos frutos percebidos". Neste
sentido, a doutrina esclarece:
" A regra geral é a de que "o usufrutuário tem direito à posse, uso, administração e percepção dos frutos"(art.
718). A posse, a que se refere o legislador, natural no usufrutuário, é a direta, que não anula nem exclui a indireta
do nu proprietário (art. 496). Como possuidor, pode o usufrutuário impetrar proteção possessória para reaver ou
conservar a posse, embora contra o nu proprietário, caso venha este a molestá-lo "(Curso de Direito Civil, vol. 3,
15a. ed. , Saraiva , SP , 1976, pág. 310). Neste sentido, confira-se: Orlando Gomes, Direitos Reais, 3a. edição, Tomo
2o., págs. 394/395; Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, vol. IV, págs. 241/242.

3 - DA REINTEGRAÇÃO DE POSSE
Como se nã o bastasse, a requerida se recusa a sair do imó vel, impedindo que o autor possa
viver nele livremente, e ainda recebe os alugueis do inquilino prejudicando a subsistência
do autor.
O Có digo Civil assegura a todo aquele que tiver sido privado de sua posse, injustamente,
por violência, clandestinidade ou precariedade, o direito de nela ser restituído, isto posto,
vejamos:
"Art. 1196. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes
inerentes à propriedade".
"Art. 1210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e
segurado de violência iminente, se tiver justo receito de ser molestado".

Cumpre salientar, que os pertences do autor permanecem no imó vel, o que justifica a posse
direta do imó vel por este, nos termos do artigo 1.209 do CC"A posse do imó vel faz
presumir, até prova contrá ria, a das coisas mó veis que nele estiverem".
A posse do imó vel acerca do qual se funda a demanda está devidamente comprovada
também pela certidã o anexa, expedida pelo cartó rio de registro de imó veis de Franca/SP,
atestando a regularidade do registro do imó vel em nome do autor da presente açã o
(matrícula do imó vel - nº. 48.645), documento que, segundo a jurisprudência, é bastante
para tal finalidade:
"(...) IMÓVEL. PROPRIEDADE. REGISTRO (...) A propriedade de bem imóvel se dá através da certidão do cartório de
registro de imóveis do respectivo imóvel"(TJMG, proc. 1.0024.10.184017, Rel. Des. Antônio Bispo, DJ de
07/07/2014).

O Có digo de Processo Civil, por sua vez, confirma a vontade do legislador conferindo ao
possuidor esbulhado o direito de ser reintegrado na posse perdida injustamente, in verbis:
"Art. 560. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação e reintegrado no de esbulho".
"Art. 561 - Incumbe ao autor provar: I - a sua posse; II - a turbação ou o esbulho praticado pelo réu; III - a data da
turbação ou do esbulho; IV - a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção a perda da posse
na ação de reintegração."

O esbulho sofrido está devidamente caracterizado pelos fatos acima narrados, que poderã o
ser comprovados pelas testemunhas durante a instruçã o processual.
A saída do autor de sua residência se deu devido a curatela, a necessidade de cuidados e
diante da ameaça a sua integridade física. O que nã o dá o direito a donatá ria e requerida
que frequente, se instale no imó vel, e passe a usufruir dos pertences que o guarnecem, nem
mesmo dos frutos percebidos dos aluguéis. Neste sentido, o E. Tribunal de Minas Gerais
entende que:
AÇÃO POSSESSÓRIA. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. ABANDONO DO IMÓVEL. LIMINAR. PRESENÇA DOS REQUISITOS. A
simples ausência dos possuidores do imóvel, mesmo que prolongada, não caracteriza o seu abandono. Presentes
os requisitos do artigo 927 do CPC, quais sejam, a sua posse, o esbulho praticado pelo
Agravante, bem como a data da perda da posse, concomitantemente com os requisitos da fumaça do bom direito
e do perigo da demora, é de se confirmar a liminar de reintegração. Agravo não provido. (AGRAVO Nº
1.0687.00000-00/001, 10a Câmara Cível, Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Relator: Des. Cabral da Silva, Data do
Julgamento 19/02/2008)

3.1 - DO CABIMENTO DE PEDIDO LIMINAR


Disciplina o art. 562, caput, do CPC, no que atina aos temas"manutençã o e reintegraçã o de
posse", que:
"Art. 562. Estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá, sem ouvir o réu, a expedição do
mandado liminar de manutenção ou de reintegração (...)".

Ainda, havendo comprovaçã o da posse, do esbulho e da data de sua ocorrência, é cediço


que seja cabível a concessã o de pedido liminar de reintegraçã o de posse, conforme já
decidiu o egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais:
"(...) REINTEGRAÇÃO DE POSSE - PROVA DA POSSE E DO ESBULHO PRESENTES - LIMINAR - POSSIBILIDADE -
Existindo a comprovação da posse, do esbulho, da data da sua ocorrência, bem como da perda da posse, nos
exatos termos do artigo 927 do CPC, cogente resta a concessão de liminar de reintegração de posse"(TJMG, proc.
1.0433.00000-00/001, Rel. Des. Pedro Aleixo, DJ de 18/03/2016).

Consoante entendimento jurisprudencial acima e a doutrina, no caso de açã o de força nova


(posse nova), é cabível é a expediçã o de mandamus para o fim de reintegraçã o imediata da
posse esbulhada ou turbada, antes mesmo da citaçã o do réu, bastando apresentar fatos e
documentos que comprovem a plausibilidade do alegado .Neste prisma:
" (...) O que diferencia as ações de força nova e velha é que somente naquelas o juiz pode conceder liminar (...) A
cognição para o deferimento da liminar será ainda superficial, pois o juiz só terá tido oportunidade de examinar os
elementos trazidos pelo autor. Portanto, não cabe exigir, aqui, prova cabal e definitiva do preenchimento dos
requisitos, bastando a plausibilidade de que os fatos tenham ocorrido tal como descritos na inicial (...) A medida
não é providência acautelatória. (...) O que ela faz é atender, ainda que em caráter provisório, a pretensão do
autor, satisfazendo e antecipando os efeitos do provimento final. Assim, se o autor requerer a reintegração da
posse, a concessão de liminar será bastante para que o autor já recupere, desde logo, a posse perdida
(...)"(GONÇALVES, Marcus Vinícius Rios. Procedimentos especiais - 10. Ed. - São Paulo: Saraiva, 2012 - Sinopses
jurídicas; v. 13, p. 71) - Grifo nosso.

O periculum in mora se evidência diante da má -fé da requerida, que desde o inicio de sua
aproximaçã o prejudicou o autor e na iminência de outros atos que possam vir a prejudicá -
lo, de forma irrepará vel, se esta continuar frequentado o imó vel.

4 - DA NÃO CONVALIDAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO (DOAÇÃO)


Disciplina o art. 1.227 do Có digo Civil que os direitos reais sobre imó veis apenas se
convalidam com o devido registro no Cartó rio de Registro de Imó veis nos referidos
títulos"Os direitos reais sobre imó veis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos,
só se adquirem com o registro no Cartó rio de Registro de Imó veis dos referidos títulos
(arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Có digo".
Conforme Certidã o atualizada da matrícula do Imó vel, verifica-se que a doaçã o ainda nã o
fora averbada junto a esse título, sendo, portanto, legítimo proprietá rio do imó vel o autor.
5 DOS DANOS MORAIS E MATERIAIS
Conforme o que fora relatado, a ré se aproveitou de uma pessoa idosa, frá gil e solitá ria. Nã o
há duvidas que Nomemanteve conduta ilícita ao causar danos irrepará veis para ao Sr.
Nome, pois, pela idade passou por situaçõ es desumanas, sendo que teve que ser afastado
de seu pró prio lar diante da grave ameaça a sua integridade física; como também causou a
sua irmã grave abalo emocional diante a situaçã o causada e as ameaças direcionadas a esta.
Aliá s, mediante os ilícitos perpetrados a requerida tentou enriquecer- se ilicitamente, o que
é vedado pelo Có digo Civil, conforme disciplina o artigo Art. 884 que dispõ e:"Aquele que,
sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente
auferido, feita a atualizaçã o dos valores monetá rios."
Nos ensinamentos de NomeHelena Diniz 4 , ao tratar do dano moral, ressalva que a
REPARAÇÃ O tem sua dupla funçã o:
a) a penal" constituindo uma sanção imposta ao ofensor, visando à diminuição de seu patrimônio, pela indenização
paga ao ofendido, visto que o bem jurídico da pessoa (integridade física, moral e intelectual) não poderá ser
violado impunemente ",
b) função satisfatória ou compensatória, pois" como o dano moral constitui um menoscabo a interesses jurídicos
extra patrimoniais, provocando sentimentos que não têm preço, a reparação pecuniária visa proporcionar ao
prejudicado uma satisfação que atenue a ofensa causada ".
O Ministro Oscar Correa, em acó rdã o do STF (RTJ 108/287), ao falar sobre dano moral,
bem salientou que:
"não se trata de pecúnia doloris, ou pretium doloris, que se não pode avaliar e pagar; mas satisfação de ordem
moral, que não ressarce prejuízo e danos e abalos e tribulações irreversíveis, mas representa a consagração e o
reconhecimento pelo direito, do valor da importância desse bem, que é a consideração moral, que se deve
proteger tanto quanto, senão mais do que os bens materiais e interesses que a lei protege".
Ressalta ainda, Carlos Alberto Bittar 5 :
"Na fixação da indenização devem ser abrangendo os danos positivos e os negativo, ou seja, os desfalque efetivo
havido no patrimônio de lesado e o ganho que, pela ausência da prestação, deixou de auferir. Regem a matéria os
princípios da integralidade da reparação e da responsabilidade patrimonial do agente. Desse modo, na
determinação das perdas e danos, cumpre verificar-se, de início, a diminuição concreta importada pelo patrimônio
do credor, em seus aspectos moral e material, a fim de devolver-lhe o equilíbrio."

O direito a indenizaçã o é assegurado pelo artigo 5º, inciso X da Constituiçã o Federal, bem
como o Có digo Civil nos artigos 186 e 927 estabelecem que aquele que violar direito e
causar um dano patrimonial, bem como moral comete ato ilícito. Sendo assim, será
obrigado a repará -los.
A obrigaçã o da requerida Nomese estende além dos danos morais, ao pagamento dos danos
materiais. Os valores apropriados ilicitamente do Sr. Nomecompreendem o montante de R$
00.000,00sendo os seguintes valores:
- Saque da aposentadoria dos meses de março a junho no valor total de R$ 00.000,00;
- Aluguel recebido referente aos meses de março até junho, sendo o valor de total R$
00.000,00;
- Valor de R$ 00.000,00referentes à Certidã o da Escritura Pú blica de Doaçã o que a irmã
teve que despender para o ajuizamento da presente açã o;
- Valor de R$ 00.000,00referentes à Certidã o atualizada da matrícula do imó vel.
DOS PEDIDOS
Diante o exposto, requer:
1 - A concessã o de prioridade na tramitaçã o do feito conforme artigo
71 do Estatuto do Idoso;
2 - Seja deferida justiça gratuita ao autor conforme autoriza a
Constituiçã o Federal, e nos termos da lei a Lei nº 1060/50;
3 - A concessã o, inaudita altera pars, da tutela de urgência nos
termos do art. 300 e seguintes do CPC, para:
3.1 - Determinar a prénotaçã o na matrícula do imó vel nº 48.645, o bloqueio proveniente de
ordem judicial, evitando-se que a requerida Nomefaça a averbaçã o da doaçã o e para que se
evite a alienaçã o do imó vel em discussã o, a fim também de resguardar terceiro de boa-fé,
nos termos do artigo 615-A do CPC;
3.2 - que seja o autor reintegrado/mantido na posse do imó vel situado à EndereçoCEP
00000-000, pois como demonstrado é de sua propriedade e o requerente jamais deixou de
zelar por ele, com ordem para desocupaçã o do imó vel por parte da REQUERIDA;
4 - A citaçã o da REQUERIDA por Oficial de Justiça, para que,
querendo, apresente a defesa que entender cabível, no prazo de 15 dias sob pena de
revelia;
5 - A intimaçã o o Ministério Pú blico para que intervenha em todas
as fases desta demanda, em cumprimento do artigo 178, Inc II CPC;
6 - Seja julgado procedente a presente açã o, declarando a nulidade
da doaçã o efetivada através da escritura pú blica lavrada no dia 06/03/2018 no 2º Tabeliã o
de Notas e de Protestos de Letras e Títulos de Franca, no livro de nº 1443 à s fls. 309,
referente a matrícula imobiliá ria nº 48.645;
7 - Requer a condenaçã o de Nomeà indenizaçã o dos danos
morais por eles suportados, em quantia a ser estipulada pelo juiz, com base em todo o
exposto, bem como aos danos matérias no valor de R$ 00.000,00;
8 - A condenaçã o da requerida no pagamento das custas e despesas
processuais, e honorá rios de sucumbência;
9 - Requer ainda, o julgamento antecipado da lide, nos termos artigo
355 do CPC, por se tratar de questã o preponderante de direito, cujo os fatos e documentos
juntados aos autos sã o satisfató rios para prestaçã o jurisdicional em face das circunstancias
do caso.
Protesta provar por todos os meios de prova admitidos.
Dá -se a causa o valor de R$ 00.000,00- considerando o valor venal de R$ 00.000,00do
imó vel e valor dos danos morais).
Termos em que,
Pede deferimento. Franca, 06 de julho de 2018.
Nome
00.000 OAB/UF
Nome
00.000 OAB/UF

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