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Caso: Nizete que nasceu em 2005, foi criada por sua mãe Beatriz e sua avó Olga. Quando
Nizete perguntava sobre o pai, Beatriz desconversava ou caía em prantos, dizendo que
ela e a avó eram a família de Nizete e sugerindo que a filha seria ingrata por não
reconhecer os esforços das duas para lhe oferecerem tudo o que podiam.
Nizete se sentia culpada, mas a dúvida sobre quem era seu pai continuava a lhe inquietar.
Um dia, em conversa com sua madrinha Sara, esta lhe revelou que Beatriz, quando disse
ao pai de Nizete que estava grávida, foi rechaçada: Edgar disse que não se
responsabilizaria e sua família não aceitaria a filha de uma faxineira. Humilhada, Beatriz
se demitiu da residência dos Sampaio Cotrim e nunca mais procurou Edgar.
Após muito pensar, Nizete resolveu ir atrás de seu pai biológico, pois não achava justo
passar por tantas dificuldades enquanto o pai pertencia a uma família abastada e poderia
lhe ter dado condições de vida muito mais favoráveis.
Ao bater à porta dos Sampaio Cotrim, foi atendida pelo próprio Edgar, hoje, já
aposentado. Quando Nizete lhe explicou a que viera, Edgar se enfureceu, alegando tratar-
se de uma interesseira que apenas visava o lucro fácil. Nizete, então, buscou resolver o
problema amigavelmente, conforme comprovam três telegramas, mas não obteve
resposta.
Nizete foi atrás de um (a) advogado (a) por estar disposta a não aceitar calada humilhação
semelhante à tolerada por sua mãe. Informa ainda que quer passar a usar o sobrenome do
pai e que, no momento, não deseja pleitear alimentos para mostrar ao pai que sua intenção
não é patrimonial.
I – DOS FATOS
A autora nasceu em 10 de outubro de 2005 e foi registrada unicamente pela mãe,
Beatriz (sobrenome), sendo declarado desconhecido o pai, segundo certidão de
nascimento anexa. A autora foi criada sem nenhuma informação a respeito de quem era
seu pai.
Sua madrinha, a senhora Sara (sobrenome), amiga de infância da genitora,
informou-lhe apenas recentemente a identidade de seu pai. A mãe da autora e o réu
mantiveram, secretamente, relacionamento amoroso pelo período de um ano e meio,
segundo atestam as cartas anexas a esta petição; esse fato pode também ser comprovado
por pessoas que os conheceram à época.
A autora procurou o réu tão logo soube de sua ascendência, mas foi imediatamente
rechaçada por ele sob a alegação de que intentava mero enriquecimento às suas custas e
que, idoso, não ia permitir ter seu patrimônio dilapidado.
Tendo procurado auxílio jurídico, a autora buscou resolver o problema
amigavelmente, convidando o réu para uma sessão de mediação, conforme comprovam
os três telegramas anexos; como não obteve resposta, não lhe resta outra via senão o
socorro do Poder Judiciário.
II – DO DIREITO
Assiste à autora o direito a ter reconhecido seu vínculo de filiação para com o réu.
Afinal, segundo o art. 27 da Lei 8.069/90, “o reconhecimento do estado de filiação é
direito personalíssimo, indisponível e imprescritível”.
É pacífico hoje, na doutrina e na jurisprudência pátrias, o reconhecimento de que o
conhecimento da origem genética integra o rol dos direitos da personalidade. Em
precedente relevante da lavra da Ministra Nancy Andrighi, ficou assentado que:
Os direitos da personalidade, entre eles o direito ao nome e ao conhecimento
da origem genética são inalienáveis, vitalícios, intransmissíveis,
extrapatrimoniais, irrenunciáveis, imprescritíveis e oponíveis erga omnes.
(...) O direito à busca da ancestralidade é personalíssimo e, dessa forma,
possui tutela jurídica integral e especial, nos moldes dos arts. 5.º e 226,
da CF/88. (STJ, REsp 807.849/RJ, 2.ª Seção, Rel. Min. Nancy Andrighi, j.
24 mar. 2010, DJ 06 ago. 2010.)
a) a procedência integral do pedido, para declarar que a autora é filha do réu, com a
consequente retificação do registro civil da autora, devendo constar de sua certidão de
nascimento ser filha do Sr. Edgar Sampaio Cotrim e ser agregado ao seu nome o prenome
Sampaio Cotrim;
b) a citação do réu por oficial de justiça para comparecer à audiência de mediação a
ser designada por esse juízo;
c) a produção de prova documental, testemunhal e especialmente pericial (exame de
DNA), além do depoimento pessoal do réu;
d) que o processo corra em segredo de justiça (CPC, art. 189, II).
e) a condenação do réu no ônus da sucumbência.
Dá-se à causa o valor de R$ 1.000,00 (mil reais) para fins de distribuição.
Extraído do Livro Processo Civil no Direito de Família. Fernanda Tartuce. 4 ed., 2019.
P. 514 a 518, com adaptações.