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Informativo 672-STJ
Márcio André Lopes Cavalcante

ÍNDICE
DIREITO CIVIL
DIREITOS DA PERSONALIDADE
Na exposição pornográfica não consentida, o fato de o rosto da vítima não estar evidenciado de maneira flagrante
é irrelevante para a configuração dos danos morais.

LOCAÇÃO DE IMÓVEIS URBANOS


A notificação premonitória é pressuposto processual para a ação de despejo por denúncia vazia de contrato de
locação por prazo indeterminado.

SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO


Os prejuízos resultantes de sinistros relacionados a vícios estruturais de construção estão acobertados pelo seguro
habitacional obrigatório, vinculado a crédito imobiliário concedido para aquisição de imóvel pelo SFH.

PROMESSA DE COMPRA E VENDA


É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de
compra e venda, ainda que desprovido de registro, de imóvel adquirido na planta que se encontra em fase de
construção.
A averbação do desmembramento de imóvel urbano é condição indispensável para a procedência da ação de
adjudicação compulsória.

DIVÓRCIO
Incidem juros e correção monetária sobre o valor econômico de cotas sociais objeto de partilha em divórcio sendo
que, após a separação de fato do casal, essa empresa ficou sob a administração exclusiva de um dos ex-cônjuges
até o encerramento de suas atividades.

AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE


A averbação de sentença proferida em ação negatória de filiação não consubstancia, em si, um direito subjetivo
autônomo das partes litigantes, tampouco se confunde com o direito personalíssimo ali discutido.

SUCESSÕES
A cessão de direitos hereditários sobre bem singular viabiliza a transmissão da posse, que pode ser objeto de tutela
específica na via dos embargos de terceiro.

DIREITO DO CONSUMIDOR
RESPONSABILIDADE PELO FATO DO SERVIÇO
Na hipótese de responsabilidade civil de médicos pela morte de paciente em atendimento custeado pelo SUS incidirá
o prazo do art. 1º-C da Lei nº 9.494/97, segundo o qual prescreverá em cinco anos a pretensão de obter indenização.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1


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DIREITO EMPRESARIAL
LETRA DE CÂMBIO
Na letra de câmbio não aceita não há obrigação cambial que vincule o sacado e assim, o sacador somente tem ação
extracambial contra o sacado não aceitante, cujo prazo prescricional não sofre as interferências do protesto do
título de crédito.

FALÊNCIA
O ajuizamento de execução fiscal em momento anterior à decretação da quebra do devedor não enseja o
reconhecimento da ausência de interesse processual do ente federado para pleitear a habilitação do crédito
correspondente no processo de falência.

RECUPERAÇÃO JUDICIAL
Nos casos em que há aditamento ao plano de recuperação judicial, o termo inicial do prazo bienal de que trata o
art. 61, caput, da Lei nº 11.101/2005 deve ser a data da concessão da recuperação judicial.

ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE


INTERNAÇÃO
Se a internação for aplicada sem termo, o cálculo do prazo prescricional deverá levar em consideração a duração
máxima da internação (3 anos).

CUMPRIMENTO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA


É válida a extinção de medida socioeducativa de internação quando o juízo da execução, ante a superveniência de
processo-crime após a maioridade penal, entende que não restam objetivos pedagógicos em sua execução.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL


HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Se houve a extinção da execução fiscal a pedido do exequente, mas o crédito tributário permanece sendo discutido
judicialmente em outra demanda, os honorários advocatícios devem ser arbitrados por apreciação equitativa.

PENHORA
São penhoráveis os valores oriundos de empréstimo consignado, salvo se o mutuário comprovar que os recursos são
necessários à de sua manutenção e de sua família.

PROCEDIMENTOS ESPECIAIS (EMBARGOS DE TERCEIRO)


Não são cabíveis embargos de terceiro para desconstituir decisão judicial que permite a averbação de protesto na
matrícula de um imóvel.

DIREITO PENAL
PRESCRIÇÃO
Acórdão que confirma ou reduz a pena interrompe a prescrição.

INJÚRIA
A ausência de previsibilidade de que a ofensa chegue ao conhecimento da vítima afasta o dolo específico do delito
de injúria, tornando a conduta atípica.

ESTELIONATO
Não se admite a incidência do princípio da insignificância na prática de estelionato qualificado por médico que, no
desempenho de cargo público, registra o ponto e se retira do hospital

FALSIDADE IDEOLÓGICA
Na falsidade ideológica, o termo inicial da contagem do prazo da prescrição da pretensão punitiva é o momento da
consumação do delito (e não o momento da eventual reiteração de seus efeitos).

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DIREITO PROCESSUAL PENAL


PROVAS
O ato de delegação da condução e direção de produção de prova oral à autoridade estrangeira, a fim de que esta
proceda diretamente à inquirição da testemunha ou do investigado, não encontra qualquer tipo de respaldo
constitucional, legal ou jurisprudencial.

DIREITO TRIBUTÁRIO
IMPOSTO DE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS
Havendo mero deslocamento para outro estabelecimento ou para outra localidade, permanecendo o produto sob
o domínio do contribuinte, não haverá incidência do IPI.

PIS E COFINS
Aproveitamento de créditos de PIS e Cofins e sistema monofásico.

DIREITO CIVIL

DIREITOS DA PERSONALIDADE
Na exposição pornográfica não consentida, o fato de o rosto da vítima não estar evidenciado de
maneira flagrante é irrelevante para a configuração dos danos morais

Caso concreto: Paulo e Letícia eram namorados. Paulo tirou fotografias de Letícia em que ela
aparece de biquini, em poses sensuais, mas sem aparecer seu rosto. Após o fim do
relacionamento, Paulo, como forma de vingança, publicou tais imagens em um perfil criado no
Facebook. Letícia denunciou as publicações por meio dos canais disponibilizados pelo
Facebook, no entanto, a plataforma não aceitou retirar as fotografias alegando que não são
fotografias pornográficas (considerando que não há nudez), além do fato de não estar sendo
exposto de forma evidente.
O STJ não concordou com os argumentos do Facebook e o condenou a pagar indenização por
danos morais em favor da autora.
A “exposição pornográfica não consentida”, da qual a “pornografia de vingança” é uma espécie,
constituiu uma grave lesão aos direitos de personalidade da pessoa exposta indevidamente,
além de configurar uma grave forma de violência de gênero que deve ser combatida de forma
contundente pelos meios jurídicos disponíveis.
Não há como descaracterizar um material pornográfico apenas pela ausência de nudez total.
Neste caso concreto, a autora encontra-se sumariamente vestida, em posições com forte apelo
sexual.
O fato de o rosto da vítima não estar evidenciado nas fotos de maneira flagrante é irrelevante
para a configuração dos danos morais na hipótese, uma vez que a mulher vítima da
pornografia de vingança sabe que sua intimidade foi indevidamente desrespeitada e,
igualmente, sua exposição não autorizada lhe é humilhante e viola flagrantemente seus
direitos de personalidade.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.735.712-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/05/2020 (Info 672).

Imagine a seguinte situação hipotética:


Paulo e Letícia eram namorados.
Paulo tirou fotografias de Letícia em que ela aparece de biquini, em poses sensuais, mas sem aparecer seu
rosto.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 3


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Após o fim do relacionamento, Paulo, como forma de vingança, publicou tais imagens em um perfil criado
no Facebook.
Letícia denunciou as publicações por meio dos canais disponibilizados pelo Facebook, no entanto, a
plataforma não aceitou retirar as fotografias alegando que não são fotografias pornográficas
(considerando que não há nudez), além do fato de não estar sendo exposto de forma evidente.

O que decidiu o STJ?


O STJ não concordou com os argumentos do Facebook e condenou a empresa a pagar indenização por
danos morais em favor da autora.
A “exposição pornográfica não consentida”, da qual a “pornografia de vingança” (revenge porn) é uma
espécie, constituiu uma grave lesão aos direitos de personalidade da pessoa exposta indevidamente, além
de configurar uma grave forma de violência de gênero que deve ser combatida de forma contundente
pelos meios jurídicos disponíveis.
Não há como descaracterizar um material pornográfico apenas pela ausência de nudez total. Neste caso
concreto, a autora encontra-se sumariamente vestida, em posições com forte apelo sexual, tipicamente
feita a um parceiro por quem ela nutria confiança.
O fato de o rosto da vítima não estar evidenciado nas fotos de maneira flagrante é irrelevante para a
configuração dos danos morais na hipótese, uma vez que a mulher vítima da pornografia de vingança sabe
que sua intimidade foi indevidamente desrespeitada e, igualmente, sua exposição não autorizada lhe é
humilhante e viola flagrantemente seus direitos de personalidade.

Na exposição pornográfica não consentida, o fato de o rosto da vítima não estar evidenciado de maneira
flagrante é irrelevante para a configuração dos danos morais.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.735.712-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/05/2020 (Info 672).

Marco Civil da Internet não se aplicou no presente caso


O caso acima explicado não foi analisado segundo a ótica do Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014)
considerando que este diploma não se encontrava em vigor na época dos fatos.
Penso, contudo, que a solução seria a mesma por força do que prevê o art. 21 do Marco Civil:
Art. 21. O provedor de aplicações de internet que disponibilize conteúdo gerado por terceiros será
responsabilizado subsidiariamente pela violação da intimidade decorrente da divulgação, sem
autorização de seus participantes, de imagens, de vídeos ou de outros materiais contendo cenas
de nudez ou de atos sexuais de caráter privado quando, após o recebimento de notificação pelo
participante ou seu representante legal, deixar de promover, de forma diligente, no âmbito e nos
limites técnicos do seu serviço, a indisponibilização desse conteúdo.
Parágrafo único. A notificação prevista no caput deverá conter, sob pena de nulidade, elementos
que permitam a identificação específica do material apontado como violador da intimidade do
participante e a verificação da legitimidade para apresentação do pedido.

Aspecto criminal
Vale ressaltar que a conduta do ex-namorado poderia configurar, inclusive, o crime previsto no art. 218-
C, § 1º do Código Penal, desde que praticada após a Lei nº 13.718/2018, que incluiu essa figura típica:
Divulgação de cena de estupro ou de cena de estupro de vulnerável, de cena de sexo ou de pornografia
Art. 218-C. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar
ou divulgar, por qualquer meio - inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de
informática ou telemática -, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de
estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, ou, sem o
consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o fato não constitui crime mais grave.

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Aumento de pena
§ 1º A pena é aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços) se o crime é praticado por agente
que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima ou com o fim de vingança ou
humilhação.
(...)

LOCAÇÃO DE IMÓVEIS URBANOS


A notificação premonitória é pressuposto processual para a ação de despejo
por denúncia vazia de contrato de locação por prazo indeterminado

Antes que o locador ajuíze ação de despejo por denúncia vazia em caso de locação por prazo
indeterminado, é obrigatório que ele faça comunicação dirigida ao locatário manifestando sua
intenção na retomada do imóvel, nos termos do art. 46, § 2º, da Lei nº 8.245/91:
Art. 46 (...) § 2º Ocorrendo a prorrogação, o locador poderá denunciar o contrato a qualquer
tempo, concedido o prazo de trinta dias para desocupação.
Isso é chamado de notificação premonitória.
A finalidade da notificação premonitória é a de evitar que o locatário seja surpreendido pelo
ajuizamento da ação de despejo, o que ainda lhe poderá acarretar o pagamento dos ônus
sucumbenciais. Ao ser comunicado, ele poderá procurar outro imóvel onde possa se instalar.
Caso a ação de despejo seja ajuizada sem essa prévia notificação, o processo deverá ser extinto
sem a resolução do mérito, por falta de condição essencial ao seu normal desenvolvimento.
Exceção: é permitido ao locador ajuizar diretamente a ação de despejo, dispensando a
notificação prévia, desde que o ajuizamento ocorra nos 30 dias seguintes ao termo final do
contrato.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.812.465/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 12/05/2020 (Info 672).

Imagine a seguinte situação hipotética:


Pedro (proprietário/locador) alugou seu imóvel para João.
O contrato foi celebrado por prazo determinado e com duração de 12 meses (janeiro/2013 a
janeiro/2014).
Chegou janeiro de 2014, mas nem o locador nem o locatário falaram nada. João permaneceu morando no
imóvel e pagando os aluguéis e Pedro continuou recebendo normalmente.
Em outubro de 2014, Pedro ajuizou ação de despejo contra João postulando a desocupação do imóvel e a
entrega das chaves.
Vale ressaltar que a denúncia do contrato feita por Pedro era “vazia”.

Abrindo aqui um parêntese: o que é “denúncia vazia”?


Chama-se de “denúncia vazia” a possibilidade de o locador solicitar a retomada do imóvel sem a necessidade
de apresentar justificativas. Em contrapartida, fala-se em “denúncia cheia” quando a lei exige, para a
retomada do imóvel, que o locador demonstre que existe alguma das hipóteses previstas na lei.

Fechando o parêntese. O que o réu alegou na contestação?


Na contestação, João alegou que, para o ajuizamento da ação de despejo, era indispensável que Pedro
tivesse feito uma notificação extrajudicial manifestando sua intenção de retomar o imóvel. Sem essa
prévia notificação não seria possível a propositura da ação.

É correto o argumento invocado por João?

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SIM.
A notificação premonitória constitui pressuposto processual para ação de despejo em locação por
denúncia vazia de contrato por prazo indeterminado.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.812.465/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 12/05/2020 (Info 672).

Antes que o locador ajuíze ação de despejo por denúncia vazia, em caso de locação por prazo indeterminado,
é obrigatório que ele faça comunicação dirigida ao locatário manifestando sua intenção na retomada do
imóvel, nos termos do art. 46, § 2º, da Lei nº 8.245/91 (Lei de locação dos imóveis urbanos):
Art. 46 (...)
§ 2º Ocorrendo a prorrogação, o locador poderá denunciar o contrato a qualquer tempo,
concedido o prazo de trinta dias para desocupação.

Isso é chamado de notificação premonitória.


A finalidade da notificação premonitória é a de evitar que o locatário seja surpreendido pelo ajuizamento
da ação de despejo, o que ainda lhe poderá acarretar o pagamento dos ônus sucumbenciais.
Depois de que locatário é comunicado da intenção do locador de retomar o bem, ele poderá procurar
outro imóvel onde possa se instalar.
É o que explicava o grande Sylvio Capanema:
“Caso a ação de despejo seja ajuizada sem a prévia notificação, deverá ser extinto o processo, sem
a resolução do mérito, por falta de condição essencial ao seu normal desenvolvimento.
A notificação dispensa solenidade especial, podendo se revestir de qualquer forma, desde que
inequívoca.
A finalidade da notificação premonitória é a de evitar que o locatário seja surpreendido pelo
ajuizamento da ação de despejo, o que ainda lhe poderá acarretar o pagamento dos ônus
sucumbenciais.
Por outro lado, o aviso permitirá ao locatário preparar-se para a desocupação e obtenção de um
novo imóvel onde possa se instalar.
Reveste-se, portanto, a exigência de importante finalidade social, para não se agravar, ainda mais,
o prejuízo que a mudança certamente causará ao locatário.” (Sylvio Capanema de Souza. A Lei do
Inquilinato Comentada. Rio de Janeiro: GEN Forense, 9ª ed., 2014, p. 195)

O que acontece se há o ajuizamento de ação de despejo sem que tenha havido prévia notificação
premonitória?
• Regra: caso a ação de despejo seja ajuizada sem essa prévia notificação, o processo deverá ser extinto
sem a resolução do mérito, por falta de condição essencial ao seu normal desenvolvimento.
• Exceção: é permitido ao locador ajuizar diretamente a ação de despejo, dispensando a notificação prévia,
desde que o ajuizamento ocorra nos 30 dias seguintes ao termo final do contrato. Ex: a locação era por
prazo determinado; o contrato terminou no dia 02/02; o locador terá até 30 dias para ajuizar a ação depois
do término desse contrato. Neste caso, trata-se de ação de despejo por término do contrato, e não de
despejo por denúncia vazia.

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SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO


Os prejuízos resultantes de sinistros relacionados a vícios estruturais de construção estão
acobertados pelo seguro habitacional obrigatório, vinculado a crédito imobiliário concedido
para aquisição de imóvel pelo SFH

Os vícios estruturais de construção estão cobertos pelo seguro habitacional obrigatório


vinculado ao crédito imobiliário concedido pelo Sistema Financeiro da Habitação - SFH, ainda
que só se revelem depois da extinção do contrato.
No âmbito do SFH, o seguro habitacional ganha conformação diferenciada, uma vez que
integra a política nacional de habitação, destinada a facilitar a aquisição da casa própria,
especialmente pelas classes de menor renda da população. Trata-se, portanto, de contrato
obrigatório que visa à proteção da família e à salvaguarda do imóvel que garante o respectivo
financiamento imobiliário, resguardando, assim, os recursos públicos direcionados à
manutenção do sistema.
A partir dessa perspectiva, infere-se que uma das justas expectativas do segurado, ao aderir
ao seguro habitacional obrigatório para aquisição da casa própria pelo SFH, é a de receber o
bem imóvel próprio e adequado ao uso a que se destina. E a essa expectativa legítima de
garantia corresponde a de ser devidamente indenizado pelos prejuízos suportados em
decorrência de danos originados na vigência do contrato e geradores dos riscos cobertos pela
seguradora, segundo o previsto na apólice, como razoavelmente se pressupõe ocorrer com os
vícios estruturais de construção.
STJ. 2ª Seção. REsp 1.804.965-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 27/05/2020 (Info 672).

Sistema Financeiro de Habitação (SFH)


Sistema Financeiro de Habitação (SFH) é um programa do Governo Federal, criado pela Lei nº 4.380/64,
com o objetivo de facilitar que pessoas de baixa renda pudessem adquirir a sua casa própria.
A legislação que rege o SFH prevê condições mais favoráveis às pessoas que adquirem os imóveis porque
existe um incentivo (subsídio) estatal. Em compensação, o adquirente tem que cumprir certas obrigações
e, em caso de inadimplemento, são estipuladas regras mais céleres para a cobrança do débito.

Seguro habitacional
O seguro habitacional é um seguro obrigatório exigido para quem contrata um financiamento imobiliário.
Assim, a pessoa que contrata um mútuo (um empréstimo) para financiar seu imóvel é obrigada a contratar
também um seguro habitacional.
Se não houver esse seguro, a instituição financeira não poderá conceder o empréstimo para a pessoa
interessada. É o que prevê o art. 79 da Lei nº 11.977/2009:
Art. 79. Os agentes financeiros do SFH somente poderão conceder financiamentos habitacionais
com cobertura securitária que preveja, no mínimo, cobertura aos riscos de morte e invalidez
permanente do mutuário e de danos físicos ao imóvel. (Redação dada pela Lei nº 12.424, de 2011)

Vale ressaltar que o mutuário tem liberdade para escolher com quem irá contratar o seguro habitacional.
Em outras palavras, ele não precisa fazer o empréstimo com a mesma instituição financeira que irá lhe
conceder o empréstimo:
Súmula 473-STJ: O mutuário do SFH não pode ser compelido a contratar o seguro habitacional obrigatório
com a instituição financeira mutuante ou com a seguradora por ela indicada.

Esse seguro garante, por exemplo, que a família permaneça com o imóvel mesmo se houver morte ou
invalidez total e permanente da pessoa que pagava o financiamento. Também garante a indenização ou a
reconstrução do imóvel, caso ocorra dano físico causado por riscos cobertos pela seguradora, de acordo
com a apólice contratada.

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Imagine agora a seguinte situação hipotética:


Regina adquiriu um apartamento na planta, financiado pelo SFH. Isso significa que ela tomou dinheiro
emprestado de uma instituição financeira e, com o recurso, comprou o imóvel, que ainda estava em
construção, ficando acertado que pagaria a dívida parceladamente ao banco.
Conforme exige o art. 79 da Lei nº 11.977/2009, Regina fez um contrato de seguro habitacional com a Sul
América Companhia de Seguros, seguro esse vinculado a crédito imobiliário concedido para aquisição de
imóvel pelo SFH.
O apartamento foi entregue e, depois de um tempo, apareceu um vício de construção. Em razão disso,
Regina precisou fazer reparos no imóvel, o que lhe custou R$ 10 mil.
Regina acionou a Sul América, mas a seguradora negou-se a indenizar, sob o argumento de que o seguro
habitacional obrigatório não tem por objetivo assegurar a qualidade e solidez da obra. Sua finalidade seria
apenas a de garantir o financiamento imobiliário.
Diante disso, Regina ajuizou ação de indenização contra a seguradora pedindo o ressarcimento pelos
gastos que teve em decorrência dos vícios de construção do imóvel que adquiriu pelo sistema financeiro
de habitação.

Regina terá direito à indenização? A cobertura do seguro abrange esses vícios?


SIM.
Os vícios estruturais de construção estão cobertos pelo seguro habitacional obrigatório vinculado ao
crédito imobiliário concedido pelo Sistema Financeiro da Habitação - SFH, ainda que só se revelem
depois da extinção do contrato.
STJ. 2ª Seção. REsp 1.804.965-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 27/05/2020 (Info 672).

No âmbito do SFH, o seguro habitacional ganha conformação diferenciada, uma vez que integra a política
nacional de habitação, destinada a facilitar a aquisição da casa própria, especialmente pelas classes de
menor renda da população.
Trata-se de contrato obrigatório que tem por objetivo proteger a família e resguardar o imóvel objeto do
financiamento imobiliário.
A partir dessa perspectiva, infere-se que uma das justas expectativas do segurado, ao aderir ao seguro
habitacional obrigatório para aquisição da casa própria pelo SFH, é a de receber o bem imóvel próprio e
adequado ao uso a que se destina. E a essa expectativa legítima de garantia corresponde a de ser
devidamente indenizado pelos prejuízos suportados em decorrência de danos originados na vigência do
contrato e geradores dos riscos cobertos pela seguradora, segundo o previsto na apólice, como
razoavelmente se pressupõe ocorrer com os vícios estruturais de construção.
Os danos suportados pelos segurados não são verificados exclusivamente em razão do decurso do tempo
e da utilização normal da coisa, mas resultam de vícios estruturais de construção, a que não deram causa,
nem poderiam de qualquer modo evitar, e que, evidentemente, apenas se agravam com o decurso do
tempo e a utilização normal da coisa.
A interpretação fundada na boa-fé objetiva, contextualizada pela função socioeconômica que
desempenha o contrato de seguro habitacional obrigatório vinculado ao SFH, leva a concluir que a
restrição de cobertura, no tocante aos riscos indicados, deve ser compreendida como a exclusão da
responsabilidade da seguradora com relação aos riscos que resultem de atos praticados pelo próprio
segurado ou do uso e desgaste natural e esperado do bem, tendo como baliza a expectativa de vida útil
do imóvel, porque configuram a atuação de forças normais sobre o prédio.
Os vícios estruturais de construção provocam, por si mesmos, a atuação de forças anormais sobre a edificação,
na medida em que, se é fragilizado o seu alicerce, qualquer esforço sobre ele - que seria naturalmente
suportado acaso a estrutura estivesse íntegra - é potencializado, do ponto de vista das suas consequências,
porque apto a ocasionar danos não esperados na situação de normalidade de fruição do bem.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 8


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Desse modo, à luz dos parâmetros da boa-fé objetiva e da função social do contrato, que os vícios
estruturais de construção estão acobertados pelo seguro habitacional, cujos efeitos devem se prolongar
no tempo, mesmo após a conclusão do contrato, para acobertar o sinistro concomitante à vigência deste,
ainda que só se revele depois de sua extinção (vício oculto).

DOD PLUS
Sistema Financeiro de Habitação é cobrado com relativa frequência em concursos de Juiz Federal. Veja
abaixo algumas informações que você precisa saber sobre o tema:
++ (Juiz Federal TRF3 2018) As normas do Código de Defesa do Consumidor são aplicáveis a todos os
contratos relacionados ao Sistema Financeiro da Habitação, independentemente da data de sua
celebração. (errado)
Comentário:
O Código de Defesa do Consumidor não se aplica aos contratos do SFH celebrados antes da sua entrada
em vigor (STJ. 4ª Turma. AgInt no REsp 1454058/RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em
05/09/2019). Em outras palavras, o CDC não se aplica retroativamente para os contratos anteriores a ele.

++ (Juiz Federal TRF3 2018) O mutuário do Sistema Financeiro da Habitação não pode ser compelido a
contratar seguro habitacional obrigatório com a instituição financeira mutuante ou com a seguradora por
ela indicada. (certo)
Comentário: é o teor da Súmula 473 do STJ.

++ (Juiz Federal TRF3 2018) Nos contratos de seguro habitacional obrigatório no âmbito do Sistema
Financeiro da Habitação, as seguradoras não são responsáveis pelos vícios decorrentes da construção.
(errado)

++ (Promotor de Justiça MPCE 2020 CEBRASPE) Com relação a bem imóvel urbano vinculado ao Sistema
Financeiro de Habitação (SFH) e registrado em nome de banco estatal que possua personalidade jurídica
de direito privado e atue como agente financeiro na implementação de política nacional de habitação, a
jurisprudência do STJ estabelece que esse bem não pode ser adquirido por usucapião, em razão do caráter
público dos serviços prestados pelo banco estatal na implementação da política nacional de habitação.
(certo)
Comentário:
O imóvel da Caixa Econômica Federal vinculado ao Sistema Financeiro de Habitação, como está afetado à
prestação de um serviço público, deve ser tratado como bem público, sendo, pois, imprescritível
(insuscetível de usucapião).
STJ. 3ª Turma. REsp 1448026-PE, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 17/11/2016 (Info 594).

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PROMESSA DE COMPRA E VENDA


É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do
compromisso de compra e venda, ainda que desprovido de registro, de imóvel adquirido na
planta que se encontra em fase de construção

Importante!!!
O STJ possui enunciado afirmando que: “é admissível a oposição de embargos de terceiro
fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda
que desprovido do registro” (Súmula 84-STJ).
Esse entendimento se aplica mesmo que o imóvel, adquirido na planta, ainda esteja em fase
de construção.
Assim, a Súmula 84 do STJ pode ser aplicada mesmo quando ainda não houve a entrega das
chaves ao promitente comprador.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.861.025/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 12/05/2020 (Info 672).

Imagine a seguinte situação hipotética:


João celebrou contrato de promessa de compra e venda contra a imobiliária CRV Ltda. com o objetivo de
adquirir um apartamento “na planta”, ou seja, que ainda estava iniciando a construção.
João é o promitente comprador e a imobiliária a promitente vendedora.
No contrato, ficou estipulado que João estava adquirindo o apartamento 1502, do Edifício Viver Melhor,
que estava sendo construído pela imobiliária.

Ação de indenização e cumprimento de sentença


Vamos agora introduzir personagem no enredo.
Regina ajuizou ação de indenização contra a CRV Ltda., que foi condenada a pagar à autora R$ 500 mil.
Iniciado o cumprimento de sentença, o juiz determinou a penhora da unidade 1502, do Edifício Viver
Melhor.
A penhora do mencionado imóvel ocorreu porque ainda constava como proprietária do bem a CRV Ltda,
sem qualquer ressalva, tendo em vista que não foi promovido o registro da promessa de compra e venda
no Cartório de Registro de Imóveis competente.
Ao saber da penhora, João opôs embargos de terceiro contra essa constrição.

É cabível a oposição de embargos de terceiro neste caso?


SIM.
É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do
compromisso de compra e venda, ainda que desprovido de registro, de imóvel adquirido na planta que
se encontra em fase de construção.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.861.025/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 12/05/2020 (Info 672).

O STJ possui enunciado afirmando que: “é admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em
alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do
registro” (Súmula 84-STJ).
Esse entendimento se aplica mesmo que o imóvel, adquirido na planta, ainda esteja em fase de
construção.
Assim, a Súmula 84 do STJ pode ser aplicada mesmo quando ainda não houve a entrega das chaves ao
promitente comprador.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 10


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Mas João não tem ainda a propriedade do imóvel...


É verdade. No entanto, ele já tem a posse indireta.
A posse que permite a oposição dos embargos de terceiro é tanto a direta quanto a indireta.
Assim, por exemplo, o usufrutuário, o locatário (possuidor direto), o locador (possuidor indireto) e o
compromissário comprador têm direito de defender sua posse por meio dos embargos.

PROMESSA DE COMPRA E VENDA


A averbação do desmembramento de imóvel urbano é condição indispensável para a
procedência da ação de adjudicação compulsória

Atenção! Cartórios e PGM


Exemplo hipotético: Jasmim Ltda. ajuizou ação de adjudicação compulsória contra Dimensão
Ltda. alegando em síntese que celebrou contrato de promessa de compra e venda de um lote
que se encontrava em fase de desmembramento perante a “Prefeitura” (Município). Afirma
que, apesar de celebrado o negócio, a ré ainda não outorgou a escritura definitiva do imóvel.
A requerida defendeu-se afirmando que não outorgou a escritura pública porque ainda não
houve o desdobro do imóvel prometido à venda e que isso seria obstáculo à procedência da
adjudicação compulsória.
Em um caso semelhante a esse, o STJ decidiu que não é possível a procedência da ação de
adjudicação compulsória.
O art. 37 da Lei nº 6.766/79 (Lei de parcelamento do solo urbano) afirma que “é vedado vender
ou prometer vender parcela de loteamento ou desmembramento não registrado”.
Além disso, segundo o regramento previsto no Decreto-Lei nº 58/1937, julgada procedente a
ação de adjudicação compulsória, a sentença valerá como título para transcrição no cartório
de registro de imóveis respectivo. Assim, se o imóvel de cuja escritura se exige a outorga não
tem matrícula própria, individualizada no registro de imóveis, eventual sentença que
substitua a declaração de vontade do promitente vendedor torna-se inócua, considerando que
não será possível a sua transcrição.
A existência de imóvel registrável (imóvel que pode ser levado a registro) é condição
específica da ação de adjudicação compulsória, de modo que a averbação do
desmembramento de imóvel urbano, devidamente aprovado pelo Município, é formalidade
que antecede necessariamente o registro de área fracionada.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.851.104-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/05/2020 (Info 672).

O que é uma promessa de compra e venda?


A promessa de compra e venda (ou compromisso de compra e venda) é...
- uma espécie de contrato preliminar
- por meio do qual uma pessoa (promitente vendedor) se compromete a vender o seu bem
- ao promissário comprador após este pagar integralmente o preço que foi ajustado.
Trata-se de um contrato preliminar porque após o promitente comprador pagar integralmente o preço,
as partes ainda irão celebrar um outro contrato, qual seja, de compra e venda.
Obs: alguns autores, como Nelson Rosenvald, diferenciam as expressões compromisso e promessa de
compra e venda. Para a maioria da doutrina e da jurisprudência, contudo, são terminologias sinônimas.

Obrigações assumidas pelas partes


O promissário comprador assume uma obrigação de dar, consistente no pagamento do preço combinado
(normalmente de forma parcelada).

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 11


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O promitente vendedor, por sua vez, assume uma obrigação de fazer, qual seja, assinar e outorgar
escritura pública de compra e venda em favor do promissário comprador após este pagar integralmente
o preço.

Forma
A promessa de compra e venda pode ser celebrada por instrumento público ou particular (art. 1.417 do
CC).
O contrato principal (compra e venda) que será assinado após o pagamento integral do preço, se envolver
bem imóvel de valor superior a 30 salários mínimos, deverá ser feito por escritura pública (art. 108 do CC).

A promessa de compra e venda precisa ser registrada em cartório para ser válida?
NÃO. A promessa de compra e venda é válida mesmo sem registro no cartório.
Quando a promessa de compra e venda é registrada em cartório, esse compromisso passa a ter natureza
jurídica de direito real à aquisição. Veja o que diz o Código Civil:
Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento,
celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis,
adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel.

(...) A promessa de compra e venda identificada como direito real ocorre quando o instrumento público
ou particular é registrado no cartório de registro de imóveis, o que não significa que a ausência do registro
retire a validade do contrato. (...)
(STJ. 4ª Turma. REsp 1185383/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 08/04/2014)

A importância do registro em cartório está na eficácia da promessa de compra e venda perante terceiros:
• Se a promessa não foi registrada: ela é válida, mas produz efeitos apenas entre as partes.
Ex: João (promitente vendedor) celebra um contrato de promessa de compra e venda de um imóvel com
Pedro (promitente comprador). Esta promessa não é registrada em cartório. João começa a pagar as
prestações mensais. Ocorre que João, de forma desonesta, vende à vista o mesmo imóvel para Carlos que,
de posse da escritura pública, vai até o cartório e registra o imóvel em seu nome. Pedro, ao descobrir a
venda, não poderá pleitear o imóvel de Carlos. Restará a ele ajuizar ação de indenização contra João. Não
significa que a promessa de compra e venda era inválida. O problema é que ela, mesmo sendo válida, não
produzia efeitos para terceiros. Logo, Pedro não tem direito de sequela porque a promessa de compra e
venda, neste caso, não é direito real.

• Se a promessa foi registrada: ela é válida e, além disso, produz efeitos perante terceiros.
Ex: utilizando o mesmo exemplo acima, se a promessa de compra e venda celebrada entre João e Pedro
tivesse sido registrada em cartório, Carlos nem teria conseguido registrar o imóvel em seu nome,
considerando que haveria essa restrição na matrícula do imóvel. No entanto, ainda que Carlos tivesse
conseguido registrar, Pedro poderia ajuizar ação de adjudicação compulsória contra Carlos,
desconstituindo esse registro. Isso porque a promessa de compra e venda produz efeitos para terceiros
(no caso, Carlos) e a alienação de João para Carlos é ineficaz perante Pedro.
Nesse sentido, confira o art. 1.418 do CC:
Art. 1.418. O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente vendedor,
ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de
compra e venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer
ao juiz a adjudicação do imóvel.

Enunciado 253 CJF: O promitente comprador, titular de direito real (art. 1.417), tem a faculdade de
reivindicar de terceiro o imóvel prometido à venda.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 12


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Irretratável ou retratável
A promessa de compra e venda, em regra, é irretratável.
As partes, contudo, com base na autonomia privada, podem inserir uma cláusula de arrependimento,
prevendo a possibilidade de desistirem de continuar o negócio jurídico. Se não previrem cláusula nesse
sentido, a promessa será irretratável.

Se o promitente vendedor, mesmo após receber o preço integral combinado, recusar-se a outorgar a
escritura pública, o que o promissário comprador poderá fazer?
Poderá ajuizar ação de adjudicação compulsória.
A adjudicação compulsória é a ação proposta pelo promissário comprador contra o promitente
vendedor que se recusa a cumprir sua obrigação de outorgar a escritura definitiva de compra e venda.
O autor da ação pede que o juiz prolate uma sentença que supra (substituta) a declaração de vontade do
promitente vendedor. Assim, a sentença já irá produzir o mesmo efeito da escritura pública que o
promitente vendedor não outorgou, podendo o autor até mesmo fazer o registro no Cartório de Registro
de Imóveis.
O pedido formulado na adjudicação compulsória era previsto de forma expressa no art. 466-B do CPC 1973:
CPC 1973 CPC 2015
Art. 466-B. Se aquele que se comprometeu a concluir Não há dispositivo no novo CPC que reproduza
um contrato não cumprir a obrigação, a outra parte, expressamente a previsão do art. 466-B do CPC
sendo isso possível e não excluído pelo título, poderá 1973. Apesar disso, a parte poderá continuar
obter uma sentença que produza o mesmo efeito do pedindo ao Judiciário a providência nele prevista
contrato a ser firmado. com base no art. 501 do CPC 2015:
Art. 466-C. Tratando-se de contrato que tenha por Art. 501. Na ação que tenha por objeto a emissão
objeto a transferência da propriedade de coisa de declaração de vontade, a sentença que julgar
determinada, ou de outro direito, a ação não será procedente o pedido, uma vez transitada em
acolhida se a parte que a intentou não cumprir a julgado, produzirá todos os efeitos da declaração
sua prestação, nem a oferecer, nos casos e formas não emitida.
legais, salvo se ainda não exigível.

O compromisso de compra e venda pode ou não ser registrado no cartório de registro de imóveis. Se a
promessa não for registrada no cartório, ainda assim o promissário comprador poderá ajuizar ação de
adjudicação compulsória?
SIM. O registro do compromisso de compra e venda não é condição para o ajuizamento da ação de
adjudicação compulsória. Mesmo sem o registro, é possível a adjudicação compulsória. Nesse sentido:
Súmula 239-STJ: O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de
compra e venda no cartório de imóveis.

Enunciado 95 da I Jornada de Direito Civil: O direito à adjudicação compulsória (art. 1.418 do novo Código
Civil), quando exercido em face do promitente vendedor, não se condiciona ao registro da promessa de
compra e venda no cartório de registro imobiliário (Súmula n. 239 do STJ).

Vantagem no caso de a promessa ter sido registrada para fins de adjudicação compulsória
Se a promessa estiver registrada no RI, o promissário comprador tem uma vantagem: ele poderá ajuizar a
ação de adjudicação compulsória com base em um rito sumário (mais rápido e simples) previsto no art.
25 da Lei nº 6.766/79 e art. 15 do DL nº 58/37. Já se o contrato não estiver registrado, a ação de
adjudicação compulsória será proposta como uma ação de conhecimento, de rito ordinário. (FARIAS,
Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil. Vol. 5. Salvador : Juspodivm, 2014, p. 840).

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 13


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Além disso, conforme já explicado acima, se a promessa estiver registrada, a adjudicação compulsória
poderá ser proposta inclusive contra terceiros.

Imagine agora a seguinte situação hipotética:


Dimensão Ltda. é proprietário de um imóvel de 1.500 m2.
Esse imóvel está sendo objeto de um processo administrativo de desmembramento, que tramita na
“Prefeitura” (Administração Pública municipal).
A Dimensão Ltda. celebrou contrato de promessa de compra e venda com a Jasmim Ltda. por meio do
qual se comprometeu a vender um lote 300 m2 que surgirá com o desmembramento do imóvel.
Apesar de celebrado o negócio, a Dimensão ainda não outorgou a escritura definitiva do imóvel.
Diante disso, a Jasmim ajuizou ação de adjudicação compulsória pedindo que o imóvel seja adjudicado,
outorgando-lhe judicialmente a escritura definitiva.
Conforme vimos acima, a adjudicação compulsória é a ação proposta pelo promissário comprador contra
o promitente vendedor que se recusa a cumprir sua obrigação de outorgar a escritura definitiva de compra
e venda. O autor da ação pede que o juiz prolate uma sentença que supra (substituta) a declaração de
vontade do promitente vendedor. Assim, a sentença já irá produzir o mesmo efeito da escritura pública
que o promitente vendedor não outorgou, podendo o autor até mesmo fazer o registro no Cartório de
Registro de Imóveis.

Contestação
A requerida defendeu-se afirmando que não outorgou a escritura pública porque ainda não houve o
desdobro do imóvel prometido à venda e que isso seria obstáculo à procedência da adjudicação compulsória.

O pedido da ação de adjudicação compulsória deverá ser julgado procedente?


NÃO.
Em um caso semelhante a esse, o STJ decidiu que não é possível a procedência da ação de adjudicação
compulsória.
O art. 37 da Lei nº 6.766/79 (Lei de parcelamento do solo urbano) afirma que “é vedado vender ou
prometer vender parcela de loteamento ou desmembramento não registrado”.
++ (Promotor MP/MS 2018) É vedado vender ou prometer vender parcela de loteamento ou de
desmembramento urbano não registrado. (certo)

Além disso, segundo o regramento previsto no Decreto-Lei nº 58/1937, julgada procedente a ação de
adjudicação compulsória, a sentença valerá como título para transcrição no cartório de registro de imóveis
respectivo. Assim, se o imóvel de cuja escritura se exige a outorga não tem matrícula própria,
individualizada no registro de imóveis, eventual sentença que substitua a declaração de vontade do
promitente vendedor torna-se inócua, considerando que não será possível a sua transcrição.
A existência de imóvel registrável (imóvel que pode ser levado a registro) é condição específica da ação
de adjudicação compulsória, de modo que a averbação do desmembramento de imóvel urbano,
devidamente aprovado pelo Município, é formalidade que antecede necessariamente o registro de área
fracionada. Nesse sentido:
Na ação de adjudicação compulsória, o ato jurisdicional, para ser exequível, deve reunir todas as exigências
previstas na Lei de Registros Públicos, e nas demais ordenadoras do parcelamento do solo, a fim de
facultar o registro do título no cartório respectivo.
Detectada, no caso concreto, a impossibilidade jurídica do pedido de registro, haja vista a falta de prévia
averbação do desmembramento de gleba rural originária, e posteriores aberturas de matrículas
individualizadas das glebas desvinculadas e prometidas à venda pelo réu. Ausente, portanto, de uma das
condições específicas da ação de adjudicação compulsória, na dicção do art. 16, § 2º, do Decreto-lei n.
58/1937 - existência de imóvel registrável.
STJ. 4ª Turma. REsp 1.297.784/DF, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 16/09/2014.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 14


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Em suma:
A averbação do desmembramento de imóvel urbano é condição indispensável para a procedência da
ação de adjudicação compulsória.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.851.104-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/05/2020 (Info 672).

DOD PLUS – INFORMAÇÕES EXTRAS


O que é o desmembramento?
O conceito de desmembramento está previsto no § 2º do art. 2º da Lei nº 6.766/79:
Art. 2º O parcelamento do solo urbano poderá ser feito mediante loteamento ou
desmembramento, observadas as disposições desta Lei e as das legislações estaduais e municipais
pertinentes.
§ 1º Considera-se loteamento a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com
abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou
ampliação das vias existentes.
§ 2º Considera-se desmembramento a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com
aproveitamento do sistema viário existente, desde que não implique na abertura de novas vias e
logradouros públicos, nem no prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes.

Loteamento x desmembramento
Uma questão comum em provas é a distinção entre loteamento e desmembramento.
Veja abaixo as principais diferenças entre os institutos:

LOTEAMENTO (com) DESMEMBRAMENTO (sem)


A divisão da gleba em lotes ocorre COM a abertura A divisão da gleba em lotes ocorre SEM abertura
de novas vias de circulação ou alguma forma de de novas vias (não há qualquer modificação no
modificação das que já existem. sistema viário que já existe).
Só se efetiva por procedimento voluntário e Pode ocorrer pela vontade do proprietário (venda,
formal do proprietário da gleba. doação etc.) ou por imposição judicial
(arrematação, partilha etc.).
É objeto de registro público. É objeto de averbação pública.

Recorremos à lição de um clássico:


“loteamento é meio de urbanização e só se efetiva por procedimento voluntário e formal do
proprietário da gleba, que planeja sua divisão e a submete à aprovação da prefeitura, para
subsequente inscrição no Registro Imobiliário, transferência gratuita das áreas das vias públicas e
espaços livres ao município e alienação dos lotes aos interessados; o desmembramento é apenas
repartição da gleba, sem atos de urbanização, e tanto pode ocorrer pela vontade do proprietário
(venda, doação etc.) como por imposição judicial (arrematação, partilha etc.), em ambos os casos
sem qualquer transferência de área ao domínio público.” (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito
municipal brasileiro. 14ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 558).

Veja como essa alternativa de prova inverte os conceitos:


++ (Promotor MP/MS 2018) Considera-se loteamento urbano a subdivisão de gleba em lotes destinados à
edificação, com aproveitamento do sistema viário existente, desde que não implique na abertura de novas
vias e logradouros públicos, nem no prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes;
enquanto se considera desmembramento urbano a subdivisão da gleba em lotes destinados à edificação,
com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou
ampliação das vias existentes. (errado)
Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 15
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++ (PGM Fortaleza 2017 CEBRASPE) No âmbito do parcelamento do solo urbano, desmembramento


corresponde à subdivisão de gleba em lotes destinados à edificação, com abertura de novas vias de
circulação e criação de logradouros públicos. (errado)
++ (PGM Goiânia UFG) O parcelamento do solo urbano poderá ser feito mediante loteamento ou
desmembramento, considerando-se este a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com
abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou
ampliação das vias existentes. (errado)
++ (PGM São Luís 2016 FCC) Sobre o parcelamento do solo urbano, é correto afirmar que são tipos de
parcelamento o loteamento, o remembramento, o desdobro e o desmembramento. (errado)

DIVÓRCIO
Incidem juros e correção monetária sobre o valor econômico de cotas sociais objeto de partilha
em divórcio sendo que, após a separação de fato do casal, essa empresa ficou sob a
administração exclusiva de um dos ex-cônjuges até o encerramento de suas atividades

Exemplo: João e Regina eram casados. João era sócio de uma sociedade empresária. Houve
separação de fato. João continuou administrando a sociedade empresária por mais algum
tempo, até que houve o encerramento das atividades da empresa. No momento do divórcio,
foi reconhecido que Regina tinha direito à metade do valor integralizado das cotas
empresariais que pertenciam a João. Considerando que houve o encerramento das atividades
da empresa após a separação do então casal o objeto partilhado consiste, em última instância,
no próprio capital investido na sociedade à época do relacionamento, devidamente
atualizado.
Considerando que a empresa encerrou suas atividades e que ela ficou sendo administrada
exclusivamente por João, não se pode impor a Regina o ônus de arcar com os prejuízos
decorrentes dessa administração exclusiva. Logo, Regina tem direito de receber o valor que as
cotas tinham acrescido de juros e correção monetária.
Aplica-se ao caso o art. 389 do Código Civil:
Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e
atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de
advogado.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.689.220-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 19/05/2020 (Info 672).

Imagine a seguinte situação hipotética:


João e Regina eram casados sob o regime da comunhão parcial de bens.
João era sócio de uma sociedade empresária. Ele tinha 80% das cotas de uma escola de idiomas. Os outros
20% pertenciam a um amigo, seu sócio.
Essa sociedade foi constituída depois que João já estava casado.

Separação de fato em 2018


O amor do casal chegou ao fim e, em janeiro de 2018, João e Regina foram morar em casas diferentes e
passaram a ter contato esporádico. Houve, portanto, a chamada “separação de fato”.

Encerramento da empresa em janeiro de 2020


João continuou administrando a sociedade empresária por mais algum tempo, até que, em janeiro de
2020, houve o encerramento das atividades da empresa.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 16


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Divórcio em agosto de 2020


Em agosto de 2020, no momento do divórcio, o juiz decidiu que Regina tem direito à metade do valor
integralizado das cotas empresariais que pertenciam a João.
Em outras palavras, Regina tem direito a metade dos 80% das cotas de João na escola de inglês.
A jurisprudência do STJ é pacífica ao reconhecer a possibilidade de partilha, em ação de divórcio, da
expressão econômica resultante de cotas empresariais que integraram o patrimônio comum construído
na vigência do relacionamento, independentemente da natureza da sociedade empresarial.

Ocorre que a escola já fechou suas portas. Como fica nesse caso?
Considerando que houve o encerramento das atividades da empresa após a separação do então casal, o
objeto partilhado consiste, em última instância, no próprio capital investido na sociedade à época do
relacionamento.

Regina terá direito de receber essa quantia acrescida de juros e correção monetária sobre o valor da
avaliação de cotas empresariais apurado conforme sua importância ao tempo da separação de fato dos
ex-cônjuges? Em outras palavras, o valor das cotas era R$ 10 mil no momento da separação de fato;
Regina terá direito de receber a quantia principal mais juros e correção monetária?
SIM.
Incidem juros e correção monetária sobre o valor econômico de cotas sociais objeto de partilha em
divórcio sendo que, após a separação de fato do casal, essa empresa ficou sob a administração exclusiva
de um dos ex-cônjuges até o encerramento de suas atividades comerciais.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.689.220-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 19/05/2020 (Info 672).

Considerando que a empresa encerrou suas atividades e que ela ficou sendo administrada exclusivamente
por João, não se pode impor a Regina o ônus de arcar com os prejuízos decorrentes dessa administração
exclusiva. Logo, Regina tem direito de receber o valor que as cotas tinham acrescido de juros e correção
monetária.
Aplica-se, ao caso, o art. 389 do Código Civil:
Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e
atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de
advogado.

AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE


A averbação de sentença proferida em ação negatória de filiação não consubstancia, em si, um
direito subjetivo autônomo das partes litigantes, tampouco se confunde com o direito
personalíssimo ali discutido

Exemplo hipotético: João tinha três filhos registrados em seu nome (Antônio, Bento e Carlos).
João ajuizou ação negatória de filiação contra Carlos. A sentença julgou o pedido procedente
declarando que João não era pai de Carlos. Ocorre que essa sentença não foi averbada no
registro civil de Carlos. Não se tomou essa providência. Assim, em todos os assentos civis de
Carlos continuou constando que João seria seu pai. Mais de 30 anos depois do trânsito em
julgado, João faleceu. Carlos habilitou-se no processo de inventário utilizando sua certidão de
nascimento, na qual ainda consta que João seria seu pai. Os herdeiros de João não
concordaram e pediram ao juízo onde tramitou a ação negatória que expedisse o mandado de
averbação. O juízo acatou o pedido e, contra esta decisão, Carlos impetrou mandado de
segurança alegando que com o falecimento de João a averbação da sentença não mais poderia

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 17


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ser feita, porque seria um direito personalíssimo do falecido. Além disso, afirmou que houve
decadência do direito de fazer a averbação.
Em um caso semelhante a esse, o STJ não concordou com os argumentos do impetrante.
A averbação da sentença, neste caso, constitui consequência legal obrigatória, destinada a
conferir publicidade e segurança jurídica ao desfecho que restou declarado e reconhecido
judicialmente. Isso se dá, inclusive, normalmente, de ofício.
Não existe nenhuma faculdade conferida às partes envolvidas a respeito de proceder ou não à
referida averbação, como se tal providência constituísse, em si, um direito personalíssimo.
Não se pode confundir o exercício do direito subjetivo de ação de caráter personalíssimo,
como o é a pretensão de desconstituir estado de filiação, cuja prerrogativa é exclusiva das
pessoas insertas nesse vínculo jurídico (pai/mãe e filho), com o ato acessório da averbação da
sentença de procedência transitada em julgado, que se afigura como mera consequência legal
obrigatória.
Mesmo que essa providência (averbação) não tenha sido feita na época oportuna, ela poderá
ser realizada depois, não se submetendo a prazo decadencial ou prescricional.
STJ. 3ª Turma. RMS 56.941/DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 19/05/2020 (Info 672).

Imagine a seguinte situação hipotética:


João tinha três filhos registrados em seu nome (Antônio, Bento e Carlos).
João ajuizou ação negatória de filiação contra Carlos.
A sentença julgou o pedido procedente declarando que João não era pai de Carlos. Esse processo, que
tramitou na 5ª Vara de Família, transitou em julgado.
Apesar de a sentença ter determinado a expedição de mandado de averbação, a Secretaria da Vara, por
equívoco, não o encaminhou ao Registro Civil das Pessoas Naturais.
Assim, a sentença não foi averbada no registro civil de Carlos. Isso deveria ter sido feito, mas não se tomou
essa providência na época. Logo, em todos os assentos civis de Carlos continuou constando que João seria
seu pai.

Falecimento de João e abertura do inventário


Mais de 30 anos depois do trânsito em julgado, João faleceu.
Antônio e Bento iniciaram o processo de inventário na 1ª Vara de Sucessões. Eles declararam que seriam
os únicos herdeiros do falecido.
Ocorre que Carlos se habilitou no processo de inventário utilizando sua certidão de nascimento na qual
ainda consta que João seria seu pai.
Antônio e Bento não concordaram e impugnaram o pedido narrando que houve essa sentença da Vara de
Família que reconheceu a inexistência de paternidade.
O Juízo da Vara de Sucessões determinou, então, que Antônio e Bento apresentassem a certidão de
nascimento de Carlos devidamente averbada com a exclusão do nome de João de seu registro.
Para cumprirem essa determinação, Antônio e Bento pediram ao juízo da 5ª Vara de Família (onde tramitou a
ação negatória) que expedisse o mandado de averbação da sentença que foi prolatada 30 anos atrás.
O juízo acatou o pedido e determinou à Secretaria da Vara que encaminhasse ao Cartório de Registro Civil
mandado de averbação para dar integral cumprimento à sentença transitada em julgada que declarou a
inexistência de relação de paternidade.
Contra essa decisão do juízo da 5ª Vara de Família, Carlos impetrou mandado de segurança alegando que,
com o falecimento de João, a averbação da sentença não mais poderia ser feita, porque seria um direito
personalíssimo do falecido. Além disso, afirmou que houve decadência do direito de fazer a averbação.

O pedido de Carlos foi acolhido pelo STJ?


NÃO.
Em um caso semelhante a esse, o STJ não concordou com os argumentos do impetrante.
Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 18
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A averbação da sentença, neste caso, constitui consequência legal obrigatória, destinada a conferir
publicidade e segurança jurídica ao desfecho que restou declarado e reconhecido judicialmente. Isso se
dá, inclusive, normalmente, de ofício.
Veja o que diz o art. 10, II, do Código Civil:
Art. 10. Far-se-á a averbação de registro público:
(...)
II - dos atos judiciais e extrajudiciais que declararem ou reconhecerem a filiação.

A averbação constitui ato acessório destinado a modificar o teor constante do registro, em virtude de
determinação judicial, conferindo-lhe, em atenção ao princípio da veracidade, publicidade e segurança jurídica.
Uma vez proposta a ação com o aludido conteúdo (de declarar ou reconhecer estado de filiação diverso
do constante no registro no assento civil da pessoa natural), a sentença de procedência daí advinda,
transitada em julgado, deverá ser, por expressa determinação legal, necessariamente averbada.
Não existe nenhuma faculdade conferida às partes envolvidas a respeito de proceder ou não à referida
averbação, como se tal providência constituísse, em si, um direito personalíssimo.
Não se pode confundir o exercício do direito subjetivo de ação de caráter personalíssimo, como o é a
pretensão de desconstituir estado de filiação, cuja prerrogativa é exclusiva das pessoas insertas nesse
vínculo jurídico (pai/mãe e filho), com o ato acessório da averbação da sentença de procedência transitada
em julgado, que se afigura como mera consequência legal obrigatória.
Mesmo que essa providência (averbação) não tenha sido feita na época oportuna, ela poderá ser realizada
depois, não se submetendo a prazo decadencial ou prescricional.

Em suma:
A averbação de sentença proferida em ação negatória de filiação não consubstancia, em si, um direito
subjetivo autônomo das partes litigantes, tampouco se confunde com o direito personalíssimo ali
discutido.
STJ. 3ª Turma. RMS 56.941/DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 19/05/2020 (Info 672).

DOD QUESTÕES
Fique atenta(o) ao art. 10 do Código Civil porque ele é muito cobrado nas provas:
++ (Juiz TJ/PA 2019 CEBRASPE) De acordo com o Código Civil, devem ser averbados em registro público
I - os casamentos, as sentenças que declararem sua nulidade e as sentenças que decretarem o divórcio.
II - os atos judiciais que declararem ou reconhecerem filiação.
III - os atos extrajudiciais que declararem ou reconhecerem filiação.
IV - as emancipações por sentença do juiz.
Estão certos apenas os itens
A) I e II.
B) I e IV.
C) II e III.
D) I, III e IV.
E) II, III e IV.
Gabarito: Letra C

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 19


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SUCESSÕES
A cessão de direitos hereditários sobre bem singular viabiliza a transmissão da posse,
que pode ser objeto de tutela específica na via dos embargos de terceiro

A cessão de direitos hereditários sobre bem singular, desde que celebrada por escritura
pública e não envolva o direito de incapazes, não é negócio jurídico nulo, tampouco inválido,
ficando apenas a sua eficácia condicionada a evento futuro e incerto, consubstanciado na
efetiva atribuição do bem ao herdeiro cedente por ocasião da partilha.
Assim, aberta a sucessão, o coerdeiro pode ceder os seus direitos hereditários, bem como o
quinhão de que disponha, por escritura pública, conforme prevê o caput do art. 1.793 do
Código Civil.
Como esse negócio não é nulo (tem apenas a sua eficácia suspensa), conclui-se que a cessão de
direitos hereditários sobre bem singular tem força para transmitir a posse desse bem ao
cessionário. Logo, o cessionário pode tutelar a posse sobre o bem, inclusive por meio de
embargos de terceiro.
Admite-se a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do
compromisso de compra e venda de imóvel, mesmo que desprovido do registro. Esse mesmo
entendimento deve ser aplicado na hipótese em que a posse é defendida com base em
instrumento público de cessão de direitos hereditários.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.809.548-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 19/05/2020 (Info 672).

Imagine a seguinte situação hipotética:


João faleceu e deixou duas filhas como herdeiras: Carla e Carolina.
Até então, somente se sabia da existência dessas duas herdeiras.
Foi aberto o inventário, tendo apenas as duas como herdeiras.
João deixou 5 bens imóveis como herança: quatro apartamentos e uma sala comercial.
Carla e Carolina cederam os direitos hereditários sobre a sala comercial em favor de Pedro.
Explicando melhor. Pedro pagou R$ 300 mil e, em troca, Carla e Carolina, por intermédio de uma escritura
pública, cederam a ele os direitos sobre a sala comercial de que trata a herança.

Cessão de direitos hereditários


A cessão de direitos hereditários é disciplinada atualmente pelo art. 1.793 do Código Civil:
Art. 1.793. O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o co-herdeiro, pode
ser objeto de cessão por escritura pública.
§ 1º Os direitos, conferidos ao herdeiro em consequência de substituição ou de direito de acrescer,
presumem-se não abrangidos pela cessão feita anteriormente.
§ 2º É ineficaz a cessão, pelo co-herdeiro, de seu direito hereditário sobre qualquer bem da
herança considerado singularmente.
§ 3º Ineficaz é a disposição, sem prévia autorização do juiz da sucessão, por qualquer herdeiro, de
bem componente do acervo hereditário, pendente a indivisibilidade.

++ (Juiz TJRS 2016 FAUGRS) O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o coerdeiro,
não pode ser objeto de cessão por escritura pública. (errado)

Ao tratar sobre esse § 2º do art. 1.793, Zeno Veloso explica que essa cessão sobre bem singular será eficaz
se for feita pela totalidade dos herdeiros:
(...) os direitos a respeito de um bem singular da herança podem ser cedidos pelo herdeiro único
(herdeiro universal) ou por todos os herdeiros, conjuntamente. E não haveria motivo para

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 20


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considerar ineficaz o negócio, pois não há ineficácia que não se oponha a interesse de terceiros, e
ninguém, no caso, pode alegar direito frustrado ou algum prejuízo. Enfim, não há razão moral,
econômica ou jurídica para impedir que a cessão, nas hipóteses citadas, seja realizada." (Cessão
de direitos hereditários de bens singulares: possibilidade. Disponível em:
www.cartaforense.com.br/conteudo/artigos/cessao-de-direitos-hereditarios-de-bens-singulares-
possibilidade/5649.

O Min. Ricardo Villas Bôas Cueva expõe as seguintes conclusões sobre o § 2º do art. 1.793:
a) a cessão de direitos hereditários sobre bem singular, desde que celebrada por escritura pública e não
envolva o direito de incapazes, não é negócio jurídico nulo, tampouco inválido, ficando apenas a sua
eficácia condicionada a evento futuro e incerto, consubstanciado na efetiva atribuição do bem ao herdeiro
cedente por ocasião da partilha;
b) a ineficácia se opera somente em relação aos demais herdeiros;
c) se celebrado pelo único herdeiro ou havendo a anuência de todos os coerdeiros, o negócio é válido e
eficaz desde o seu nascimento, independentemente de autorização judicial, pois o que a lei busca evitar é
que um único herdeiro, em prejuízo dos demais, aliene um bem que ainda não lhe pertence, e
d) se o negócio não é nulo, mas tem apenas a sua eficácia suspensa, a cessão de direitos hereditários sobre
bem singular viabiliza a transmissão da posse, que pode ser objeto de tutela específica na via dos
embargos de terceiro.

Ação de investigação de paternidade, ação de exigir contas e penhora


Foi então que Silvia ajuizou ação de investigação de paternidade com petição de herança afirmando que
também era filha de João.
O pedido foi julgado procedente.
Silvia ajuizou ação de exigir contas contra Carla e Carolina, julgada procedente para condenar as rés ao
pagamento de R$ 900 mil, acrescido de juros e correção monetária.
Nos autos dessa ação de exigir contas, o juiz determinou a penhora da sala comercial.
Pedro, que estava ocupando a sala, opôs embargos de terceiro contra a decisão judicial de penhora.

O pedido contido nos embargos pode ser acolhido? É cabível embargos de terceiro neste caso?
SIM.

Embargos de terceiro
Os embargos de terceiro são...
- uma ação de conhecimento
- com rito especial,
- por meio da qual uma pessoa objetiva livrar um bem do qual tenha posse (como senhor/proprietário ou
possuidor),
- bem este que está sofrendo ou na iminência de sofrer
- uma constrição judicial (exs: penhora, arresto, sequestro etc.)

Atualmente, os embargos de terceiro estão previstos no art. 674 do CPC:


Art. 674. Quem, não sendo parte no processo, sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre
bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo, poderá
requerer seu desfazimento ou sua inibição por meio de embargos de terceiro.

Conforme vimos acima, a cessão de direitos hereditários sobre bem individualizado não é eivada de
nulidade (não se trata de negócio jurídico nulo). No máximo, essa cessão será ineficaz em relação aos
coerdeiros que com ela não anuíram.

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Como essa cessão não é nula, o cessionário possui direito de defender a manutenção da sua posse por
intermédio dos embargos de terceiro.
Vale ressaltar, ainda, que é possível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse
advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, mesmo que desprovido do registro, a teor da
Súmula nº 84 do STJ:
Súmula 84-STJ: É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda
do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro.

Esse mesmo entendimento pode ser aplicado para o caso concreto, de forma que é possível a oposição de
embargos de terceiro para defender a posse transmitida com base em instrumento público de cessão de
direitos hereditários.

Em suma:
A cessão de direitos hereditários sobre bem singular viabiliza a transmissão da posse, que pode ser
objeto de tutela específica na via dos embargos de terceiro.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.809.548-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 19/05/2020 (Info 672).

DIREITO DO CONSUMIDOR

RESPONSABILIDADE PELO FATO DO SERVIÇO


Na hipótese de responsabilidade civil de médicos pela morte de paciente em atendimento
custeado pelo SUS incidirá o prazo do art. 1º-C da Lei nº 9.494/97, segundo o qual prescreverá
em cinco anos a pretensão de obter indenização

Importante!!!
Exemplo hipotético: uma criança foi atendida na emergência de um hospital particular
conveniado ao SUS. Em razão de erro médico, ela acabou falecendo. Os pais da criança
pretendem ajuizar ação de indenização por danos morais contra os médicos e o hospital. Qual
é o prazo prescricional neste caso?
5 anos, com base no art. 1º-C, da Lei nº 9.494/97:
Art. 1º-C. Prescreverá em cinco anos o direito de obter indenização dos danos causados por
agentes de pessoas jurídicas de direito público e de pessoas jurídicas de direito privado
prestadoras de serviços públicos.
A participação complementar da iniciativa privada na execução de ações e serviços de saúde
se formaliza mediante contrato ou convênio com a administração pública (art. 24, parágrafo
único, da Lei nº 8.080/90).
Assim, o hospital privado que, mediante convênio, se credencia para exercer essa atividade de
saúde pública, recebendo, em contrapartida, remuneração dos cofres públicos, passa a
desempenhar o múnus público. O mesmo acontecendo com o profissional da medicina que,
diretamente, se obriga com o SUS.
A participação complementar da iniciativa privada - seja das pessoas jurídicas, seja dos
respectivos profissionais - na execução de atividades de saúde caracteriza-se como serviço
público indivisível e universal (uti universi), o que afasta, por conseguinte, a incidência das
regras do CDC. Logo, não se aplica o prazo prescricional do art. 27 do CDC, mas sim o do art.
1º-C da Lei nº 9.494/97.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 22


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Obs: na prática, não muda nada quanto ao prazo porque tanto o art. 27 como o art. 1º-C
preveem o prazo de 5 anos.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.771.169-SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 26/05/2020 (Info 672).

Imagine a seguinte situação adaptada:


Uma criança foi picada por uma aranha. Seus pais a levaram para ser atendida na emergência de um
hospital particular conveniado ao SUS.
Em razão de erro médico, a criança, infelizmente, acabou falecendo.
Depois de 3 anos e 1 mês do fato, quando enfim começaram a superar a perda, os pais da criança ajuizaram
ação de indenização por danos morais contra os médicos que atenderam sua filha e também contra o
hospital.
Em contestação, os réus arguiram a prescrição afirmando que a criança foi atendida em um hospital
particular, mas com atendimento custeado pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Em outras palavras, é como
se ela tivesse sido recebida em um hospital público. Logo, neste caso não incidiria o Código de Defesa do
Consumidor.
Diante disso, como não se aplica o CDC, o prazo prescricional não seria o do art. 27 do Código consumerista
(5 anos). O prazo prescricional seria, portanto, de 3 anos, com base na regra geral do Código Civil:
Art. 206. Prescreve:
(...)
§ 3º Em três anos:
(...)
V - a pretensão de reparação civil;

Primeira pergunta: neste caso, aplica-se, ou não, o Código de Defesa do Consumidor?


A doutrina diz que não.
A jurisprudência está dividida.
Vou explicar com calma.

Iniciativa privada participa do SUS de forma complementar e, nessa condição, desempenha serviço público
A saúde é direito de todos e dever do Estado (art. 196 da CF/88).
Para que os serviços de saúde fossem prestados gratuitamente a todas as pessoas, a Constituição previu
que União, Estados, Distrito Federal e Municípios deveriam juntar esforços. Nesse sentido, foi idealizado
o SUS (Sistema Único de Saúde).
O SUS é financiado com recursos do orçamento da seguridade social da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, além de outras fontes (art. 198, § 1º).
Vale ressaltar, no entanto, que as instituições privadas (ex: hospitais particulares) poderão participar do
SUS, de forma complementar:
Art. 199. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada.
§ 1º As instituições privadas poderão participar de forma complementar do sistema único de
saúde, segundo diretrizes deste, mediante contrato de direito público ou convênio, tendo
preferência as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos.
(...)

Essa participação complementar da iniciativa privada na execução de ações e serviços de saúde se


formaliza mediante contrato ou convênio com a administração pública (art. 24, parágrafo único, da Lei nº
8.080/90), nos termos da Lei 8.666/90, utilizando-se como referência, para efeito de remuneração, a
Tabela de Procedimentos do SUS (§ 6º do art. 3º da Portaria nº 2.657/2016 do Ministério da Saúde).
O serviço de saúde, quando prestado pela iniciativa privada por meio do SUS, constitui serviço público
social, conforme já decidiu o STF:

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 23


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O hospital privado que, mediante convênio, se credencia para exercer atividade de relevância pública,
recebendo, em contrapartida, remuneração dos cofres públicos, passa a desempenhar o múnus público.
O mesmo acontecendo com o profissional da medicina que, diretamente, se obriga com o SUS.
STF. 2ª Turma. RHC 90.523, julgado em 19/04/2011.

Como exemplo disso, na esfera criminal, o entendimento da jurisprudência é no sentido de que o médico
contratado de hospital credenciado ao SUS, que presta atendimento à pessoa acobertada pelo referido
sistema, equipara-se a funcionário público, nos termos do art. 327, § 1º, do CP (STF. 2ª Turma. HC
97.710/SC, julgado em 02/02/2010).

Ok, entendi que o serviço prestado pelo hospital conveniado pelo SUS é serviço público. Se há a
prestação de um serviço público, não se aplica o CDC?
Conforme explica Bruno Miragem, não são todos os serviços públicos que se subordinam às normas de
proteção do consumidor (Curso de direito do consumidor. 4ª ed. São Paulo: RT, 2013. p. 172).
Para saber se incide ou não o CDC é necessário analisar se o serviço público é uti singuli ou uti universi.

Serviços público uti singuli Serviços públicos uti universi


São aqueles prestados e fruídos individualmente. São aqueles prestados de modo difuso para toda a
Por essa razão, seu uso é mensurável. coletividade.
Devem ser remunerados por quem se aproveita Não são passíveis de mensuração.
diretamente.
São remunerados normalmente mediante tarifa. São custeados por intermédio de impostos pagos
pelos contribuintes (relação de direito tributário).
Exs: serviços de energia elétrica, água. Exs: segurança pública, iluminação pública.
É possível a aplicação do CDC. Não é possível a aplicação do CDC.

++ (Delegado PC/PI 2018) Os serviços públicos gerais (ou uti universi) são indivisíveis e devem ser mantidos
por impostos. (certo)

Vamos ler novamente Bruno Miragem:


“Não se cogita assim, a aplicação do CDC à prestação de serviços públicos custeados pelo esforço
geral, através da tributação, como é o caso dos que são oferecidos e percebidos coletivamente,
sem possibilidade de mensuração ou determinação de graus de utilização do mesmo (serviços uti
universi).” (MIRAGEM, Bruno. Curso de direito do consumidor. 4ª ed. São Paulo: RT, 2013. p. 173)

Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald são ainda mais claros:


“Em se tratando de serviços públicos, nem todos atraem a aplicação do CDC. Apenas serão objeto
de relação de consumo aqueles prestados mediante contraprestação específica. O usuário, desse
modo, precisa ser individualizado (uti singuli).
Devem, ainda, ser remunerados contratualmente por tarifa ou preço público. Desse modo, os
danos sofridos pelos cidadãos usuários de hospitais públicos ou postos de saúde estão fora da
órbita das relações de consumo.” (Curso de direito civil: responsabilidade civil. 5ª ed. Salvador:
JusPodivm, 2018. p. 821) (grifou-se)

Assim, conforme vimos acima, segundo a doutrina majoritária, não se aplica o CDC para os danos causados
por hospitais ou médicos do SUS.

A jurisprudência, por sua vez, está dividida:

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 24


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NÃO SE APLICA O CDC APLICA-SE O CDC


A participação complementar da iniciativa privada A assistência médica e hospitalar é considerada
- seja das pessoas jurídicas, seja dos respectivos serviço público essencial e, no caso, foi prestada
profissionais - na execução de atividades de saúde por delegação e não diretamente pela
caracteriza-se como serviço público indivisível e Administração Pública. O custeio das despesas
universal (uti universi), o que afasta, por efetuado pelo SUS caracteriza remuneração
conseguinte, a incidência das regras do CDC. indireta apta a qualificar a relação jurídica, no
STJ. 3ª Turma. REsp 1771169/SC, Rel. Min. Nancy caso, como de consumo.
Andrighi, julgado em 26/05/2020. Desse modo, deve ser aplicado o CDC.
STJ. 4ª Turma. AgInt no REsp 1347473/SP, Rel.
Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 04/12/2018.

Se considerássemos que essa relação é regida pelo CDC, qual seria o prazo prescricional?
5 anos, com base no art. 27 do CDC:
Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do
produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a
partir do conhecimento do dano e de sua autoria.

No caso concreto, a 3ª Turma do STJ entendeu que não poderiam incidir as regras do CDC; logo, neste
caso, qual foi o prazo prescricional aplicado?
5 anos, com base no art. 1º-C, da Lei nº 9.494/97:
Art. 1º-C. Prescreverá em cinco anos o direito de obter indenização dos danos causados por
agentes de pessoas jurídicas de direito público e de pessoas jurídicas de direito privado
prestadoras de serviços públicos.

Afastada a incidência do art. 27 do CDC, deve-se aplicar o art. 1º-C da Lei nº 9.494/97.
O STJ possui o entendimento de que a norma do art. 1º-C da Lei nº 9.494/97, por ter natureza especial,
destinando-se clara e especificamente aos danos causados por agentes de pessoas jurídicas de direito
público ou privado prestadoras de serviços públicos, não foi revogada, expressa ou tacitamente, pelo art.
206, § 3º, V, do Código Civil, considerando que este último dispositivo possui natureza geral.
O prazo de 5 anos é mais adequado e razoável para a solução de litígios relacionados às atividades do
serviço público (STJ. 4ª Turma. REsp 1.083.686/RJ, julgado em 15/08/2017).

Em suma:
Na hipótese de responsabilidade civil de médicos pela morte de paciente em atendimento custeado
pelo SUS incidirá o prazo do art. 1º-C da Lei nº 9.494/97, segundo o qual prescreverá em 5 anos a
pretensão de obter indenização.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.771.169-SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 26/05/2020 (Info 672).

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 25


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DIREITO EMPRESARIAL

LETRA DE CÂMBIO
Na letra de câmbio não aceita não há obrigação cambial que vincule o sacado e assim, o sacador
somente tem ação extracambial contra o sacado não aceitante, cujo prazo prescricional não
sofre as interferências do protesto do título de crédito

Importante!!!
O aceite é o ato por meio do qual o sacado se vincula à ordem de pagamento emitida pelo
sacador, tornando-se o responsável principal pela dívida inscrita na letra de câmbio.
Se não houve aceite, não há responsável e a letra de câmbio deixa de ter natureza de título de
crédito, consistindo em um mero documento, produzido unilateralmente pelo sacador.
Assim, na letra de câmbio não aceita não há obrigação cambial que vincule o sacado.
Nesse caso, o sacador somente tem ação extracambial contra esse sacado não aceitante. O
prazo prescricional dessa pretensão não sofre as interferências do protesto do título de
crédito.
A prescrição interrompida pelo protesto cambial se refere única e exclusivamente à ação
cambiária, sendo endereçada unicamente ao responsável principal e, eventualmente, aos
devedores indiretos do título, entre os quais não se enquadra o sacado não aceitante.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.748.779-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/05/2020 (Info 672).

Imagine a seguinte situação hipotética:


A letra de câmbio é um título de crédito que representa uma ordem de pagamento.
Assim, o SACADOR emite uma ordem para que...
- o SACADO (destinatário da ordem) pague determinado valor ao
- TOMADOR (beneficiário da ordem).

Veja um exemplo de letra de câmbio constante no livro de Ricardo Negrão (Curso de Direito Comercial e
de Empresa. Vol. 2. São Paulo: Saraiva, 2019):

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 26


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Aceite da letra
O sacador emite a letra de câmbio e entrega ao tomador (beneficiário).
O tomador levará a letra ao sacado, para que este a aceite.
O aceite é necessário porque no momento em que a letra é emitida (saque), ela ainda não vincula o sacado
(o sacado não participou de nada ainda e, portanto, não está obrigado). No momento da emissão da letra,
quem se vincula é o sacador.
Assim, o aceite é o ato que vincula o sacado.
O aceite é o ato formal por meio do qual o sacado se obriga a efetuar o pagamento da ordem que lhe foi
dada, quando chegar o dia do vencimento.
O efeito do aceite consiste, portanto, em inserir o sacado na relação cambiária, tornando-o o responsável
principal da dívida inscrita na cártula, o que decorre do fato de que, ao aceitar a letra de câmbio, apondo
sua assinatura no título, o sacado aceitante faz uma promessa direta de efetuar o pagamento ao tomador
(beneficiário, portador), no vencimento.

Apresentação
O ato de submeter a letra ao reconhecimento do sacado chama-se apresentação.
Se o sacado reconhecê-la, assinando a letra, torna-se aceitante, obrigado principal pelo pagamento.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 27


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O aceite, na letra de câmbio, é obrigatório? O sacado é obrigado a aceitar?


NÃO. O aceite, na letra de câmbio, é facultativo. Isso significa que o sacado pode se recusar a aceitar, sem
necessidade de apresentar qualquer justificativa.
Conforme explica Fran Martins, a concordância do sacado com a ordem de pagamento é eventual e
facultativa, de modo que “se o sacado, a pessoa a quem a ordem é dada e cujo nome, obrigatoriamente,
deve ser mencionado na letra, desejar cumprir a ordem, lançará no título a sua assinatura, passando a ser
aceitante e nesse caso, em virtude daquela assinatura, se tornara o obrigado principal pelo pagamento”
(MARTINS, Fran. Títulos de Crédito, 17ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 84).

Vale ressaltar, contudo, que, se o sacado aceitar, ele não pode mais voltar atrás, ou seja, o aceite é
facultativo, mas depois que feito, é irretratável.

Como é realizado o “aceite”?


• O aceite é escrito na própria letra. Deverá ser escrita a palavra “aceito”, “aceitamos” ou qualquer outra
expressão parecida. Em seguida, o sacado (ou seu procurador) deve assinar.
• Também vale como aceite a simples assinatura do sacado aposta na parte anterior da letra.

Sacado que não aceitou não possui obrigação cambial


Conforme já vimos, a mera citação do nome do sacado na letra de câmbio não gera para ele (sacado) uma
obrigação cambial.
Não haverá relação cambial decorrente da menção do nome do sacado no documento, mesmo que exista
uma relação jurídica subjacente que tenha servido de ensejo ao saque da cártula. Em outras palavras, mesmo
que o sacador tivesse uma razão jurídica para emitir a letra, o sacado não tem obrigação cambial, caso não
aceite. Isso porque, por força do princípio da autonomia das relações cambiárias, o título de crédito é
“documento constitutivo de direito novo, autônomo, originário e inteiramente desvinculado da relação
causal” (ROSA JR., Luiz Emygdio F., Títulos de crédito, 7ª Ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2011, p. 67).

Na esmagadora maioria dos casos, o sacador aponta determinado indivíduo como sacado na letra de
câmbio porque isso já está combinado entre eles, ou seja, em regra, sacador e sacado possuem alguma
relação jurídica. Se o sacado não aceita a letra de câmbio, o que o sacador poderá tomar alguma medida?
O sacador terá que propor uma ação extracambial para discutir a relação jurídica subjacente.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 28


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Na letra de câmbio não aceita, não há obrigação cambial que vincule o sacado e, assim, o sacador somente
tem ação extracambial contra o sacado não aceitante, cujo prazo prescricional não sofre as interferências
do protesto do título de crédito.

Se a letra de câmbio não foi aceita nem paga, o protesto deverá ser tirado contra o sacador (e não contra
o sacado)
O protesto da letra de câmbio sem aceite deve ser tirado contra o sacador, que é quem vai sofrer os efeitos
da recusa ou falta de protesto ou do pagamento, não produzindo, nessa específica hipótese, efeitos contra
o sacado. Veja o que diz o art. 21, § 5º da Lei nº 9.492/97:
Art. 21 (...)
§ 5º Não se poderá tirar protesto por falta de pagamento de letra de câmbio contra o sacado não
aceitante. (Incluído pela Lei nº 12.767/2012)

Conforme explica José Eunápio Borges:


“O sacado – que não aceita – não é, repita-se, um responsável cambial. Sua situação diante de
uma letra de câmbio, que não aceitou ou se recusa a pagar, quando sacada à vista, é semelhante
à de um banco que se nega a pagar um cheque emitido contra ele. Protestado o cheque por falta
de pagamento, a repercussão imediata do protesto [...] não será contra este [sacado não
aceitante], que deixou de pagar, mas contra o
emitente do cheque [sacador], cuja ordem deixou de ser cumprida. É claro que muitas vezes o
sacado terá obrigação extra-cambial de aceitar ou de pagar e responderá perante o sacador,
extracambialmente, pela
inexecução de tal obrigação.” (Títulos de crédito. 2ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1979, p. 113).

Dessa forma, o protesto, por falta de aceite ou de pagamento de letra de câmbio não aceita, deve ser
dirigido contra o sacador que emitiu a ordem de pagamento não honrada, e não contra o sacado, que não
firmou obrigação cambial e nem pode ser compelido a aceitar a obrigação constante na cártula por meio
do protesto, não sofrendo, portanto, os efeitos decorrentes do protesto da letra de câmbio não aceita.

Interrupção do prazo prescricional pelo protesto por falta ou recusa de pagamento


O Código Civil prevê que o protesto cambial interrompe a prescrição:
Art. 202. A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á:
(...)
III - por protesto cambial;

É necessário, no entanto, estabelecer o efetivo alcance dessa previsão.


O protesto cambial interrompe a prescrição apenas para a ação cambiária. Além disso, essa interrupção
somente se aplica para a pretensão dirigida contra o responsável principal e, eventualmente, contra os
devedores indiretos do título, entre os quais não se enquadra o sacado não aceitante.

Em suma:
O aceite é o ato por meio do qual o sacado se vincula à ordem de pagamento emitida pelo sacador,
tornando-se o responsável principal pela dívida inscrita na letra de câmbio.
Se não houve aceite, não há responsável e a letra de câmbio deixa de ter natureza de título de crédito,
consistindo em um mero documento, produzido unilateralmente pelo sacador.
Assim, na letra de câmbio não aceita não há obrigação cambial que vincule o sacado.
Nesse caso, o sacador somente tem ação extracambial contra esse sacado não aceitante. O prazo
prescricional dessa pretensão não sofre as interferências do protesto do título de crédito.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 29


Informativo
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A prescrição interrompida pelo protesto cambial se refere única e exclusivamente à ação cambiária,
sendo endereçada unicamente ao responsável principal e, eventualmente, aos devedores indiretos do
título, entre os quais não se enquadra o sacado não aceitante.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.748.779-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/05/2020 (Info 672).

FALÊNCIA
O ajuizamento de execução fiscal em momento anterior à decretação da quebra do devedor não
enseja o reconhecimento da ausência de interesse processual do ente federado para pleitear a
habilitação do crédito correspondente no processo de falência

A legislação prevê que a cobrança judicial do crédito tributário não é sujeita a concurso de
credores ou habilitação em falência, recuperação judicial, concordata, inventário ou
arrolamento (art. 187 do CTN e o art. 29 da Lei nº 6.830/80). Isso, contudo, não representa
óbice à habilitação de créditos tributários no concurso de credores da falência.
Esses dispositivos trazem, na verdade, a previsão de uma prerrogativa do ente público que
pode optar entre receber o pagamento de seu crédito pelo rito da execução fiscal, ou mediante
habilitação nos autos da falência.
Assim, a despeito de existir a prerrogativa de cobrança do crédito tributário via execução
fiscal, não existe óbice para que o Fisco (no exercício de juízo de conveniência e oportunidade)
venha a requerer a habilitação de seus créditos nos autos do procedimento falimentar,
submetendo-se à ordem de pagamento prevista na Lei nº 11.101/2005. Vale ressaltar, no
entanto, que isso implicará renúncia do rito previsto na Lei nº 6.830/80, considerando que
não cabe uma garantia dúplice.
Desse modo, tendo o ente público escolhido um dos ritos à sua disposição (habilitar o crédito
na falência), não pode o juízo falimentar afirmar que não existe interesse de agir do poder
público. Importante mencionar, contudo, que haverá a paralisação da tramitação da ação de
execução fiscal, que foi ajuizada antes da falência.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.857.055-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 12/05/2020 (Info 672).

Imagine a seguinte situação hipotética:


A União (Fazenda Nacional) ajuizou execução fiscal contra a sociedade empresária “Viação SP” cobrando
crédito tributário, processo que tramita na 1ª Vara Federal.
Alguns meses depois, antes que a execução fiscal chegasse ao fim, foi decretada a falência da “Viação SP”,
processo que tramita na 3ª Vara de Falências.
A União pediu então ao juízo da 3ª Vara, a habilitação do crédito que está sendo cobrado na execução fiscal.
O juízo da 3ª Vara indeferiu o pedido, como a União já está cobrando o valor devido na execução fiscal,
ela não pode habilitar este crédito na falência considerando que faltaria ao poder público interesse
processual.

Agiu corretamente o juízo da 3ª Vara de Falências? A Fazenda Nacional está impedida de habilitar o
crédito na falência?
NÃO. Vamos entender com calma.

Prerrogativas do art. 187 do CTN e do art. 29 da Lei nº 6.830/80


O art. 187 do CTN e o art. 29 da Lei nº 6.830/80 preveem o seguinte:
Art. 187. A cobrança judicial do crédito tributário não é sujeita a concurso de credores ou
habilitação em falência, recuperação judicial, concordata, inventário ou arrolamento.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 30


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Art. 29. A cobrança judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública não é sujeita a concurso de credores
ou habilitação em falência, concordata, liquidação, inventário ou arrolamento

++ (Juiz TJ/MT 2018 VUNESP) A cobrança judicial do crédito tributário não é sujeita a concurso de credores
ou habilitação em falência, recuperação judicial, concordata, inventário ou arrolamento. (certo)

O STJ entende, contudo, que esses dois dispositivos não proíbem que a Fazenda Pública faça a habilitação
dos créditos tributários na falência. Esses dispositivos garantem ao ente público a prerrogativa de escolher
entre receber o pagamento de seu crédito pelo rito da execução fiscal ou mediante habilitação nos autos
da falência.
Assim, muito embora o processamento e o julgamento das execuções fiscais não se submetam ao juízo
universal da falência, compete à Fazenda Pública optar por ingressar com a cobrança judicial ou requerer
a habilitação de seu crédito na ação falimentar.

Optando pela falência, a Fazenda deve renunciar o rito da execução fiscal


Vale ressaltar, no entanto, que, se o ente estatal optar por habilitar o crédito na falência, deverá renunciar
o rito da execução fiscal, na medida em que não se pode admitir bis in idem:
Possuindo a União Federal a prerrogativa de escolher entre receber seu crédito por meio da execução
fiscal ou pela habilitação de crédito, ao optar pela adoção de um procedimento, consequentemente
renunciará ao outro.
STJ. 2ª Turma. Resp 1815825/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 01/10/2019.

(...) Malgrado a prerrogativa de cobrança do crédito tributário via execução fiscal, inexiste óbice para que
o Fisco (no exercício de juízo de conveniência e oportunidade) venha a requerer a habilitação de seus
créditos nos autos do procedimento falimentar, submetendo-se à ordem de pagamento prevista na Lei
11.101/2005, o que implicará renúncia a utilizar-se do rito previsto na Lei 6.830/80, ante o descabimento
de garantia dúplice. (...)
STJ. 4ª Turma. REsp 1466200/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 04/12/2018.

Em suma:
O ajuizamento de execução fiscal em momento anterior à decretação da quebra do devedor não enseja
o reconhecimento da ausência de interesse processual do ente federado para pleitear a habilitação do
crédito correspondente no processo de falência.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.857.055-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 12/05/2020 (Info 672).

RECUPERAÇÃO JUDICIAL
Nos casos em que há aditamento ao plano de recuperação judicial, o termo inicial do prazo
bienal de que trata o art. 61, caput, da Lei nº 11.101/2005 deve ser a data da concessão da
recuperação judicial

O art. 61 da Lei nº 11.101/2005 estabeleceu o prazo de 2 anos para o devedor permanecer em


recuperação judicial. Esse prazo se inicia com a concessão da recuperação judicial e se encerra
com o cumprimento de todas as obrigações previstas no plano que se vencerem até 2 anos do
termo inicial:
Art. 61. Proferida a decisão prevista no art. 58 desta Lei, o devedor permanecerá em
recuperação judicial até que se cumpram todas as obrigações previstas no plano que se
vencerem até 2 (dois) anos depois da concessão da recuperação judicial.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 31


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Se houver o aditamento do plano de recuperação judicial, o termo inicial do prazo bienal de


que trata o art. 61, da Lei nº 11.101/2005 continuará sendo a data da concessão da
recuperação judicial ou passará para a data em que foi homologado o aditivo ao plano?
Continuará a ser a data da concessão da recuperação judicial.
A apresentação de aditivos ao plano de recuperação judicial pressupõe que o plano estava
sendo cumprido e, por situações que somente se mostraram depois, teve que ser modificado,
o que foi admitido pelos credores. Não há, assim, propriamente uma ruptura da fase de
execução, motivo pelo qual inexiste justificativa para a modificação do termo inicial da
contagem do prazo bienal para o encerramento da recuperação judicial.
Assim, decorridos 2 anos da concessão da recuperação judicial, ela deve ser encerrada, seja
pelo cumprimento das obrigações estabelecidas para esse período, seja pela eventual
decretação da falência.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.853.347-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 05/05/2020 (Info 672).

Recuperação judicial
A recuperação judicial surgiu para substituir a antiga “concordata” e tem por objetivo viabilizar a
superação da situação de crise do devedor, a fim de permitir que a atividade empresária se mantenha e,
com isso, sejam preservados os empregos dos trabalhadores e os interesses dos credores.
A recuperação judicial consiste, portanto, em um processo judicial, no qual será construído e executado
um plano com o objetivo de recuperar a empresa que está em vias de efetivamente ir à falência.
A recuperação judicial é atualmente regida pela Lei nº 11.101/2005.

Fases da recuperação
De forma resumida, a recuperação judicial possui três fases:
a) postulação: inicia-se com o pedido de recuperação e vai até o despacho de processamento;
b) processamento: vai do despacho de processamento até a decisão concessiva;
c) execução: da decisão concessiva até o encerramento da recuperação judicial.

A decisão concessiva da recuperação judicial é disciplinada pelo art. 58 da Lei nº 11.101/2005:


Art. 58. Cumpridas as exigências desta Lei, o juiz concederá a recuperação judicial do devedor cujo
plano não tenha sofrido objeção de credor nos termos do art. 55 desta Lei ou tenha sido aprovado
pela assembleia-geral de credores na forma do art. 45 desta Lei.

Duração da recuperação judicial (duração da fase de execução)


O art. 61 da Lei nº 11.101/2005 estabeleceu o prazo de 2 anos para o devedor permanecer em recuperação
judicial. Esse prazo se inicia com a concessão da recuperação judicial e se encerra com o cumprimento de
todas as obrigações previstas no plano que se vencerem até 2 anos do termo inicial:
Art. 61. Proferida a decisão prevista no art. 58 desta Lei, o devedor permanecerá em recuperação
judicial até que se cumpram todas as obrigações previstas no plano que se vencerem até 2 (dois)
anos depois da concessão da recuperação judicial.
§ 1º Durante o período estabelecido no caput deste artigo, o descumprimento de qualquer
obrigação prevista no plano acarretará a convolação da recuperação em falência, nos termos do
art. 73 desta Lei.
(...)

Vale ressaltar que esse é o prazo máximo que o Poder Judiciário, o Ministério Público e o administrador
judicial irão ficar acompanhando a recuperação judicial. No entanto, o plano de recuperação judicial pode
prever prazos de pagamento maiores. Conforme explica o Min. Ricardo Villas Bôas Cueva:

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 32


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“É preciso esclarecer desde logo que o fato de a recuperação judicial se encerrar no prazo de 2
(dois) anos não significa que o plano não possa prever prazos mais alongados para o cumprimento
das obrigações, mas, sim, que o cumprimento somente será acompanhado pelo Judiciário, pelo
Ministério Público e pelo administrador judicial nessa fase, para depois estar sob a fiscalização
única dos credores.”

Importante esclarecer que, se o devedor descumprir alguma obrigação prevista no plano após o prazo de
2 anos, não será mais possível convolar a recuperação em falência, por força da redação do § 1º do art. 61
acima transcrito. Veja como esse sutil aspecto foi cobrado em prova e fez muitos candidatos errarem:
++ (Juiz TJAM 2016 CESPE) Considerando que determinado juiz tenha concedido a recuperação judicial a
um devedor, após a aprovação do plano de recuperação em assembleia geral de credores, se, decorridos
mais de dois anos da referida decisão judicial, o devedor inadimplir obrigação prevista no plano, o juiz
deverá convolar a recuperação em falência. (errado)

Esse período de 2 anos é, portanto, um prazo de efetiva fiscalização judicial das atividades da empresa em
recuperação. Vale ressaltar que esse prazo não pode ser reduzido nem ampliado ainda que por vontade
do devedor e dos credores.

Imagine agora a seguinte situação hipotética:


Em 16/08/2012, o juiz proferiu decisão de processamento da recuperação judicial.
Depois da publicação dessa decisão, o devedor deverá apresentar o plano de recuperação judicial em juízo
no prazo improrrogável de 60 dias. Caso não apresente, a recuperação é transformada em falência (art.
53 da Lei).
Em 10/10/2012, o devedor apresentou o plano de recuperação judicial.
Em 02/02/2013, o juiz homologou o plano e concedeu a recuperação judicial. Aqui se inicia o prazo de 2
anos de que trata o art. 61 da Lei.
Suponhamos que, em 02/02/2014, é apresentado um aditamento ao plano de recuperação, sendo
homologado pelo juiz.

Esse aditamento irá interferir no prazo do art. 61 da Lei nº 11.101/2005? Se houver o aditamento do
plano de recuperação judicial, o termo inicial do prazo bienal de que trata o art. 61 continuará sendo a
data da concessão da recuperação judicial ou passará para a data em que foi homologado o aditivo ao
plano?
O aditamento não irá interferir.
O termo inicial do prazo de 2 anos do art. 61 continuará sendo a data da concessão da recuperação judicial.
A apresentação de aditivos ao plano de recuperação judicial pressupõe que o plano estava sendo cumprido
e, por situações que somente se mostraram depois, teve que ser modificado, o que foi admitido pelos
credores. Não há, assim, propriamente uma ruptura da fase de execução, motivo pelo qual inexiste
justificativa para a modificação do termo inicial da contagem do prazo bienal para o encerramento da
recuperação judicial.
Assim, decorridos 2 anos da concessão da recuperação judicial, ela deve ser encerrada, seja pelo
cumprimento das obrigações estabelecidas para esse período, seja pela eventual decretação da falência.

Em suma:
Mesmo nos casos em que há aditamento ao plano de recuperação judicial, o termo inicial do prazo
bienal de que trata o art. 61, caput, da Lei nº 11.101/2005 deve continuar sendo a data da concessão da
recuperação judicial.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.853.347-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 05/05/2020 (Info 672).

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 33


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ECA
INTERNAÇÃO
Se a internação for aplicada sem termo, o cálculo do prazo prescricional
deverá levar em consideração a duração máxima da internação (3 anos)

Importante!!!
Tratando-se de medida socioeducativa aplicada sem termo, o prazo prescricional deve ter
como parâmetro a duração máxima da internação (3 anos), e não o tempo da medida, que
poderá efetivamente ser cumprida até que o socioeducando complete 21 anos de idade.
Assim, deve-se considerar o lapso prescricional de 8 anos previsto no art. 109, IV, do Código
Penal, posteriormente reduzido pela metade em razão do disposto no art. 115 do mesmo
diploma legal, de maneira a restar fixado em 4 anos.
STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1.856.028-SC, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em
12/05/2020 (Info 672).

Ato infracional
Quando uma criança ou adolescente pratica um fato previsto em lei como crime ou contravenção penal,
esta conduta é chamada de “ato infracional”.
Assim, juridicamente, não se deve dizer que a criança ou adolescente cometeu um crime ou contravenção
penal, mas sim ato infracional.
• Criança: é a pessoa que tem até 12 anos de idade incompletos.
• Adolescente: é a pessoa que tem entre 12 e 18 anos de idade.

Quando uma criança ou adolescente pratica um ato infracional, não receberá uma pena (sanção penal),
considerando que não pratica crime nem contravenção. O que acontece então?
• Criança: receberá uma medida protetiva (art. 101 do ECA).
• Adolescente: receberá uma medida socioeducativa (art. 112 do ECA) e/ou medida protetiva (art. 101).

O que é prescrição no direito penal?


Prescrição pode ser conceituada como sendo:
- a perda do direito do Estado de
- punir (pretensão punitiva) ou
- executar uma punição já imposta (pretensão executória),
- em razão de não ter agido (inércia) nos prazos previstos em lei.

Existe prescrição envolvendo medidas socioeducativas?


SIM. Conforme entendimento pacífico do STJ:
Súmula 338-STJ: A prescrição penal é aplicável nas medidas socioeducativas.

++ (Promotor MP/MS 2015) De acordo com o entendimento do STJ, a prescrição penal é aplicável nas
medidas socioeducativas previstas no ECA. (certo)

Espécies de prescrição
No direito penal, temos duas espécies de prescrição:
a) prescrição da pretensão punitiva;
b) prescrição da pretensão executória.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 34


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Adaptando esses conceitos para o âmbito do direito infracional, é possível afirmar que existem duas
espécies de prescrição relacionadas com as medidas socioeducativas:
a) prescrição da pretensão (prescrição da ação): perda da pretensão de ajuizar a ação socioeducativa;
b) prescrição da execução das medidas socioeducativas: perda da pretensão de fazer cumprir a medida
socioeducativa imposta na sentença.
Como se deve calcular o prazo prescricional das medidas socioeducativas?
O ECA não possui dispositivos tratando sobre prescrição. Diante disso, devem ser aplicadas as regras do
Código Penal para aferir a ocorrência da prescrição quanto às medidas socioeducativas.
Imagine agora a seguinte situação hipotética:
Lucas, adolescente de 15 anos, praticou ato infracional equiparado a homicídio.
O juiz julgou procedente a representação (ação socioeducativa) oferecida pelo Ministério Público e aplicou
a Lucas a medida socioeducativa de internação, sem termo final, nos termos do art. 121, § 2º do ECA:
Art. 121. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de brevidade,
excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.
(...)
§ 2º A medida não comporta prazo determinado, devendo sua manutenção ser reavaliada,
mediante decisão fundamentada, no máximo a cada seis meses.

Como calcular a prescrição neste caso?


Se a medida socioeducativa foi aplicada sem termo (“sem prazo”), o prazo prescricional deve ser calculado
com base no período máximo de duração da medida de internação, que é 3 anos, nos termos do art. 121,
§ 3º do ECA:
Art. 121 (...)
§ 3º Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos.

Se a medida de internação tem prazo máximo de 3 anos, o prazo prescricional, segundo o Código Penal,
deveria ser 8 anos, se considerássemos apenas o art. 109, IV, do CP:
Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1º do
art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime,
verificando-se:
(...)
IV - em oito anos, se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro;

Ocorre que a medida socioeducativa é aplicada para quem tem menos de 21 anos. Logo, esse prazo de 8
anos deverá ser obrigatoriamente reduzido pela metade conforme determina o art. 115 do CP:
Art. 115. São reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o criminoso era, ao tempo do
crime, menor de 21 (vinte e um) anos, ou, na data da sentença, maior de 70 (setenta) anos.

Em suma:
Tratando-se de medida socioeducativa aplicada sem termo, o prazo prescricional deve ter como
parâmetro a duração máxima da internação (3 anos), e não o tempo da medida, que poderá
efetivamente ser cumprida até que o socioeducando complete 21 anos de idade.
Assim, deve-se considerar o lapso prescricional de 8 anos previsto no art. 109, IV, do Código Penal,
posteriormente reduzido pela metade em razão do disposto no art. 115 do mesmo diploma legal, de
maneira a restar fixado em 4 anos.
STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1.856.028-SC, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 12/05/2020
(Info 672).

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 35


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CUMPRIMENTO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA


É válida a extinção de medida socioeducativa de internação quando o juízo da execução, ante a
superveniência de processo-crime após a maioridade penal, entende que não restam objetivos
pedagógicos em sua execução

Importante!!!
Exemplo: Adriano, de 20 anos, foi sentenciado a cumprir medida socioeducativa de internação
em virtude de ato infracional praticado quando ele era adolescente. A sentença transitou em
julgado. Ocorre que o juízo da vara de infância e juventude constatou que Adriano encontra-
se preso em razão de crime de roubo cometido quando ele já era adulto. Diante disso, o juízo
da vara infracional extinguiu a execução da medida socioeducativa afirmando que, tendo em
vista a sua idade e o seu perfil pessoal agravado, não restam objetivos pedagógicos no
cumprimento da internação.
O STJ afirmou que a decisão foi acertada.
O art. 46, § 1º da Lei nº 12.594/2012 (Lei do SINASE) prevê a seguinte faculdade para o julgador:
Art. 46 (...) § 1º No caso de o maior de 18 (dezoito) anos, em cumprimento de medida
socioeducativa, responder a processo-crime, caberá à autoridade judiciária decidir sobre
eventual extinção da execução, cientificando da decisão o juízo criminal competente.
STJ. 6ª Turma. HC 551.319-RS, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 12/05/2020 (Info 672).

Imagine a seguinte situação hipotética:


Adriano, de 20 anos, foi sentenciado a cumprir medida socioeducativa de internação em virtude de ato
infracional praticado quando ele era adolescente.
A sentença transitou em julgado.
Ocorre que o juízo da vara de infância e juventude constatou que Adriano encontra-se preso em razão de
crime de roubo cometido quando ele já era adulto.
Diante disso, o juízo da vara infracional extinguiu a execução da medida socioeducativa afirmando que,
tendo em vista a sua idade e o seu perfil pessoal agravado, não restam objetivos pedagógicos no
cumprimento da internação.

Agiu corretamente o magistrado?


SIM. O STJ afirmou que a decisão foi acertada.
O art. 46, § 1º da Lei nº 12.594/2012 (Lei do SINASE) prevê a seguinte faculdade ao julgador:
Art. 46 (...)
§ 1º No caso de o maior de 18 (dezoito) anos, em cumprimento de medida socioeducativa,
responder a processo-crime, caberá à autoridade judiciária decidir sobre eventual extinção da
execução, cientificando da decisão o juízo criminal competente.

++ (MP/GO 2012) No caso de o maior de 18 anos, em cumprimento de medida socioeducativa responder


a processo crime, caberá à autoridade judiciária decidir sobre eventual extinção da execução, cientificando
da decisão o juízo criminal competente. (certo)

Conforme explica Nucci:


“Esta é uma alternativa para extinguir a medida socioeducativa, que, segundo este dispositivo,
constitui faculdade do juiz. Porém, é sensata a extinção da execução socioeducativa na maior parte
dos casos em que o adolescente, completando a maioridade, pratica crime e por ele responde. De
que adianta prosseguir no processo de educação e integração sociofamiliar se o mal maior já foi
cometido, que é o delito? Pensamos ser caso de extinção. Excepcionalmente, caso o adolescente
Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 36
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esteja internado por fato grave (homicídio, latrocínio, estupro), sem atingir o teto de três anos, o
simples fato de responder, aos 18 anos, por um caso de furto, não autoriza a extinção da
internação, que, na prática, é mais eficaz tanto para ele como para a sociedade.” (NUCCI,
Guilherme de Souza. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado: em buscada Constituição
Federal das Crianças e dos Adolescentes. 2ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 854-855).

Assim, é válida a extinção de medida socioeducativa de internação quando o juízo da execução, ante a
superveniência de processo-crime após a maioridade penal, entende que não restam objetivos
pedagógicos em sua execução
STJ. 6ª Turma. HC 551.319-RS, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 12/05/2020 (Info 672).

Vale ressaltar, mais uma vez, que a extinção da medida socioeducativa, nesta hipótese, não é obrigatória
ou automática. Trata-se de uma faculdade do juiz a ser examinada com base no caso concreto:
++ (MP/SC 2016) As hipóteses de extinção da medida socioeducativa vieram bem definidas na Lei n.
12.594/12. Será automática a extinção do cumprimento de medida socioeducativa em relação ao
imputável que vier a responder a processo crime, frente à notória ausência de interesse em se prosseguir
no correspondente processo de educação e integração sociofamiliar. (errado)
++ (DPE/GO 2018) A Lei n. 12.594/2012 (Lei Sinase) institui o sistema nacional de atendimento
socioeducativo e regulamenta a execução das medidas socioeducativas destinadas a adolescentes que
pratiquem ato infracional e estabelece que o juiz da infância e juventude, examinando caso de maior de
18 anos, em cumprimento de medida socioeducativa e respondendo a processo crime, será obrigado a
extinguir a execução, cientificando da decisão o juízo criminal competente. (errado)

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Se houve a extinção da execução fiscal a pedido do exequente, mas o crédito tributário
permanece sendo discutido judicialmente em outra demanda, os honorários advocatícios devem
ser arbitrados por apreciação equitativa

Nos casos em que o acolhimento da pretensão não tenha correlação com o valor da causa ou
não se observe proveito econômico com a extinção sem resolução do mérito da execução fiscal,
os honorários de sucumbência devem ser arbitrados por apreciação equitativa, com
observância dos critérios dos §§ 2º e 8º do art. 85 do CPC/2015.
Caso concreto: o Município ajuizou execução fiscal contra a empresa; a executada informou
que o débito cobrado está sendo discutido em ação declaratória em tramitação, na qual foi
proferida sentença e acórdão suspendendo a exigibilidade do crédito tributário, estando
aguardando apenas o julgamento de recurso extraordinário; diante disso, o Município pediu
a desistência da execução, com a extinção do processo sem julgamento do mérito.
Nessa situação, os honorários advocatícios deverão ser fixados, não com base no § 3º do art.
85, mas sim com fundamento no § 8º. Isso porque a extinção da execução fiscal não acarreta
impacto direto na questão de fundo, vez que o crédito tributário é ainda objeto de controvérsia
judicial na outra ação.
Art. 85 (...) § 8º Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda,
quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação
equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2º.
STJ. 1ª Turma. REsp 1.776.512-SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 12/05/2020 (Info 672).

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 37


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Imagine a seguinte situação hipotética:


O Município ajuizou execução fiscal contra a empresa TBA Ltda.
A empresa executada informou que o débito cobrado está sendo discutido em uma ação declaratória que
ela propôs e que está em tramitação. Argumentou também que, nessa ação declaratória, já foi proferida
sentença de procedência e acórdão do Tribunal de Justiça confirmando a sentença e determinando a
suspensão da exigibilidade do crédito tributário. Nesse processo está se aguardando apenas o julgamento
do recurso extraordinário interposto pela Fazenda Pública.
Diante dessa informação, o Município pediu a desistência da execução fiscal, com a extinção do processo
sem julgamento do mérito, nos termos do art. 485, VIII, do CPC/2015:
Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando:
(...)
VIII - homologar a desistência da ação;

O magistrado condenou o Município a pagar honorários advocatícios no valor de R$ 50 mil com base em
percentual sobre o proveito econômico obtido, nos termos do art. 85, § 3º do CPC/2015:
Art. 85 (...)
§ 3º Nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a fixação dos honorários observará os critérios
estabelecidos nos incisos I a IV do § 2º e os seguintes percentuais:
I - mínimo de dez e máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação ou do proveito
econômico obtido até 200 (duzentos) salários-mínimos;
II - mínimo de oito e máximo de dez por cento sobre o valor da condenação ou do proveito
econômico obtido acima de 200 (duzentos) salários-mínimos até 2.000 (dois mil) salários-mínimos;
III - mínimo de cinco e máximo de oito por cento sobre o valor da condenação ou do proveito
econômico obtido acima de 2.000 (dois mil) salários-mínimos até 20.000 (vinte mil) salários-
mínimos;
IV - mínimo de três e máximo de cinco por cento sobre o valor da condenação ou do proveito
econômico obtido acima de 20.000 (vinte mil) salários-mínimos até 100.000 (cem mil) salários-
mínimos;
V - mínimo de um e máximo de três por cento sobre o valor da condenação ou do proveito
econômico obtido acima de 100.000 (cem mil) salários-mínimos.

O Município recorreu afirmando que a aplicação dos percentuais mínimos previstos nos incisos do § 3º do
art. 85, incidentes sobre o valor da causa, seriam desproporcionais no caso concreto. Além disso,
sustentou que, com a desistência, o executado não experimentou ainda qualquer proveito econômico,
uma vez que o crédito continua sendo discutido em outra ação judicial.

O STJ acolheu a tese da empresa?


SIM.
A regra geral do CPC/2015 é a de que os honorários advocatícios serão fixados com base em percentuais
mínimos e máximos sobre a dimensão econômica da demanda. Isso está previsto nos §§ 2º e 3º do art. 85.
O § 6º do art. 85 afirma, inclusive, que:
Art. 85 (...)
§ 6º Os limites e critérios previstos nos §§ 2º e 3º aplicam-se independentemente de qual seja o
conteúdo da decisão, inclusive aos casos de improcedência ou de sentença sem resolução de
mérito.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 38


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Equidade
O CPC/2015 prevê um critério residual (excepcional), que é baseado na equidade.
Esse critério residual é utilizado nas causas de inestimável ou irrisório proveito econômico, conforme
dicção do § 8º:
Art. 85 (...)
§ 8º Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o
valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa,
observando o disposto nos incisos do § 2º.

Os honorários advocatícios só podem ser fixados com base na equidade de forma subsidiária, ou seja:
• quando não for possível o arbitramento pela regra geral; ou
• quando for inestimável ou irrisório o valor da causa.
Assim, o juízo de equidade na fixação dos honorários advocatícios somente pode ser utilizado de forma
subsidiária, quando não presente qualquer hipótese prevista no § 2º do art. 85 do CPC.
STJ. 2ª Seção. REsp 1746072-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. Acd. Min. Raul Araújo, julgado em
13/02/2019 (Info 645).

No caso concreto, a execução fiscal foi extinta, mas sem proveito econômico para o devedor
Em uma execução fiscal, o proveito econômico está diretamente relacionado com o crédito tributário e
com os encargos legais constantes da certidão de dívida ativa. Nesse sentido, veja o que diz o art. 6º, § 4º,
da Lei nº 6.830/80 (Lei de Execução Fiscal):
Art. 6º (...)
§ 4º O valor da causa será o da dívida constante da certidão, com os encargos legais.

Existem alguns casos na execução fiscal em que o juiz irá acolher a pretensão do devedor, mas isso não irá
gerar para ele proveito econômico. Mesmo acolhendo o pedido do executado, essa decisão não acarretará
impacto no crédito inscrito em dívida ativa (valor originário, juros e demais encargos), o qual poderá
continuar sendo cobrado, ou novamente cobrado, do mesmo devedor e/ou dos demais responsáveis, se
o exercício da pretensão executória ainda estiver dentro do prazo fixado pela lei.
Exemplo desse tipo de situação: o caso do juiz que acolhe a exceção de pré-executividade para anular o
processo por causa da existência de litispendência ou de incompetência do juízo. Não se pode dizer que
houve proveito econômico para o executado já que o crédito tributário pode continuar sendo cobrado em
outra ação.
Nesses casos, deve-se reconhecer que o proveito econômico ou o valor da causa não poderão ser
utilizados como parâmetro único para essa providência, pois a extinção da execução não interfere na
subsistência do crédito tributário cobrado, o qual, a depender do resultado da ação conexa em que está
sendo discutido, ainda poderá ser exigido em sua totalidade.
Não há, em verdade, um proveito econômico imediato alcançado pela parte devedora, e sim uma
transferência, um diferimento (adiamento) da discussão relativa ao bem da vida controvertido. E esse
tempo ganho com o não pagamento do tributo, de fato, é inestimável, pois o sucesso da pretensão do
devedor não terá, em tese, nenhum impacto sobre o cálculo do débito inscrito em dívida ativa, já que
atualizável na forma da lei.
O executado só terá proveito econômico quando houver a solução definitiva da controvérsia sobre o
crédito tributário.
Não se trata de afirmar que o proveito econômico obtido com a sentença de extinção da execução não é
mensurável, o que atrairia a regra do art. 85, § 4º, III, do CPC/2015. Trata-se de afirmar que é inexistente
ou irrisório o proveito econômico alcançado com a extinção da execução sem julgamento do mérito, uma
vez que a obrigação tributária, o crédito tributário e a existência de relação jurídica tributária (bens da

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 39


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vida controvertidos) ainda são discutidos em sede de ações conexas, só se observando algum proveito
econômico com o julgamento definitivo daquelas ações.
Também não é o caso de se negar vigência ao § 6º do art. 85 do CPC/2015 que determina a aplicação dos
critérios previstos nos §§ 2º e 3º independentemente de qual seja o conteúdo da decisão. Busca-se evitar
a indevida aplicação em duplicidade da nova tarifação dos honorários sucumbenciais estabelecida pelo
legislador.
Com efeito, a fixação em bis in idem de verbas de sucumbência em percentual sobre o valor da causa
acarretaria a oneração das partes em percentual desproporcional ao proveito econômico alcançado com
o fim de todas as ações.

Em suma:
Se houve a extinção da execução fiscal a pedido do exequente, mas o crédito tributário permanece
sendo discutido judicialmente em outra demanda, os honorários advocatícios devem ser arbitrados por
apreciação equitativa.
Assim, nos casos em que o acolhimento da pretensão não tenha correlação com o valor da causa ou não
se observe proveito econômico com a extinção sem resolução do mérito da execução fiscal, os
honorários de sucumbência devem ser arbitrados por apreciação equitativa, com observância dos
critérios dos §§ 2º e 8º do art. 85 do CPC/2015.
STJ. 1ª Turma. REsp 1.776.512-SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 12/05/2020 (Info 672).

PENHORA
São penhoráveis os valores oriundos de empréstimo consignado, salvo se o mutuário comprovar
que os recursos são necessários à sua manutenção e de sua família

Importante!!!
Os valores oriundos de empréstimo consignado em folha de pagamento, depositados em conta
bancária do devedor, não gozam de proteção da impenhorabilidade atribuída aos salários,
proventos e pensões. Não se aplica, neste caso, o art. 833, IV, do CPC/2015:
Art. 833. São impenhoráveis: IV - os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as
remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem
como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor
e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal,
ressalvado o § 2º;
Assim, a quantia decorrente de empréstimo consignado, embora seja descontada diretamente
da folha de pagamento do mutuário, não tem caráter salarial, sendo, em regra, passível de
penhora.
A proteção da impenhorabilidade ocorre somente se o mutuário (devedor) comprovar que os
recursos oriundos do empréstimo consignado são necessários à sua manutenção e à da sua
família.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.820.477-DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 19/05/2020 (Info 672).

Imagine a seguinte situação hipotética:


O banco ajuizou execução de título extrajudicial contra João.
O juiz determinou a penhora de R$ 5 mil que estavam depositados na conta bancária do devedor.
O executado apresentou embargos à execução alegando e comprovando que o dinheiro penhorado é fruto
de um empréstimo consignado que ele contraiu e que tinha acabado de ser depositado em sua conta.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 40


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O devedor argumentou que os valores decorrentes de empréstimo consignado em folha de pagamento


recebem a mesma proteção da impenhorabilidade atribuída aos salários, proventos de aposentadoria e
pensões, devendo, portanto, ser enquadrados no art. 833, IV, do CPC/2015:
Art. 833. São impenhoráveis:
(...)
IV - os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de
aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por
liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de
trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o § 2º;

O que o STJ entende a respeito do tema? Os valores decorrentes de empréstimo consignado em folha de
pagamento podem ou não ser penhorados?
• Regra: SIM. Em regra, os valores oriundos de empréstimo consignado são PENHORÁVEIS.
• Exceção: a penhora não será permitida se o mutuário comprovar que os recursos são necessários à sua
manutenção e de sua família.

Empréstimo consignado e seu impacto na renda do trabalhador


O empréstimo consignado “é uma modalidade de crédito em que o desconto da prestação é feito
diretamente na folha de pagamento ou de benefício previdenciário do contratante”, reduzindo o risco de
inadimplência e, por esse motivo, permite a redução da taxa de juros cobrada pela instituição financeira
(Fonte: https://www.bcb.gov.br/nor/relcidfin/docs/art7_emprestimo_consignado.pdf.).
Essa modalidade de empréstimo compromete a renda do trabalhador, do pensionista ou do aposentado,
podendo, assim, reduzir o seu poder aquisitivo e, em certos casos, prejudicar a sua subsistência. Isso
porque o mutuário (devedor) recebe determinada quantia do mutuante (instituição financeira ou
cooperativa de crédito) e, em contrapartida, ocorre a diminuição do salário devido aos descontos
efetuados diretamente na folha de pagamento.

Mesmo havendo esse impacto na renda, os valores do empréstimo consignado não têm natureza de
salário
Ainda que as parcelas do empréstimo contratado sejam descontadas diretamente da folha de pagamento
do mutuário, a origem desse valor não é salarial, pois não se trata de valores decorrentes de prestação de
serviço.
O salário tem origem no contrato trabalho ou na prestação do serviço; o empréstimo tem origem em
contrato de mútuo celebrado entre o trabalhador (mutuário) e a instituição financeira ou cooperativa de
crédito (mutuante).
Assim, o empréstimo consignado não pode ser considerado nem mesmo como adiantamento de salário.
Somente se poderia considerar como adiantamento salarial se fosse feito pelo empregador e em função
exclusiva do contrato de trabalho.
Logo, não sendo salarial, o empréstimo consignado não possui, em regra, natureza alimentar.

Art. 833 do CPC deve ser interpretado restritivamente


O empréstimo pessoal, ainda que na modalidade consignada, não encontra previsão no rol do art. 833 do
CPC. Por constituir exceção ao princípio da responsabilidade patrimonial (art. 831 do CPC/2015), não se
admite, nesse aspecto, interpretação extensiva.

Desse modo, a regra geral é:


Os valores decorrentes de empréstimo consignado, em regra, não são protegidos pela impenhorabilidade,
por não estarem abrangidos pelas expressões vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações,
proventos de aposentadoria, pensões, de que trata a parte inicial do inciso IV art. 833 do CPC/2015.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 41


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Exceção:
Se o mutuário (devedor) comprovar que os recursos oriundos do empréstimo consignado são necessários
à sua manutenção e à da sua família, tais valores recebem o manto da impenhorabilidade. Essa
interpretação decorre da aplicação da parte final do art. 833, IV, do CPC/2015: “destinadas ao sustento do
devedor e de sua família”:
Art. 833. São impenhoráveis:
(...)
IV - os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de
aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por
liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de
trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o § 2º;

Em suma:
São penhoráveis os valores oriundos de empréstimo consignado, salvo se o mutuário comprovar que os
recursos são necessários à sua manutenção e de sua família.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.820.477-DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 19/05/2020 (Info 672).

PROCEDIMENTOS ESPECIAIS (EMBARGOS DE TERCEIRO)


Não são cabíveis embargos de terceiro para desconstituir decisão judicial que permite a
averbação de protesto na matrícula de um imóvel

O protesto contra a alienação de bens é uma medida judicial por meio da qual o promovente
comunica a terceiros interessados que ele entende possuir direitos sobre o imóvel.
Mesmo que o protesto tenha sido registrado na matrícula do imóvel, o único efeito produzido
é o de comunicar aos interessados na aquisição do bem, que alguém alega possuir direitos
sobre este bem.
O protesto não acrescenta nem diminui direitos do promovente. Ele é unilateral e apenas dá
ciência sobre a manifestação do promovente. Se essa manifestação tem relevância ou não, isso
somente será decidido no processo competente, se houver.
Os embargos de terceiro são remédio processual a disposição do terceiro prejudicado por um
esbulho judicial, o qual se configura quando a atuação jurisdicional alcança bens que excedam
os limites patrimoniais da obrigação exigida. Em palavras mais simples, os embargos de
terceiro têm por objetivo desfazer o ato constritivo judicial que recai sobre determinado bem.
Assim, é pressuposto dos embargos de terceiro a existência de um ato de constrição judicial
sobre o bem que o terceiro alega ser possuidor ou proprietário.
A averbação do protesto na matrícula do imóvel não afeta a posse ou a propriedade de terceiro
alheio ao procedimento e não configura apreensão judicial. Logo, não são cabíveis embargos
de terceiro contra essa determinação.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.758.858-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/05/2020 (Info 672).

Protesto contra a alienação de bens


O protesto contra a alienação de bens é uma medida judicial por meio da qual o promovente comunica a
terceiros interessados que ele entende possuir direitos sobre o imóvel.

Como essa comunicação é feita? Como ocorre essa “publicidade”?


O CPC de 1973 previa que o protesto seria publicado por meio de editais.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 42


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No entanto, a jurisprudência admite que o meio realmente eficaz de propiciar o conhecimento de terceiros
sobre a existência do protesto é fazer a sua averbação no registro de imóveis.

Quais são os efeitos da averbação do protesto?


Mesmo que o protesto tenha sido registrado na matrícula do imóvel, o único efeito produzido é o de
comunicar aos interessados na aquisição do bem que alguém alega possuir direitos sobre ele.
O protesto contra a alienação de bens, mesmo que esteja averbado na matrícula do imóvel, não pode ser
usado como forma de impedir juridicamente a venda.
O adquirente toma conhecimento de que existe o protesto, mas é livre para decidir se assume o risco e
compra o bem.
A averbação do protesto contra a alienação de bens na matrícula do imóvel não cumpre outro propósito
senão o de dar a efetiva publicidade da manifestação de vontade do promovente, sem diminuir ou
acrescentar direitos das partes interessadas, ou tampouco constituir efetivo óbice à negociação ou à
escrituração da compra e venda.

Imagine agora a seguinte situação hipotética:


João é proprietário do bem imóvel X.
Pedro disputa esse bem com João.
Pedro realizou protesto contra a alienação desse bem e averbou o protesto na matrícula do imóvel.
Algum tempo depois, João vendeu o bem imóvel para Carlos.
O Oficial de Registro de Imóveis recusou-se a efetivar o registro da escritura de compra e venda na
matrícula do imóvel sob a alegação de que havia esse protesto contra a alienação do bem.

Agiu corretamente o Oficial de Registro?


NÃO. Isso porque o protesto contra a alienação de bens, mesmo que esteja averbado na matrícula do
imóvel, não impede a venda.

Carlos ajuizou embargos de terceiro pedindo o cancelamento do protesto contra a alienação do bem.
Carlos escolheu o caminho correto? É cabível a propositura de embargos de terceiro para desconstituir
decisão judicial que permite a averbação de protesto na matrícula de um imóvel?
NÃO.
Os embargos de terceiro são um remédio processual (uma ação judicial) utilizado para livrar o bem do
embargante de uma apreensão judicial indevida. Têm por objetivo desfazer o ato de constrição judicial
que recai sobre o bem.
Desse modo, um dos pressupostos indispensáveis dos embargos de terceiro é que tenha havido um ato
de constrição judicial que recaiu sobre o bem.

Não são cabíveis embargos de terceiro para desconstituir decisão judicial que permite a averbação de
protesto na matrícula de um imóvel.
A averbação do protesto na matrícula do imóvel não afeta a posse ou a propriedade de terceiro alheio
ao procedimento e não configura apreensão judicial. Logo, não são cabíveis embargos de terceiro contra
essa determinação.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.758.858-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/05/2020 (Info 672).

A recusa do Oficial em fazer o registro do imóvel no nome de Carlos não pode ser imputada ao protesto
na matrícula do imóvel, que é mero ato de publicidade e não afeta a posse ou a propriedade de terceiro
alheio ao procedimento. Além disso, esse protesto não configura ato judicial de apreensão do bem.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 43


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DIREITO PENAL
PRESCRIÇÃO
Acórdão que confirma ou reduz a pena interrompe a prescrição

Importante!!!
Nos termos do inciso IV do artigo 117 do Código Penal, o acórdão condenatório sempre
interrompe a prescrição, inclusive quando confirmatório da sentença de 1º grau, seja
mantendo, reduzindo ou aumentando a pena anteriormente imposta.
A prescrição é, como se sabe, o perecimento da pretensão punitiva ou da pretensão executória
pela inércia do próprio Estado.
No art. 117 do Código Penal, que deve ser interpretado de forma sistemática, todas as causas
interruptivas da prescrição demonstram, em cada inciso, que o Estado não está inerte.
Não obstante a posição de parte da doutrina, o Código Penal não faz distinção entre acórdão
condenatório inicial e acórdão condenatório confirmatório da decisão. Não há,
sistematicamente, justificativa para tratamentos díspares.
STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 1.668.298-SP, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 12/05/2020 (Info 672).
STF. Plenário. HC 176473/RR, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 27/04/2020.

O que é prescrição no direito penal?


Prescrição pode ser conceituada como sendo:
- a perda do direito do Estado de
- punir (pretensão punitiva) ou
- executar uma punição já imposta (pretensão executória),
- em razão de não ter agido (inércia) nos prazos previstos em lei.
Natureza jurídica
A prescrição é causa de extinção da punibilidade (art. 107, IV do CP).
Prazos
Os prazos de prescrição estão previstos no art. 109 do CP.
Termo inicial da prescrição da pretensão punitiva
Quando começa a correr o prazo da prescrição? Em outras palavras, a partir de quando começa o prazo
para que o Estado-acusação tente punir uma pessoa que, supostamente, cometeu um crime?
As regras e as exceções são as seguintes:

Regra geral no caso de O prazo prescricional começa a correr do dia


crimes consumados em que o crime se CONSUMOU.

Regra geral no caso de O prazo prescricional começa a correr do dia


crimes tentados em que CESSOU A ATIVIDADE CRIMINOSA.

1ª regra específica: O prazo prescricional começa a correr do dia


crimes permanentes em que CESSOU A PERMANÊNCIA.

2ª regra específica: O prazo prescricional começa a correr do dia


crime de bigamia em que O FATO SE TORNOU CONHECIDO.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 44


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3ª regra específica: O prazo prescricional começa a correr do dia


crime de falsificação ou em que O FATO SE TORNOU CONHECIDO.
alteração de assentamento do
registro civil

4ª regra específica: O prazo prescricional começa a correr do dia


crimes contra a dignidade sexual em que a vítima completar 18 (dezoito) anos,
de crianças e adolescentes salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal.

Causas que interrompem o prazo prescricional


O art. 117 do CP traz os momentos em que o prazo da prescrição é interrompido.
Interrupção do prazo significa que ele é zerado e recomeça a ser contado a partir daquela data.
Art. 117. O curso da prescrição interrompe-se:
I - pelo recebimento da denúncia ou da queixa;
II - pela pronúncia;
III - pela decisão confirmatória da pronúncia;
IV - pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis;
V - pelo início ou continuação do cumprimento da pena;
VI - pela reincidência.

Análise do inciso IV do art. 117 do CP


O inciso IV do art. 117 do CP prevê que a publicação da sentença condenatória ou do acórdão condenatório
interrompe o prazo prescricional. Esse é um inciso que gerava algumas polêmicas na doutrina e
jurisprudência, razão pela qual irei explicá-lo com mais calma.

Imagine a seguinte situação hipotética:


João praticou um furto consumado em 28/03/2010.
Foi denunciado e a denúncia recebida em 28/06/2010.
O réu foi condenado, em 1ª instância, a uma pena de 2 anos de reclusão, sentença publicada em
28/10/2011.
O Ministério Público não recorreu.
A defesa interpôs apelação e o Tribunal de Justiça manteve a sentença, confirmando a condenação,
acórdão publicado em 28/09/2013.
Contra a decisão do TJ, a defesa interpôs recurso extraordinário ao STF.
No dia 28/05/2015, a 1ª Turma do STF iniciou o julgamento do recurso.

Vamos verificar se houve prescrição no caso relatado acima.

Início do prazo prescricional


O prazo prescricional do crime cometido por João começou a correr em 28/03/2008, dia em que o crime
se consumou, nos termos do art. 111, I, do CP:
Art. 111. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr:
I - do dia em que o crime se consumou;

Como ele foi condenado a uma pena não superior a 2 anos, qual é o prazo prescricional aplicável a este fato?
O delito praticado por João prescreverá em 4 anos, nos termos do art. 109, V do CP:

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 45


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Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1º do
art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime,
verificando-se:
(...)
V - em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede a dois;

Conforme vimos acima, existem algumas hipóteses que interrompem o prazo prescricional (art. 117).
Vejamos quais delas se aplicam ao caso concreto:
• Início da contagem do prazo prescricional: dia em que o crime se consumou - 28/03/2010.
• Este prazo foi interrompido (recomeçou do zero) quando a denúncia foi recebida: 28/06/2010.
• O prazo foi novamente interrompido (recomeçou) quando a sentença condenatória foi publicada:
28/10/2011.

Confira se houve prescrição:


• Entre a data do fato e o recebimento da denúncia: 3 meses (não houve prescrição).
• Entre a data do recebimento e a publicação da sentença: 1 ano e 4 meses (não houve prescrição).
Logo, até aqui não houve prescrição.

Após a publicação da sentença condenatória, o que acontece com o prazo que já passou?
Ele será interrompido, ou seja, reiniciado. Despreza-se o período anterior (esse 1 ano e 4 meses) e inicia-
se uma nova contagem a partir desta data (28/10/2011).

No dia 28/09/2013 foi publicado um acórdão do Tribunal de Justiça confirmando a condenação, ou seja,
dizendo que a sentença deveria ser mantida, que não era caso de mudar nada. Este acórdão interrompeu
a prescrição?
SIM. Depois de muita polêmica, o STF pacificou o tema e firmou a posição de que o acórdão confirmatório
da sentença implica a interrupção da prescrição. Foi fixada a seguinte tese a respeito:
Nos termos do inciso IV do artigo 117 do Código Penal, o acórdão condenatório sempre interrompe a
prescrição, inclusive quando confirmatório da sentença de 1º grau, seja mantendo, reduzindo ou
aumentando a pena anteriormente imposta.
STF. Plenário. HC 176473/RR, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 27/04/2020.

A prescrição é o perecimento da pretensão punitiva ou da pretensão executória pela inércia do próprio Estado.
As hipóteses do art. 117 do Código Penal representam hipóteses nas quais o Estado agiu, ou seja, situações
nas quais não ficou inerte.
Se o Tribunal prolata acórdão confirmando a condenação, isso significa que o Tribunal agiu/decidiu o caso.
Consequentemente, se o Estado não está inerte, há necessidade de se interromper a prescrição para o
cumprimento do devido processo legal.
Assim, a interrupção da prescrição ocorre pela simples condenação em segundo grau, seja confirmando
integralmente a sentença, seja reduzindo ou aumentando a pena anteriormente imposta.

Posição do STJ e da doutrina majoritária era em sentido contrário


Vale ressaltar que a doutrina majoritária defende posição contrária ao que decidiu o STF.
O STJ também acompanhava esse entendimento doutrinário e dizia que:
Se o acórdão apenas CONFIRMA a condenação ou então REDUZ a pena do condenado, ele não terá o
condão de interromper a prescrição.
STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 1557791/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 06/02/2020.
STJ. Corte Especial. AgRg no RE nos EDcl no REsp 1301820/RJ, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em
16/11/2016.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 46


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O STJ, contudo, mudou de entendimento e passou a acompanhar a posição do STF:


O acórdão confirmatório da condenação é causa interruptiva da prescrição.
STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 1.668.298-SP, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 12/05/2020 (Info 672).

Portanto, o entendimento que atualmente vigora tanto no STF como no STJ é o de que: o acórdão que
confirma ou reduz a pena enquadra-se no inciso IV do art. 117 do CP e, portanto, interrompe a prescrição.

INJÚRIA
A ausência de previsibilidade de que a ofensa chegue ao conhecimento da vítima
afasta o dolo específico do delito de injúria, tornando a conduta atípica

Importante!!!
Exemplo: Rita e Adriana trabalhavam em um órgão público. Rita ligou para o ramal telefônico de
Adriana para falar sobre um requerimento de abono de faltas que ela havia solicitado. Adriana
avisou, então, que Reginaldo (chefe do setor) havia indeferido o pedido. Ao saber de tal fato, Rita
passou a proferir ofensas contra ele, afirmando para Adriana: “este macaco, preto sem vergonha
está indeferindo a minha falta”. Vale ressaltar, contudo, que, momentos antes, Reginaldo, que
estava no mesmo setor que Adriana, havia retirado o telefone do gancho para fazer uma ligação e
acabou por ouvir as palavras injuriosas proferidas por Rita. O Ministério Público ofereceu
denúncia contra Rita pela prática do crime de injúria racial (art. 140, § 3º do CP):
Art. 140 (...) § 3º Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia,
religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência: Pena - reclusão de
um a três anos e multa.
Para o STJ, não houve crime. Isso porque o delito de injúria se consuma quando a ofensa chega ao
conhecimento da vítima, sendo necessário dolo específico de ofender a honra subjetiva da vítima.
A acusada não tinha como saber que a vítima estava ouvindo o teor da conversa pela extensão
telefônica.
Como a injúria se consuma com a ofensa à honra subjetiva de alguém, não há que se falar em
dolo específico no caso em que a vítima não era seu interlocutor na conversa telefônica e,
acidentalmente, tomou conhecimento do teor da conversa.
O tipo penal em questão exige que a ofensa seja dirigida ao ofendido com a intenção de
menosprezá-lo, ofendendo-lhe a honra subjetiva.
STJ. 6ª Turma. REsp 1.765.673-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 26/05/2020 (Info 672).

Imagine a seguinte situação adaptada:


Rita e Adriana trabalhavam em uma repartição pública.
Rita ligou para o ramal telefônico de Adriana para falar sobre um requerimento de abono de faltas que ela
havia solicitado.
Adriana avisou, então, que Reginaldo (chefe do setor) havia indeferido o pedido.
Ao saber de tal fato, Rita passou a proferir ofensas contra ele, afirmando para Adriana: “este macaco,
preto sem vergonha está indeferindo a minha falta” (sic).
Vale ressaltar, contudo, que, momentos antes, Reginaldo, que estava no mesmo setor que Adriana, havia
retirado o telefone do gancho para fazer uma ligação e acabou por ouvir as palavras injuriosas proferidas
por Rita.
O Ministério Público ofereceu denúncia contra Rita pela prática do crime de injúria racial (art. 140, § 3º do CP):
Art. 140 (...)
Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 47
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§ 3º Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem
ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência:
Pena - reclusão de um a três anos e multa.

Houve crime de injúria?


NÃO. Para o STJ, não houve crime.
A ausência de previsibilidade de que a ofensa chegue ao conhecimento da vítima afasta o dolo específico
do delito de injúria, tornando a conduta atípica
STJ. 6ª Turma. REsp 1.765.673-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 26/05/2020 (Info 672).

A acusada não tinha como saber que a vítima estava ouvindo o teor da conversa pela extensão telefônica.

Consumação da injúria e elemento subjetivo especial


O delito de injúria se consuma quando a ofensa chega ao conhecimento da vítima, sendo necessário dolo
específico de ofender a honra subjetiva da vítima.
Como a injúria se consuma com a ofensa à honra subjetiva de alguém, não há que se falar em dolo
específico no caso em que a vítima não era seu interlocutor na conversa telefônica e, acidentalmente,
tomou conhecimento do teor da conversa.
O tipo penal em questão exige que a ofensa seja dirigida ao ofendido com a intenção de menosprezá-lo,
ofendendo-lhe a honra subjetiva.
Veja outro julgado semelhante a esse:
(...) No caso dos autos, verifica-se que em uma conversa particular travada via e-mail com outro membro
do Ministério Público, o paciente teria proferido ofensas contra a vítima, tendo o diálogo chegado ao
conhecimento desta em razão de um descuido do acusado, que, ao invés de responder unicamente ao
remetente, encaminhou as mensagens acidentalmente para todos os membros do Ministério Público do
Estado do Espírito Santo, o que demonstra a ausência de intenção de macular a honra do querelante, já
que em momento algum desejou dar publicidade às mensagens trocadas com seu colega.
5. Ademais, não se pode afirmar que no âmbito restrito dos e-mails trocados entre o paciente e o outro
querelado teria havido o dolo de ofender a honra de quem quer que seja, pois o conteúdo das mensagens
entre eles trocada revela, nitidamente, que estariam desabafando um com o outro, sem a intenção
específica de denegrir o suposto ofendido. (...)
STJ. 5ª Turma. HC 256.989/ES, Min. Jorge Mussi, DJe 5/2/2014.

DOD DICAS
Dois aspectos sobre o crime de injúria são muito cobrados em provas objetivas:
1) a redação do §§ 1º, 2º e 3º do art. 140:
Art. 140 (...)
§ 1º O juiz pode deixar de aplicar a pena:
I - quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria;
II - no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria.
§ 2º Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou pelo meio
empregado, se considerem aviltantes:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência.
§ 3º Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem
ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência:
Pena - reclusão de um a três anos e multa.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 48


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++ (DPE/AM 2018 FCC) Comete o crime de injúria aquele que ofende a dignidade de alguém com utilização
de elementos referentes à condição de pessoa idosa. (certo)
++ (MP/GO 2019) No crime de injúria, o juiz pode deixar de aplicar a pena quando o ofendido, de forma
reprovável, provocou diretamente a injúria; e também no caso de retorsão imediata, que consista em
outra injúria. (certo)

2) a ação penal no crime de injúria:


Regra: ação penal PRIVADA.
Exceções:
2.1) ação pública incondicionada: se da injúria real resultar lesão grave ou gravíssima (art. 145, caput).
2.2) ação pública condicionada à requisição do Ministro do Justiça: se a injúria foi praticada contra
Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro (art. 145, parágrafo único).
2.3) ação pública condicionada à representação do ofendido:
a) em caso de crime contra funcionário público no exercício de suas funções (Súmula 714 do STF).
b) se da injúria real resultar lesão leve (art. 145, caput, do CP).
c) injúria qualificada do § 3º do art. 140 (injúria com preconceito).
++ (Juiz de Direito TJ/MS 2020 FCC) Quanto aos crimes contra a honra, a ação penal é pública
incondicionada na injúria com preconceito. (errado)
++ (MP/GO 2019) O crime de injúria consistente na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia,
religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência é de ação pública
incondicionada. (errado)
++ (Juiz de Direito TJ/MS 2020 FCC) Quanto aos crimes contra a honra, possível a propositura de ação
penal privada no caso de servidor público ofendido em razão do exercício de suas funções. (certo)

++ (MP/SP 2019) Nos crimes contra a honra, a ação penal,


A) no crime contra chefe de governo estrangeiro, será pública condicionada à representação.
B) no crime contra funcionário público, em razão de suas funções, será pública condicionada à
representação.
C) no crime de injúria real, será de iniciativa privada, ainda que resulte lesão corporal.
D) no crime de injúria racial, será de iniciativa privada.
E) no crime contra Presidente de República, será pública condicionada à representação.
Letra B

ESTELIONATO
Não se admite a incidência do princípio da insignificância na prática de estelionato qualificado
por médico que, no desempenho de cargo público, registra o ponto e se retira do hospital

Importante!!!
Caso concreto: o réu foi denunciado pelo MPF pela prática de estelionato qualificado, porque,
na qualidade médico de hospital universitário federal, teria registrado seu ponto e se retirado
do local, sem cumprir sua carga horária durante quase dois anos.
A jurisprudência do STJ não tem admitido, nos casos de prática de estelionato “qualificado”, a
incidência do princípio da insignificância (princípio inspirado na fragmentariedade do Direito
Penal). Isso porque se identifica, neste caso, uma maior reprovabilidade da conduta delitiva.
No caso concreto, o STJ afirmou que não era possível o trancamento da ação penal, sob o fundamento
de inexistência de prejuízo expressivo para a vítima, considerando que, em se tratando de hospital
universitário, os pagamentos aos médicos são provenientes de verbas federais.
STJ. 5ª Turma. AgRg no HC 548.869-RS, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 12/05/2020 (Info 672).

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 49


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Imagine a seguinte situação hipotética:


João era médico de um hospital universitário federal.
Ele chegava para trabalhar na instituição, registrava seu ponto, mas em seguida se retirava do local sem
cumprir sua carga horária.
Essa conduta teria perdurado por quase dois anos, quando foi descoberta.
Diante disso, o MPF ofereceu denúncia contra João pela prática de estelionato “qualificado”*, previsto no
art. 171, § 3º c/c o art. 71 do Código Penal:
Art. 171. Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou
mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, de quinhentos mil réis a dez contos de réis.
(...)
§ 3º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de entidade de
direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência.

Art. 71. Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da
mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes,
devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só
dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto
a dois terços.

* o § 3º do art. 171 do CP, tecnicamente, não é uma hipótese de qualificadora, mas sim de causa de
aumento de pena. Logo, o melhor não seria falar em estelionato qualificado, e sim em estelionato
majorado. No entanto, no julgado constou essa denominação.

A defesa do réu pediu a sua absolvição com base no princípio da insignificância. Essa tese foi acolhida
pelo STJ?
NÃO.
Não se admite a incidência do princípio da insignificância na prática de estelionato “qualificado” por
médico que, no desempenho de cargo público, registra o ponto e se retira do hospital.
A jurisprudência do STJ não tem admitido, nos casos de prática de estelionato “qualificado”, a incidência
do princípio da insignificância (princípio inspirado na fragmentariedade do Direito Penal). Isso porque
se identifica, neste caso, uma maior reprovabilidade da conduta delitiva.
No caso concreto, o STJ afirmou que não era possível o trancamento da ação penal, sob o fundamento
de inexistência de prejuízo expressivo para a vítima, considerando que, em se tratando de hospital
universitário, os pagamentos aos médicos são provenientes de verbas federais.
STJ. 5ª Turma. AgRg no HC 548.869-RS, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 12/05/2020 (Info 672).

O Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que no delito previsto no art. 171, § 3º, do Código
Penal não se aplica o princípio da insignificância para o trancamento da ação penal, uma vez que a conduta
ofende o patrimônio público, a moral administrativa e a fé pública, bem como é altamente reprovável.
STJ. 5ª Turma. RHC 61.931/RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 15/12/2015.

Jurisprudência em Teses (ed. 84)


Tese 2: O princípio da insignificância é inaplicável ao crime de estelionato quando cometido contra a
administração pública, uma vez que a conduta ofende o patrimônio público, a moral administrativa e a fé
pública, possuindo elevado grau de reprovabilidade.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 50


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FALSIDADE IDEOLÓGICA
Na falsidade ideológica, o termo inicial da contagem do prazo da prescrição da pretensão punitiva é
o momento da consumação do delito (e não o momento da eventual reiteração de seus efeitos)

Importante!!!
A falsidade ideológica é crime formal e instantâneo, cujos efeitos podem se protrair no tempo.
A despeito dos efeitos que possam, ou não, gerar, a falsidade ideológica se consuma no
momento em que é praticada a conduta.
Diante desse contexto, o termo inicial da contagem do prazo da prescrição da pretensão
punitiva é o momento da consumação do delito (e não o da eventual reiteração de seus
efeitos).
Caso concreto: em 2010, foi incluído um sócio “laranja” no contrato social da empresa. Ele não
iria ser sócio realmente, sendo isso uma falsidade ideológica. Logo, considera-se que aí foi
praticado o crime. Não se pode afirmar que esse crime (essa conduta) teria sido reiterado
quando, por ocasião da alteração contratual ocorrida em 2019, deixou-se de regularizar o
nome do sócio verdadeiramente titular da empresa, mantendo-se o nome do “laranja”. Isso
porque não há como se entender que constitui novo crime a omissão em corrigir informação
falsa por ele inserida em documento público, quando teve oportunidade para tanto. Logo, o
termo inicial da contagem da prescrição foi 2010.
STJ. 3ª Seção. RvCr 5.233-DF, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 13/05/2020 (Info 672).

Imagine a seguinte situação hipotética:


João era sócio da sociedade empresária “Vista Bela Ltda.”.
Ocorre que João é parente do Prefeito e, como queria obter contratos fraudulentos com o Município,
decidiu simular que havia saído da sociedade a fim de não despertar suspeitas.
Assim, em 2010, foi feita uma alteração no contrato social da empresa por meio da qual João saiu
formalmente do quadro societário e, em seu lugar, entrou Paulo.
Vale ressaltar que Paulo é apenas um “laranja” de João, sendo pessoa de baixa instrução formal, que não
sabe nada sobre a empresa e nunca praticou qualquer ato como sócio. O sócio administrador, na prática,
continuou sendo João.

Qual foi o crime praticado, em tese, por João?


Falsidade ideológica, delito tipificado no art. 299 do Código Penal:
Art. 299. Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele
inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar
direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três
anos, e multa, de quinhentos mil réis a cinco contos de réis, se o documento é particular.
Parágrafo único. Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo,
ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de registro civil, aumenta-se a pena de sexta
parte.

Verifica-se o delito de falsidade ideológica quando os acusados, na elaboração de contrato social de


empresa, inserem falsamente o nome de terceira pessoa na condição de sócia, mediante a promessa de
pagamento da quantia mensal pelo “empréstimo do nome”, com o fim de alterar a verdade sobre fato
juridicamente relevante, isto é, a condição de verdadeiros sócios e proprietários da empresa.
STJ. 6ª Turma. HC 436.024/SP, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 12/06/2018.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 51


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Em que consiste a falsidade ideológica:


declaração que devia com o objetivo de
omite
constar em... documento • prejudicar direito
O agente... declaração falsa ou - público ou • criar obrigação ou
insere ou
diversa da que devia - particular • alterar a verdade sobre fato
faz inserir
ser escrita em... juridicamente relevante.

O crime de falsidade ideológica é também chamado de falso ideal, falso moral ou falso intelectual.
A falsidade ideológica é punida apenas se praticada com dolo, exigindo-se também um especial fim de agir
(elemento subjetivo específico).
Esse elemento subjetivo específico é o “fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade
sobre fato juridicamente relevante”.
Não existe falsidade ideológica culposa.

++ (DPU 2015 CESPE) Praticará o crime de falsidade ideológica aquele que, quando do preenchimento de
cadastro público, nele inserir declaração diversa da que deveria, ainda que não tenha o fim de prejudicar
direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. (errado).

Voltando ao caso concreto:


Em 2019, foi feita uma nova alteração no contrato social da “Vista Bela”, desta vez para incluir outros
objetos sociais (outras atividades que essa empresa pode desempenhar).
Não houve qualquer alteração quanto aos sócios, ou seja, Paulo continuou figurando como sócio.
A situação foi descoberta pelo Ministério Público que denunciou João pelo crime de falsidade ideológica.
Em 2020, João foi condenado a 2 anos de reclusão e argumentou que houve prescrição pela pena em
contrato considerando que o crime se consumou em 2010.
O Ministério Público não concordou e afirmou que, em 2019, o réu, ao efetuar nova alteração no quadro
societário, deixou de regularizar o nome do sócio verdadeiramente titular da empresa, mantendo o nome
do “laranja”. Logo, ao reiterar a conduta, o prazo prescricional teria se renovado, reiniciando-se em 2019.

A tese do MP foi acolhida pelo STJ?


NÃO.
Na falsidade ideológica, o termo inicial da contagem do prazo da prescrição da pretensão punitiva é o
momento da consumação do delito (e não o momento da eventual reiteração de seus efeitos).
STJ. 3ª Seção. RvCr 5.233-DF, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 13/05/2020 (Info 672).

Termo inicial da prescrição da pretensão punitiva


Quando começa a correr o prazo da prescrição? Em outras palavras, a partir de quando começa o prazo
para que o Estado-acusação tente punir uma pessoa que, supostamente, cometeu um crime?
A regra geral é a de que, no caso de crimes consumados, o prazo prescricional começa a correr do dia em
que o crime se CONSUMOU.

Quando a falsidade ideológica se consuma?


O delito de falsidade ideológica é crime formal, que se consuma com a prática de uma das figuras típicas
previstas, independente da ocorrência de qualquer resultado ou de efetivo prejuízo para terceiro (STJ. 5ª
Turma. AgRg no AREsp 1583094/SP, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 13/04/2020).
Desse modo, em nosso exemplo, o crime se consumou em 2010 quando João inseriu declaração falsa.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 52


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Consumação x produção dos efeitos


Os efeitos da falsidade podem se protrair no tempo. Em outras palavras, o crime se consuma em um dia,
mas ele continua produzindo efeitos por meses, anos ou até mesmo para sempre.
Mesmo que os efeitos da falsidade perdurem durante anos, a verdade é que o crime já se consumou no
momento em que foi praticada a conduta.
Diante desse contexto, o termo inicial da contagem do prazo da prescrição da pretensão punitiva é o
momento da consumação do delito (e não o da eventual reiteração de seus efeitos).
Não há como se entender que constitui novo crime a omissão do réu em corrigir informação falsa por ele
inserida em documento público quando teve oportunidade para tanto.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

PROVAS
O ato de delegação da condução e direção de produção de prova oral à autoridade estrangeira, a
fim de que esta proceda diretamente à inquirição da testemunha ou do investigado, não
encontra qualquer tipo de respaldo constitucional, legal ou jurisprudencial

Caso concreto: o Tribunal de Paris solicitou cooperação jurídica em matéria penal, na


modalidade auxílio direto, a fim de que fossem realizadas diversas diligências no Brasil,
dentre as quais a oitiva de investigado e busca e apreensão no seu endereço, para subsidiar
apuração criminal que ocorre na Justiça da França. O pedido da autoridade francesa foi
embasado em Acordo de Cooperação Judiciária em Matéria Penal, na Convenção das Nações
Unidas contra a Corrupção e na Convenção das Nações Unidas contra a Criminalidade
Organizada Transnacional. O pleito foi encaminhado ao Ministério da Justiça do Brasil, que o
remeteu ao Procurador-Geral da República o qual, por sua vez, designou Procurador da
República atuante no Rio de Janeiro para a execução das diligências. O Membro do Ministério
Público Federal requereu o deferimento das medidas assecuratórias ao Juízo da 9ª Vara
Federal do Rio de Janeiro, no que foi atendido.
O investigado impetrou habeas corpus sustentando a nulidade de sua oitiva porque todas as
perguntas foram formuladas direta e exclusivamente pela Autoridade Judiciária francesa que
acompanhava o Membro do Ministério Público Federal nomeado para realizar as diligências.
O STJ concordou com o pedido da defesa.
O ato de delegação da condução e direção de produção de prova oral à autoridade estrangeira,
a fim de que esta proceda diretamente à inquirição da testemunha ou do investigado, não
encontra qualquer tipo de respaldo constitucional, legal ou jurisprudencial. Trata-se de ato
eivado de nulidade absoluta, por ofensa à soberania nacional, o qual não pode produzir efeitos
dentro de investigações penais que estejam dentro das atribuições das autoridades brasileiras.
STJ. 6ª Turma. RHC 102.322-RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 12/05/2020 (Info 672).

Imagine a seguinte situação adaptada:


O Tribunal de Paris solicitou cooperação jurídica em matéria penal, na modalidade auxílio direto, a fim de
que fossem realizadas diversas diligências no Brasil, dentre as quais a oitiva de investigado e busca e
apreensão no seu endereço, para subsidiar apuração criminal que ocorre na Justiça da França.
O pedido da autoridade francesa foi embasado em Acordo de Cooperação Judiciária em Matéria Penal, na
Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção e na Convenção das Nações Unidas contra a
Criminalidade Organizada Transnacional.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 53


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O pleito foi encaminhado ao Ministério da Justiça do Brasil, que o remeteu ao Procurador-Geral da


República o qual, por sua vez, designou Procurador da República atuante no Rio de Janeiro para a execução
das diligências.
O Membro do Ministério Público Federal requereu o deferimento das medidas assecuratórias ao Juízo da
9ª Vara Federal do Rio de Janeiro, no que foi atendido.
O investigado impetrou habeas corpus sustentando:
a) a ausência de exequatur pelo STJ no pedido de cooperação jurídica internacional;
b) a nulidade de sua oitiva porque todas as perguntas foram formuladas direta e exclusivamente pela
Autoridade Judiciária francesa que acompanhava o Membro do Ministério Público Federal nomeado para
realizar as diligências.

O STJ concordou com os argumentos da defesa?


SIM.

Primeiro argumento: era necessário exequatur do STJ no caso concreto?


SIM.
Conforme já explicado, o pleito foi encaminhado ao Ministério da Justiça do Brasil, que o remeteu ao PGR,
o qual, por sua vez, designou Procurador da República para a execução das diligências.
O membro do MPF requereu o deferimento das medidas assecuratórias ao Juízo da Vara Federal do Rio
de Janeiro, no que foi atendido. As diligências foram cumpridas.
No entendimento do MPF, o pedido da França não consistia em carta rogatória, enquadrando-se como
mero pedido de auxílio direto (que não precisa de exequatur).
O STJ, contudo, discordou e entendeu que era sim necessário exequatur, considerando que existente
decisão judicial estrangeira a ser submetida ao crivo daquele Tribunal, nos termos do art. 105, I, “i”, da
CF/88:
Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:
(...)
i) a homologação de sentenças estrangeiras e a concessão de exequatur às cartas rogatórias;

A carta rogatória e o auxílio direto, apesar de conviverem no ordenamento jurídico como sistemas de
cooperação internacional em matéria penal, são institutos com ritos e procedimentos diversos,
principalmente, em razão das normas aplicáveis e da origem da decisão que ensejou o pedido estrangeiro.
Na carta rogatória passiva, há decisão judicial oriunda da justiça rogante que precisa ser executada e
cumprida no Estado rogado, cabendo ao STJ o juízo de delibação, sem, contudo, adentrar-se no mérito da
decisão oriunda do país estrangeiro.
No auxílio direto passivo, há um pedido de assistência do Estado alienígena diretamente ao Estado rogado,
para que este preste as informações solicitadas ou provoque a Justiça Federal para julgar a providência
requerida (medida acautelatórias), conforme o caso concreto.
Tudo isso baseado em Acordo ou Tratado Internacional de cooperação.

• carta rogatória passiva: decisão judicial estrangeira precisa ser executada e cumprida no Brasil. Precisa
de exequatur do STJ.
• auxílio direto passivo: o Estado estrangeira está solicitando apenas informações ou pedindo que a Justiça
Federal decrete alguma medida acautelatória. Não precisa de exequatur.

No caso concreto, o Promotor da República de Paris denunciou e solicitou investigação, e o juiz de


instrução julgou necessárias as providências “para a manifestação da verdade”.
O juízo estrangeiro, ao deferir a produção da prova requerida pelo Ministério Público, emitiu
pronunciamento jurisdicional. Isso significa dizer que houve um juízo de valor realizado pelo Juízo
alienígena sobre a necessidade e adequação da colheita de prova.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 54


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Assim, a decisão judicial estrangeira deve ser submetida ao juízo delibatório do STJ, assegurando-se às
partes as garantias do devido processo legal, sem, contudo, adentrar-se no mérito da decisão proveniente
do país rogante.
É importante frisar que não se trata de mero ato judicial formal de encaminhamento de pedido de
cooperação, mas de ato com caráter decisório proferido pelo poder judiciário francês no exercício típico
da função jurisdicional.
Portanto, a concessão do exequatur era imprescindível na hipótese, pois, existente decisão judicial
estrangeira a ser submetida ao crivo do STJ, o caso concreto amolda-se à definição de carta rogatória,
devendo, portanto, haver a anulação dos procedimentos já realizados.
Não respeitada a competência adequada para o processamento da cooperação internacional em território
nacional, nos termos do art. 105, inciso I, alínea “i”, da Constituição da República, impõe-se a anulação do
feito desde o seu início.

Segundo argumento
Pela análise da gravação de vídeo da mencionada audiência é capaz de comprovar a veracidade da
alegação da defesa de que as autoridades estrangeiras dirigiram e conduziram, por cerca de cinco horas
seguidas, o ato de produção de prova oral. A autoridade brasileira apenas deu início ao ato e passou a
palavra para a autoridade estrangeira que formulou todas as perguntas.
Assim, o membro do Ministério Público Federal, ao qual foi confiada a realização do mencionado ato,
desobedeceu ordem expressa da Procuradoria Geral da República, a qual fez constar a exigência de que a
autoridade brasileira não apenas estivesse presente durante todo ato, como também o dirigisse.
A presença da autoridade estrangeira é permitida no ato, mas desde que não interfira, direta ou
indiretamente, na direção da audiência. Essa, com efeito, é a melhor interpretação a ser dada aos
dispositivos do Acordo de Cooperação Judiciária em Matéria Penal entre o Brasil e a França (Decreto nº
3.324/1999), os quais demonstram nítida preocupação com os limites dos atos de cooperação ali
previstos, a bem da preservação da soberania dos Estados requerente e requerido.
Em outras palavras, o ato de delegação, expressa ou tácita, da condução e direção de produção de prova
oral à autoridade estrangeira, a fim de que esta proceda diretamente à inquirição da testemunha ou do
investigado, não encontra qualquer tipo de respaldo constitucional, legal ou jurisprudencial.

Conclusões
Diante disso, o STJ reconheceu que, no caso concreto:
a) houve decisão judicial estrangeira que deveria ter sido submetida ao juízo delibatório do STJ,
assegurando-se às Partes as garantias do devido processo legal, sem, contudo, adentrar-se no mérito da
decisão proveniente do País rogante; e
b) deve-se reconhecer a nulidade da oitiva do investigado, porque todas as perguntas foram formuladas
direta e exclusivamente pela autoridade judiciária francesa que acompanhava o membro do Ministério
Público Federal nomeado para realizar as diligências.

Em suma:
O ato de delegação da condução e direção de produção de prova oral à autoridade estrangeira, a fim de
que esta proceda diretamente à inquirição da testemunha ou do investigado, não encontra qualquer
tipo de respaldo constitucional, legal ou jurisprudencial.
Trata-se de ato eivado de nulidade absoluta, por ofensa à soberania nacional, o qual não pode produzir
efeitos dentro de investigações penais que estejam dentro das atribuições das autoridades brasileiras.
STJ. 6ª Turma. RHC 102.322-RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 12/05/2020 (Info 672).

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 55


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DIREITO TRIBUTÁRIO

IMPOSTO DE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS


Havendo mero deslocamento para outro estabelecimento ou para outra localidade,
permanecendo o produto sob o domínio do contribuinte, não haverá incidência do IPI

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O art. 46, II, do CTN prevê o seguinte:
Art. 46. O imposto, de competência da União, sobre produtos industrializados tem como fato
gerador:
II - a sua saída dos estabelecimentos a que se refere o parágrafo único do artigo 51;
A saída do estabelecimento a que refere o art. 46, II, do CTN, que caracteriza o aspecto
temporal da hipótese de incidência, pressupõe, logicamente, a mudança de titularidade do
produto industrializado.
Havendo mero deslocamento para outro estabelecimento ou para outra localidade,
permanecendo o produto sob o domínio do contribuinte, não haverá incidência do IPI.
STJ. 1ª Turma. REsp 1.402.138-RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 12/05/2020 (Info 672).

IPI
IPI é a sigla para Imposto sobre Produtos Industrializados.
Trata-se de um tributo federal e que incide sobre a produção e a circulação de produtos industrializados.
O IPI foi instituído por meio da Lei nº 4.502/64.

Fato gerador do IPI


Segundo o art. 46 do CTN, o IPI possui três fatos geradores:
I - o desembaraço aduaneiro do produto industrializado, quando de procedência estrangeira;
II - a saída do produto industrializado do estabelecimento industrial ou equiparado a industrial;
III - a arrematação do produto industrializado, quando apreendido ou abandonado e levado a leilão.

Imagine agora a seguinte situação adaptada:


Dinacon é uma empresa que realiza serviços de detonação ou desmonte. Ex: demolição de uma casa antiga
com a utilização de explosivos.
A Dinacon foi contratada por uma outra empresa para fazer o serviço de detonação de rochas em um
terreno no qual seria construído um prédio no futuro.
Em razão disso, a Dinacon levou os explosivos que ela fabricou para o terreno a fim de utilizá-los no serviço
de detonação das rochas.
A Receita Federal cobrou IPI alegando que a saída dos explosivos do estabelecimento da indústria se
enquadra na hipótese de incidência do art. 46, II, do CTN:
Art. 46. O imposto, de competência da União, sobre produtos industrializados tem como fato
gerador:
(...)
II - a sua saída dos estabelecimentos a que se refere o parágrafo único do artigo 51;

Agiu corretamente a Receita Federal?


NÃO.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 56


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Não incide IPI sobre o deslocamento físico de produto industrializado (explosivos) para prestação de
serviços pelo próprio contribuinte, qual seja, a detonação ou desmonte de rochas.
O aspecto material da hipótese de incidência do IPI é “industrializar produto e celebrar operação jurídica
que promova a transferência de sua propriedade ou posse” (PAULSEN, Leandro. Constituição e Código
Tributário comentados à luz da doutrina e da jurisprudência. 18ª ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 837).
Assim, o aspecto material do IPI abrange dois momentos distintos e necessários:
a) a industrialização;
b) a transferência de propriedade ou posse do produto industrializado, que deve ser onerosa.

A saída do estabelecimento a que refere o art. 46, II, do CTN, que caracteriza o aspecto temporal da
hipótese de incidência, pressupõe, logicamente, a mudança de titularidade do produto industrializado. Se
houver mero deslocamento para outro estabelecimento ou para outra localidade, permanecendo o
produto sob o domínio do contribuinte, não haverá incidência do IPI.

Mero deslocamento do bem não é fato gerador de IPI


Se não houver mudança de titularidade onerosa do produto industrializado, o IPI não incide.
Assim, o mero deslocamento de bens, sem transferência de titularidade e riqueza, apresenta-se
indiferente à hipótese de incidência do IPI.
A empresa em questão promove a detonação ou desmonte de rochas e, para tanto, industrializa seus
próprios explosivos, utilizando-os na prestação dos serviços. A empresa não promove a venda desses
artefatos separadamente, quer dizer, não transfere a propriedade ou posse do produto que industrializa.
A “saída” do estabelecimento ocorreu como mero deslocamento até o local onde será empregado na sua
atividade fim.
Os explosivos de fabricação própria podem ser caracterizados, assim, como insumos que serão utilizados
na prestação dos serviços executados, havendo simples saída física (e não jurídica), do estabelecimento
da empresa.
A parte contratante pagou pelo serviço que a Dinacon presta como um todo. Não se verifica o pagamento
diferenciado em relação aos detonadores empregados na obrigação de fazer. Não há fornecimento desses
explosivos de forma separada, para que o tomador do serviço o utilize.
Nesse contexto, não há que se falar em incidência de IPI, considerando que não houve a transferência de
propriedade ou posse de forma onerosa, um dos pressupostos necessários para a caracterização da
hipótese de incidência do tributo.

Em suma:
Havendo mero deslocamento para outro estabelecimento ou para outra localidade, permanecendo o
produto sob o domínio do contribuinte, não haverá incidência do IPI.
STJ. 1ª Turma. REsp 1.402.138-RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 12/05/2020 (Info 672).

Súmula 166 do STJ


Aplica-se para o tema acima, o mesmo raciocínio utilizado pelo STJ para a edição da Súmula 166:
Súmula 166-STJ: Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para
outro estabelecimento do mesmo contribuinte.

DOD REVISÃO
Veja esse tema correlato que já estudamos juntos:
A “Souza Cruz”, indústria de tabaco, produziu 2 mil cigarros e os vendeu para o distribuidor “BB”.
O caminhão saiu da fábrica levando os cigarros que seriam entregues na distribuidora.
Ocorre que o veículo foi abordado por assaltantes armados que roubaram toda a carga.
Apesar disso, a Receita Federal fez o lançamento tributário cobrando o IPI referente aos 2 mil cigarros
produzidos.
Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 57
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A empresa ingressou, então, com ação ordinária pedindo a anulação do lançamento e,


consequentemente, do crédito tributário ao argumento de que não houve o fato gerador.

O pedido da indústria é acolhido pela jurisprudência do STJ?


SIM.
Na hipótese em que ocorrer roubo/furto da mercadoria após a sua saída do estabelecimento do fabricante
não se configura o evento ensejador de incidência do IPI.
Não deve incidir IPI sobre a venda de produtos, na hipótese de roubo ou furto da mercadoria, antes da
entrega ao comprador. Isso porque, neste caso, como não foi concluída a operação mercantil, não ficou
configurado o fato gerador.
STJ. 1ª Seção. EREsp 734.403-RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 14/11/2018 (Info 638).

PIS E COFINS
Aproveitamento de créditos de PIS e Cofins e sistema monofásico

O benefício fiscal consistente em permitir a manutenção de créditos de PIS e Cofins, ainda que
as vendas e revendas realizadas pela empresa não tenham sido oneradas pela incidência
dessas contribuições no sistema monofásico, é extensível às pessoas jurídicas não vinculadas
ao REPORTO.
STJ. 1ª Turma. REsp 1.861.190-RS, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 26/05/2020 (Info 672).

NÃO CUMULATIVIDADE DO PIS/PASES E COFINS


Princípio da não cumulatividade
O princípio da não cumulatividade é um princípio de tributação por meio do qual se pretende evitar a
chamada “tributação em cascata”, que onera as sucessivas operações e prestações com bens e serviços
sujeitos a determinado tributo (PGE/MT 2016 FCC).
Para você entender melhor, veja o caso do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).
O IPI é um imposto não cumulativo (art. 153, § 3º, II, da CF/88), o que significa que é possível compensar o
que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores, ou seja, o valor pago na operação
imediatamente anterior pode ser abatido do mesmo imposto em operação posterior (art. 49 do CTN).
“A cada aquisição tributada de insumo, o adquirente registra como crédito o valor do tributo incidente na
operação. Tal valor é um ‘direito’ do contribuinte, consistente na possibilidade de recuperar o valor
incidente nas operações subsequentes (é o ‘IPI a recuperar’).
A cada alienação tributada de produto, o alienante registra como débito o valor do tributo incidente na
operação. Tal valor é uma obrigação do contribuinte, consistente no dever de recolher o valor devido aos
cofres públicos federais ou compensá-los com os créditos obtidos nas operações anteriores (trata-se do
‘IPI a recolher’).
Periodicamente, faz-se uma comparação entre os débitos e créditos. Caso os débitos sejam superiores aos
créditos, o contribuinte deve recolher a diferença aos cofres públicos. Caso os créditos sejam maiores, a
diferença pode ser compensada posteriormente ou mesmo, cumpridos determinados requisitos, ser objeto
de ressarcimento.” (ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário. Salvador: Juspodivm, 2019, p. 681-682).

Exemplo de aplicação do princípio da não cumulatividade:


Imaginemos uma indústria que fabrica computadores. Ela precisa comprar os insumos que são utilizados
na fabricação dos seus bens. Exs: precisa adquirir os plásticos que são utilizados no computador, comprar
os metais que são empregados nos dispositivos eletrônicos etc.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 58


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Quando essa indústria compra cada um desses insumos, ela paga um preço para o fornecedor. Ocorre que
esse fornecedor pagou um valor de IPI e embutiu no preço o valor deste IPI.
Ex: suponhamos que a indústria pagou R$ 100 mil para o fornecedor do plástico; imagine que de R$ 100
mil, R$ 10 mil é referente ao IPI, ou seja, essa quantia é custo de IPI que o fornecedor repassou para a
indústria. Vamos agora imaginar que a indústria vendeu os computadores e, por essa venda, foi
cobrada R$ 500 mil de IPI. Como a indústria já pagou R$ 10 mil na aquisição dos insumos, vai utilizar esse
crédito para descontar do valor do IPI e assim só irá pagar R$ 490 mil de IPI pelas vendas. Isso é a
não cumulatividade.

Tributos sujeitos ao regime não cumulativo


A redação originária da CF/88 previu a sistemática da não cumulatividade apenas para dois impostos: o IPI
(art. 153, § 3º, II) e o ICMS (art. 155, § 2º, I), ambos submetidos a regime plurifásico.
No entanto, a EC 42/2003 acrescentou o § 12 ao art. 195 da Constituição autorizando que a lei previsse o
regime da não cumulatividade também para o PIS/PASEP e para a Cofins. Veja:
Art. 195 (...)
§ 12. A lei definirá os setores de atividade econômica para os quais as contribuições incidentes na
forma dos incisos I, b; e IV do caput, serão não-cumulativas.

Constitucionalizou-se, desse modo, a regra da não cumulatividade, tradicionalmente restrita ao IPI e ao


ICMS, para a Cofins e o PIS/PASEP (contribuições voltadas ao financiamento da seguridade social).
Vale ressaltar, no entanto, que existem diferenças significativas entre os regimes.
A não cumulatividade do ICMS e do IPI é obrigatória e baseada no texto constitucional. Já a não
cumulatividade da Cofins e do PIS/PASEP não é obrigatória e depende de previsão em lei, que irá definir
as regras aplicáveis.

Entrada de insumos isentos, sujeitos à alíquota zero ou não tributáveis: não há direito a crédito
presumido
Quando a operação anterior é isenta, em regra, não existe direito de crédito em favor do adquirente. Isso
porque, segundo a técnica da não cumulatividade, prevista no art. 153, § 3º, II, da CF/88, somente é
possível creditar o imposto que foi cobrado na operação anterior:
Art. 153. (...)
§ 3º O imposto previsto no inciso IV (obs: IPI):
(...)
II – será não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação com o montante
cobrado nas anteriores;

Se não foi cobrado imposto (por ser isento, sujeito à alíquota zero ou não tributável), não é possível
creditamento do IPI.

Exemplo:
Morlan S/A é uma indústria que comprou insumos da empresa Tecno S/A.
A adquirente pediu para ter direito ao crédito de IPI relativo a essa compra.
Ocorre que os insumos que a Morlan comprou da empresa Tecno são isentos do pagamento de IPI.
Diante disso, a Receita Federal afirmou que a Morlan não teria direito a creditamento. Isso porque se a
operação é isenta, ela não gera crédito de IPI. Assim, não houve imposto efetivamente cobrado.
A posição da Receita Federal está em harmonia com o entendimento do STF cristalizado na SV 58:
Súmula vinculante 58: Inexiste direito a crédito presumido de IPI relativamente à entrada de insumos
isentos, sujeitos à alíquota zero ou não tributáveis, o que não contraria o princípio da não cumulatividade.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 59


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Essa mesma regra existe para o ICMS:


Art. 155 (...)
§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
(...)
II - a isenção ou não-incidência, salvo determinação em contrário da legislação:
a) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações
seguintes;

Por que existe essa regra?


Em relação ao IPI e ao ICMS, a regra da não cumulatividade tem por objetivo evitar a chamada tributação
em cascata, ou seja, a incidência de imposto sobre imposto, no caso de tributos multifásicos, assim
entendidos aqueles exigíveis em operações sucessivas.
O princípio da não-cumulatividade é alicerçado no direito que o contribuinte possui à compensação. Isso
significa que o valor a ser pago na operação posterior sofre a diminuição do que foi pago anteriormente.
Assim, se nada de IPI foi pago na entrada do produto, nada há a ser compensado na operação seguinte.
Logo, o aproveitamento dos créditos do IPI não se caracteriza quando a matéria-prima utilizada na
fabricação de produtos tributados reste desonerada, sejam os insumos isentos, sujeitos à alíquota zero ou
não tributáveis. Isso porque a compensação com o montante devido na operação subsequente pressupõe,
necessariamente, a existência de crédito gerado na operação anterior, o que não ocorre nas hipóteses
exoneratórias.

No caso do PIS/PASEP e da COFINS existe alguma regra constitucional semelhante ao que preveem o
art. 153, § 3º, II e o art. 155, § 2º, I, da CF/88 (que vimos acima)?
NÃO. O único dispositivo constitucional que trata sobre a não cumulatividade do PIS/PASEP e da COFINS
é o art. 195, § 12 e ele não proíbe a manutenção de créditos de PIS e COFINS, ainda que as vendas e
revendas realizadas pela empresa não tenham sido oneradas pela incidência dessas contribuições.

REGIME MONOFÁSICO DA CONTRIBUIÇÃO AO PIS E DA COFINS


Regime de incidência monofásica é uma técnica de tributação segundo a qual haverá a incidência única
do tributo, com alíquota mais gravosa, desonerando-se as demais fases da cadeia produtiva.
Na monofasia, o contribuinte é único e o tributo recolhido, ainda que as operações subsequentes não se
consumem, não será devolvido.
Ex: em vez de cobrar PIS/Pasep e Cofins da indústria, do intermediário e do comerciante, o legislador
estipula apenas uma cobrança (na fase inicial), com uma alíquota alta. Assim, a indústria paga e repassará
o “custo econômico” disso para o intermediário que, por sua vez, repassará para o comerciante e este
para o consumidor.
Essa é uma tendência que vem sendo adotada pelo legislador tributário para setores econômicos
geradores de expressiva arrecadação, com o objetivo de trazer mais simplicidade e eficiência para a
arrecadação, combatendo a evasão fiscal.
A CF/88 autoriza que o legislador adote essa técnica para o PIS/PASEP e a Cofins. Veja o que diz o § 4º do
art. 149 da CF/88:
Art. 149 (...)
§ 4º A lei definirá as hipóteses em que as contribuições incidirão uma única vez.

Direito de creditamento de PIS e COFINS


A legislação autoriza que, ao pagar o PIS e a COFINS, a pessoa jurídica possa “descontar” alguns créditos
que ela vai adquirindo nas hipóteses previstas no art. 3º da Lei nº 10.637/2002 e art. 3º da Lei nº
10.833/2003.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 60


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Assim, essa leis regem a não cumulatividade do PIS/Pasep e da COFINS e expressamente definem as
situações nas quais é possível o creditamento. Veja:

Lei nº 10.637/2002 (PIS/PASEP):


Art. 3º Do valor apurado na forma do art. 2º (valor da contribuição para o PIS/PASEP) a pessoa
jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a:
I – bens adquiridos para revenda, exceto em relação às mercadorias e aos produtos referidos:
a) no inciso III do § 3º do art. 1º desta Lei; e
b) nos §§ 1º e 1º-A do art. 2º desta Lei;
II – bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação
de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes, exceto em relação
ao pagamento de que trata o art. 2º da Lei nº 10.485, de 3 de julho de 2002, devido pelo fabricante
ou importador, ao concessionário, pela intermediação ou entrega dos veículos classificados nas
posições 87.03 e 87.04 da TIPI;
(...)

Lei nº 10.833/2003 (COFINS):


Art. 3º Do valor apurado na forma do art. 2º (valor da COFINS) a pessoa jurídica poderá descontar
créditos calculados em relação a:
I - bens adquiridos para revenda, exceto em relação às mercadorias e aos produtos referidos:
a) no inciso III do § 3º do art. 1º desta Lei; e
b) nos §§ 1º e 1º-A do art. 2º desta Lei;
II - bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de
bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes, exceto em relação ao
pagamento de que trata o art. 2º da Lei nº 10.485, de 3 de julho de 2002, devido pelo fabricante ou
importador, ao concessionário, pela intermediação ou entrega dos veículos classificados nas
posições 87.03 e 87.04 da Tipi;
(...)

Essas leis, por sua vez, preveem situações nas quais não haverá direito ao creditamento:
Lei nº 10.637/2002 (PIS/PASEP):
Art. 3º (...)
§ 2º Não dará direito a crédito o valor:
(...)
II - da aquisição de bens ou serviços não sujeitos ao pagamento da contribuição, inclusive no caso
de isenção, esse último quando revendidos ou utilizados como insumo em produtos ou serviços
sujeitos à alíquota 0 (zero), isentos ou não alcançados pela contribuição.

Lei nº 10.833/2003 (COFINS):


Art. 3º (...)
§ 2º Não dará direito a crédito o valor:
(...)
II - da aquisição de bens ou serviços não sujeitos ao pagamento da contribuição, inclusive no caso
de isenção, esse último quando revendidos ou utilizados como insumo em produtos ou serviços
sujeitos à alíquota 0 (zero), isentos ou não alcançados pela contribuição.

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 61


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REPORTO
A Lei nº 11.033/2004 instituiu o Regime Tributário para Incentivo à Modernização e à Ampliação da
Estrutura Portuária (REPORTO), estabeleceu diversos benefícios fiscais. Um deles foi a suspensão do
PIS/Pasep e da Cofins:
Art. 14. Serão efetuadas com suspensão do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI, da
Contribuição para o PIS/Pasep, da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social -
COFINS e, quando for o caso, do Imposto de Importação - II, as vendas e as importações de
máquinas, equipamentos, peças de reposição e outros bens, no mercado interno, quando
adquiridos ou importados diretamente pelos beneficiários do Reporto e destinados ao seu ativo
imobilizado para utilização exclusiva na execução de serviços de:
I - carga, descarga, armazenagem e movimentação de mercadorias e produtos;
II - sistemas suplementares de apoio operacional;
III - proteção ambiental;
IV - sistemas de segurança e de monitoramento de fluxo de pessoas, mercadorias, produtos,
veículos e embarcações;
V - dragagens; e
VI - treinamento e formação de trabalhadores, inclusive na implantação de Centros de
Treinamento Profissional.
(...)
§ 2º A suspensão da contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS converte-se em operação,
inclusive de importação, sujeita a alíquota 0 (zero) após o decurso do prazo de 5 (cinco) anos,
contado da data da ocorrência do respectivo fato gerador.

O art. 17, por sua vez, assegura a manutenção dos créditos existentes de contribuição ao PIS/Pasep e da
COFINS, ainda que a revenda não seja tributada:
Art. 17. As vendas efetuadas com suspensão, isenção, alíquota 0 (zero) ou não incidência da
Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS não impedem a manutenção, pelo vendedor, dos
créditos vinculados a essas operações.

Desse modo, permite-se àquele que efetivamente adquiriu créditos dentro da sistemática da não
cumulatividade não seja obrigado a estorná-los ao efetuar vendas submetidas à suspensão, isenção,
alíquota zero ou não incidência da contribuição ao PIS/Pasep e da Cofins.
Em outras palavras, o art. 17 deixa clara a possibilidade de o contribuinte utilizar créditos da contribuição
ao PIS/Pasep e da COFINS no caso de venda efetuada no regime monofásico, pois garante a manutenção
desses créditos pelo vendedor na hipótese de venda de produtos com incidência monofásica.
Esse art. 17 não se aplica apenas às operações realizadas com beneficiários do regime do REPORTO. Isso
porque o dispositivo não traz expressa essa limitação, além de não vincular as vendas de que trata às
efetuadas na forma do art. 14 da mesma lei.
Assim, o art. 17 da Lei nº 11.0133/2004 aplica-se também para situações fora do regime de REPORTO,
podendo, em tese, alcançar qualquer contribuinte:
O art. 17 da Lei nº 11.033/2004 não é de aplicação exclusiva ao Regime Tributário para Incentivo à
Modernização e à Ampliação da Estrutura Portuária - REPORTO.
STJ. 2ª Turma. REsp 1.267.003/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 17/09/2013.

O benefício fiscal consistente em permitir a manutenção de créditos de PIS e Cofins, ainda que as vendas
e revendas realizadas pela empresa não tenham sido oneradas pela incidência dessas contribuições no
sistema monofásico, é extensível às pessoas jurídicas não vinculadas ao REPORTO.
STJ. 1ª Turma. REsp 1.861.190-RS, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 26/05/2020 (Info 672).

Informativo 672-STJ (19/06/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 62


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Como conciliar a conclusão do STJ acima exposta com a redação do art. 3º, § 2º, II, da Lei nº 10.637/2002
e do art. 3º, § 2º, II, da Lei nº 10.833/2003 que, como vimos, proíbem a manutenção do crédito nesses
casos?
O STJ entendeu que o art. 3º, § 2º, II, da Lei nº 10.637/2002 e o art. 3º, § 2º, II, da Lei nº 10.833/2003
foram revogados tacitamente pelo art. 17 da Lei nº 11.033/2004 considerando que este dispositivo é
posterior e regulou inteiramente a matéria.
Assim, a vedação legal que existia para a utilização de créditos na tributação monofásica foi afastada pelo
art. 17 da Lei nº 11.033/2004, que expressamente autoriza o crédito de contribuição ao PIS e da COFINS.

EXERCÍCIOS

Julgue os itens a seguir:


1) Na exposição pornográfica não consentida, o fato de o rosto da vítima não estar evidenciado de maneira
flagrante é irrelevante para a configuração dos danos morais. ( )
2) A notificação premonitória não é pressuposto processual para a ação de despejo por denúncia vazia de
contrato de locação por prazo indeterminado. ( )
3) Os vícios estruturais de construção estão cobertos pelo seguro habitacional obrigatório vinculado ao
crédito imobiliário concedido pelo Sistema Financeiro da Habitação - SFH, ainda que só se revelem depois
da extinção do contrato. ( )
4) (Juiz Federal TRF3 2018) As normas do Código de Defesa do Consumidor são aplicáveis a todos os
contratos relacionados ao Sistema Financeiro da Habitação, independentemente da data de sua
celebração. ( )
5) (Juiz Federal TRF3 2018) O mutuário do Sistema Financeiro da Habitação não pode ser compelido a
contratar seguro habitacional obrigatório com a instituição financeira mutuante ou com a seguradora
por ela indicada. ( )
6) (Promotor de Justiça MPCE 2020 CEBRASPE) Com relação a bem imóvel urbano vinculado ao Sistema
Financeiro de Habitação (SFH) e registrado em nome de banco estatal que possua personalidade jurídica
de direito privado e atue como agente financeiro na implementação de política nacional de habitação, a
jurisprudência do STJ estabelece que esse bem não pode ser adquirido por usucapião, em razão do
caráter público dos serviços prestados pelo banco estatal na implementação da política nacional de
habitação. ( )
7) É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do
compromisso de compra e venda, ainda que desprovido de registro, de imóvel adquirido na planta que
se encontra em fase de construção. ( )
8) A averbação do desmembramento de imóvel urbano não é condição indispensável para a procedência
da ação de adjudicação compulsória. ( )
9) (Promotor MP/MS 2018) Considera-se loteamento urbano a subdivisão de gleba em lotes destinados à
edificação, com aproveitamento do sistema viário existente, desde que não implique na abertura de
novas vias e logradouros públicos, nem no prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes;
enquanto se considera desmembramento urbano a subdivisão da gleba em lotes destinados à edificação,
com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou
ampliação das vias existentes. ( )
10) (PGM Fortaleza 2017 CEBRASPE) No âmbito do parcelamento do solo urbano, desmembramento
corresponde à subdivisão de gleba em lotes destinados à edificação, com abertura de novas vias de
circulação e criação de logradouros públicos. ( )
11) (PGM Goiânia UFG) O parcelamento do solo urbano poderá ser feito mediante loteamento ou
desmembramento, considerando-se este a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com

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abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou


ampliação das vias existentes. ( )
12) (PGM São Luís 2016 FCC) Sobre o parcelamento do solo urbano, é correto afirmar que são tipos de
parcelamento o loteamento, o remembramento, o desdobro e o desmembramento. ( )
13) Incidem juros e correção monetária sobre o valor econômico de cotas sociais objeto de partilha em
divórcio sendo que, após a separação de fato do casal, essa empresa ficou sob a administração exclusiva
de um dos ex-cônjuges até o encerramento de suas atividades. ( )
14) A averbação de sentença proferida em ação negatória de filiação não consubstancia, em si, um direito
subjetivo autônomo das partes litigantes, tampouco se confunde com o direito personalíssimo ali
discutido. ( )
15) (Juiz TJ/PA 2019 CEBRASPE) De acordo com o Código Civil, devem ser averbados em registro público
I - os casamentos, as sentenças que declararem sua nulidade e as sentenças que decretarem o divórcio.
II - os atos judiciais que declararem ou reconhecerem filiação.
III - os atos extrajudiciais que declararem ou reconhecerem filiação.
IV - as emancipações por sentença do juiz.
Estão certos apenas os itens
A) I e II.
B) I e IV.
C) II e III.
D) I, III e IV.
E) II, III e IV.

16) (Juiz TJRS 2016 FAUGRS) O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o coerdeiro,
não pode ser objeto de cessão por escritura pública. ( )
17) A cessão de direitos hereditários sobre bem singular viabiliza a transmissão da posse, que pode ser objeto
de tutela específica na via dos embargos de terceiro. ( )
18) Na hipótese de responsabilidade civil de médicos pela morte de paciente em atendimento custeado pelo
SUS incidirá o prazo do art. 1º-C da Lei nº 9.494/97, segundo o qual prescreverá em cinco anos a
pretensão de obter indenização. ( )
19) Na letra de câmbio não aceita não há obrigação cambial que vincule o sacado e assim, o sacador somente
tem ação extracambial contra o sacado não aceitante, cujo prazo prescricional não sofre as interferências
do protesto do título de crédito. ( )
20) O ajuizamento de execução fiscal em momento anterior à decretação da quebra do devedor não enseja
o reconhecimento da ausência de interesse processual do ente federado para pleitear a habilitação do
crédito correspondente no processo de falência. ( )
21) (Juiz TJ/MT 2018 VUNESP) A cobrança judicial do crédito tributário não é sujeita a concurso de credores
ou habilitação em falência, recuperação judicial, concordata, inventário ou arrolamento. ( )
22) Nos casos em que há aditamento ao plano de recuperação judicial, o termo inicial do prazo bienal de que
trata o art. 61, caput, da Lei nº 11.101/2005 deve ser a data da concessão da recuperação judicial. ( )
23) (Juiz TJAM 2016 CESPE) Considerando que determinado juiz tenha concedido a recuperação judicial a um
devedor, após a aprovação do plano de recuperação em assembleia geral de credores, se, decorridos
mais de dois anos da referida decisão judicial, o devedor inadimplir obrigação prevista no plano, o juiz
deverá convolar a recuperação em falência. ( )
24) Se a internação for aplicada sem termo, o cálculo do prazo prescricional deverá levar em consideração a
duração máxima da internação (3 anos). ( )
25) (Promotor MP/MS 2015) De acordo com o entendimento do STJ, a prescrição penal é aplicável nas
medidas socioeducativas previstas no ECA. ( )
26) É válida a extinção de medida socioeducativa de internação quando o juízo da execução, ante a
superveniência de processo-crime após a maioridade penal, entende que não restam objetivos
pedagógicos em sua execução. ( )

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27) (MP/GO 2012) No caso de o maior de 18 anos, em cumprimento de medida socioeducativa responder a
processo crime, caberá à autoridade judiciária decidir sobre eventual extinção da execução, cientificando
da decisão o juízo criminal competente. ( )
28) (MP/SC 2016) As hipóteses de extinção da medida socioeducativa vieram bem definidas na Lei n.
12.594/12. Será automática a extinção do cumprimento de medida socioeducativa em relação ao
imputável que vier a responder a processo crime, frente à notória ausência de interesse em se prosseguir
no correspondente processo de educação e integração sociofamiliar. ( )
29) (DPE/GO 2018) A Lei n. 12.594/2012 (Lei Sinase) institui o sistema nacional de atendimento
socioeducativo e regulamenta a execução das medidas socioeducativas destinadas a adolescentes que
pratiquem ato infracional e estabelece que o juiz da infância e juventude, examinando caso de maior de
18 anos, em cumprimento de medida socioeducativa e respondendo a processo crime, será obrigado a
extinguir a execução, cientificando da decisão o juízo criminal competente. ( )
30) Se houve a extinção da execução fiscal a pedido do exequente, mas o crédito tributário permanece sendo
discutido judicialmente em outra demanda, os honorários advocatícios devem ser arbitrados por
apreciação equitativa. ( )
31) Nos casos em que o acolhimento da pretensão não tenha correlação com o valor da causa ou não se
observe proveito econômico com a extinção sem resolução do mérito da execução fiscal, os honorários
de sucumbência devem ser arbitrados por apreciação equitativa, com observância dos critérios dos §§
2º e 8º do art. 85 do CPC/2015. ( )
32) São impenhoráveis os valores oriundos de empréstimo consignado. ( )
33) Não são cabíveis embargos de terceiro para desconstituir decisão judicial que permite a averbação de
protesto na matrícula de um imóvel. ( )
34) Acórdão que confirma ou reduz a pena não interrompe a prescrição. ( )
35) A ausência de previsibilidade de que a ofensa chegue ao conhecimento da vítima afasta o dolo específico
do delito de injúria, tornando a conduta atípica. ( )
36) (DPE/AM 2018 FCC) Comete o crime de injúria aquele que ofende a dignidade de alguém com utilização
de elementos referentes à condição de pessoa idosa. ( )
37) (MP/GO 2019) No crime de injúria, o juiz pode deixar de aplicar a pena quando o ofendido, de forma
reprovável, provocou diretamente a injúria; e também no caso de retorsão imediata, que consista em
outra injúria. ( )
38) (Juiz de Direito TJ/MS 2020 FCC) Quanto aos crimes contra a honra, a ação penal é pública incondicionada
na injúria com preconceito. ( )
39) (MP/GO 2019) O crime de injúria consistente na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia,
religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência é de ação pública
incondicionada. ( )
40) (Juiz de Direito TJ/MS 2020 FCC) Quanto aos crimes contra a honra, possível a propositura de ação penal
privada no caso de servidor público ofendido em razão do exercício de suas funções. ( )
41) (MP/SP 2019) Nos crimes contra a honra, a ação penal,
A) no crime contra chefe de governo estrangeiro, será pública condicionada à representação.
B) no crime contra funcionário público, em razão de suas funções, será pública condicionada à
representação.
C) no crime de injúria real, será de iniciativa privada, ainda que resulte lesão corporal.
D) no crime de injúria racial, será de iniciativa privada.
E) no crime contra Presidente de República, será pública condicionada à representação.

42) Não se admite a incidência do princípio da insignificância na prática de estelionato qualificado por médico
que, no desempenho de cargo público, registra o ponto e se retira do hospital. ( )
43) O princípio da insignificância é inaplicável ao crime de estelionato quando cometido contra a
administração pública, uma vez que a conduta ofende o patrimônio público, a moral administrativa e a
fé pública, possuindo elevado grau de reprovabilidade. ( )

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44) Na falsidade ideológica, o termo inicial da contagem do prazo da prescrição da pretensão punitiva é o
momento da consumação do delito (e não o momento da eventual reiteração de seus efeitos). ( )
45) (DPU 2015 CESPE) Praticará o crime de falsidade ideológica aquele que, quando do preenchimento de
cadastro público, nele inserir declaração diversa da que deveria, ainda que não tenha o fim de prejudicar
direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. ( )
46) Verifica-se o delito de falsidade ideológica quando os acusados, na elaboração de contrato social de
empresa, inserem falsamente o nome de terceira pessoa na condição de sócia, mediante a promessa de
pagamento da quantia mensal pelo “empréstimo do nome”, com o fim de alterar a verdade sobre fato
juridicamente relevante, isto é, a condição de verdadeiros sócios e proprietários da empresa. ( )
47) O ato de delegação da condução e direção de produção de prova oral à autoridade estrangeira, a fim de
que esta proceda diretamente à inquirição da testemunha ou do investigado, não encontra qualquer tipo
de respaldo constitucional, legal ou jurisprudencial. ( )
48) Havendo mero deslocamento para outro estabelecimento ou para outra localidade, permanecendo o
produto sob o domínio do contribuinte, não haverá incidência do IPI. ( )

Gabarito
1. C 2. E 3. C 4. E 5. C 6. C 7. C 8. E 9. E 10. E
11. E 12. E 13. C 14. C 15. Letra C 16. E 17. C 18. C 19. C 20. C
21. C 22. C 23. E 24. C 25. C 26. C 27. C 28. E 29. E 30. C
31. C 32. E 33. C 34. E 35. C 36. C 37. C 38. E 39. E 40. C
41. Letra B 42. C 43. C 44. C 45. E 46. C 47. C 48. C

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