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ESTADO DE PERIGO

O estado de perigo ocorre quando um negociante, pessoa de sua família ou amigo próximo se
encontra em situação de perigo conhecido pela outra parte, sendo esta a única razão para a
celebração do negócio jurídico (NJ). O negociante, temeroso de grave dano ou prejuízo, acaba
realizando o NJ mediante prestação exorbitante, resultando em onerosidade excessiva (elemento
objetivo). Para que esse vício esteja presente, é necessário que a outra parte tenha conhecimento da
situação de risco que afeta o primeiro (elemento subjetivo).

ELEMENTOS DO ESTADO DE PERIGO

1. Situação de necessidade, decorrente da iminência de dano atual e grave;


2. Nexo de causalidade entre a declaração e o perigo de grave dano;
3. Pessoa ameaçada de dano, que pode ser o próprio declarante, pessoa de sua família ou amigo;
4. Conhecimento do perigo pela parte beneficiária; e
5. Obrigação excessivamente onerosa.

CONSEQUÊNCIA DO ESTADO DE PERIGO

O negócio jurídico é anulável (art. 171, II). A anulação não será decretada se for oferecido suplemento
suficiente ou se a parte favorecida concordar com a redução do proveito (aplicação analógica do art.
157, §2º - enunciado 148, da III Jornada de Direito Civil).

LESÃO

A lesão ocorre quando há prejuízo decorrente da desproporção entre as prestações de um negócio


jurídico, devido ao abuso da inexperiência ou da necessidade de uma das partes. Ela se manifesta
quando uma pessoa, sob premente necessidade ou inexperiência, se obriga a uma prestação
manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta (art. 157).

ESPÉCIES DE LESÃO

1. Enorme ou propriamente dita: caracterizada pelo excesso nas vantagens e desvantagens, tratando-
se de defeito exclusivamente objetivo.
2. Usurária ou usura real (Lei de Economia Popular): caracterizada não apenas pelo critério objetivo,
mas também por elementos subjetivos como estado de necessidade, inexperiência e dolo de
aproveitamento.
3. Lesão Especial: falta de qualificação específica, contemplada no artigo 157 do CC.
4. Lesão Consumerista: tipificada no CDC, caracterizada apenas pelo elemento objetivo, dispensando
a investigação subjetiva.

ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DA LESÃO

1. Ordem objetiva, caracterizada pela manifesta desproporção entre as prestações estabelecidas no


NJ;
2. Índole subjetiva, caracterizada pela inexperiência ou premente necessidade do lesado no momento
da contratação, levando a outra parte a um lucro exagerado, dispensando o chamado dolo de
aproveitamento.

CONSEQUÊNCIA DA LESÃO

O negócio jurídico é anulável (art. 171, II). Não será decretada a anulação se for oferecido suplemento
suficiente ou se a parte favorecida concordar com a redução do proveito. Não deve ser confundida
com a teoria da imprevisão, pois nesta o NJ nasce válido, mas tem seu equilíbrio rompido pela
superveniência de circunstâncias imprevisíveis pelas partes.

PARTE II – DEFEITO SOCIAL OU VÍCIOS SOCIAIS


Os vícios sociais prejudicam uma pessoa estranha ao negócio, mas que possui interesse nos seus
efeitos. A fraude contra credores e a simulação são exemplos de vícios sociais, sendo condenados por
sua repercussão social e por serem atentatórios à boa-fé e à socialidade.

FRAUDE CONTRA CREDORES

A fraude contra credores ocorre quando um devedor age maliciosamente, em estado de insolvência
ou iminência de tornar-se insolvente, dispondo de seus bens para afastar a possibilidade de
responder por obrigações assumidas anteriormente. Isso prejudica os credores, pois diminui o
patrimônio disponível para garantir o pagamento de débitos.

ESPÉCIES DE FRAUDE CONTRA CREDORES

1. Transmissão gratuita de bens ou remissão de dívida (art. 158): destinada aos credores
quirografários e aos cuja garantia se tornar insuficiente, exigindo transmissão gratuita de bens ou
remissão de dívida, eventus damni, e anterioridade do crédito.
2. Alienatio rei: consiste na alienação de um bem, envolvendo alienação do bem por um preço vil e a
consciência do adquirente da fraude.
3. Alcance da lei falimentar: caracteriza-se pela realização de negócios fraudulentos após a decretação
da falência, com o intuito de prejudicar credores quirografários e subtrair bens da massa falida.

Esses vícios sociais são rechaçados pelo ordenamento jurídico por sua violação à boa-fé e aos
princípios sociais.

ESPÉCIES: CONTRATOS ONEROSOS QUE REDUZAM O DEVEDOR À INSOLVÊNCIA (ART. 159)

Ocorre quando, em qualquer outro contrato oneroso, o devedor é reduzido à insolvência. Além dos
requisitos eventus damni e anterioridade do crédito, é necessária a presença de:

1. Consilium fraudis: O devedor deve ter ciência de que se torna insolvente com o NJ, visando fraudar
a expectativa de garantia do credor. Caracteriza-se pela má-fé e intuito fraudulento (elemento
subjetivo). Este conhecimento é presumido, cabendo ao devedor provar que não tinha ciência de que
a venda o conduziria à insolvência.

2. Scientia fraudis: A insolvência deve ser notória ou haver motivo para que o outro contratante
(comprador) dela tenha conhecimento. Não se exige que o comprador tenha manifesta intenção de
fraudar o credor (consilium fraudis), apenas conhecimento do estado de insolvência (scientia fraudis).
Esse requisito protege a boa-fé do terceiro/adquirente que desconhecia a situação de insolvência do
devedor/alienante.

HIPÓTESES EM QUE SE PRESUME O ÂNIMO FRAUDULENTO

1. Na transmissão gratuita de bens (CC, 158, caput);


2. Na remissão (perdão) de dívidas (CC, 158, caput);
3. Na celebração de contratos onerosos do devedor com terceiros, em casos nos quais a insolvência
seja notória, pública (CC, 159);
4. Na antecipação de pagamento (CC, 162);
5. No pagamento de dívida ainda não vencida, por colocar alguns dos devedores em posição
desfavorável, quebrando a igualdade (CC, 162); e
6. Na outorga de direitos preferenciais a um dos credores (CC, 163).

AÇÃO PAULIANA OU REVOCATÓRIA

É o remédio pelo qual os credores anulam ou impugnam os atos fraudulentos de seu devedor. Essa
ação afasta o enriquecimento sem causa das partes envolvidas com a fraude, repondo o bem alienado
no acervo do devedor para futura satisfação da dívida anterior.
Em face de terceiros, a ação somente poderá ser proposta e surtirá efeitos se comprovada a má-fé.
Não sendo o caso, os terceiros estão protegidos.

NATUREZA JURÍDICA DA AÇÃO PAULIANA

A ação pauliana tem natureza desconstitutiva do negócio jurídico. Se julgada procedente, anula-se o
negócio fraudulento lesivo aos credores, determinando o retorno do bem ao patrimônio do devedor.

LEGITIMIDADE ATIVA

1. Credores quirografários (CC, 158): decorre do fato de não possuírem garantia especial do
recebimento de seus créditos.
2. Credores que já o eram ao tempo da alienação fraudulenta (CC, 158, §2º): os que se tornaram
credores depois da alienação não podem reclamar.

LEGITIMIDADE PASSIVA

1. O devedor insolvente;
2. O adquirente que com ele celebrou a estipulação considerada fraudulenta; e
3. Os terceiros adquirentes que hajam procedido de má-fé, se o bem alienado pelo devedor já houver
sido transmitido a outrem.

FRAUDE NÃO ULTIMADA

Quando o NJ é aperfeiçoado, mas o cumprimento é diferido para data futura, permite-se ao


adquirente evitar a propositura da ação pauliana ou extingui-la mediante depósito em juízo,
solicitando a citação por edital de todos os interessados (CC, 160, parágrafo único). Há a possibilidade
de suplemento do preço pelo adquirente para evitar a anulação do NJ e conservar os bens.

CARACTERÍSTICAS DA SIMULAÇÃO

A simulação é, em regra, um negócio jurídico bilateral, sendo os contratos o seu campo natural.
Resulta do acordo entre duas partes para lesar terceiros ou fraudar a lei. Sempre é acordada com a
outra parte ou com as pessoas a quem se destina. É uma declaração deliberadamente desconforme
com a intenção real, sendo apresentada sob aparência irreal ou fictícia, realizada com o intuito de
enganar terceiros ou fraudar a lei.

HIPÓTESES EXEMPLIFICATIVAS EM QUE OCORRE A SIMULAÇÃO

a) De negócios jurídicos que visam conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais
realmente se conferem ou transmitem (simulação subjetiva);

b) De negócios jurídicos que contêm declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira
(simulação objetiva); e

c) De negócios jurídicos cujos instrumentos particulares são antedatados ou pós-datados (simulação


objetiva).

CLASSIFICAÇÃO

1) Simulação absoluta:Nessa situação, na aparência, tem-se determinado negócio jurídico, mas, na


essência, a parte não deseja negócio algum. Diz-se absoluta porque a declaração de vontade não
produz resultado, ou seja, deveria ela produzir um, mas essa não é a intenção do agente. Geralmente,
essa modalidade destina-se a prejudicar terceiro, subtraindo os bens do devedor à execução ou
partilha.
2) Simulação relativa: Nesse caso, o negociante celebra um negócio jurídico na aparência, mas, na
essência, almeja outro ato jurídico.

-Subclassificação da Simulação Relativa:


- 2.1) Relativa Subjetiva (CC, 167, §1º, I): Nessa situação, o vício social afeta o elemento subjetivo
do negócio jurídico, a pessoa com que o mesmo é celebrado. A parte celebra o negócio jurídico com
uma pessoa na aparência, mas com outra na essência, envolvendo muitas vezes a figura do "testa de
ferro" ou "laranja", que substitui somente de fato aquela pessoa que realmente celebra o negócio
jurídico. Trata-se do negócio jurídico celebrado por interposta pessoa.
- 2.2) Relativa Objetiva: Nesse caso, o vício social afeta o elemento objetivo do negócio jurídico
celebrado, o seu conteúdo. Celebra-se um negócio jurídico, mas na realidade há outra figura
obrigacional, sendo mascarados os seus elementos verdadeiros.

EFEITOS DA SIMULAÇÃO

O Código Civil considera a simulação como causa de nulidade. Desse modo, a simulação acarreta a
nulidade do negócio simulado. No entanto, em caso de simulação relativa, o negócio simulado poderá
subsistir se for válido na substância e na forma.

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