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Teoria Geral do Direito Civil

Washington Luiz Junior


9 - Defeitos dos Negócios Jurídicos
• 9.1 - Erro
• 9.2 - Dolo
• 9.3 - Coação
• 9.4 - Fraude contra credores. Ação
revocatória.
• 9.5 - Lesão
• 9.6 - Estado de Perigo
Defeitos dos negócios jurídicos
• A declaração de vontade é elemento essencial do
negócio jurídico;
• Para que este seja válido é necessário que a
vontade tenha sido emanada em condições
normais;
• Só assim o negócio jurídico praticado produz os
efeitos jurídicos queridos pelas partes.
• Ex.: concordância de venda de um bem sob
efeito de hipnose;
• O defeito ou vício na manifestação de vontade
exclui a consciência e a vontade e mesmo se a
vontade existir, mas não corresponder aquela
que o agente quer exteriorizar, não se entende
o ato válido em sua plenitude
Nota:
• Ausência de vontade: ato nulo;

• Defeito ou vício na vontade: ato anulável;


Erro ou ignorância
• É a noção inexata, não verdadeira sobre alguma
coisa, objeto ou pessoa, que influencia a
formação de vontade.
• É a falsa noção sobre algo;
• Obs.: o CCB equiparou quanto aos efeitos o erro
à ignorância, porém ERRO é a falsa noção da
realidade, enquanto IGNORÂNCIA é a ausência
de conhecimento – completo desconhecimento
das realidade;
• O erro só vicia o ato se influir na vontade do
declarante, se este emite a sua vontade de
modo diverso do que manifestaria se tivesse
conhecimento exato ou completo.
• Ou seja: só o erro essencial torna o ato
anulável;
• Erro essencial é o erro substancial, de razão
plausível, relevante, aquele em que qualquer
pessoa de razoável inteligência incorreria;
Há erro essencial quando:
• Recair sobre a natureza do negócio:
• O agente pensa estar realizando um ato mas
pratica outro;
• Ex.: doa um bem pensando que o está
vendendo;
Há erro essencial quando:
• Atingir o objeto principal do negócio:
• O objeto não é o pretendido pelo agente:
• Ex. pensa estar adquirindo o quadro de um
pintor famoso quando na verdade é da autoria
de outro pintor; terrenos próximo ao mar;
Há erro essencial quando:
• Incidir sobre as qualidades essenciais do
objeto:
• Pensa adquirir um objeto com determinadas
qualidades porém este não as detém;
• Ex.: pulseira de ouro que na verdade trata-se
de bijouteria;
Há erro essencial quando:
• Recair sobre as qualidades essenciais ou
identidade de pessoa:
• Ex.: pensa casar-se com uma pessoa e na
verdade esta casando com outra;
Há erro essencial quando:
• Incidir sobre um erro de direito:
• O agente concretiza um negócio
desconhecendo que a lei proíbe.
• Ex.: aquisição de mercadoria importada sem o
conhecimento de que a importação de tal
mercadoria é proibida.
• Obs.: não se confunde com o descumprimento
da norma e sim do desconhecimento do fato.
CCB
• Art. 139. O erro é substancial quando:

• I - interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da


declaração, ou a alguma das qualidades a ele essenciais;

• II - concerne à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a


quem se refira a declaração de vontade, desde que tenha
influído nesta de modo relevante;

• III - sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da


lei, for o motivo único ou principal do negócio jurídico.
Erro acidental
• Ocorre quando incide sobre qualidades
secundárias ou acessórias do objeto ou
pessoa;
• Não acarreta a anulação, eis que via de regra
não acarreta prejuízo;
• Ex.: compra de um carro azul escuro quando
este apesar de ser escuro não tem a cor azul
literalmente, apenas aproximando-se;
Erro escusável (desculpável)
• É o erro justificável, desculpável; exatamente o
contrário do erro grosseiro ou inescusável, de erro
decorrente do não emprego da diligência ordinária;
• Ao considerar anulável o erro: “que poderia ser
percebido por pessoa de diligência normal, em face
das circunstâncias do negócio.” o código explicitou a
necessidade de que o erro seja escusável, adotando
um padrão abstrato do homem médio (homo
medius) para a aferição da escusabilidade.
CCB
• Art. 138. São anuláveis os negócios jurídicos,
quando as declarações de vontade emanarem
de erro substancial que poderia ser percebido
por pessoa de diligência normal, em face das
circunstâncias do negócio.
• Ou seja:
• Somente uma razão relevante e plausível, que
decorra prejuízo, dá azo a anulação, e que
possa ser auferida pelo homem médio em seu
entendimento e percepção.
Declaração de vontade emitida por
intermediário
• Quando a declaração de vontade é emitida por
intermediário ou por meio de comunicação, e a
transmissão da vontade ocorre de forma errada,
havendo divergência entre o que foi pretendido e o
que foi transmitido, tal vício é equiparado ao erro,
ensejando anulação do negócio jurídico;

• Art. 141. A transmissão errônea da vontade por


meios interpostos é anulável nos mesmos casos em
que o é a declaração direta.
Dolo
• “É o emprego de um artifício ou expediente
ardiloso para induzir alguém a prática de um
ato e aproveita o autor do dolo ou a terceiro.”
(Clóvis Bevilaqua);
• Trata-se de erro intencionalmente provocado
na vítima pelo autor do dolo que de outra
maneira não teria praticado o ato;
CCB
• Art. 145. São os negócios jurídicos anuláveis
por dolo, quando este for a sua causa.
• A diferença entre erro e dolo é que o erro
deriva de um equivoco do próprio agente; no
dolo este equivoco é induzido;
intencionalmente provocado; sendo passível
de anulação;

• Em suma: artifício empregado para enganar


alguém.
Para que o dolo constitua vício de consentimento, é preciso que,
assim como o erro, ele seja essencial, e possua os seguintes
elementos:

a. Intenção de induzir a pessoa a praticar o ato


jurídico – de prejudicar a pessoa, de obter
vantagem, a qual não existiria se houvesse o
dolo;
b. Uso de artifícios ou expedientes graves –
relevantes, importantes, que incidam na
manifestação de vontade;
c. Situação em que estes artifícios sejam a causa
da realização do negócio jurídico;
Dolo acidental
• Art. 146. O dolo acidental só obriga à
satisfação das perdas e danos, e é acidental
quando, a seu despeito, o negócio seria
realizado, embora por outro modo.
• “Dolo Acidental. Caracterização. Venda de
trator cujo ano de fabricação não correspondia
ao informado e cobrado pelo revendedor.
Reparação de danos causados aos adquirentes
que se impõe.” (RT, 785/243).
Outro exemplo:
• Imóvel que o vendedor faz acreditar ao
comprador valer R$ 100.000,00 quando na
verdade vale R$ 80.000,00.
• Não invalida o negócio que de qualquer forma
seria efetuado, porém se pode pedir a
reparação do prejuízo experimentado
referente a diferença entre o preço pago e o
valor real do bem.
Dolo recíproco – torpeza bilateral
• Ocorre quando ambas as partes agem como
dolo; nenhuma delas pode alegar o dolo da
outra para anular o ato, nem reclamar
indenização;

• Art. 150. Se ambas as partes procederem com


dolo, nenhuma pode alegá-lo para anular o
negócio, ou reclamar indenização.
COAÇÃO
• É a pressão física ou moral exercida sobre a
pessoa para obrigá-la a efetivar um negócio
jurídico;
Coação física
• Constrangimento corporal que retira toda a
capacidade do querer, implicando em
ausência total de consentimento;
• Este tipo de coação acarreta a NULIDADE (ou
inexistência) do ato;
• Ex.: assinatura de um contrato com uma arma
de fogo apontada par a sua cabeça, pronta
para o disparo;
Coação moral
• A violência moral atua sobre a vontade da vítima, sem
impedir o consentimento, sendo certo que neste caso
a vítima goza de relativa (aind que pequena por vezes)
liberdade de escolha, podendo optar pela realização
do negócio jurídico ou o dano que lhe é imposto;
• Realizar o negócio ou suportar as consequências;
também chamada de coação psicológica;
• Acarreta a anulabilidade do ato;
• Ex.: assinar o documento ou ver uma pessoa querida
ser assassinada;
A coação deve ser:
• Atual ou iminente – deve se referir a dano
presente, não há que se falar em danos
passados ou futuros;
• Justo receio de dano – medo de sofrer um
prejuízo à pessoa, seus bens ou a pessoas da
família;
Obs
• Não pode ser considerada coação o simples
temor reverencial (medo de repreensão dos
pais), superior hierárquico ou qualquer outra
pessoa a quem se deva obediência;
CCB
• Art. 151. A coação, para viciar a declaração da vontade, há de ser tal que incuta ao paciente fundado
temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens.

• Parágrafo único. Se disser respeito a pessoa não pertencente à família do paciente, o juiz, com base nas
circunstâncias, decidirá se houve coação.

• Art. 152. No apreciar a coação, ter-se-ão em conta o sexo, a idade, a condição, a saúde, o temperamento
do paciente e todas as demais circunstâncias que possam influir na gravidade dela.

• Art. 153. Não se considera coação a ameaça do exercício normal de um direito, nem o simples temor
reverencial.

• Art. 154. Vicia o negócio jurídico a coação exercida por terceiro, se dela tivesse ou devesse ter
conhecimento a parte a que aproveite, e esta responderá solidariamente com aquele por perdas e danos.

• Art. 155. Subsistirá o negócio jurídico, se a coação decorrer de terceiro, sem que a parte a que aproveite
dela tivesse ou devesse ter conhecimento; mas o autor da coação responderá por todas as perdas e danos
que houver causado ao coacto.
ESTADO DE PERIGO
• Este vício foi introduzido de forma inédita no código
vigente, não possuindo correspondente na legislação
revogada;
• Ocorre quando alguém assume obrigação excessivamente
onerosa, em virtude de realidade sua ou de alguém da
família, ou ainda por equiparação, a pessoa que não possua
vínculo de parentesco mas que possua vínculo de afinidade
e afeição, quando o juiz decidirá de acordo como caso
concreto e suas circunstâncias.
• Ex.: pessoa que, prestes a afogar-se, desesperada, promete
toda a sua fortuna para ser salva.
CCB
• Art. 156. Configura-se o estado de perigo
quando alguém, premido da necessidade de
salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave
dano conhecido pela outra parte, assume
obrigação excessivamente onerosa.
• Parágrafo único. Tratando-se de pessoa não
pertencente à família do declarante, o juiz
decidirá segundo as circunstâncias.
LESÃO
• Configura-se quando alguém, em relação a outrem, assume uma prestação
manifestamente desproporcional à contraprestação de outra parte por
necessidade ou inexperiência.

• Art. 157. Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade,
ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente
desproporcional ao valor da prestação oposta.

• § 1º Aprecia-se a desproporção das prestações segundo os valores vigentes


ao tempo em que foi celebrado o negócio jurídico.

• § 2º Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento


suficiente, ou se a parte favorecida concordar com a redução do proveito.
Onerosidade excessiva e desequilíbrio
negocial
• Segundo Maria Helena Diniz:
• “prejuízo que uma das partes sofre na
conclusão de um negócio, oriundo da
desproporção existente entre as prestações
dos contraentes, sendo que a outra, abusando
da premente necessidade ou inexperiência
daquela, obtém lucro exorbitante ou
desproporcional ao proveito resultante da
prestação.”
Seção IV
Da Resolução por Onerosidade Excessiva
• Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a
prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com
extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos
extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do
contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da
citação.

• Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a


modificar eqüitativamente as condições do contrato.

• Art. 480. Se no contrato as obrigações couberem a apenas uma das


partes, poderá ela pleitear que a sua prestação seja reduzida, ou
alterado o modo de executá-la, a fim de evitar a onerosidade excessiva.
Elementos
• Objetivo: prestação desproporcional que causa
desequilíbrio entre as partes contratantes – uma
obtém vantagens excessivas, e a outra, prejuízos
exagerados;

• Subjetivo: configurado pelas expressões


“inexperiência” ou “premente necessidade”. É
preciso que esta situação anteceda a formação do
vínculo contratual. Se for superveniente não será
causa de anulação.
Obs.
• Diferentemente dos outros casos de vício, não
se exige malícia ou conhecimento da parte
para a anulação; basta que estejam
caracterizados os elementos anteriormente
citados;
Obs. 2.
• Para que seja afastada como causa de
anulação a parte favorecida poderá propor
suplementação ou concordar em reduzir o
proveito.
• Ex.: comprador que abre mão de parte de
terreno comprado sob as condições de lesão
para não ver o mesmo questionado;
Diferenças entre lesão e estado de perigo

• Na lesão há desproporção das prestações causada


por estado de necessidade econômica da parte,
conhecida da outra parte contraente;

• No estado de perigo, há o temor de grave dano


moral ou material à pessoa ou parente seu, o que
obriga que o contraente realize o negócio,
assumindo prestações excessivamente onerosa.
Diferenças entre lesão e estado de perigo

• Na lesão o cumprimento do negócio deve-se á


necessidade econômica;

• No estado de perigo a efetivação do negócio


se dá em virtude do temor do dano;
Fraude contra credores
• É a prática maliciosa, pelo devedor de atos
que desfalquem o seu patrimônio, com o
escopo de livrá-lo da execução por dívidas e
do pagamento dos direito dos credores.
• Ex.: venda de terreno dado em garantia de
dívida; doação de bem dado em garantia;
Elementos da fraude
1. Objetivo – a realização do ato em si; a
alienação da coisa dada em garantia ou do
patrimônio existente na época do
endividamento;
2. Subjetivo – a intenção de fraudar, a má fé; a
intenção de prejudicar;
CCB
• Art. 158. Os negócios de transmissão gratuita de bens ou
remissão de dívida, se os praticar o devedor já insolvente, ou
por eles reduzido à insolvência, ainda quando o ignore,
poderão ser anulados pelos credores quirografários, como
lesivos dos seus direitos.

• § 1º Igual direito assiste aos credores cuja garantia se tornar


insuficiente.

• § 2º Só os credores que já o eram ao tempo daqueles atos


podem pleitear a anulação deles.
O art. 158 CCB prevê alguns atos em que a insolvência é presumida,
possibilitando aos credores a anulação do negócio praticado pelo devedor:

a. Atos de transmissão gratuita de bens (doação);


b. Atos de remissão (perdão) de dívidas;
c. Contratos onerosos (contrato de compra e venda de um bem a um
parente, venda por preço vil, venda de todos os bens);
d. Pagamento antecipado de dívidas (se um credor é pago antecipadamente,
em detrimento dos demais, presume-se que há fraude, pois há uma
ordem de preferência para pagamento. Nesse caso o credor fica obrigado
a repor aquilo que recebeu. Se a dívida já estava vencida não há anulação.
e. Outorga de direitos preferenciais (hipoteca, penhor ou anticrese)a
credores quirografários, pois há uma afronta a ordem de preferência dos
credores e estes se encontram em último lugar. Se lhes é concedido um
direito preferencial, este ficará em posição mais vantajosa. Anula-se tão
somente a preferência, não perdendo a condição de credor do insolvente.
Obs.
• Não são considerados fraudulentos os atos
praticados pelo devedor para a manutenção
do estabelecimento, sua subsistência e o da
sua família.
Obs. 2.
• Os atos fraudulentos são anuláveis por via da ação
revocatória ou pauliana;
• Estão legitimados os credores quirografários que o eram
na época da insolvência;
• É proposta em face do credor e dos beneficiários dos
atos fraudulentos;
• Anulado o ato, a vantagem resultante vai para o acervo
de bens para que se efetue o concurso de credores. Esta
regra tem bastante aplicação no instituto da falência que
é uma faculdade reservada aos empresários.
Simulação
• Ao contrário do ordenamento anterior,
simulação é hoje causa para anulação do
negócio jurídico, ou seja, torna o ato nulo;
• Há um desacordo entre a vontade
intencionada e a declarada, no sentido de
criar um fato que não existe ou de ocultar um
que realmente exista;
CCB
• Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido
for na substância e na forma.

• § 1º Haverá simulação nos negócios jurídicos quando:


• Nota: Ver dispositivo equivalente do antigo Código Civil - Lei nº 3.071, de 1916.

• I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais


realmente se conferem, ou transmitem;

• II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira;

• III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.

• § 2º Ressalvam-se os direitos de terceiros de boa-fé em face dos contraentes do negócio


jurídico simulado.
Características
• Em regra, configura uma declaração bilateral de
vontade, originando-se de um conluio entre as partes;
• É sempre ajustada com outra parte: em geral, o que
verdadeiramente caracteriza a simulação e o conluio
de duas pessoas prontas para ludibriar uma terceira;
• A manifestação de vontade das partes não representa
a verdadeira intenção, declarando outra, fictícia e
irreal;
• Tem por objetivo prejudicar terceiro;
Exs.:
• Marido que na eminência de separação
judicial, vende (simuladamente) seus bens ou
forja dívidas, para não ter que partilhar
judicialmente coma esposa;
Simulação e dissimulação:
• Na primeira, apresenta-se o que não existe;

• Na segunda, se omite o que é verdadeiro;

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