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FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

Universidade Estadual de Maringá


Artes Visuais – 4º ANO Sala K
Soraya Ayumi Tory – RA104247
13/04/20

Publicado pela primeira vez em 1996, o livro Pedagogia da Autonomia é a


última obra publicada em vida pelo famoso educador brasileiro Paulo Freire. Como
proposto pelo título escolhido pelo autor, o livro se debruça a pensar, entre outras
coisas a questão da formação de uma autonomia para os educandos através das
práticas de ensino e aprendizagem. A obra é estruturada em Prefácio, Primeiras
Palavras e mais três capítulos: Não há docência sem discência, Ensinar não é
transferir conhecimento e Ensinar é uma especificidade humana. Os capítulos são
subdivididos em tópicos e cada tópico se inicia com a frase “ensinar exige [...]”,
dando o tom do principal assunto e problemática trazida por Freire: a questão da
educação, da pedagogia e das dinâmicas do ensino.
Mas não é qualquer educação àquela proposta por Freire, o autor é altamente
progressista e faz a defasa de uma educação crítica e para a liberdade do indivíduo,
intelectualmente e socialmente. Nesse sentido um dos primeiros assuntos criticados
pelo autor é acerca da educação que ele nomeia como “bancária”. Partindo de uma
oposição a ideias neoliberais de mundo e de ensino, contra uma educação
exclusivamente para o mercado e para a formação de mão de obra, Freire defende a
importância da ética e do pensamento crítico nas práticas dos professores.
Tal reflexão crítica deve, sobretudo, ser ancorada em uma dinâmica dialética
entre teoria e prática em que seja sempre lembrado que ensinar não é transferir
conhecimento, como colocado por uma educação bancária. Os saberes são
formados dialeticamente entre professor e estudante e os alunos não são cascas
vazias esperando para serem preenchidas pelo conhecimento supremo e total de
um professor.
Em oposição a essa rigidez acrítica e de saberes memorizados e
desassociados da vida dos estudantes colocada pela educação bancária, Freire
defende uma educação pautada pela manutenção da curiosidade para com o
mundo, em favor da criticidade e humildade para com os saberes e também para
com os processos constantes de construção, desconstrução e reconstrução dos
conhecimentos, necessários para uma dialética do pensamento, que para o autor
configura um pensar certo, diferente de um pensar errado, que configuraria apenas a
memorização de dados e informações.
Freire defende também uma educação guiada pela ética e pela estética, há
de se ter boniteza nos processos de ensino-aprendizagem. Os conhecimentos
precisam perpassar pela vida para que façam sentido, é necessária uma dialética
entre teoria e prática tanto para as práticas de ensino dos professores quanto para
as experiências de aprendizagem dos alunos, isto é, há de se valorizar também, e
essencialmente, os contextos e saberes de vida dos estudantes, proporcionando
condições para que tais saberes se entrelacem dialeticamente com outros
conteúdos.
Paulo Freire reforça que ensinar não é transferir conhecimento e que tal
premissa exige do professor uma postura curiosa, à espreita daquilo que é relevante
para seus alunos, uma postura crítica acerca daquilo que é trazido por eles e uma
postura humilde e corajosa, diante da constatação de que não há simplismos para o
conhecimento e que o inacabamento está mais próximo da condição humana do que
seu contrário.
Ensinar exige consciência do inacabamento, da existência enquanto ser
social e histórico e do condicionamento gerado por tais condições. No entanto, ser
condicionado não é ser determinado e nesse sentido o indivíduo não é um objeto da
história e sim seu sujeito ativo. Nessas condições é então possível pensar
possibilidades de mudança e conduzir atuações transformadoras no mundo, como
colocado pelo autor

A invenção da existência envolve, repita-se, necessariamente, a linguagem, a


cultura, a comunicação em níveis mais profundos e complexos do que o que
ocorria e ocorre no domínio da vida, a “espiritualização” do mundo, a
possibilidade de embelezar como de enfear o mundo e tudo isso inscreveria
mulheres e homens como seres éticos. Capazes de intervir no mundo, de
comparar, de ajuizar, de decidir, de romper, de escolher, capazes de grandes
ações, de dignificantes testemunhos, mas capazes também de impensáveis
exemplos de baixeza e de indignidade. Só os seres que se tornaram éticos
podem romper com a ética (FREIRE, 1996, p. 22).

Seguindo, Freire pontua que ensinar exige bom senso, sendo esse um
exercício fundamental da docência e que deve ter como referência a ética e o
respeito à autonomia do estudante, pilar do ensino-aprendizagem. O ato de ensinar
deve respeito à dignidade, à curiosidade, à linguagem e aos gostos dos estudantes,
sendo ilegítimo ao ensino-aprendizagem autoritarismos ou mesmo
descompromissos para com esse processo.
O autor então comenta que a luta por direitos dos professores é um direito e
um dever irrecusável à profissão, sendo um dever ético integrado à prática docente
crítica e progressista em favor da autonomia do ser humano.
Para Freire aprender é construir e reconstruir o conhecimento em dialética,
autonomamente, logo um conhecimento que é transmitido pode ser apenas
memorizado. Assim, aprendemos não para reter conhecimento, mas para mudar a
realidade. Nesse sentido, ensinar exige esperança e exige acreditar que é possível
mudar o mundo, há de se acreditar que a história e o conhecimento nos
contextualizam e nos situam enquanto agentes transformadores, críticos e não
passivos da história.
Ao final do segundo capítulo de seu livro, Freire comenta que a curiosidade é
essencial aos processos educativos, sendo que partimos de uma curiosidade
espontaneamente humana para a elaboração de uma curiosidade
epistemologicamente estruturada por meio de processos críticos, que devem ser
estimulados.
No último capítulo de Pedagogia da Autonomia, Ensinar é uma especificidade
humana, Freire diz sobre a legitimidade de uma autoridade docente democrática,
dizendo sobre a segurança profissional advinda da consciência ética necessária à
docência. A presença de um professor é uma presença política, há de se alinhar
teoria e prática no ser professor, devemos querer aproximar àquilo que expomos
teoricamente com àquilo que praticamos. Autoritarismos em sala de aula
desqualificam a condição de um professor e são um exemplo de desalinhamento
possível entre teoria e prática.
Não é possível ser professor sem que isso nos afete. Educar é uma forma de
atuar no mundo, não há educação neutra, por mais que queiram que acreditemos
nisso. Como colocado pelo autor:

Creio que nunca precisou o professor progressista estar tão advertido quanto
hoje em face da esperteza com que a ideologia dominante insinua a
neutralidade da educação. Desse ponto de vista, que é reacionário, o espaço
pedagógico, neutro por excelência, é aquele em que se treinam os alunos
para práticas apolíticas, como se a maneira humana de estar no mundo fosse
ou pudesse ser uma maneira neutra. (FREIRE, 1996, p. 38).
Ser professor exige que decidamos entre acatar a ideologia dominante,
reproduzindo-a alienadamente às injustiças sociais, ou posicionarmo-nos contra
prática antiéticas de dominação historicamente instituídas, em favor de condições
sociais mais justas, igualitárias e democráticas. A educação é política em sua raiz,
advindo diretamente da possibilidade humana de ser educado. A educação, no
entanto, não pode tudo, pode alguma coisa. É importante reconhecer que sozinha a
educação não pode mudar o mundo, tão pouco pode apenas ser um sistema de
reprodução do status quo, a educação pode mostrar que é possível mudar o mundo.
Ensinar exige também escutar, um processo democrático de ensino
aprendizagem reconhece o estudante enquanto ponto central da educação e
enquanto sujeito que constrói de modo autônomo seu conhecimento. Escutar é
respeitar a leitura de mundo do estudante enquanto válida e essencial para sua
compreensão de outros assuntos a serem ensinados.
Freire ainda nos alerta que devemos nos atentar às ideologias e ter cuidado
para com elas, uma vez que podem nos descarrilhar do pensar certo, em nome de
verdades absolutas. Proclamar apenas a “morte às ideologias”, no entanto é
também problemático. Ensinar é estar aberto ao diálogo e aos posicionamentos que
divergem dos nossos sem a ambição de cegamente “converte-los”. Não saber algo
faz também parte dos processos educativos e não é motivo para tirar a segurança
de um professor.
Por fim, em seu último tópico, exige querer bem aos educandos, Freire exalta
a coragem e a necessidade de se abrir afetivamente nos processos de ensino-
aprendizagem, na medida em que se quer bem para seus estudantes e para as
práticas educativas. Ser um professor sério, bravo e afastado não faz
necessariamente bem para os processos educativos. Ser afetivo e ser um docente
ético e responsável para com sua missão não são características incompatíveis.

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