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Declaração Conjunta da
Comissão Mundial para a Ética do Conhecimento Científico e Tecnológico (COMEST) da
UNESCO e do Comitê Internacional de Bioética (IBC) da UNESCO
Introdução
Programas de vacinação foram iniciados em muitas partes do mundo e, embora muitos países
ainda não tenham vacinas em quantidades suficientes, vários deles estão trabalhando na
introdução dos chamados “passaportes vacinais” ou certificados semelhantes. Esses
documentos permitem que as pessoas demonstrem que têm poucas probabilidades de
transmitir o vírus, seja porque estão significativamente protegidas por vacinação ou infecção
passada, ou porque têm a prova de um teste negativo recente para a presença do vírus. Os
“passes” podem ser certificados vacinais (que funcionam como prova de vacinação),
certificados de recuperação (que registram se uma pessoa se recuperou recentemente da
COVID-19), certificados de teste (que fornecem evidências de um teste de COVID-19 negativo
recente), ou uma combinação deles. Os certificados são tipicamente produzidos com o uso de
tecnologias digitais, com uma alternativa impressa para pessoas que não têm acesso ou não
querem a usar a versão digital. Além disso, tais documentos digitais ou físicos podem
funcionar como um “passaporte” internacional que permite que as pessoas viajem entre
países, ou como uma “licença” mais ampla para participar de atividades sociais específicas,
como assistir a eventos, entrar em edifícios ou mesmo ir ao trabalho.
Uma forma de se respeitar os direitos das pessoas que não têm acesso às vacinas, que não
podem ser vacinadas por razões médicas, ou que rejeitam a vacinação é equiparar a prova de
vacinação com a prova de não estar infectado(a) ou com a prova de recuperação recente da
infecção. Isso pode ser obtido substituindo-se os “passaportes de vacinação” por “certificados
COVID-19” mais amplos que também registram infecções recentes e/ou resultados de testes
negativos recentes. Para garantir os direitos e as liberdades civis, é essencial assegurar que
esses certificados mostrem apenas que as pessoas têm poucas probabilidades de transmitir o
vírus, sem revelar o fundamento desse diagnóstico (vacinação recente, recuperação de uma
infecção recente ou resultado de um teste negativo recente), exceto quando houver motivos
urgentes e legítimos para isso.
As tecnologias digitais usadas para facilitar os certificados COVID-19 devem ser acessíveis,
compreensíveis e utilizáveis também pelas pessoas que possuem menor alfabetização digital
e pelas que não têm conexão com a internet. Aqui, é necessária atenção específica ao
substancial grupo de idosos, que têm menos habilidades digitais e menos acesso às
tecnologias digitais. Para aqueles que não sao capazes de usar essas tecnologias, devem ser
fornecidos meios alternativos totalmente funcionais para acessar as áreas da sociedade para
as quais será necessário um certificado COVID-19.
Nem todos os Estados têm igual acesso às vacinas. Conforme discutido em nossa declaração
anterior sobre as vacinas para a COVID-191, a acumulação de vacinas pode resultar em uma
situação internacional injusta. A introdução dos certificados COVID-19 pode aprofundar essas
diferenças internacionais. Portanto, o desenvolvimento de certificados COVID-19 precisa fazer
parte de uma estratégia global, baseada em uma abordagem multilateral e na cooperação
internacional, que permita aos Estados aceitarem os certificados uns dos outros. A introdução
de certificados COVID-19 não deve acarretar limitações de viagem injustas para aqueles que
não têm acesso a vacinas ou que receberam uma vacina que não é aceita nos países para os
quais desejam viajar. Para essas pessoas, devem ser disponibilizados testes de fácil acesso,
de forma gratuita ou por um preço baixo e, em situações excepcionais, deve-se reservar
espaços para viagens médicas urgentes.
Além disso, a desigualdade global no acesso a vacinas requer esforços globais para aumentar
a produção e a distribuição geral de vacinas, incluindo financiamento para a iniciativa COVAX
e renúncias de patentes. Devem ser desenvolvidos padrões compartilhados para o
reconhecimento internacional de diferentes vacinas usadas em diferentes países, assim como
diferentes avaliações da eficácia de vacinas específicas para prevenir a transmissão.
1
Consultar: UNESCO. UNESCO’s ethics commissions call for global vaccines equity and solidarity, disponível em:
<https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000375608>.
O reconhecimento do registro de quaisquer vacinas para prevenir a COVID-19 deve cumprir
normas de regulação internacionalmente aceitas, sem a influência de elementos de politização
ou discriminação contra a empresa ou o país que as produziram e originalmente registraram.
O reconhecimento das vacinas pela OMS pode servir de base para tais padrões
compartilhados.
Os certificados COVID-19 devem fornecer uma base confiável para determinar se as pessoas
podem participar de atividades sociais com risco mínimo de propagação do vírus. Para obter
isso, todos os dados utilizados no funcionamento dos certificados COVID-19 devem ser
coletados, armazenados e processados de maneira segura, e devem ser tomadas medidas
contra o risco de falsificação, fraude e hackeamento. Em segundo lugar, os certificados
COVID-19 devem fornecer uma indicação adequada da proteção que vacinas específicas
trazem, levando em consideração as diferenças de duração e grau de imunidade das diversas
vacinas. Terceiro, os certificados COVID-19 devem ser capazes de se adaptar aos avanços
científicos, bem como devem exigir atualizações frequentes de várias fontes científicas para
fornecer uma prova confiável de que o detentor do certificado provavelmente não irá propagar
o vírus. Devem ser estabelecidos procedimentos responsáveis em relação à base de
evidências para determinar se e em que medida uma pessoa vacinada, recuperada ou testada
está efetivamente imunizada, em relação ao conhecimento científico mais recente sobre a
contribuição das vacinas para a redução da transmissão do vírus, a confiabilidade dos vários
tipos de resultados de teste2, e a probabilidade de mutações em andamento do vírus.
(7) Privacidade
Para garantir a privacidade dos cidadãos, é crucial que as versões digitais dos certificados
COVID-19 atendam aos critérios de limitação de finalidade, minimização de dados, requisitos
de segurança e princípios de privacidade desde o projeto. Isso significa que o acesso aos
dados necessários para o funcionamento do aplicativo é limitado apenas a esta finalidade, e
que os dados nunca devem ser disponibilizados a terceiros. Além disso, os aplicativos devem
utilizar apenas a quantidade mínima de dados necessária para seu funcionamento, e esses
dados devem ser armazenados de forma segura e ser acessíveis apenas com a permissão do
seu titular. O aplicativo e seus dados devem ser removíveis a qualquer momento, sem deixar
rastros.3
2 Consultar: Hall, M. A. et.al. Vaccine Passport’ certification: policy and ethical considerations, disponível
em: <https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMp2104289>.
3
Consultar: IBC. Report on big data and health, disponível em:
<https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000248724>.
4
Consultar: Baral, S. D. et.al. COVID-19 Passports will harm sustainable development,
disponível em: <https://blogs.bmj.com/bmj/2021/03/30/COVID-19-vaccine-passports-will-
harm-sustainable- development>.
Finalmente, para reduzir o risco de novas ocorrências de zoonoses que podem causar novas
pandemias, os Estados-membros devem moldar as condições para ecossistemas sustentáveis
e tornar a sustentabilidade uma prioridade máxima na formulação de suas políticas.
Conclusão