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O R G AN I ZAD O R E S

Susana Rangel Vieira da Cunha


ARTE CONTEMPORÂNEA
E EDUCAÇÃO INFANTIL
Rodrigo Saballa de Carvalho
Crianças observando,
descobrindo
AU TO RE S
e criando
Andressa Thaís Favero Bertasi
Susana Rangel Vieira da Cunha
Camila Bettim Borges
Rodrigo Saballa de Carvalho
Carla Clauber Organizadores
Cayenne Ruschel da Silveira

Jéssica Maria Freisleben

Lutiere Dalia Valle

o- Marcia Aparecida Gobbi

Maria Eduarda Rangel Vieira

da Cunha

Rodrigo Sabalia de Carvalho

Rosa lavelberg

Silvia Pillotto

Stéfani Vieira

Susana Rangel Vieira da Cunha

www.editoram ediacao.com.br f t
A arte contemporânea pode ser
uma das principais referências
em propostas pedagógicas na
Educação Infantil, tendo em vista
sua concepção interrogativa,
crítica, lúdica, convite para que
os espectadores participem das A

obras em pensamentos ou em
ações. As provocações da arte
ARTE CONTEMPORÂNEA
contemporânea sugerem uma E EDUCAÇÃO INFANTIL
pedagogia provocativa em arte,
propiciando a oportunidade de as
crianças expressarem o mundo de Crianças observando,
forma crítica, sensível, buscando
suas próprias respostas sobre a vida
descobrindo
por meio de produções artísticas e criando
singulares e contemporâneas.
Metaforicamente, os textos aqui
reunidos podem ser considerados
bagagens que possibilitarão Susana Rangel Vieira da Cunha
que você, leitor, reflita sobre a Estágio Pós- doutor al Sêni or C APES (2014-2015) em Artes y Educ ac ión na
potência das artes visuais e da arte Uni ver si dade de Bar c elona e no I nsti tuto Estudos da C ri anç a da UMI NHO,
contemporânea no trabalho com as Mestr e ( 1994) e Doutor a ( 2004) em Educaç ão, li c enc iada em Ar tes Vi suai s
crianças a partir de uma docência (1983) pela UFRGS, Prof essora e Pesqui sador a ( 1996-2015) da Faculdade
investigativa e inventiva. Partindo de Educaç ão da UFRGS, Pr opr ietári a da Empr esa Amarelo Van Gogh:
de tal pressuposto, convidamos Educ aç ão, Infânc ia e Arte, possui experi ênci a nas áreas de Ar tes Vi suais,
você a apreciar as proposições Estudos da C ultur a Visual, I nf ânc ia e Formação D oc ente, é autor a
presentes em cada um dos de li vr os e ar tigos nas temáti c as r eferi das.
capítulos, tal como a multiplicidade
de elementos que aparecem na
imagem dos carrinhos na capa Rodrigo Saballa de Carvalho
deste livro: reflexões teóricas, Pós-doutor em Educ ação ( UFPEL) , D outor em Educaç ão pela UFRGS,
situações vividas e comentários Mestr e em Educação pela UFRGS, Pr of essor do D epar tamento de Estudos
das crianças que constituem um Especi ali zados da Fac uldade de Educ ação da UFRGS - Ár ea Educaç ão
vigoroso diálogo travado com você Inf antil, Professor do Pr ograma de Pós-graduação em Educação da UFRGS -
durante toda a leitura. Lembramos, Linha de Pesquisa: Estudo das Infânci as.
também, que os capítulos/bagagens
podem ser ressignificados por cada (Organizadores)
educador de acordo com as suas
necessidades e interesses, já que,
a p artir de sua p rática pe d ag ó gic a
co m as c rianç as nas e s co las ,
surgirão o utro s e lem e nto s a c o mp o r Editora
se us p ró p rio s c arrinho s . P o rtanto , Mediação
pre pare -s e p ara es sa le itura.
Ave nture -s e ! D e s frute d e c ad a um a
P o rto Al e g re
de no ss as p ro po siç õe s e jamais
es que ça que é vo cê quem de f ine
2017
o rote iro d a viag e m q ue se pro põ e
a f aze r. À s c rianç as a arte d o s e u
próp rio tem po !
Organizadores

41
Sum ário

Coordenação Editorial: Jussara Hoffmann


Apresentação:
Ca pa * e P r ojet o Gr áf ic o : Se t or E d it o rial Me dia çã o Sobre carrinhos , bagagens e viagens : diálogos entre
Impre s s ão : Gráf ic a e E dit or a P allot ti
artes plás tic as , infânc ia e pe dag og ia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho
* Imagem da capa : Obra "ESTRATÉGIAS PARA MUDANÇA..." de Téti Waldraff, 2000.
Fotografia de Fábio Del Re.
1. Uma arte do nosso tempo para as crianças de hoje .............9
Susana Rangel Vieira da Cunha
A arte do nos s o te mp o .....................................................................1 1
Dados Internacionai s de Catalogação na Publicação (CIP) Arte c lás sica ou co nte mpo rânea na Ed uc ação I nf antil? ......................... 11
Criatividade e o novo da arte co ntem po râne a ...................................... 1 4
A786 A r t e c o n t e mp o r â n e a e Ed u c a ç ã o Infa ntil : cria nça s ob s e rv a n d o , d e s c o b rin d o
É de s enho? É p intura? 0 q ue é? ........................................................1 7
e c r i a n d o / S u s a n a R a n g e l Vi e i r a d a C u n h a , R o d r i g o S a b a l l a d e C a r v a l h o
(o r g an iza d o r es ) -1 . e d . - P o rt o A leg re : M ed i açã o , 201 7.
Fitas ade sivas, papel picado, sabão , brinquedo:
28 p. ; 25 c m. mater i ai s ou s upor tes? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
Temas e nar r ati vas i n f anti s . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23
Incl ui bi bl i og rafi a Pr oposi ç ões . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
IS BN 978-85-7706-115-0

1. A r t e co n t e mp o râ n e a - Ed u c a ç ã o d e c r i a n ç a s . 2 . P r o f e s s o r e s - F o r ma ç ã o .
2 . Ar t e , in fân c ia, fo rm aç ã o d o ce n te e c u ltu ra n a e s co la .. .. .. .. .2 7
3. P rá t ic a de ens ino . 4. A rt es vi s ua is . 1. C unh a, S us an a R ang el V i eir a d a. Rosa lavelberg
1I . Ca r v a lh o , Ro d r ig o S ab al l a d e . Ac r edi t ando no potenc i al da c r i anç a . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33

CD U 7. 07 1 . 5 -0 33 2
CDD 70 0. 4523
3. A potência edu(vo)cativa das artes ..................................37
Lutiere Dalla Valle e Jéssica Maria Freisleben
(Bibliotecária responsável: Sabrina Leal Araujo - CRB 10/ 1507) Inf ânc ia e p rátic as pe d agó g ic as ........................................................4 0
Espaços expositivos e lugar de exp erime ntaç ão ..................................4 3
Experiências compartilhadas entre formação inicial e continuada...........46
Todos os direitos desta edição reservados à
Exp lo rando a p otê nc ia e du(vo )c ativa d as artes visuais .........................4 8
Edi tora Medi ação Di stri bui dora e Li vrari a - EIRELI - EPP Algumas considerações ....................................................................49

Av. Taquara, 386/908 Bairro Petrópolis Porto Alegre RS 4. Visitando e criando a partir de uma
CEP 90460-210 Fone (51) 3330 8105 exposição de arte contemporânea ... ... ... ... .. ... ... ... .. ... ... ... .. 51
Maria Eduarda Rangel Vieira da Cunha
www.editoramediacao.com.br f t
Reconhecendo a memória ................................................................52
Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida A memória no trabalho de Rochele Zandavalli ......................................56
ou duplicada sem autorização expressa do Editor. A memória no trabalho de Bispo do Rosário ...........................................57
Materiais inusitados ........................................................................60
© b y O r g a n i za d o r e s , 2 0 1 7 P r i n t e d i n B r a z i l / I mp r e s s o n o ' B r a s i l
Reflexões posteriores.'
osteriores :.....................................................................61

e
5. Respingos , colagens , vozes, sensações ... ... ... ... ... .. ... ... ... ... .. 65
Camila Bettim Borges
Selecionando os materiais ..................................................................65 Ap r es e nt a çã o
Do lugar: a es co la é um e sp aço d e arte co ntem porânea? .........................66
Do modo: como desenvolver experiências em arte contemporânea?........69 SOBRE CARRINHOS, BAGAGENS e VIAGENS:
Da ação: ap ro priação d a arte co ntem po rânea na Ed ucação Inf antil...........7 0
Do ato: c rianc as em ac ão ...................................................................7 2 DIÁLOGOS ENTRE ARTES PLÁSTICAS,
Do olhar que aco lhe e re spe ita: af eto s e s ens ib ilidad es ............................73 INFÂNCIA E PEDAGOGIA
6. As produções gráfico -plásticas das crianças .........................75
Andressa Thaís Favero Bertasi e Rodrigo Saballa de Carvalho Su sa n a Ra n ge l Vie ira da Cu nh a
Pensando os traçado s: escritas sob re o ato d e des enhar ...................... 77 Ro drig o Sa ba lla de Carv a lh o
Marcas vis íve is : reveland o os pe nsame nto s das c rianç as ..........................81
Prop os tas d e de se nho : algumas s ug es tõ es .............................................8 5
0 de s enho: um unive rs o d e p ensam entos ...............................................8 8

7. Crianças, fotografias , derivas: ............................................ 89


Marcia Aparecida Gobbi
C o m o s p é s n a r u a : der i va s, pr i nc í pi o de vi agem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89
Qu e as c r i an ç as f ot og r a f a m , já s ab em os ,
po ré m , o q ue e c o mo elas fo tog raf am? ..................................................9 0
Atrave ss a lo g o m enino, o f aro l vai f ec har! .............................................9 3
Fotog rafar a cidade s em pre ss a de che g ar ............................................9 4
Com o as c rianç as f otog raf am a c id ad e s e São Paulo ? ..............................96
Câm e ra na m ão, c rianças , f o tog rafias ...................................................9 8
Olhar, ver, re c e be r, g uardar .................................................................9 9
Dar, re ce b er, re tornar .........................................................................1 0 1

8. Cria nd o co m pe d a ço s de p ap e l . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1 0 3
Cayenne Ruschel da Silveira e Stéfani Vieira A obra carrinhos de vi agem, da a rti sta plást ica Tét i W aldraf f, aci ma,
Arte co nte mp orâne a e pro po stas pe dagóg ic as ........................................1 04
Pe d aço s de p ap e l ..............................................................................1 0 6
é inspiradora para pens armo s nos diálo gos nec essá rios est abe leci dos en-
Conclus ão: o q ue os p apé is p icado s no ensinaram ? ............................... 1 09 tre art es plás ti c as , i nf ânc ia e pe da gogia , no liv ro que o ra a pre se nta mo s
ao públic o le ito r. Tra ta -s e de um liv ro portador de ba ga ge ns de pro fe ss o-
9. A experiência dos bebês com a arte ...................................111
re s e pe squi sa do re s do c ampo das a rte s e da pedagogia , cujo o bjet iv o é
Silvia Pillotto e Carla Clauber
Bebês, sujeitos de ação/interação ........................................................112 o de ins pi rar aç õ es educa ti v as no co nte xto do traba lho pe da gógi co co m
Territórios de experiências e de sentidos: cri anç as. As sim co mo a s érie de carrinhos que t ra nsport am dif ere nte s ba-
a arte habitand o esse lugar da ed uc aç ão .............................................. 11 3
gage ns apresentados pela artis ta, o livro o ferta e m c ada um de seus nove
0 pro fe s so r: pro vo c ad o r d e af e to ? .......................................................11 5
Percurs os pos síveis nas p ráticas educ ativas capítulos uma miría de de pos si bilida de s para o le ito r des env olv er propo s-
(sonor as, vi suai s e c or por ais) . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . 117 ta s pe da gógi ca s po t ent es , que t o me m c o mo pont o de part i da o pro t ago -
nis mo das c ri ança s em se us pec ulia re s mo do s de ha bi ta r o mundo.
Referências e sugestões de leitura .... ... ... ... ... ... .... ... ... ... ... 122
Sobre os organizadores , autores e autoras .... .... .... .... .... .... 127

5 Ed i t o r a M e d i aç ã o

o
ARTE CONTEMP ORÁNEA E E DUCA ÇÃ O INFA NTIL Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho (Orgs. l

ti

"Uma art e do no s so t e mpo na Educ aç ã o Inf ant il" é o pri me iro c a pí - 0 de s e nh o c o mo pe ns a me nt o vi s ua l é t e ma do c a pí t ulo 6: "As
tulo des te liv ro , es crit o po r Susa na Range l Vi ei ra da Cunha. 0 a rgumento produçõ e s grá f ic o -plá s ti c as da s c ria nç a s" -, es c ri t o po r Andre ss a Thaí s
da autora é o de que as concepçõ es sobre arte produzem o s modos de pla- Favero Bertasi e Rodrigo Sa balla de Ca rv a lho , que mo st ram vá ri as po s -
neja r e des envo lver propos tas relativ as a ela no s co nte xtos educac iona is. si bi li da de s de t ra ba lho t e ndo o des e nho c o mo li ngua ge m na Educ a ç ã o
Nes se s ent ido, suge re que as prof es so ras s e aproximem da a rt e c onte m- Inf ant il. Os aut ore s de fe nde m o c onc ei t o de de se nho c omo pe nsa ment o
porâ nea, at uali zando c onc eito s, modo s de ve r e de planeja r as prátic as. vis ual, como modo de e xpres são das narra tiv as da s c ria nç as e não co mo
No c apí tulo 2: "Art e, infâ nci a, fo rma çã o doc ent e e c ultura na es co - simples re pre se nta çã o.
la"-, Ro sa lave lberg a prese nt a que st ões a tua is do c ampo artes v isuais na 0 c a pít ulo 7 do li v ro, de Ma rc ia Apare c i da Go bbi : "Cri a nç a s , f o t o -
et a pa da Educa ç ão Inf ant i l, de f endendo o a rgume nt o de que a li be rda de gra fi as , de riv as " - traz a suge st ão da linguagem da f ot ogra fi a no trabalho
de e xpressã o a rtís tic a depende de o rie ntaç ões di dáti cas especí fica s para com as cri ança s na e scola. A propo siç ão do a rti go é uma reflexão a partir
que as cri anç as poss am aprender e c riar de mo do aut oral suas pro duç ões das seguintes indaga çõe s: c omo as má quinas digitai s s ão uti liza das pe las
em sala de aula. cri a nç a s de sde t e nra i da de ? 0 que c o nt ê m a s ima ge ns c a pta da s pe la s
Prosseguindo o diálogo, Lutiere Dalla Valle e Jéssica Maria Freisleben, cri ança s e m re açã o ao c oti di ano v iv ido, expe ri enc ia do e inve nt ado pelas
auto res do capí tulo 3, int itulado : "A po tênc ia e du(vo)c ati va das a rte s vi su- mesmas? É poss íve l pens ar na c âme ra f oto grá fic a co mo jogo prese nte no
ais" -, a borda m experimenta ções que arti culam a f ormaç ão docent e co m/ a dia a dia de meni nos e meni nas nas esc ola s de Educa ção Inf ant il?
partir das artes visuai s na Educação I nfantil e Anos I niciais do Ensi no Fun- Cayenne Ruschel da Silv eira e Stéfani Vieira s ão as a utoras do capí-
damental. Para tanto , os auto res a borda m a perspectiv a edu(vo)c ativa que tulo 8 , int itula do: "Cri ando com peda ços do papel". Ela s narram uma série
to ma c omo po nt o de pa rti da a rt e fa t os vi s ua i s /na rra ti v os pro duzido s por de açõ es pedagógi cas planeja das e de senvolvidas no âmbit o da pes qui sa
artistas como disparador para process os de interlocução com as crianças e "Co nv ersAÇÕES: a rte c onte mpo râ ne a e c ri anças ", e vi denci ando no t exto
invenção de pro postas. os mo do s co mo as c ri anças e xperie nci am e s e relac io na m com mat eria is
Na est ei ra da di scuss ão, propost a pelos capítulos anteriores, Maria expre s si v os e s eus di fe re nt e s s upo rt e s, tra ns f i gurando s ua s produçõ e s
Eduarda Range l Vie ira da Cunha, a uto ra do c apí tulo 4: "Vis ita ndo e c ria n- em art efa tos si ngulares.
do a parti r de uma expo s iç ão de art e co nt empo râ nea ", f az uma produt iv a Fi na li za ndo o li vro e a pa rt ir do suge st iv o tí tulo : "A e xperiê nc ia dos
ref lexão so bre a s relaçõ es da s c ri anç as co m a a rte c ont emporâne a, além be bê s co m a arte " -, Si lvi a Pillot t o e Carla Cla ube r pro põe m uma educa -
de apresent ar várias possibilidades de projetos de ens ino em arte s visuais. çã o pe lo se ns ív e l, e m que o pro f es so r de be bê s s inta -s e um pro vo ca do r
0 ca pít ulo 5 do liv ro: "Res pingos , c o la gens , vo zes e s ens aç õ es " -, de afe to s, re ali za ndo a çõe s que s eja m mobili za doras de e xpe ri ênc ia s que
é de Camila Bettim Borges , que es cre ve so bre a i ntríns ec a relaçã o ent re envo lv am plenamente os s enti do s e s ua s pos si bi li da des s onora s, c orpo -
cria nça s e a art e c ont emporâ nea . Para ta nto , a autora a rti cula s eus argu- rais e v isuais.
me nt os e m def es a da arte c o m a le it ura das o bra s de a rti st as c o nt empo - Me ta f ori ca ment e, os te xt o s a qui re uni do s pode m s er co nsi dera do s
râneo s co mo Sa ndro Ka, Lia Menna Ba rreto e Rochele Za ndav alli, alé m de bagagens que poss ibilita rã o que v oc ê, le it or, ref li ta so bre a pot ênc ia das
apre sentar pro pos içõ es a se rem pe nsadas, explo rada s e vi venc iadas com artes visuais e da a rte contemporâ nea no trabalho co m a s crianças a par-
as crianças e professores. tir de uma docê ncia inv esti gat iva e invent iva . Pa rtindo de t al press upos to,
convi damos vo cê a apre cia r as propo si çõ e s pre se nte s e m ca da um do s

Ed i t o r a M e d i aç ã o 6 7 Ed i t o r a M e di a ç ã o

Q
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÀO INFANTI L

ca pí t ulo s, ta l c o mo a mult iplic i da de de ele me nto s que a pa rec e m na i ma -


gem do s c arrinhos na abert ura dest e t ext o - reflexõ es teó ri cas , s ituaçõ es
vi vi das e c oment ári os da s c ri a nç a s que c o ns t it ue m um v i go ro s o diá logo
1
tra va do co m voc ê durante t oda a leit ura. UMA ARTE DO NOSSO TEMPO
Le mbramo s , t a mbé m, que o s c apí t ulo s / ba ga ge ns po de m s e r c o ns -
PARA AS CRIANÇAS DE HOJE
ta nt e me nt e re s s i gni f i c a do s po r c a da e duc a do r de a co rdo c o m a s s ua s
ne c es s ida de s e int ere ss e s, já que , a pa rt i r de s ua prá ti c a pe da gó gi c a
Susana Rangel Vieira da Cunha
co m a s c ri a nç a s nas es c ola s, surgi rão out ro s e leme nt o s a c o mpo r s eus
própri os c arri nhos .
Portanto, prepare-se para essa lei tura. Ave nture-se! De sf rute de
cada uma de noss as pro po si çõe s e ja ma is es queç a que é v oc ê quem de-
fine o rot eiro da v iagem que se pro põe a fazer.

A a rgument a ç ã o pri nc i pa l de s te t e xt o s e s ust e nt a na pre mis s a de


que a s no s s a s c o nc e pç õ e s s obre a rt e pro duze m no s s o s mo do s de pla -
ne jar e des e nv o lv e r propo st a s nos co nt ext os educa c io nai s . Pa ra t anto ,
sugere-s e que e sc ola s e pro fe ss ore s se apro ximem da a rt e pro duzida em
no s s o te mpo , at ua li za ndo co nc ei to s, o o lha r e a s f o rma s de pro duzi -la
e nos últi mos cem anos. Des te modo , sã o te cidas reflexõe s s obre po ssív eis
mane ira s de e nsi nar art e para crianças na contemporane ida de.
Co nc e pç õ e s e o bra s de a rt e s ã o v o lá t e i s , alguma s pe rma ne c e m
co mo s e ndo a rt e po r s é culo s e o ut ra s s ã o e f ê me ra s e e s que c ida s . Um
exe mplo c lá s s i c o f o i a pri me i ra e xpo s iç ã o do s i mpre s s io ni s t a s (1874)
nã o c ons i dera da a rt e pe la e li t e c ult ura l de Paris, t e nd o e m v i s t a que
so me nt e s e c o ns a gra va m o s art i s t a s, ho je c o mplet a me nte e s quec i do s ,
que s e e nquadra s se m de nt ro da art e a ca dêmic a o u ne oc lás si c a. Mo net ,
Manet, Re noi r, Pis sarro, Si sle y, Va n Gogh, Dega s, Cézanne e suas obras
fo ra m rec o nhe c ido s s o ment e no s é c ulo XX e t o rna ra m-se gra nde s í c o -
ne s da a rt e mundi al.
Socia lmente, as c once pçõe s so bre arte são construídas em dete rmi-
na do s co nt exto s cult ura is e e co nô mi co s. Conce pçõ es , te oria s e um c on-
junt o de obje to s o u aç õe s s ão v alida do s po r grupo s so c ia is e m perío do s

Editora Mediação 8 9 Ed i t o r a M e di a ç ã o
ARTE CONTEMP ORÃNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho (Orgs .)

hi st ó ri co s . Ta mbé m os lo c ai s e xpos i ti v os , t e xto s c rít i co s e public a çõ e s A arte do nosso tempo


di ve rs as co nt ri bue m pa ra que se jam f ormuladas no ss as de fi ni çõ e s so bre
o que é art e. Ra rame nt e e nco nt ra mos pro po s ta s educa t iv a s na Educ a çã o I nfa n-
A hi s tó ri a da a rt e, muse us, c e nt ro s c ult urai s , li v ro s, fi lme s, c a tá lo - ti l e no s Anos Ini ci a is do Ens ino F unda ment al so b a pe rspe ct i va da art e
go s de expo s iç ão , so u v en i rs, no t í ci a s e m jo rnai s , TV, Inte rnet , prát ic as do s últ i mo s c i nque nt a a no s , que po derí amo s de no mi na r, gro s s o mo do ,
pedagógic as v ivenciadas nas e scolas, i nformaçõ es a qui e ac olá produzem como art e conte mpo râ nea o u pós -mo de rna. Pa ra Ca uquelin (2 005 , p. 18 ),
em nó s o s conce it os so bre o que é art e. Cunha (20 01 ), em s uas a nális es "a a rt e do pa s s a do no s i mpe de de c a pt a r a a rt e de no s s o t e mpo ". Em
sobre a s rela çõe s e ntre o s modo s de entender arte e modo s de e nsi ná-la, muit as pro po st as e duc at iv as , no ta -s e uma nos ta lgia da a rt e do pas sa do ,
afirma que a visão predo minant e de a rte da maioria das pesso as centra-se impe di ndo um o lha r a t e nt o e c o mpre ens í v e l pa ra o que s e pro duz ho je .
nos gra ndes mov imento s art ís ti co s euro pe us , em alguns a rt is ta s e em a l- Se gundo Cunha (2 0 1 2 , p. 117), "o pa radi gma que mui t a s ve ze s ori e nt a
gumas obras emble mát ica s que são reproduzidas em ca mis eta s, caneca s, o pe ns a ment o pe dagó gi c o e m a rt e f unda -s e em c ri t é rio s de a rt e de um
panos de pra to, bolsas , entre t antos o utros a rte fa to s que t ornaram a arte tempo e de uma so ci edade que nã o é es sa na qual v iv emos ".
do pa ss ado popular entre nó s. No e nt a nt o , há ma i s c e m a no s , surgi u o ut ra mo da li da de de arte,
De vá rias mane iras , as idei as s obre arte se propa gam nos c onte xtos as v anguarda s art ís ti ca s, que romperam c om padrõ es es té ti co s he ge mô -
educa ti vo s, e a mi sc igenaç ão de i nf orma çõ es, s ejam e la s do ca mpo ac a- nicos, ina ugurando po ét i c as do c ot i di a no e a bele za gro t e sc a . Pode-se,
dê mi co e / ou do s e nso c o mum so bre o c a mpo da a rte c o nf i gura m mo do s assim, af irmar que a a rte de ho je s ofreu tra nsfo rmaçõ es radic ais, oriundas
de e ns iná-la e m di fe re nt es nív ei s educ at iv os . Muit as v ezes , a inst it ui çã o dos movi me nto s vanguardis ta s no que s e ref ere a os ma te ria is , à s temát i-
esc olar nã o at ualiza as co nc epçõe s de arte c omo f az c om outros ca mpos cas, ao s f ormatos , à s linguagens, ao re finamento téc nic o, à autoria, entre
do c o nhe c i ment o e c o nt inua re a f i rma ndo um pe ns a me nto s o bre e la c a l- ta nt o s o ut ro s a s pe c t o s que c a ra c t e ri za m o que de no mi na mo s de "arte
0-
ca do e m uma ma tri z clá s s ic a , aqui ent e ndi da do perí o do Re nas c e nti s t a conte mpo râ nea ". To da s e st as trans fo rma çõ es oc orridas no ca mpo a rt íst i-
a o Ne o c lá s s i c o e na Art e Mo de rna , do Ro ma nt i s mo à s Va ngua rda s do co deveriam esta r incorporadas nas f orma s de ens inar art e do séc ulo XXI.
iníc io do s éc ulo XX.
Aguirre (s /d, p. 3) aponta as idei as do mi nante s, fundada s na mo de r-
ni da de , so bre a a rt e e s e u e ns ino em t ermo s da fo rmaç ã o do s suje it o s . Arte clássica ou contemporânea na Educação Infantil?
Segundo o autor, as ide ias recorrentes seriam: a filorracionalista , que teria
como princ ípi o i dea is de beleza : a educaç ão art íst ica objet iva ria o des en- Dife renteme nte do que oc orreu e m o utros perí odo s hi stó ric os, a a rte
vo lv imento do go st o e da s ensi bi li da de e st ét ic a; e a emotiv ista , bas eada conte mporânea nã o te m co mo ca ra ct erís ti ca um c onjunt o de arti st as c om
na i de i a de a rte c omo e xpre s sã o de se nt ime nt os e emoç õe s : se u e ns ino afi ni da de s fo rma is , es té ti ca s, te má ti ca s. 0 que ca ra ct eriza a mai oria dos
pro pi ci aria as manife st aç õe s de li be rda de . No Bras il, tai s co nc epç õe s se arti st as é a po st ura e xplo ra t ória , co nte st at óri a e crít i ca dos grande s pa -
co nfi gura ra m nas pedagogi as t radic ionai s, tec ni ci st as e expressivistas, radigmas da arte, entre e les , a di ss olução da s c at ego ria s c lá ssi cas co mo
mes cla ndo -se e int erc ala ndo -se e m v ári os períodos his tórico s. pintura, escultura, de s e nho e o s pa drõ e s e st é ti c os da be leza clássica.
Ta mbém s e no ta , entre os a rt is ta s at ua is , a va lo ri za çã o e do cume nt aç ão
do s pro ce s so s, as o bra s c omo pro pulso ra s de que st i oname nt os so ci a is ,

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polí tic os, nã o e nce rra ndo mai s v erdade s nela s próprias , mas abrindo pos- U m a c r i a n ç a q u e i n i c i a u m d e s e n h o p o d e t e r u m pr oj et o, u m a i dei a i ni -

sibilida de s para que o e spe ct ador co mplet e a obra com s ua s ref erênc ia s. c i a l. A o m e s mo te mp o , n ã o s e s e n te o b r i g a d a a te r q u e ma n te r o p o n to
de p a r t i d a i n i c i a l . Se du r an te a el a bo r aç ão do d e se n ho , u m si g no gr áf i c o ,
Se gundo Ca nt o n (20 1 3, p. 1 3 9),
um a c o r , u m e s tí m ul o ext er n o , o f e r e c e m - lh e u m a s u ge s t ão di f e r e n te , el e s
po de m t o r n a r - s e u m c a m i n h o a s e r p er c o r r i d o, um a p i st a a s e r e xp l or a da ,
sem ser im puls ionada por um projeto s ociopolítico espe cíf ico e s em o res-
um i t i n er á r i o p ar a u m no vo p r a ze r e u m a " d i ve r s ã o" .
pald o de movimentos ou m anif esto s, a ação artística contempo râne a se en-
gaja em te ntativas d e res tabelec er na arte um a co nexão co m o o bs ervad or
de fo rm a a incitar nele algum tipo d e p os tura d iante do mund o e da vid a. Alé m das t emá ti ca s s ugeri da s, dura nte o proc es so do dese nho, pro-
fe s s ore s re c ome ndam c olo rir dent ro de li nhas e a c o nse lham c ri a nça s a
Out ro as pec t o re le v ant e da a rte co nte mporâ ne a é que nã o há uma não borra re m, ras garem, amas sa re m, pe rf urarem a s uperf íc ie . Ou s eja, o
inte nç ão do a rt is ta de narra r ev ento s o u expres s ar s enti me nt o s indi vi du- supo rt e, a f olha , de ve f ic ar i nt ac to e rec eber o des enho , ente ndido co mo
ais , ma s prov oc ar a c ri aç ão de outros pe ns amento s e na rrat iv as s obre o um produto bem ac abado, que de ve po rt ar uma me nsa ge m int eligíve l pa ra
mundo , o u s obre o que e ss e pode ri a s e r. 0 que pre t e ndo a lert a r é que , os o utro s. Nessa ori enta ção peda gógica, os proc esso s de des cobe rta ma-
se no s s a c ompree nsã o so bre a a rt e é que e la "t ra nsmi t e me ns a ge ns ", térica, espac ial, fo rmal, colorís tica na feit ura do desenho são pouco v alori-
"é uma produç ão e xpre s s iv a do i nte ri o r de c a da um", "re pro duz a lguma zados e explorados. Pode-se dizer que, nesse t ipo de ação pedagógi ca, há
coisa ext e rna o u int erna", "uma f o rma de expres sa r s enti me nt os , me - ras tro s de uma c oncepção de a rt e c lá ssi ca em que o s uport e f ic a i nt act o,
do s, inc erte zas pa ra out ro s i ndi ví duo s", "co mo a lgo boni to e agradáv e l", dist anc ia-s e das dema ndas da s crianças e do que s e co mpreende por a rte
"dev e s er be m fe i ta ", no ss o pensa mento pe da gó gic o e st ará s ubordinado na a tua lida de.
às c onc epç ões de arte de out ro tempo que nã o é o nos so, e as pro pos tas As de ma nda s da s c ri anç a s pequenas, de f a t o , são e xplo rat ória s:
pe dagó gi c as , em co nso nâ nc i a a e s se pens ame nt o , bus ca rã o f aze r c o m amassar, rasgar, furar, mo lhar, provar, roçar pelo co rpo os materiais,
1W
que c ri a nç a s e jov e ns se a pro xime m e rea lize m tra ba lho s dent ro de uma aç õ e s c o muns que de v e m s er i nc e nt iv a da s e nunc a c ont ro la das . 0 que
abo rdagem e m arte dis ta nt e da s c once pç õe s da a rt e de hoje. se def ende é que as cri anç as te nha m a o portunida de de interagir, experi-
No que s e ref ere ao co nt exto da Educa ç ão I nf ant il, ai nda há aç õe s me nt ar, c ri a r, a pre nde r co m a a rte de s eu t e mpo e não apena s co m a do
pedagó gic as orientadas na pe rspec tiv a da art e c lás si ca, em que cri anç as pas sa do . 0 pe ns amento v is ua l, i ma gi nat iv o, pro ce ss ua l da s cria nç as t em
de t rê s a qua t ro a no s de s e n ha m e m f o lha s bra n c a s A4 (s e ri a uma re- mui to s po nto s de c o nta t o c om o s modo s de o s a rti s t as co nte mporâ ne o s
produç ão da te la bra nc a) uma his tó ri a (o s fe it os his tó ri co s re trat ados na pro duzirem arte, e ntre ele s:
arte ), um pass eio (a nat ureza), a f amí lia (a tra diçã o do retra to fami lia r).
Mas por que sugeri r "t emá tica s" se a arte de hoje não tem ma is e sta - a exploração das materialidades durante a feitura;
- a e xaltaç ão de asp ec to s fo rmais , co lo rí stico s e es paciais e m de trim ento
inte nç ão ? E po r que ta i s te má ti ca s? Será que a s cria nç as peque na s nã o
das prop orçõ es visíveis das form as;
gos ta ri am de a pe na s rea li za r experimenta çõe s na s superfí ci es , o bjet os e
- as simp lif ic aç õe s f ormais e m vez d os de talhes re alis tas;
ma t e ri a i s? Apena s bri nc a r, t ra ns f o rma r e de sc o brir o que dá para fa ze r - a inco rp oraç ão d e im ag ens, s ig no s e lo go marc as ;
co m um pinc el qua se se c o o u c om mui ta ti nta ? - a ressignificação de objetos, dando outro sentido a eles;
Staccioli (2011, p. 22) coment a que a e xpressão gráfica das crianças - a inventividade nos usos das ferramentas e suportes.
é ca maleônica e dis tante de tema s predefi nidos por adult os:

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Criatividade e o novo da arte contemporânea Da mes ma fo rma c o mo o s co nc e it o s de a rte e c ri a ti v i dade v ie ra m


sofrendo no vas configuraç ões , o conceit o de no vo, de ori gina lidade, so fre
Que a s pec t os da a rt e co nt emporâ nea po de m s e r repe nsa dos , pro - um a balo, no i níc io do s é culo XX, qua ndo Duc hamp a pres e nt a c omo a rt e
ble ma ti zados , incorpo ra do s a os pla nejamentos e a çõ es pe da gó gic as c om um o bje to ut i li tá rio , um mic tó rio , e m s ua o bra "A F o nt e" (1 91 7 ). 0 "no vo "
cri a nç a s ? Qua ndo pens a mos e m c ri a ti v i da de e no no v o , qua s e de i me - de Duc hamp é a rec onf igura ção de um objet o c omum, banal, transf orma do
dia to pensamos em art ist as , e scrito res , dire tores de ci nema e suas obras em obra de a rte . Na arte co nt emporânea , a lé m de trans fo rmar o ordinário
diferenciadas . Rara mente associ amos i sso a cienti stas, cozinheiros, enge- em e xt ra ordi ná ri o, pas s amos a t er o nov o nã o mai s ce nt ra do na obra e m
nhe iros, médico s, prof es sores , mec ânico s, entre out ro s pro fi ssi onais . No si, mas nos pe ns ament os que po de rã o de senca de ar no s es pe cta do re s. A
enta nto, os proc esso s de cri ação não são exc lusi vos do c ampo das art es. grande "nov i da de " da art e co nte mpo râ ne a é, então , t ransf ormar os s uje i-
De mui to s mo dos , o s is t e ma da s art es vi s uai s pro duziu no Oci de nt e , a o tos , ante s es pec ta do re s pa ss ivo s, e m suje it os cria ti vo s, a tiv os , que pa r-
longo de séc ulos, a ide ia de que a rt ist as e s uas produçõ es sã o e xce pci o- tic ipa m e expande m s eus pe nsa mento s e imagi naç ão a partir da s o bra s.
nais, cri ativ os e portadores de inovaç ões. Ao no s v o lta rmo s pa ra a pro duç ão de a rt e c o nt e mpo râne a , po de -
Co mo le mbra Os t ro we r (1 9 8 7 , p. 5), "c onsi de ra mo s a cria ti vi da de mo s aprende r que o s a rt is ta s des af i am o s mat eria i s do no ss o co t idia no ,
um pot e nc ia l i ne re nt e a os ho me ns [e à s mulhe re s ]. (. .. ) 0 c ri ar s ó po de tra ns fo rmando -o s em o ut ros o bjet os de ma ne ira similar a o jo go s imbó li co
se r v is t o num se nt i do glo ba l, co mo um a gi r i nt e gra do em um v i ve r huma - inf ant il. I números sã o os exemplo s da a propria ção e da t ransf ormaç ão de
no. De fa to, c ri ar e vi ve r se i nte rligam". Se ndo o criar uma c aract erís ti ca materiais e objeto s, entre eles a obra "Marulho", de Cildo Mei reles , expos-
humana , seu exe rc í ci o e sua s mani fe s ta ç õe s nã o s ão exc lus iv i da de de ta na 6a Bienal do Merco sul e m 2 00 6. Pa ra co mpo r a o bra , o a rt ist a rec o-
de t ermina do c ampo do c o nhe c ime nt o . briu uma gra nde s upe rf í ci e do chã o co m rev i st a s po rta do ras de i ma gens
Ape sa r da a s so c ia ç ã o qua s e i me dia t a entre arte , cria t iv i da de e o fo to gráf ic a s de mare s, s obre po s ta s, s uge ri ndo o mo v imento de o ndas . A
9_ novo, o c o nce i t o de c ria t i v ida de , a s s i m c o mo da arte , f o i s e ndo t ra ns - interação entre o públi co e a instala ção s e de u em um píer, com as pe sso-
fo rma do a o lo ngo da hi s t ó ri a . Ta t a rki e wi cz (2 00 2 ) re a li zo u um pro fundo as pró xi mas do mar. Alé m do v is ual, na ambi ênc ia hav ia uma so noridade
estudo s obre tai s modif icaç ões, mos tra ndo que, a parti r do Re nasc imento, co mpos ta pela pa la vra água e m vá ri a s lí ngua s que produzia o s ruídos do
surge a a ssociaçã o entre arte e i nvenção, quando o s artist as têm "licença" ma r. Segundo Meireles (20 06 ), "o s o m t a mbé m e xe rc e um pa pe l f unda -
pa ra c ri a rem mundo s no v os e nã o c ópi as do mundo v i sí v el. So ment e no menta l pa ra a sua ela bo ra çã o c once it ual e f ormal, po is de sloc a conti nua-
sé c ulo XI X, o s t e rmo s cri ado r e c ri a ti v i da de s e i nc orpo ra m à linguage m me nt e o fo co de a te nç ão do v is it ant e, e st imulando o es ta be lec imento de
da arte e se co nv e rt e m e m pro pri eda de quas e e xclus i va de la, be m c omo relaç ões c ogni tivas nova s do espa ço o nde e les s e encontram".
pass am a se r a ssoc iados a o a rtis ta. Contudo, mesmo is so sendo recente, A i ns ta la çã o de Cildo f oi c ompo st a po r re vi st as (o ma r), ma de ira (o
é comum ass ociarmos a cria tividade à arte em nosso traba lho pedagó gico, píer) e a palavra água (o som do mar): materiais comuns que ele recompõe,
busc ando i nc es sa nte me nt e que as c ria nç as "crie m" a lgo nunca v is to . pro duzindo uma ide ia de mar que não é mimé tic a. Um tra balho que po derí-
Co mpre endemo s que a hi st ó ri a da art e c o nst ró i uma história de amos de no minar co mo "c ria ti v o", mas nã o úni co e "no vo " c omo foram as
"nov ida de s", c omo s e os arti s ta s s empre e st iv e ss em re apre s enta ndo de obras at é as va nguarda s a rt ís tic as . Se pensa rmos em outras re prese nt a-
out ro s modos s ua s pro duçõ es e, a ss im, na ma ioria das ve ze s, v inc ula-se çõe s s obre mar e sobre o concei to de criat ivi dade do séc ulo XIX, le mbra-
art e ao no vo , à quilo nunca vi st o a nt eriorme nte nas obra s. mos "Os Ma res", de W illia m Turner (1775 - 185 1), pintor inglês, românt ico,

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co ns idera do c omo um do s pre curs ore s do I mpres si onis mo, que v i ajou na É desenho? É pintura ? 0 que é?
proa de navi os para pro cura r e ntender os f enô meno s do mar e transpô-los
pic torica me nte na supe rfí cie de uma tela. Quando Braque e Picass o, em 1907, iniciaram as colagens com mate-
Ci ldo e Turner, a rt i st as de di fe rente s é po c as , nos a pre se nta m v er- riais e objeto s do co tidiano , como jornai s, asse ntos de cadeiras, papelões,
sões de uma me sma temát ic a. As fo rmas c o mo eles so luci onaram o rótulo s, areia, f itas, entre outros mat eriai s em s uas pintura s, po de-se dizer
"ma r" c ausa m dif erente s ef eit os s obre nós . Em amba s, pode mo s ra st re ar que se perc ebeu a pos sibilidade da miscige nação de materiais e das moda-
os modos como c ada um lido u c om os ma teriai s e co m os seus proc ess os lidades a rtíst icas . 0 próprio te rmo "cola gem" (co iag e), antes inexistente no
de cria çã o. Para cria r, ambo s pe squi sa ra m, t es taram mat eria is , envo lv e- campo das artes, foi criado pelos dois artistas em suas experiências cubistas
ra m-se , expe ri me nt aram, t ro uxeram lembrança s, (des )c onst ruíram, fo ra m e permanece até nossos dias como mais uma modali dade das artes visuais.
alé m da quilo que sabia m so bre o ma r. Muit o ma is do que a junç ão de ma te ri a is extra pi c tó ri c os co mpo ndo
Qua ndo fa zemos i ss o com a s cria nça s? Uti li zamos a memóri a af et i- uma obra , Bra que e Pi c as so des enc adea ra m out ro pensa me nto s obre o s
va e a visual como pro pulsoras do s proc essos de criação ? Quando proble- materi ais e questi onaram os te rritórios da arte : pint ura, desenho e esc ultu-
mat iza mo s o s mat eriai s ou as incenti vamos a us á-los de outras fo rma s? ra, a tríade clássica considerada como as mais importantes modalidades da
A dimensão criativa, transformativa, é o que nos diferencia das outras arte até o iní cio do sé culo XX. Entã o, a pint ura que, junto com a es cult ura,
espéc ies , po rém i ss o não quer dize r que t odos te nham a po ssi bi li dade de foi considerada como o modo "superior" da expressão artística, passa a ser
desenvolvê -la "espontanea mente ". As açõe s pedagógi cas precis am se r re- adulterada em seus mate riai s, forma, téc nic a, e es ses no vos objeto s rom-
visit adas na perspecti va da art e co ntemporânea em termos dos proce ssos pem as fronteiras rígidas entre as diferentes modalidades da arte'.
de c ria ção do s a rti sta s, não pa ra copiá-los com "rele ituras ", mas pa ra en- Muit o s o ut ros art is t as , a o longo do s éc ulo XX, c ont ri buí ram pa ra a
tender co mo eles busca ram s oluçõe s, explo rando ma teria is, co mo os re s- ruptura dos co nc ei to s t ra di ci onais das moda li da de s art ís ti ca s e a des te r-
r significaram e como os apres entaram para o s apreciadores dessas obras. rit oria lizaç ão da s li nguagens. Co nt udo , me s mo c o m a i nt e ns i fi c a ç ã o da
Muitas vezes, nas escolas, o potencial criativo das crianças é entendido hi bri di za ç ão da a rt e , ai nda ho je , e m uma e xpo si çã o de a rt e c onte mpo râ -
como inato, não como um exercício árduo de conhecimento e de elaboração ne a , not a mo s a nec e ss i da de de e nqua dra rmo s a s o bra s co mo des e nho ,
contínua. A ideia sobre a cri atividade co mo um "dom" indiv idual, const ruída pi nt ura, e sc ultura , fo to gra fi a, c inema, c olagem.
na a rte clá ssi ca e expandida so cialmente, ainda persist e nas esc olas , em Se pe nsa rmos que as di fe rente s modalidade s da arte tê m co nto rnos
especial da Educação Infa ntil. Encontramos, em pla nos de ensino, objetivos def inido s, co rremo s o ris co de elabora rmos o tra ba lho peda gó gic o ali nha-
tais como "desenvolv er a criatividade". do co m as v is õ e s ma is t ra di ci o nai s de a rt e . É c o mum no s de pa ra rmo s ,
Na prática, professores acabam apenas disponibilizando materiais e fa- em es co la s, c om pro po st as que t êm, como po nt o de parti da , os mat eria is
zendo algumas perguntas para que as crianças desenvolvam a sua dimensão ou as linguagens t ra di ci onai s da arte . As si m, na s egunda -f eira é o di a da
criativa . Basear -se no press upost o de que to das as crianças pequena s são argi la , na t e rç a da t inta , na quarta da e sc ultura , e tc . Ou, ent ão , de se nho
potencia lmente c riativas induz à formula ção de propostas pedagógicas com
poucos desafios. Crianças, assim como adultos, precisam ser aguçadas, de-
1 Para ver outros artistas que fizeram experimentações com colagem, acessar: http:/lenciclopedia.
safiadas, para serem ainda mais criativas. itauculturai.org.br/termo369/colagem.

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no pri me iro bi me s tre , pi ntura no s egundo . Ass i m c o mo o s a rt i st a s c o n- e pi nt ura a s e re m e xplo ra do s pa ra pro duzi r li nha s , ma ncha s e borrões.
t e mpo r â ne o s ro mpe r a m c o m a "ri gi de z da s li ngua ge ns e ma t e ri a i s ", é Impo rta nte da r-s e c ont a de que nã o bas t a a e xi s tê nci a de mat e ri a is que
impo rt a nt e que a e s c o la s e a t ua li ze e bus que o ut ro s mo do s de pe ns a r ofereçam possibilidades gráfi co-pictóricas, é necessário pensar na sua uti-
e pla ne ja r o propo s t a s pe da gó gic a s e m a rt e na Educ a ç ão I nf a nti l. Uma lização e exploração pelas crianças na perspectiva de que as linguagens da
pintura re aliza da pela s criança s na se gunda -f eira po derá se rvi r de supo r- arte expandiram s eus li mit es.
te pa ra um de s e nho e m ca rv ã o na t erç a -f e i ra . Uma c o la ge m po de v i r a Le mbra mo s que , mes mo a art e t e ndo a bo li do a s f ront ei ras das li n-
se r pi nc elada, des enha da . gua ge ns , é ne ce ss ário que as c ri ança s pe rc ebam, e xperie nc ie m e explo-
0 impo rt ante é o po rt unizar à s cri ança s no va s expe ri ênci as e i nv en- rem si tuaçõ es de aprendizagem com as diversa s linguage ns, co mo indicam
çõ e s c o m o s ma te ri ai s , sem de li mi t ar e m des e nho , pi ntura, es c ult ura , as Diretrize s Curric ula res Na cio nai s para Educ açã o I nfa nt il (20 10, p. 25 ),
ma s t ra ba lha ndo c o m a hi bridi za çã o das li ngua ge ns , f aze ndo "de se nhu- de modo a f avo rec er "a imers ão da s c ria nç as nas di fe rentes li nguagens e
ras" (desenho + pintura), "pi ntus e nho s " (pintura + desenho), cria ndo o progres siv o domí nio po r e las de vá rio s gêne ros e formas de expre ssã o:
inst alaç õe s de a ro ma s, s ons, s ensa çõ es , extrapolando qua lque r re fe rê n- ges tua l, ve rbal, plás ti ca, dramát ica e musi cal". Ente nde mo s que , para e x-
ci a que te mo s s o b a de no mi na çã o de "a rt e s v i s ua i s ", i ndo alé m da s li n- perie nc ia r a hi bridizaç ão das linguagens, é nec es sá ri o co nhec ê-la s, bem
gua gens t radici ona is da art e. como explo rar os di fere nte s mate ria is e a s ma rca s que pro duzem.
De s de Bra que e Pi c as s o , c ent e na s de a rt i st a s a mpli a ra m e mi sc i -
ge na ram as li nguage ns da a rte , e nt re e le s, o pint or I berê Ca ma rgo , que ,
na dé c a d a de 4 0 , ela bo ra v a t ra ba lho s c o m na nqui m, gua c he e c a ne t a Fitas adesivas , papel picado,
es fe ro gráf ic a. Em 19 88 , Elida Te ss le r, em s ua pri me ira expo si çã o indi vi - sabão , brinquedos : materiais ou s uportes?
dua l (1 9 88 ), pro duzi u de s enho s e m gra nde s f orma t o s , ut i li za ndo pa s t e l
e graf i t e pa ra pro duzi r e f e i t o s de t i nt a . Des enhos, c uja s ma nc ha s de - At é o i ní ci o do s é c ulo XX, a trí a de de ele me nt o s pa ra a pro duç ã o
no t a m p i nt ura . Na d é c a da de 9 0 , Nuno Ra mo s 2 de no mi no u "Qua dro s " de uma obra de arte se s ust ent av a no suporte (s upe rf íc i e onde se rá de -
obra s que sã o a cúmulo s de obje t os e mat e ri ai s , co mo para f i na , t ec i do , se nv olv i do o t ra ba lho c o mo t e la , pape l, argila, má rmore), nos ma te ri ai s
es pe lho , plás t ic o , met a l, re s ina , t int a e m uma superf íc i e. 0 res ult a do fo i (elemento s que marcam a s uperf íc ie , como ti nt as, c arvã o, gi z) e no s ins-
uma e spéc i e de "pi nt ura t ridi me ns i ona l" o u "pi nturarele vo ", o que di fi c ul- trume ntos (objetos que este ndem as habili dade s manuais como pincel, for-
ta e nquadrá -la s e m t e rrit ó ri o s rí gi do s da pi nt ura o u e sc ult ura . Ta mbé m mão, es pátula , alic ate, t esoura ). No entanto , assi m como as fronteiras das
Erwi n W urm t ra ns f o rmo u o bje t o s do c o t i di a no e m c o rpo s huma no s , um li ngua ge ns da a rte f ora m ro mpida s, t ambém o f o ra m as de li mi ta ç õe s do s
mis to de pe rf ormance e e sc ultura, c onvo ca ndo a parti ci pa ção do públic o. element os consti tut ivo s da a rte . Um s upo rte é material, é inst rument o. Um
Além das produç ões e e xpe rime nta ções dos artist as que podem s ub- material é s uporte , é inst rume nt o.
sidia r no sso pens amento pedagógic o, encont ramo s ho je materiais , co mo o 0 que co ns i de ra mo s s upo rt e ? Pe dra s , c o mo no s mo s t ra Bez Bat-
lápis aquarelado, o pastel oleoso ou seco, o carvão, o lápis dermatográfico, ti , a s ma de i ras , c o mo Ma uro F uke e F ra ns Kra jc berg, a s bo ne c a s e bi -
ent re outros, que po ssi bi lit am trânsit os e experiment aç ões e ntre des enho chi nho s de pe lúc i a, c o mo Li a Me nna Barreto , o s o bje t o s , c o mo Ne ls o n
Lei rner, os bri nque do s, c omo Sa ndro Ka, o s abão das i ns ta la çõ es , co mo
2 Ver informações de artistas e obras aqui citados nas referências deste livro.

Ed i t o r a M e d i aç ã o 18 19 Ed i t o r a M e d i aç ã o
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÂO I NFANTI L Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho (Orgs .)

Nuno Ramo s, os li vros, co mo W a lmo r Correa , móv eis , ute nsí lio s domést i- A idei a de us a rmo s fi t a s ades iv as e m uma a ç ã o e duc a t i v a e de
co s, a li me nt os , ro upa s e ca rros , co mo Erwi n W urm3, e ntre ta nt os o ut ro s pe s qui s a f o i i nspi rada na e xpo s iç ã o "Mil e um di a s e o ut ro s e nigma s4 ",
ma te ri ai s de que o s arti st as s e apro pria m e transf orma m em s ua s obra s. de Re gina Silveira (2 011), de trabalho s em plotter. A ide ia da aus ênci a de
São mat eri ai s que pas sam a s er supo rte e a própri a o bra. supo rt e , a po uc a i nti mi da de que a s c ri anç a s t i nham e m li da r c o m e s s a
Quando es s es ma te ri a is -s upo rt e s-ins trume nt os ut ili za do s pelo s ar- ausência e a ut i li za ç ã o de um mat eri al co la nt e que ra ra me nt e ut i li za -
ti s ta s e ntra m nas es c ola s c omo ma te ria i s de "art e"? Ao e labo ra rmo s a s va m co mo "mat e ri al de a rt e s", impulsi o na ra m nos sa c ria çã o e m to rno de
propos ta s, é impo rt ante pe ns armo s que a a rt e tra ns põ e a te la branca o u aç õe s e duc at iv a s. No ss a i nt e nç ão fo i que e las ti ve s se m a o po rtuni dade
as fo lhas de pa pe l A4 , que há uma s éri e de po s si bi li da de s de s upo rte s , de e xplora r e de s e a propria r de o ut ro s ma te ri a is , perc ebendo que qual-
em t ermo s de f o rma t o s, mat e ria i s , c o re s , t a manho s. Qua l a re aç ã o da s quer um é úti l para a realizaçã o de sua s produçõ es. Em o utra situação pe-
cri anças a o o fe rec ermos c omo s uport e, po r exe mplo , plá sti co bo lha, Pe r- da gógi c a, cri a nç a s que f reque nt a va m o Espa ç o de Arte Azul Ani l produ-
fex, ba lão , peda ços de madeira, are ia da prai a, pedaci nhos irregula res de zi ra m c om fi ta is ola nt e "de s enho s " em grandes fo rma to s nas pa re de s da
papé is, fi ta crepe? E s e retiramo s o suporte e of ere cermos ape nas es ses escola. A desc onstrução da perspectiv a e a pro jeção de objet os da art ista
mate ria is, como f ita cre pe? também serviram de ins piraçã o para que a s c ria nça s produzi sse m o bje tos
Em uma da s no s s a s pe s qui s a s : "Conve rs a çõ es : mat eria is expres - em i s o po r e a ra me e o s des e nha s s em a o s o l e m di f ere nt e s mo me nt o s ,
si vo s e c ri ança s " (2 01 1 a 2 0 14 ), co m cri a nça s de quat ro e c i nc o ano s , perce be ndo que as s ombras s ão modif ic adas pela inci dê nc ia da luz.
ofe re cemos a e las pe que no s pa pé i s c o lo ri do s de f o rma s irregulares e Em rela ção aos materiais, po de mo s a f i rma r que um dos maio res
fit as adesi vas c olo ridas . Quando entre ga mos o ma terial, as cri anças pe r- ensi na me nt os da arte de ho je é : qualquer material é material . E ele pode
gunta ra m: "onde c o la mo s? " Pro ble mat i zamo s, e nt ã o , c o m e la s a ne ce s - se r re a pro v ei t a do s empre e de fo rma i nus i t ada . No e nt ant o , a s e s c ola s
si da de de t ere m uma s uperfí c ie c omo s uport e e pe rgunt amo s se nã o era co nti nua m f o rne ce ndo lis t as de ma t eri a is tra di c io nai s , às ve zes de alt o
0- po ss ív el e la bo ra re m suas f orma s se m uma f olha de pa pe l. A parti r de ss e cus to para as ins ti tui çõe s e f ami lia re s e de pouc o i nte re sse e re ndi mento
de s a f io , e las c ri ara m fo rma s i nus i ta da s , lúdi c a s e mui t o di f ere nc i a da s expre ss iv o pa ra a s c ria nç a s. Ao e labo ra rmo s a s pro po s ta s de a rt e para
ent re s i. També m produzi ra m f o rma s humana s que de no t a va m mo v i me n- as cri anç as , é import ant e pens armos : a a rt e ultra pas s ou a t e la bra nc a ,
to . Em o ut ra s i t uaç ã o da pe s qui s a , fo ra m di s po ni bi li za da s ape na s f i t a s as folhas de pape l, a forma ret angular, abri ndo -se a vá ria s poss ibili dades
ade siv as colori das , e a me sma pe rgunta fo i repe ti da pelas cri anç as. Re s- do us o de ma t eri ai s e e s pa ç os . Ale rta -se que purpurina , lant ejoula, EVA
po nde mo s que dev e ria m pro c ura r c o is a s e luga re s onde po de ri am c ola r tê m co m po uc as pos s i bi li da de s e xpre s s iv a s , e mbo ra um ce rt o mo di s mo
as f i ta s. Po r a lguns mi nuto s , olhara m a s ala, as pa re des , o s objet os , o s de seu us o nas esc ola s. É i mpo rta nte re ver o uso de sse s mate ria is e s eu
es pa ç o s v a zi os . Em s e gui da , um me ni no f o i para a fre nt e do e s pe lho e espectro expre ssivo.
co me ç o u a c ort a r pe da ç os gra nde s de f i t a e pa ss o u a c o lá -lo s , pro du- Ta mbém se de ve le va r e m co nta f o rmat os , c ore s, t e xt ura s, c o ns is -
zi ndo f o rma s , de po i s o ut ras c ri a nç a s v a s c ulha ra m o s lo ca is da s ala e tê nc ia s , gra mat ura e t ama nhos dos s upo rt es c o nv e nci o na is , co mo , por
inic ia ra m suas c ompos iç õe s em dif ere nt es s uperfí ci es . exemplo , o s pa péi s. Na pe squis a ref eri da a nte rio rme nt e, of ere ce mo s à s

' Ver informações de artistas e obras aqui citados nas referências bibliográficas deste livro. http: /lwww .iberecamargo .org. br/site/uploads/multimediaExposicao/190920123444_Regina%2OSil-
veira%20-%2OMil%20e%20um %20dias%20e%20outros%2oEnigmas. pdf.

Ed i t o r a M e di a ç ã o 20 21 Ed i t o r a M e d i aç ã o
ARTE CONTEMP ORÃNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho IOrgs .)

cria nç as di fe re nt e s ti po s de pa pé is , co mo c a ns on, s ulf i t e, t e la do , ma n- Ho je o s art i st a s , a o li da r c o m ma te ri ai s inus it a do s, c omo fuma ça , ge lo ,


te iga , duplex, c o uc hê , kraf t , s eda , c elof a ne , jo rna l, pá gi nas de re v is t as , cé lula s f ot o elét ric as , marés , roc has , v idro , s e de dic am a ent ende r c omo
de gui as t ele fô ni co s, pa pe lã o. Também dis po ni bi lizamos papé is de co re s ta is mat eria is rea ge m. Para ta nt o, pe squi sa m, t es ta m e proc uram des co -
varia das , e mui ta s v ezes as c ria nç as os pint av am pa ra , depoi s de a t inta brir suas pot enci alidades de uso.
seca r, t raba lhar com mat eria is gráfi cos , co mo c arvã o, lápis , pa stel sec o e Po de mo s perc orre r junto às c ria nç as os me smos ca mi nho s inv es ti -
oleo s o. Na mai o ri a das propos t as , pro curamos fugi r do f orma t o re t angu- gat iv os dos a rt is ta s co m argi la , pa pe lã o, a ra me , te ci do , ge lo , arei a, boli-
lar, of erece ndo fo rmas alea tó ria s, geo mé tri ca s, muit o pe quenas ou mui to nha s de gude, a li ca te , es pá tula de si li co ne , grav et os , es puma , entre ta n-
grandes . Muita s ve zes a t ransformaç ão dos papé is foi fei ta pela s próprias to s o utro s mat e ri a is co nte mpla do s no s pla neja me nto s , i nv e st i ga ndo se u
cri ança s que o s corta va m ou ra sgav am e brincav am de adi vi nhar o si gni- func i o na me nto e m di f e rent e s s i t ua çõ e s . Se me lha nt e a o mé to do c i e nt í -
fic ado da s fo rma s obti da s. fi c o, é f unda ment a l a obs erv a çã o , a fo rmula ç ão de hipó t es e s, a e xperi -
Forma s a le ató ri as, c ores e texturas dife re nt es do s papéis dese nc a- menta çã o, o e nt e ndi me nt o pe la s c ri a nç a s do que f o i e xpe ri me nt a do e ,
de ia m os pro c es so s de c ria çã o. 0 t o que em uma s upe rf íc ie muit o li sa o u po r fi m, a dis cuss ão de sua s pe rgunta s e co nc lusõ es .
áspera, uma c o r i nus i t a da o u u ma f o rma que le mbra um c a c ho r ro c o r- Qua ndo a s c ria nç as s e la nç a m na s i nv es t i ga ç õ es mat é ric a s , nós,
re ndo se rv em pa ra i mpuls io na r a ima gi na çã o da s c ri ança s. No ta mo s que adulto s, po de mo s a pre nde r c o m s ua s de s c o be rt a s . É i mpo rt a nt e pre s -
nã o era nec e ss ári a uma i ndi ca çã o t emát i ca pa ra que ela s se "liga ss em" ta rmo s a te nç ã o no que di ze m qua ndo pro duzem s e us tra ba lho s: "Qua n-
ao traba lho. Ao co nt rário , obs ervamos que ins ti gá -la s às de sco be rta s em do pas s a á gua, f ic a bo rra di nho", di z Da ni ele so bre a uti li za ç ã o da á gua
rela ção ao s mate ria is, pe squisá -lo s, ente ndê -lo s desc obrir sua s poss ibi li- junt o a o pa st e l s ec o. "Co m o lá pi s de pont a c olo ri da, é co mo pint ar co m
dade s po de s er a via pela qual e las expa ndem sua s li ngua gens plá stic as e vá rio s lá pi s", e xc la ma J uli a ao t es t a r o lá pis mult ic o lori do. "F a z c o s qui -
singula ri za m modos de expre ss ar pontos de vi st a. nha ", o bs e rv a Ni c o la s s o bre a s de s c o be rt a s da pi nt ura e m s ua s mã o s
lê-
Tesouras e pinc éis são ins t rume nt o s tradi ci o na lme nt e prese ntes co m o pa st e l se c o. Ta i s de s co bert as e co nst a ta çõ e s das cria nça s a t ra -
nos almo xari fados das e sco las. Des de que não causem risc o à s crianç as, ves sadas pe la ludici da de poderã o auxili ar profe sso re s a me lho r conhec er
outros i ns t rume nt o s s e me lha nt e s po de m s e t o rna r gra nde s a li a do s de os ma t e ri a i s e a f o rmular no v a s propo s ta s pe da gó gic a s a part i r de ss a s
sua ima ginaçã o. Podem ma nus e a r um gra mpea do r, po r e xe mplo , para de sc obe rt as i nfa nt is .
pro duzi r li nha s em uma s upe rf íc i e , uma e s pá t ula de s i lic o ne pa ra c obri r
superf íc i es co m t i nt a , pro duzi ndo e f e it o s dif e re nte s do s pro duzi do s c o m
pincé is e rolinho s de e spuma . Um perfura do r de pa pe l po de rá s ervi r pa ra Temas e narrativas infantis
a rea lizaç ão de "des enho s" pe rfura do s, e os pe queno s círculo s, re sulta n-
tes da s perfuraç ões , poderã o s er aprov ei tados pa ra enc obrir supe rfí cie s. A arte oci dent al, at é o iní cio do séc ulo XX, fo i marca da por temas, a
Le mbra mo s que , des de que a a rte e xi s te , há inv es t iga ç ão so bre a mai oria de le s det ermi nados por aque les que a subs idi av am. As te mát ic as
ut i li za ç ã o do s ma t e ria i s . Art i st a s de t o do s o s t e mpo s t iv e ra m e t êm um mai s re co rrent es f oram a s religio sa s, mi to ló gi ca s, alegóric as , his tó ri ca s,
árduo tra ba lho para do minar a ma té ri a . Os re na sc ent is ta s t inha m dif ic ul- os ret ra to s, a vi da c ot idi ana, a nat ure za , a na tureza-mo rt a. A arte , únic a
dades em quant idade de ó leo de linhaç a para f azer as ti nta s, de do sa r di- font e i magéti ca, realista , at é a invenção da fo tograf ia em 182 6, formulava
luente s e pi gmento s para obte r o brilho das superfíc ies ou cores vibra ntes. mundo s, narrav a a vida so b det ermi na dos ponto s de vi st a.

Ed i t o r a M e d i aç ã o 22 23 Ed i t o r a M e di a ç ã o
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO INFA NTIL Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Sahalla de Carvalho (Orgs.)

A t radi ç ão de t e ma s , as narra ti v a s e a a rt e c o mo "me ns age ns" a o Sobre as narrat iva s dos art ist as, Cant on (p. 13 9) obs erv a que apre-
público ainda fa zem parte dos c once ito s de art e da mai ori a da s pe ssoa s e se nt am uma narra ti va f ra gmenta da , indiret a, que des co ns trói pos si bi li da -
se fa ze m pre se nt es quando es co la s des envo lve m propost as e m art e sus- de s de uma le i tura úni ca e li ne a r. A e s s e proc e ss o de u o nome de "na r-
te nt adas na i ndic a çã o te má t ic a. "De s enhe m a f amília , a mãe , os irmã os , ra ti va envi es a da ". Fa ze ndo uma a nalogi a entre o s mo dos na rrat iv o s do s
o pa s s ei o no pa rque, o o ut o no , um di a de c huv a " s ão s uges t õ e s re c o r- arti st as de hoje e a s produçõ es v is uai s da s c ri ança s peque na s, po de -s e
re nte s . A a rte de no s so t empo a ba ndo na t ai s t e mát i ca s re pre se nta t iv a s dizer que e xi ste m semelhança s e nt re os mo do s de narra r, de ntre ela s:
e na rrat iv as , se gundo Ca nt on (20 13 , p. 13 8-13 9). Em pes quis a re alizada
co m s et e nt a a rti st a s bra s ile iros da ge raç ã o de 19 9 0 a 2 0 00 , e le apo nt a - ambos evocam situações;
- não as traduzem de forma análoga ao que é visto;
para as te máti cas de suas obras:
- criam e revelam universos além de realidades e experiências imediatas;
- enfatizam ou minimizam aspectos das suas experiências;
As re laçõ e s de dualidade entre ide ntidad e e alteridade , corpo e e sp írito,
- apropriam-se de objetos dando outros sentidos a eles.
te mp o, his tó ria e m em ó ria, a te ns ão entre e s p aço p úb lic o e p rivad o e a
busc a d e um a atuaç ão polí tic a fo ra dos lim ite s partidários (...) O s te mas se
As c ria nç a s, c o mo o s art i s ta s a t ua i s , nã o tê m o bri ga ç ão c o m f o r-
estruturam a partir d e arranjos f ormais e c onstruçõ es c once ituais : fo rm am
narrativas não line ares , e nvie sadas , que levam e m c onta a so fisticação da mas f idedigna s ao rea l obs ervá ve l, t êm c ompromiss o co m se u imaginário
estruturaç ão de m ate riais e me io s. e c om s ua s fo rma s si ngulares e envi es adas de mos trarem se us mundo s.

Segundo o autor , esses são temas que desenv olvem em seus traba-
lhos a partir de discussões atuais às quais eles têm v inculações . Ac redit o Proposições
que podemos nos apropriar dessa ideia em situações pedagógicas , tentan-
do entender as culturas da infância e as crianças como produtoras de cul- De mui t as mane i ra s , o mo do c o mo a art e é co mpre e ndi da pa s sa a

tura (SARMENTO , 2 0 0 3 ), suas lógicas , formas de pensar , preocupações, ser a ref erênc ia para o pensamento pedagó gico nos dife rente s ní veis edu-

relações afetivas , seus imaginários, modos de apreensão do mundo trans- ca ci o na is , e m e spe ci al pa ra aque les di ri gidos à inf ânc ia . Aguirre (2 0 12 )

formados em " temas ". É importante evitar que ações pedagógicas estejam obs erv a que a mai or pa rte das pro po sta s de a rt es nas e sco las e museus,
dirigida à i nf ânci a, ai nda te m c omo orie nta çã o a repro duçã o dos padrõ es
sustentadas em temas adultos a serem registrados pelas crianças, mas,
sim, temas originários das experiências e v iv ências infantis , para que seus hegemô nic os e i dea lizado s da his tória da art e e que, no s c ont ext os esc o-

saberes possam vir à tona , desencadeando -se processos imaginativos. Se- lares, no ta-se a aus ênc ia de produçõe s da a rte do noss o t empo.

gundo Lima e Lima (20 14, p . 825), se o que define as ações pedagógicas A art e do pa s sa do que a i nda s e f az pres e nt e na Educ aç ã o Inf ant il,
da s f olha s brancas reta ngulares, da s ele ç ão e utili zação dos materiais
es ti ve r pa u t a d o n o q u e lh e s f a l t a e m r e l a ç ã o a o a du l t o , n ã o e s t a r e m o s e i ns t rume nt o s t radi c io nai s , das indic aç õe s te má ti ca s, da necessidade
f a la n do de c r i a n ç a s r ea i s, ma s , si m , d e u m pr o je t o d e vi r a se r , do qu a l a de as cri anç as narrare m a lgo , da t e rri to ria liza ç ão rí gida da s linguage ns
i m ag em i nf an ti l es tá a us en te . En te nd er a s c u lt ur as d a i n f â nc i a , po r t an to , é gerando ausê nc ia de e xperi ênci as hí bridas, e nt re outros as pe ct os, e st ão
i m pr es c i nd í ve l, p oi s e la s vi a bi li za m n ovos s en t i d os p ar a a a ç ã o e du c a ti va .
des arti cula das do co nt exto de pro duçã o a rt ís ti ca c ont empo râ ne a.

Ed i t o r a M e d i aç ã o 24 25 Ed i t o r a M e d i aç ã o
ARTE CONTEMP ORÁNEA E E DUCA ÇÃ O INFA NTIL

Nã o se que r di ze r co m is to que a a rt e de t odos o s te mpos dev a se r


aba ndo na da o u esque cida. Mo ne t , Kandi nsky, Van Go gh, Porti nari, Di
Ca va lca nt i , Vo lpi , e t a nt os outro s a rt is t as c o nt inuam se ndo i mpo rt ant es , 2 A
ma s mi lha res de po is de les pro duzi ram obras dent ro de o ut ra c o nc e pç ã o
ARTE, INFANCIA, FORMAÇÃO DOCENTE
de arte. Mui tas e sco la s des co nhece m ess es o utros modo s de fa ze r a rt e.
E CULTURA NA ESCOLA
A a rt e c o nt e mpo râ nea po de s er uma da s pri nci pai s re fe rênc ia s e m
pro pos tas peda gógi cas na Educação I nf a nt i l, t e ndo e m vis ta s ua co n-
Rosa Iavelberg
ce pç ão i nt erro ga ti va , crít ica, lúdi ca, co nv i t e pa ra que o s e s pe c ta do re s
pa rt i ci pe m das obra s e m pensa ment os o u e m a çõ es . As pro vo c aç õe s da
art e c ont e mpo râ ne a suge re m uma pe da go gi a pro v o ca t i v a e m a rt e, pro -
pi c i ando a o po rt uni da de de a s c ri anç a s e xpres s a re m o mundo de fo rma
crít ica , s ens íve l, busc ando s uas própri as res pos tas so bre a v ida po r meio
de produç ões a rt ís ti cas s ingulares e c ontempo râ ne as. Às cria nça s a arte
do se u próprio te mpo !
A e sc ola é uma opo rt unidade ímpa r de co nt at o co m a a rt e no s anos
iniciais de Educação Básica (creches e pré-escolas). No espaço escolar, as
crianç as po dem c riar, aprender e dese nvolv er sua arte por meio de experi-
ênc ias planeja das pe lo s s eus prof ess ore s, po r e sco lhas que fa ze m diante
do s mat e ri ai s o f ere ci do s e pe la int era çã o c om os c o le gas . Ne s te te xto ,
vamos a bo rdar que st õe s c onte mporânea s do c ampo da s arte s vi suai s no
segme nt o da Educa çã o Inf anti l.
É certo que as crianças de zero a s eis anos são livres para desenhar,
modelar, c ola r, ca ri mba r, co ns truir, e mpilhar ou just apor co isa s, entre o u-
tras poss ibilida des cri ativ as, f a ze ndo us o do c o rpo e m a ç ã o e u s a ndo
dife rentes ma teriais co mo mei os de aces so a um mundo si mbó lic o i nes go-
táve l de jogo e expres são artís tic a. Contudo, a libe rda de de manife sta ção
e de construção depe nde de o rientaç ões didá tica s adequa das para que as
cri ança s po ss am v iv er a a rt e na e sc ola de modo auto ra l, s em s ubmi ss ão
a pro je to s a lhe io s à s s ua s nec e ss ida de s e po ss ibi li da des de c ria çã o no
campo c irc unsc rit o pe lo projet o c urri cular da e sc ola.
Um mo v ime nto co nst a nte de at ua li zaç ã o e art ic ulaç ã o e nt re t e ori a
e prá ti ca em a rte e educ a çã o é uma da s c ha ve s dos prof e ss ore s pa ra a
obse rva ção dos aluno s nos e spa ços educat ivo s. Essa di nâmica oco rre de

Editora Mediação 26
27 Ed i t o r a M e d i aç ã o
ARTE CONTEMP ORÁNEA E E DUCA ÇÃ O INFA NTIL Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Sahalla de Carvalho (Orgs .)

mo do e fi c az, quando os pro f es so re s a ss umem uma po st ura i nv es t igat iv a pelo s profes sores é considerada uma manif esta ção exó gena (de fo ra para
em re laç ã o à própria prá ti c a e uma po st ura re f le xiv a junt o a uma e qui pe dent ro). Nela co nfe re-se às cri anç as um papel de submis são , promove ndo
es co la r c ola bo ra t iv a que pro mov a o des e nv olv imento prof i ss io nal. 0 t ra - a re ali zaçã o de traba lho s se m a expres são genuína da infânc ia na s ala de
ba lho c o mpa rt i lha do e m e qui pe f a z da e s co la um luga r de ampli a çã o de aula , se m a liberdade nece ssá ria às cons truções art íst icas infant is.
co nhec i me nt o para o s pro fe ss o re s c om c ons ci ênc ia do i mport ante pa pe l A pos tura didá ti ca a ss umi da na orienta çã o mo derni st a fo i i mporta n-
que de se mpe nham ta nto na pró pri a forma ção c omo na das cria nça s. Ne s- te para desc onst ruir as base s do ens ino de arte na esco la t radi cional, que
se proce sso é ne cess ário que os gest ores est ejam int egra dos. prec oni zav a o treino de ha bilida des , a có pia de modelo s, o pree nchime nto
A concordâ ncia com e ssa forma de intera ção inves tigativa da equipe, e o c ont o rno de f orma s , o li ga -po nto s pa ra e nc ont ra r o s c ont o rnos do s
na qual t odos s e re sponsabilizam pela educ aç ão do s alunos , pe lo pró prio dese nho s, e ntre outra s. 0 us o da arte inf anti l, muit as vezes, est ava a s er-
avanço profissional e o dos colegas, necessita de tempos deliberados para a viç o da c oordenaçã o moto ra, co mo o a des tra mento da mão pa ra a a lfa be-
tematização e a orientação das práticas de sala de aula e da participação de tizaçã o, co nc ebe ndo-s e a c ria nç a c omo um ser pass ivo e m s ala de aula.
todos os agentes educativos em um grupo de estudos e análise das práticas, Na es co la renov ada, pass ou-s e a co mpre ende r o perío do que a nt e-
para que tal proposta se consolide como formação continuada, necessária à cede o Ensino Fundamenta l co mo não preparat ório des se, com obje tivo s e
constituição de um professor protagonista com postura autoral e inquiridora. demandas próprios às necessidades das cri anças. Nes se sentido , a ênfase
As ba se s t e óri ca s que no rte i am a prá ti c a didá ti c a do tra ba lho co m dos aut ore s da a rte -educa ção mo dernist a, que vi gorou até o fim do s a nos
arte na Educa ção Infantil advêm de aut ore s da a rte -educa ção , da á rea de 80 no Bra sil, ins isti u na liv re e xpre ssão, mes mo diant e de vários caso s de
arte e de educaç ão. Entre as produções bi bli ográfi cas , dest aca mos as de cria nça s que ma ni f es ta v am, prec o ce me nte , dif ic ulda de s e i ns e gura nça s
pensado res cujas aná lises teórica s pode m ser a ssocia das às experi ências nos momentos do fa ze r a rt ís ti co. Na époc a s e at ri buí a a prec ari edade do
de sala de aula. de se nv olvi me nt o cria ti vo a a spec to s psi co ló gi co s advi ndos de si tuaç õe s
Saber ver a criança e sua arte, co m orienta ções fié is às pro posições vivi das fo ra da e sco la, tai s c omo a esca sse z de experiência s importantes
da arte-educa çã o c ontempo rânea , pode evi ta r que duas te ndênc ia s a inda no c ot i di ano das c ri a nç as . De s s e mo do , co ube a o s a rte -e duc a do re s do
vigentes, na s quai s nã o s e c o nsi dera m a s i dei a s e prá ti c as a tua li zada s período a i nve nçã o de pro pos tas para li da r c om tai s pro ble mas . Ess as se
da área, o corra m nas es co las bras ileiras : a livre-expre ssã o e s eu opos to da va m por me io de i nte rv e nç õe s que nã o i nc luí am a arte do s a rt is t as o u
(a ti vi da de s orde na da s pe la c onduçã o dos pro fe ss ores no pa ss o a pa ss o dos colegas da classe, pois a bas e das inte rpretações sobre as fa ltas cria-
das a çõe s artís ti ca s dos a lunos da Educaç ão I nfa nt il). A li vre e xpres sã o, ti v as ti nha ori ge m e m i nfluênc ia s e pre ss õ es ne gat i va s do me io so bre o
t a mbé m c o nh e c i da c o mo laissez-faire, fo i a pro po st a da a rt e -educ aç ã o mundo psíquic o da criança. Nã o s e c onsi derava , a ssi m, s e a ne ces sidade
modernist a e c rit ica da pe la aus ência de di re cio nament o. de i nt e ra çã o da c ri anç a e m s it ua ç õe s de e ns ino e a prendi zage m co m a
A li vre-e xpre ss ão si gnif i co u auto e xpre ss ão , c ujo paradigma re it era arte para ult rapa ssar as barre iras por ela enco ntra das.
que a a rt e i nf a nt i l é uma ma ni f es t a ç ão e ndó ge na (de de nt ro para fo ra ), As c ontradiç õe s te óri ca s do s pe ns adores da a rt e-educ aç ão moder-
que expres s a a s expe ri ê nci a s de vi da do s a luno s , s e m di a lo ga r c o m a s ni st a s e a ce nt uav a m no traba lho junt o ao s a doles c ente s , mas e las e xis -
produçõe s do s c olegas e dos artist as. Esse pa radi gma vigo rou forteme nte tiam des de a Educaç ão I nfantil. Muitas cri anç as desenhava m e stereóti pos
do s anos 3 0 em dia nt e e m no ss o pa ís , e te m funda me nt o no mit o da a rt e no s mome nt os de li v re e xpre s s ã o e t ambé m ha v i a de f as a ge ns e ntre o s
es pont â ne a e uni v e rs a l da i nf ânc ia . As cri a çõ e s do s a luno s c o nduzida s de s e nho s de c ria nç as da me s ma i da de . Ta l dif e re nç a era c omo s empre

Ed i t o r a M e di a ç ã o 28 29 Ed i t o r a M e d i aç ã o
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho (Orgs .l

ti

atribuí da a fa lt as ps ic ológica s do s des enhi st as, i ni bi çõe s ou baixo envo l- conte mporâneo s, c o mo Ma t t he ws (1 9 9 9 ; 20 0 3 ), sabe-se que, sem as
vi me nt o co m expe ri ênci as s igni fi ca ti va s. As di fe re nç as de oportuni da de s veredas que f oram aberta s, por mei o da co ra ge m que os educ adores mo-
educa ti vas c omo f at or de def as age m nã o e ra m le vanta da s, po is o de se n- de rnis t a s t i v e ra m a o e nf re nt a r a e duc a ç ão t radi c i ona l, nã o t e ri a m sido
volvimento de via s er es pontâ neo , nat ural e uni ve rsa l. concebidas as propo st as conte mpo râ nea s. Os arte-educa do res mo de rni s-
Para os moderni st as , as c ri ança s que nã o se e xpre ss av am não de- tas ac re dit av am que, po r mei o da educaç ão artí sti ca , s eria alcança do um
vi am s e r enco rajadas si mple s me nt e a t enta r des enhar o que nã o s abia m fut uro me lho r. A c ria t iv i dade e ra muit o v a lo riza da no perí odo . Se m i ss o ,
faze r, mas a i dent ifi car-se com o t ema mediante a me mória de s ua própria não s eria possível co mpre e ndermo s o re s p e i t o q ue s e de v e t e r c o m a
expe riê ncia co m ele (LOW ENFELD, 196 1). Por exemplo, diante de um a lu- cri ança e m te rmos de sua arte.
no que queri a de se nha r uma pra ia e dizi a nã o saber f azê-lo, o s pro fe ss o- A crença no de se nv olvi me nt o na tura l da a rt e da c ri ança e do jo ve m
re s po deria m i ns t igar a me mó ria da e xpe ri ênc ia , fa zendo pe rgunt as , t ai s f o i um ma rc o da s e s co la s mo derni st a s , ma s t e xt o s de a lguns autores
como: "Me cont a co mo era a praia em que você foi? A areia era gross a ou co nte mporâ neo s e m re la çã o à Educ a çã o Inf ant i l s uge re m que a c ri anç a
fina ? Ha via out ras cri anç as? 0 que v ocê lev ou para a prai a?" pequena se des env olv e ma is foc ada em doi s fa tores: na int era ção com as
De fa to, as propos tas criat ivas se davam com mais int ensidade e em pró pri a s i ma ge ns e c o m a s do s c o lega s (W I L SON; W I L SON; HURW I TZ ,
mai or número co m as c ri ança s no Ensi no F unda me nt al. Em f unçã o di ss o, 2004 ). Apesa r do ga nho de a bert ura para a inte raçã o co m a art e do s co le-
a li vre e xpre ss ã o pe rduro u na Educ a ç ão I nfa nt i l, ges t a ndo pro ble ma s e gas , dis corda mos dess a perspect iv a, poi s ela limi ta a aprendi zagem, uma
restrição de repe rtório a rtístico , que se revelava m nos anos subse quentes. ve z que a c ri a nç a ta mbé m di a lo ga c o m image ns do mei o que a a fe t am e ,
Co mo v imo s , qua ndo a nã o i nt e rv enç ã o do s prof e s s o re s e a c ri a - em de corrê nci a, es sa s i nf lue m na sua a rt e.
ti vi da de e ra m impe rat iv as à liv re e xpres sã o, def endi a-s e a li be rt aç ão da Sa be -s e que as narra ti v as , as i lust ra çõ es de liv ro s, a s imagens te -
cria nç a da s prá ti ca s di dá ti c as c entralizado ra s da e sc ola t ra di ci onal. E a le vi si va s e as vi sualidades à s qua is a s cri ança s tê m ac es s o re flet em-s e
arte -educa çã o mo de rni st a t ra zia a s i as va nta ge ns e a s upe rio ri dade da em s ua s ima gens de s de a Educ a çã o Inf a nt i l. Is s o nã o a nula o de s enho
sua propo sta em re la ção ao pa ssa do, s eguindo a es tei ra do s a rti sta s mo- ge nuí no e a ut o ra l, po i s a ma rc a do co nt e xt o c ult ura l e da é po ca é f a t o
dernos , que deram as co sta s à a rte ac adê mic a. no e st udo da a rt e na inf â nc i a . Ho je já t e mos doc ume nt a das i ma ge ns de
A a rt e-e duca ç ã o mo de rni s t a e s t á expre ss a no pensa me nt o, ent re mais de um s éculo de trabalho s art ístico s de crianç as. Es ses a rquivo s nos
out ro s, de L owenfe ld (1 96 1), que f ez uma anális e compa ra ti va da a rt e na traze m uma pe que na hi st ó ri a da a rt e i nf a nt il aut oral que não é res ult ado
educaç ão : dife re nça e ntre a i mit aç ão (es co la tradi cio na l) e a a uto expre s- de c ópi as como f ora m as re ali zadas na esco la tra dic ional.
são (esc ola modernista )'. A prát i c a da li v re e xpre s sã o pro punha a libe rt aç ã o da art e i nf ant i l
0 valor da arte-educação mode rni sta é indiscutível. Seus marcos dos modelos da arte a dult a, pondo f im a os pro gramas da es co la t ra di ci o-
são datado s e, apesa r da nega ção de sua s ide ias e prá ticas entre aut ores nal que co nc ei tua va a infâ nc ia co mo impe rf eit a enqua nt o não a lc anç as se
a habilidade dos artis tas mirando-se no espelho desse s, nublando a própria
ident idade da infâ ncia . Fo ram v ento s de força extrao rdinária que deixaram
' Pensamento submetido ou dependente versus pensamento independente; expressão que segue um mui to s de se us so pros na s te ori as e prát ic as co nt emporâneas . Alguns de
nível que não é próprio e sim alheio versus expressão que está de acordo com o nível pessoal da
criança ; frustração versus liberação ou descarga emocional; aderência a formas estabelecidas versus se us pilares f o ra m de rrubado s, o ut ro s trans fo rmados o u s uperados , ma s
fácil adaptação a situações novas; e dependência, rigidez, inclinação a seguir outros versus progresso,
bom êxito e felicidade (LOWENFELD, 1961, p. 26, tradução nossa). també m houve inova çã o.

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0 e nsi no e a aprendizagem de arte co m a rt e, ou se ja , que co ns ide ra um c ampo mai s va st o e co nt extualizado so bre po ét ic as e spec íf ic as é re-
a arte co mo obje t o de c onhe c ime nt o na e sc o la , é um s e gundo mome nt o queri do na s int erve nçõ e s di dát ic a s. Ta l ca mpo da a ç ão do s pro fe ss o re s
que s e inst ala no Bra si l e em mui to s outros paí se s, no fi na l do s anos 8 0, se est ende a obras de to do s o s t empos e luga res , inc lui ndo os objet os da
te ndo c omo pre ss upo s t o que a a rt e da c ria nça s e a lime nt a da pro duç ã o art e co nt empo râ ne a.
soci al e hist óri ca da arte e da cultura v isual. Nessa trilha das inovaç ões, a simulação ocupou o lugar da releitura e
Nes sa é po ca , as c ri anças pas sa ra m a freque nta r muse us e i ns ti tui- de uma moda lidade de interpreta ção das obras que delega ao aluno o papel
ções culturais e a i nteragi r c om o bra s o rigi nai s, come çaram a es tabele cer de lei to r, independente mente da a ção a rtí st ica c ria ti va no at o de co mpre-
co nt a t o c o m re pro duç õ e s na sala de aula , f a ze ndo le i tura s e rele i tura s ende r a s ques t õe s que os art is ta s s e c o lo c aram. 0 aluno pa ss a a le r a s
de i ma ge ns . Na Educa ç ã o Inf a nt il, po r e xe mplo , propunha -s e c o mple t a r obra s si mula ndo, "f a ze ndo de c o nta " que é o a rt is t a . A di f e re nça nã o é
se gment o s de re produç õe s de o bra s de a rt i s ta s co la dos no pa pe l pe lo s sut il, é subs tantiv a e mui to perti nente à Educa ção I nfa nt il, ca ra cte ri zando
profess ores e também falar e agir sobre i magens de art e trazi das à s ala de um no vo mo me nt o e m a rt e-e duca ç ão .
aula. Os a luno s i a m a mus e us c om c ade rno s no s qua is fa zi am regi s tro s Sof ia, ci nco anos, produz f ormas re dondas e circulare s de pape l c o-
sobre as o bras observa da s. Po rta nt o, a arte era um objet o a ser a pre ndi- lorido , brinca ndo co m e la s c omo puls eiras, chapé u, e de out ra s mane ira s,
do pa ra dele o bte r-s e a lime nt o pa ra os mo ment os de cri aç ã o pes s oa l. 0 po de ndo -se dize r que e la "e s tá na o bra ", v i v endo uma i me rs ã o po é ti c a .
fazer , a le it ura da i ma ge m e a ref lexão s obre arte pa ss am a se r o s ei xo s 0 mo vi mento e a parti c ipaç ã o co rpo ra l s ão f undame nt ai s nessa imersão,
de aprendi zagem si gnifi ca tiv a des de a Educa çã o I nf ant il, a s cri anças s ão o que c o i nc i de c o m a c ara ct e rís t ic a da cri anç a de ss a f a ixa et á ri a . As
convidadas a fazer e a falar , a ver imagens e a inventar histórias sobre elas cri a nç a s c o nta m hi s t óri a s e ide nti f i ca m sua s e xperi ê nc i a s na s i mage ns
indi vi dualme nt e ou lado a la do c om s eus pa re s. que ve e m, po rt a nt o , s e c o lo c a m c o mo pa rte da e xperi ê nc i a do a rt i s t a ,
A s e pa ra çã o e nt re o s a pre ndi ze s e o o bjet o de e s tudo , "eles e as pe rf ormer no c as o, guarda da s a s di f erença s nas po ss ibili da de s de apre -
obras ", f oi c lara ne ss e pe rí odo , ma s fo i se ndo s ubst it uí da , gra dualme nt e, ensã o do mundo e nt re adulto s e c ri a nç as .
pe lo que no me a mo s de "ele s na s o bra s ", me rgulha ndo -s e nas po é t i c a s
do s arti st as . Essa ime rs ã o pa ss o u a suge ri r no v os pro c edi ment os didá -
ti co s a pa rt ir de 20 10 , c o m o f a ze r a rt e nã o ma i s pa rt i ndo da s o bra s Acreditando no potencial da criança
es t uda da s , ma s de que s tõ e s a elas subjac e nt es , de idei a s que o artista
Pa rt indo -s e de s sa c once pç ão , ca be ao s pro fe s so re s de Educação
se c o lo c o u, que não po de m s e r re v e la da s po r s ua ma t eri a lida de ou po r
simples medi aç ão de i nf orma çõe s di ante de la s. Infa nti l a cre dit ar no pot enci al cri ati vo das crianças. Em ve z de o bse rva r o

Essa nova conce pç ão sugere que os co nt eúdo s da s obras serão dese nvo lvi mento art íst ico espont âne o, ali mentar sua gê nes e, ou seja, co-

as s imi la dos por uma f o rma es pec í fi c a de a ç ão dos aluno s s o bre ela s, a nhe cer c omo a cria nça pass a de um mo mento do s eu saber artí sti co pa ra
outro ma is a va nç ado. Em outras palav ra s, o s prof es so re s prec is am c on-
"s i mula ç ão ", co mo a pro po s ta de Thi erry de Duv e (2 0 1 2)2 . A pa rt i r da í ,
siderar a relação entre ensino e aprendizagem pa ra plane jar a s intera ções
que pro move m o pot enc ial de cri ação artíst ica do s aluno s. Não bast a o fe-
2 Ao contrário da imitação , a simulação não freia a invenção , ela está fora do plano formal . Seu papel rec er ma teria is e dei xar f aze r, me smo nas at ivi da des nas qua is a criança
não é disciplinar, é o de despertar os sentidos latentes cuja fonte não está no indivíduo e sua criativi-
dade, mas na tradição simulada (DUVE, 2012). pode fazer arte livrement e. De ve-se obs ervar e di aloga r com ela, obse rvar

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se us proc es so s e pro dut os . É nec es s ário c o mpre ender a i mpo rt ânc ia do da mão nos intervalos do desenho, mostrando que os estava amassando.
ince nti vo à a uto nomia e à inves tigação da criança, po r meio da promo ção Is s o de no t a que a ss i mi lo u a lguma s fo rma s c ult ura i s em re la ç ã o ao us o
de se u prot agonis mo cria do r, a po ia ndo-a nas a rt es , na s de ma is áreas da dos ma teriai s. Ela expre sso u o que podi a e o que nã o podi a s er fei to com
educa ção escolar e na v ida. aquele s lápis. Tal conhe ciment o foi co ns truído por mei o de inf ormaç ões e
A int ençã o do fazer a rtís tico , po r ve zes, nas ce da intera ção com tra- inte raçõ es no meio, na casa ou na esco la.
balhos de outras cri ança s. Obs erva mos , por e xemplo , os es forços de uma Nas sua s a çõe s, a me nina mostrou liberdade no uso do s ma teriai s e
menina de um a no e dez mese s que pa rec ia es tar f aze ndo um c írc ulo c om na c ria çã o das fo rma s redondas . 0 i mpo rt a nt e é que fe z i númera s te nta -
um fio de a rame flexí vel, e ncapa do co m plá stico , porque ha via e ncont rado, tiv as pa ra aprende r c ois as no va s a part ir do que já sa bia , rec onhec endo,
entre os lápis de cera de sua casa , um aro desse material feito em dias ante- em primei ro luga r, que nada est á pronto e , a s egui r, que t udo pre ci sa s er
riores por sua prima de oito anos. Ela vivenciou os atos de construção da pri- construído. A c ri a nç a de nos s o re la t o já sa bi a pe di r a juda a o s a dult o s
ma e, ao observar o resultado daquele processo construtivo, desejou fazer o pa ra res olv er pro ble ma s proc edi me nt ai s qua ndo prec i sa va , ma i s adia nt e
seu aro . Essa tarefa não é fácil para uma criança de sua idade. É preciso unir irá pedir ajuda aos cole gas.
as pont as e enrolar a s e xtre midade s. No c aso , a aprendi zagem se dá pela Insistir em fazer sozinha é o que predomina nas ações de uma criança
desc obe rta e pela reso luçã o de problemas. A menina fez inúme ras te nta ti- criat iva e prot agoni sta. A persistê ncia é o c aminho da criaç ão, é o av esso
vas, mas não conseguia fechar as pontas. Como chamava o círculo de balão, da de pendê nc ia, é a abertura à liberda de, que é a condi çã o nec es sária à
passou a desenhar formas circulares, falando a palavra balão, enquanto gira- ação artí stica. Em relaçã o à auto nomia no uso dos materia is, essa criança
va seu lápis de cera no papel (redondez no desenho) e a cantar: roda, roda, ta mbém mos t rou que do mi na va gi ra r o f i o pa ra f a ze r o c í rculo , ma s nã o
roda, pé, pé, pé (redondez na letra da música), enquanto desenhava o balão. sabia co mo pre nder as duas ponta s para f echá-lo, ela e st ava , portanto, a
Esse fa to rev ela o e xtraordinári o es forço de uma cri anç a ness e per- me io ca minho da so luç ã o. Re it e ra mos que a t a re fa de que m ac o mpa nha
f, curso de c riaçã o. 0 profe ssor nada fez por e la, o bserv ando-a por um longo tais atos investigativos da criança é apoiá-la, deixando-a experimentar para
tempo. Por fim, após v ári as t enta tiv as e m relaç ão ao f io, ela dec idi u fa zer que pos sa conf iar no própri o pote nci al. Pode-s e fa zer algumas i ndi caç ões
um enrola dinho , que fic ou co m o vo lume de uma bo li nha . Ela nã o desi sti u, ou perguntas, mas nunca se deve fazer pela criança.
embo ra sa be ndo que po dia pe di r a juda . Es s e e xe mplo co mpro v a que o Em o ut ra si tua çã o, a me sma c ri anç a quis de se nha r co m f it a c re pe ,
professor prec isa se conter e não realizar coisas pela c riança quando essa co la ndo pe daç o s s o bre uma s upe rf í ci e . Ela c o ns e gui u t i rar um pe da ç o
faz suas inv estiga ções procedi mentai s. Pode ocorrer de uma o utra c riança de a pro xi ma da me nt e de z c e nt í me tro s , puxa ndo a f i t a , ro da ndo o ro lo e
ajudar, mesmo uma c riança mais velha s ervi r de inspiração , c omo ocorreu muda ndo-o de mã o a té c o rta r a fi t a c om um puxã o . Na s e quê nc i a, t e v e
com a me nina em questão, mas o melhor c aminho para que ela poss a acre- a i nte nç ã o de co la r a f it a c re pe so bre a s upe rf íc i e , s e m, c o ntudo , c o n-
dit ar em se u pote nci al co nst rut iv o e expre ss ivo é o i nc ent ivo a re solver o se gui r, de po is de inúme ras t e nta t i v a s, v i rar a f it a do la do da c o la pa ra
problema que ela própri a se coloco u e dent ro de suas poss ibilidades. o s upo rt e . Se ndo a s s i m, a f i t a f i c a v a c o la da e m s e us de do s . Po r f i m,
Nes sa at iv ida de a me nina també m demons trou co isa s que a pre ndeu liv ro u-se dela e pediu a juda a o adulto. Com o t empo e la irá apre nder que
sobre os materiais de desenho ao se referir aos lápis de cera. Ela disse, re- é preci so vira r a fi ta.
po rta ndo - se a eles : "boc a não ", "ama ss ar pode ". Parec e u te r vo nta de de É i mpe ra tiv o confia r na criança pa ra que e la po ss a c ons truir c onhe-
coloca r o s lápi s de cera na boc a, mas prefe ri u e nro lá-los e ntre a s palmas cimento artísti co de modo auto ral, o que irá ocorrer gradati vamente: s aber

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ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO I NFANTI L

conc ebe r (dar fo rma ), saber usa r e criar proce diment os (té cni ca), e sa ber
apreci ar o que faz e o que out ros fa zem (a rti sta s e crianças ). A c onf iança
que de posita mos na capa cidade de c riaçã o leva rá a crianç a a a credit ar no
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próprio pote ncial, sem dependências, sem bloquei os e com a dedicação ne- A POTÊNCIA EDU(VO )CATIVA
cessária diante dos obstáculos presentes nas suas investigações artísticas DAS ARTES VISUAIS
e em seus atos criadores.
As pesquisas iniciadas com ess as cria nças ti veram co ntinuidade. Em Lutiere Dalla Valie
re la çã o a te mas e le it os pa ra des enhar, pude mo s v erif ic ar, po r exe mplo , Jéssica Maria Freisleben
no pe rc urs o lo ngi tudi na l de um me nino do s doi s a o s oi t o a no s , que e le
ma nt ev e e de s env o lve u algumas t emá t i ca s , a pe s ar de i nt ro duzi r o ut ro s
des enho s ao lo ngo do c ami nho. Des enhou nes se pe rí odo os te ma s: leã o,
princ es a, tre m e s ere ia e te v e um de s envo lvi mento mui to grande na me -
di da e m que a v a nç a v a . Alerta -s e que nã o s e t rat a de e st e re ót i po uma
cri anç a de se nha r a mes ma c oi s a po r um lo ngo t e mpo , c o nt a nt o que s e u
(...) a infância é um o utro: aq uilo q ue , s em pre além d e q ualque r tentativa
de s e nho s e t ra ns fo rme de um pa ra o o ut ro , de no t a ndo a e xi s t ê nc i a de
de cap tura, inq uie ta a s egurança de nos sos saberes, questiona o po der de
um pro ce s s o de i nv es t i ga ç ão c ri at i v a . A a rt e de c a da c ri anç a t ra z uma
nossas práticas e abre um vazio em que se abis ma o edif ício bem construí-
ide nt idade a rt ís tic a em de se nv olvimento , por i ss o pre ci sa se r culti va da e
do d e no ssas ins tituiçõe s d e ac olhimento. P ensar a inf ância co mo um outro
consi de ra da e m sua si ngularidade. De f a to , o s a rt i s ta s mo de rno s f o ra m é, justame nte, pe nsar e ssa inq uie taç ão, ess e q uestioname nto e e sse vazio
admi ra do re s da arte i nf anti l pela sua si mpli c idade e li be rda de de expres - (LA RR OS A, 1 999 , p. 1 84 ).
f, são , s em preo cupaç ão co m a repres ent aç ão do re al, mas pe la express ão
de s eu univ e rs o si mbó li c o, marc ado por s uas e xpe ri ênc ia s no fa ze r e no Pensar e propor processos de aprendizagens com crianças e mediados
obs erva r o a mbiente nat ura l e cultura l. por imagens requer escolhas delicadas, uma vez que há infinitas possibilida-
Most ras de tra ba lho s de art e nas esco las reve lam claramente a s des e abo rdagens nesse sent ido, começando pe la tomada de decis ões prá-
conc epçõ es s obre o e nsino e apre ndizagem em arte , a visã o de inf ânci a e ticas: quais imagens levar ao espaço educativo? Que processos são preten-
do pa pe l da arte i nfa nt il. Env olve r os fa mi li are s e/ ou as pes so as que cui- didos? 0 que se busca com determinados percursos propostos? E quais são
dam das c ri ança s em ev ento s no e spaço e sc olar é uma fo rma impo rt ante as bases teóric o-metodológicas que visam a o ferecer algum t ipo de susten-
de da r valor ao tra balho artí stic o e à s inv esti gaçõe s rea liza das, ampli ando tação? Decisões complexas porque estão sempre atreladas ao ponto de vista
o c a mpo de a t ua ç ã o da c o muni da de e s c o la r. A di v e rs i dade no s mo do s de quem propõe e, portanto, com o risco de um caráter tecnicista, informati-
do f azer artí st ic o i nf ant il, expre ss a no s t ra ba lho s expo s to s, e quando o s vo/ilustrativo ou limitado às questões pensadas pelos proponentes, podendo
adulto s v iv e m e pa rt i c i pa m co m a s c ria nç a s da s a t i vi da des de a rt e na s restringir-se a práticas prescritivas e destituídas de sentido. Em decorrência
esc olas, c ontri buem pa ra a va lorizaç ão de uma arte infa nti l genuí na e ali- dessas possibilidades, há, por parte dos educadores, hoje, uma preocupação
menta da pe las c ulturas artísti cas que a criança le vará consi go pa ra a vida em inventar novas experiências estéticas que articulem a percepção, a mani-
como f orma aut oral de pa rti ci paç ão so cia l. pulação material, a invenção e a criação de objetos/artefatos pelas crianças.

Ed i t o r a M e di a ç ã o 36 37 Ed i t o r a M e d i aç ã o
Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho (0rgs. )
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L

Nes te te xto , pro po mos a abordagem edu(v o)cat iva que prete nde e x- termos da aquisi ção da linguage m es crit a po r me io de narra tiva s vi suai s e

plorar as i magens em t rês aspecto s centrais : a) educat ivo: que di z respeito apre ens ão de v ocábulo s re lac iona dos às temáti cas abo rdadas em e xpo si-

àquilo que s e e ns ina, a const rução de vis õe s de mundo , de le gi ti maç ão e ções art ísti cas. Ai nda em f ase inic ial, o projeto ante cipa pi stas relevantes

conc epç ões ima gét icas ; b) ev oca tiv o: que diz res pei to à s perc epçõ es que para s e pens ar e s e propor pro cessos de aprendizagem e m que a arte seja
envo lv em a memória , àqui lo que permanec e co mo ref erenci al a pree ndido pro t a go ni s ta no pe rí odo e m que a a lf a be t iza ç ã o i nf ant i l t e m po r f o c o o

ante ri orme nt e em c onexã o co m no vo s/ outros s abe re s, o que t ra z à to na , des envo lv imento da c ompree ns ão li nguí st ic a.
emerge, fa z surgir; e c) cativ o: de cati var, que busca estabelece r relações Em um pri mei ro mome nt o, bus ca mo s c o nhe ce r c omo o c orre o pla -

a part ir do ca rát e r de s eduçã o da i mage m que apris i ona , que af e ta , que nejamento e o cronograma da s aulas minis trada s pe los profe ssore s re gen-
te s da s turmas e m re la çã o ao s proc e ss os de alfa be ti za çã o, i st o é, c omo
do mi na o c a mpo da i maginaç ão .
Nes se se nti do , a lguma s das expe riê nc ias de a pre ndiza ge m e m art e, ele s c o mpre e ndem e s sa e ta pa de a qui s i ç ão e co ns truç ã o c o gni t i v a, de
a pa rt ir da produç ã o artí st ic a co nt e mporânea , co m cri ança s em i da de de soc ializaçã o e c ompartilha mento de s abe res , que st ões rela tiv as ao disc i-

alfa bet i za ç ão es co lar, t ê m s ido rele va nte de sa f io do s no ss os grupo s de plinamento , subjet iv aç ão e div ersi da de . Da mes ma manei ra , obse rv amos

pe s qui s a, ens i no e e xte ns ão na uni v ers i da de e m di á lo go c o m a e s c ola . como a produç ão a rt ís ti ca se i ns ere ne st e co nt ext o arti cula da à s de ma is

Sobre tudo a parti r do c ampo das a rt es vi suai s, t erre no mov ediç o em que proposiç ões ao longo de suas aulas.
pisa mos, te ndo em vista dois desafios principais: o primeiro deles no A pa rt i r de a lguns enco nt ros , o des af i o pro po st o f oi pe ns ar na a rt e

que t ange à a bo rda ge m met o do lógic a ut iliza da que i mplic a pos i çõ es nã o c o mo po t ê nc i a pe d a gó gi c a , t e ndo c o mo f i o c o ndut o r o c o rpo huma no .

hi erárquic a s, mas hori zo nt ai s e perme adas pe la c uri os idade pue ri l; e e m Em que medida s e poderi a propi ci ar experiê nci as c ognit iva s e i gualmente

segundo , no que tange a a rticular saberes da esfe ra das artes visua is com contribui r para os proc es so s de alfa bet izaç ão . As cria nça s de s eis a no s,

a apree ns ã o da li nguagem es cri ta , s em que uma s e s obre ponha à out ra , co m as quai s des e nv olv e mos o pro je to , des e ja va m, so bre tudo , brincar,
fa la r, c anta r, des co brir, to ca r, mexer, co rrer - o que nos reque ri a pe ns ar
ma s se c ompleme nte m.
Est e texto traz o re la to de uma experiê nci a de trabalho compa rti lha- e propor prát ic as peda gó gi ca s pauta da s pe la vi vê nc i a expe ri enc ia l, pelo

do entre doce nt es em fo rmaç ão inici al no Curs o de Li ce nci at ura e m Art es conta to , pe lo a fe to, pelo di álogo abert o, f av orec endo o mo vi me nt o curi o-

Vi s ua i s e um grupo de pro f es s o ra s alf a be t i za do ra s de qua t ro t urma s de so em torno de ca da ela boraçã o.


pri mei ro a no do Ens i no F unda me nta l. Co nf iguramo s pro c es s o s e duca t i - Embas ados pela pe rs pe ct iv a educa ti va da cult ura vi sual (HERNÁN-

vo s a pa rt i r de di s t i nt a s e xperi ê nc i a s : produç ão a rt í s t ic a (c o m v i s ta s à DEZ, 20 09 ), no s so po nt o de pa rti da fo i o pro jet o "Arte co nt e mporâ ne a e


educa ção da c ultura vi sual: pe dago gias cult urai s na alf abeti zaçã o infant il`,
experi mentaç ão ma terial e sua s pos sibili dades plást ica s); i nte rpreta ção e
cons trução de signifi cados a pa rtir da vi sita ção a e xpo siç ões; e a re ali za- bus ca ndo t ec er re la çõe s entre a a rte e a es crita , entre a e xpe ri ência e a
compreensão de diferentes linguagens artíst icas, entre a formação inicial e
ção de of ici na s, c ontat o co m art is ta s e diá lo go c om es tuda nt es do Curso
de Art e s Vi s ua is . a formação c ontinuada dos docentes envolvidos.
De mo do ge ra l, a prá ti c a a bo rda da v e m c o ntri bui ndo c o m o s pro -
cess os de f ormação inici al a o possi bilitar a ins erçã o desse s docentes em Projeto de ensino, pesquisa e extensão desenvolvido entre março e novembro de 2016 com a parti-
cipação de acadêmicas do Curso de Licenciatura em Artes Visuais da Universidade Federal de Santa
fo rma ç ão no ambie nte es c ola r e , igualment e f av o re c e m a s c ri a nç a s e m Maria e professoras das primeiros anos do Colégio Marista Santa Maria.

39 Editora Mediação
Ed i t o r a M e d i aç ã o 38
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO I NFANTI L Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho IOrgs .l

Infância e práticas pedagógicas Di f e re nt e me nt e de s s es mo de lo s , a t ua lme nte no s de pa ra mo s c o m


inf â nci a s mult i f a ce t a da s, o ri unda s de uma di v e rs i da de de v iv ê nc i as ja -
Ao a bo rda r a i nf â nc i a e m no s s o s proce ssos edu(vo)cati vos, ca be ma i s v is t a a nte rio rme nt e c omo proc e s so s de a li ena çã o f rent e à ra pide z
des ta ca r breve me nt e quais s ão a s bas es t eó ri cas que res palda m no ss as contempo rânea da c irc ulaçã o de inf ormaç õe s, à ins erç ão de se nfrea da da
prá ti ca s, bem c omo mo bilizam nos so pensa me nt o. Busc amos e m Philippe pa rt ic i pa çã o e pode r de de ci sõ es ja ma i s vi st a a nt eri orme nte . Da me sma
Ari ès (2 0 06 ) um po nto de pa rti da pa ra art ic ula r c o nc e i to s a c erc a des s a fo rma , o a ce s s o i ns t ant â ne o à s inf o rma ç õ e s e a o s a pa ra t o s t e c noló gi -
et a pa s o c i a lment e c o ns t ruí da , no mi na da e le gi t i ma da medi a nt e a s pe c - cos , re de s so ci ai s de c omparti lhamento de imagens , audi ov is ua is , na rra-
to s c o nt i nge nt e s a ca da perí o do hi s t ó ric o , s oc i a l e c ult ura l. Do me s mo tiva s, etc . e stã o c ada vez ma is pre sentes e inc orpo rados às experi ênc ias
mo do, no s ba se a mo s e m F e rna ndo He rná nde z, s ua abo rda ge m da c ult u- cot idi ana s das cri anç as.
ra v is ual no que t a nge à s ques t õe s relat iv a s ao olha r e à s v is ua li dades , Di a nt e de ss a s perc epç õe s , a i ns erç ão em te mas ti dos co mo a pro -
aos modos de ve r. pri a do s a o uni v ers o a dult o , c a da v e z ma is pre c o ce me nt e , sã o int rodu-
Se gundo Ari è s, a i de i a de i nf â nc i a c o mo um pe rí o do pe c uli a r da s zi do s e inc orpora dos ao s i magi ná rio s i nfa nti s . Obv ia me nt e , nã o e xi st e
no s sa s v i das nã o co rre s po nde a um es t ado na t ura l i nere nt e à c ondiç ã o nes te te xto o de se jo de aprof undar e ssa s perce pçõ es que e me rge m tanto
huma na e, s i m, a uma c ons t ruç ã o da huma ni da de atrelada às pa rti c ula - do s e n s o c o mum qua nt o de e s t u do s o ri undo s d o c a mpo da s c i ê nc i a s
ridades his tó ri ca s. As imagens se le ci onadas e a na li sa da s po r ele, a ss im soc ia is. Cont udo, de vido a s eu re flexo nas práti ca s des env olvidas na e s-
c o mo t a nt a s out ra s, pe rmi t e m c o nhe c e r a infâ ncia e pro duzi r signifi- co la , ca be menc i o ná-la s co mo a spe c t o s que igua lment e rev e rbe ra m no
ca do s so bre e la . 0 a ut o r e xami na e de s c o nst ró i o c o nc e i to de i nf â nc i a ce nt ro do nos so t rabalho .
co mo um f e nôme no nat ural da v ida e v ai demo nst rando c o mo a c o nce p- Para Davi d Buckingham (200 7), essas cri ança s que int eragem c om a
çã o de i nfâ nci a c o ns i st e em uma c o ns t ruç ão hi s tó ri ca , c ult ura l, f abric a - tecno logi a fazem parte da geraçã o eletrônica que s e de senvo lve dentro da
f,
da pe la mo de rni dade . lógic a da a ut onomia e li be rdade de mo di fi ca çã o pa ra a cria çã o do mundo
0 e s t udo hi s t ó ri c o de Ari è s de s t a c a , e nt re o ut ro s a s pe c t o s , que , em que se e nc o ntra m. Es pe c i fi c a me nt e e m no s so c ont e xt o de t ra ba lho ,
dura nt e pa r t e da I da de Mé di a , as c ria nç a s e ra m co ns i dera da s me ro s de pa ra mo -no s c om c ria nç a s que t ê m ac e s so à s mí di as di gi t a i s c o t idi a -
seres bi oló gi c os , se m es t a t ut o s o c i a l ne m a u t o n o mi a . Po r s ua inge - na me nt e, aprese nt ando-nos u m re pe rtó ri o i ma gét ic o ori undo da s mais
nui dade , ge nti leza e gra ça , co ns i st i a m uma f o n t e de dis traç ão e de va ri adas f onte s - c inema, public idade, pro gra ma s de TV, s éri es , et c. -, o
re la xa me nt o pa ra o s a dult o s . Du ra nt e a l gu m t e mp o , a repres e nt a çã o que, por um la do, impli cou espec ial atenç ão de nos sa parte aos eleme ntos
da s c ri a nç a s pa r e c i a ma i s c o m a de um a du lt o e m mi ni a t ur a , e m e s - vis ua is rec orre nt es em s ua s fa la s, be m co mo pro duçõ es vi suai s po r elas
cala re duzi da , ma s c o m expre s sõ e s e mús c ulo s se melha nt e s aos de elaboradas - e m alguns c as os , extremamente e st ereo ti pa da s.
um a dult o . Art i s t a s nã o he s i t a ra m, e m c a s o s r a ro s de nud e z e xpo s t a , As cri anç as c o m seus obje to s e arte fa to s visuais de mo ns t ra m
re pre se nt a r a mus c ul a t ura v i s t a no s a d ult o s . A i nf â nc i a de s a pa re c e u suas e sc olha s so bre pe rs onagens infa nt is , e a sa la de aula parec e inva -
da i c o no gra f i a junt o c o m o ut ro s t e ma s he le ní s t i c o s , e o lo ngo pe rí o do di da por Ba rbi e s , pri nc e sa s , s upe r-heró i s , He li o Ki t t i s, Mi nio ns , de nt re
ro mâ ni c o que pre v ale c eu a té o fi m do s éc ulo XI I I re cus o u-s e a mo st ra r out ros pe rs o na ge ns , e m sua s ca pa s do s ca de rno s , na s mo c hi la s e la n-
traç o s es pec íf i co s da i nf ânc ia . che i ra s, na s e s t a mpa s da s ro upas , no s bri nque do s e no s pró pri os pe r-
so na ge ns le v a do s à e s c ola . Da mes ma f o rma, há gra nde inf luênc i a na s

Ed i t o r a M e d i aç ã o 40 41 Editora Mediação
ARTE CONTEMP ORÂNEA E E DUCA ÇÃ O INFA NTIL Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho IOrgs .l

bri nc a de i ras - que e m ge ra l c o meç a m a s e ca rac t e ri zar c omo bri nc a de i - Expos iç õe s da Uni versi da de 2 - o que i mpli co u o de sloca me nt o da s cria n-
ra s de meni no s (s upe r-he ró is , lut a s , duelo s ) o u de meni nas (pri nc es a s , ças , pe rc epç ão de out ro s es pa ços , te mpo e dis ta nc iamento . A e xpos iç ão
cui da dos co m a nima is e nat ure za, ta ref a s domé st i ca s ), te rri t óri os expli - conto u co m 15 des enho s fe it os c om ponta s ec a so bre pa pe l ve ge ta l, que
ci t a me nt e de marc a do s pe la co nt ra di t óri a re laç ã o cro mát i c a azul/rosa. re me te m a f ormas huma na s, i nte rnas e exte rna s, a borda ndo a s re laç õe s
Ape sa r de c o ns t at a rmo s grande e sf o rç o po r pa rt e da e s co la e da s mic ro e mac ro da re pres ent aç ão de te ci do s ce lulares , órgã os , es trut uras
prof ess ora s e m ro mpe r c om essa s perc epç ões est ere oti pada s e m rela ção óssea s, membros e part es do corpo. Após a v isita ção, as crianças part ici-
ao gênero, pre v ale c em a s c o nce pç õ es biná ri as , pri nc ipa lme nt e a part i r param de uma o fi cina art íst ic a, que lhes poss ibili tou a expe riment aç ão do
do s i magi ná rio s c ria dos , di f undi do s e le gi ti ma do s po r f i l me s e de ma i s material - pa pel vegetal - que foi a base para as o bras vistas na exposição.
pro dut os de riv ados des sa s narrat iva s.
Nes se e nla ce , no ssa mai or implic açã o no â mbi to do pro je to fo i bus-
car, na s ima ge ns t razida s pe la s c ri a nç as , a pot ê nc ia e du(vo )ca ti va re la - Espaço expositivo e lugar de experimentação
ci ona ndo s ua s i ma ge ns a i ma gens de obras produzi da s por arti s ta s c on-
tempo râ neo s. Assi m, nos apro xi mamos das cria nç as po r mei o de of ic inas Os e spa ços explo rados pelo projeto foram espaço s e xpo sit ivo s e de
env olve ndo e xperime nt aç ão de mat eri ai s tra di ci onais (lá pis , ca ne tas , ti n- produç ão artí st ic a na Univ e rs idade F ederal de Santa Ma ri a e igualme nt e
tas) e ma teri ais vari ados reco lhidos pelas pró pria s cri ança s a part ir de um no Co lé gi o Ma ri s t a Sa nt a Ma ri a. Apro v e it a ndo a s po s s i bi li dade s que a
pro je t o de rec i cla ge m. Nas salas de a ula , c ri a mo s o que c ha ma mo s de art e co nt empo râ ne a pe rmit e, a dinâmica da expo si çã o te nt ou pro po r algo
cant o c omum (uma grande c aixa de pape lão ), no qua l c ada criança espon- alé m da o bs e rva ç ã o , pe rmi t i ndo o c o nt a t o do v i s i t a nt e por me i o do t o -
tanea mente depo si tav a ma teria is de sc art ados em s ua s c as as pa ra se rv ir que . Um t oque s ua v e , c omo um c a ri nho o u uma bri sa , suges t ão da da à s
como mat erial para s ua s c ri aç ões f utura s. cria nças , pa ra que pudes sem sentir as t exturas, as ranhura s e as f issuras
1`
Outro int ento de nos sa pa rt e co ns i st iu e m t enci ona r re la çõ e s entre fe i ta s no papel vegetal que t o rna ra m po ss í ve l v i sua li zar os de s enhos ,
obje to s o ri undo s da produç ã o cult ura l po pula r, de dis t ri buiç ão em gra nde perce ber a transpa rê nci a do pa pe l e a transluci de z que de u nome à e xpo-
escala , c om o bra s a rt ís t ic a s c o nfe c c io nada s jus ta me nt e a part i r de ss e s si çã o, t es ta r no va s po ss ibilidades c om papéi s co lo ri do s co lo ca do s at rá s
materiais - po rém re s si gnif i ca das , de s ti t uí das do s ignif i ca do de o rige m da s f i gura s s us pe nsa s , de s co brir f ormas c onhe ci da s e m me io à ri que za
para se t ornarem o ut ra c ois a, um objet o. Nos so i ntuit o, a lé m de prov oc ar de det alhe s da s obra s expos ta s, v er, olha r, bus c ar o des co nhec ido, i ndo
a curiosidade das c rianças s obre os a rtefatos a presentados, foi desnatura- alé m do que é fa mi li ar, parti ndo do real s em limite s à imaginaçã o. 0 o bje-
lizar a vis ão da arte como a preensão té cnica e/ ou ilust rat iva , res saltando tiv o fo i jus ta me nte a rris car palpi tes e i nte rpre ta çõe s da s cri ança s.
a c once pçã o inventi va , a ut oral e autônoma.
As propo s t a s v i s a ra m à art i c ula ç ã o e nt re o t e ma c e nt ra l: e st udo s
' VALLE, Lutiere Dalla . Exposição "A (Trans)Lucidez da Arte: (Des )Tino Humano ". Exposição Indivi-
s o bre o c o rpo hu ma no - f i o c o nd ut o r t ra ba lha do na escola nessa faixa dual de Desenhos ocorrida de 11 a 25 de abril de 2016 na Sala de Exposições Cláudio Carriconde do
Centro de Artes e Letras da Universidade Federal de Santa Maria . A série de desenhos traz interpre-
etária - e as a çõ e s a rt ís t i ca s pro pos t a s pe lo grupo . Co mo pri me ira pro - tações do corpo humano , fragmentado , inserido em meio a elementos decorativos em excesso , feitos
pos iç ão , o po rt unizo u-se uma vi vê nci a artís ti ca por me io da v is it a à e xpo- a partir do relevo calcado em papel vegetal . Os trabalhos em grandes proporções atingem um caráter
translúcido , uma vez que o modo como são apresentados (afastados da parede ) propõe uma relação
siç ão "A (Trans)L uci dez da Arte : (De s)Tino Humano", realiza da na Sa la de de proximidade e temporalidade com os espectadores.

Ed i t o r a M e d i aç ã o 42 43 Editora Mediação
ARTE CONTEMP ORÁNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Sahalla de Carvalho (Orgs.)

As e st ra té gi as t inha m que se r te ci da s a ca da v is it aç ão /media çã o à


i expo s iç ão de v ido a o f at o de o públic o s er af et a do de ma ne ira di fe re nte .
des enhos e est ruturas tí pic os de ss a f aixa etá ri a. No insta nt e e m que pe r-
ce be ram a fragi li dade do pa pel, que po de ria ra sgar co m f ac i li da de, a lgu-
0 pla ne jame nt o f e it o nã o fo i t i do co mo a lgo e s tá ti c o, fe c ha do, pe lo c on- ma s c ria nça s t i ve ram que do sa r a fo rça da po nta -se c a no pape l v ege ta l
trá rio , f oi f le xí v el e a be rto a muda nç a s do i ní c i o a o fi m, te ndo e m vi s t a pa ra o bt er o res ult ado es pe ra do . Alé m di ss o, puderam te st ar e spes sura s
que a inf ânc ia alt era os rumos , i nte rro ga e nem sempre ac eit a a previ sibi- de li nha s, pois o s palit os po ss ibili ta va m f azer li nhas ma is f ina s, e nquanto
li da de . E fo i o que ac ont ec eu durante a s vi si ta s media da s na e xpos iç ão : o cabo de pinc éis result ava em li nhas mais gros sas.
experime nt amo s, inve rte mo s a o rde m das a çõe s, adaptamos ao t empo de Finalizada a oficina, a próxima etapa do trabalho com as crianças con-
co nce nt ra ç ã o das c ri a nça s , c o nv e rsa mos c om e la s e e xplo ra mos o que sis tiu na vi sit a a um la borató rio de c iência s e qui pado c om mic ros cópios e
fo i po s sí v e l e m grupo s ou i ndi v idua lme nt e , pa ra que po st e rio rment e pu- réplicas de estruturas ósseas , ó rgã os e membro s do c orpo humano em três
déss emo s se nta r e convers ar sobre o s eleme ntos vi sualiza dos nas obras. dimensões . Após a explana ção sobre o tema em ques tão por part e de uma
0 que as obras da exposição des pe rt aram nessas crianças? As monito ra do laboratório , as c rianç as puderam observ ar as lâminas e poste-
obras confi gurara m o s objeto s/bri nquedo s de seu inte res se? E a pot ênc ia riormente questionar e conversar sobre a experiência que tiveram. 0 momen-
edu(vo )c ati va da expos iç ão art ís tic a: o que pe ns ar e pro por pa ra além da to de analisar as lâminas com fragmentos de t ecidos celulare s por meio dos
vis it aç ão ? 0 que ess a expe ri ênci a sus ci to u em nós , pes quis adores e do- microscópios causou muito entusiasmo e curiosidade pelas descobertas que
ce nt es ? Co mo dia lo ga mo s c om e ss a expe ri ênci a? 0 que re ve rberou, que estavam fazendo. De ntre ta ntas pergunt as, de stacamo s alguns exe mplos:
pensa mento s mobiliza ra m nos sos pro ces so s de forma çã o - s eja m ele s de
- E ss e e sq uel et o é d e ver dad e? Ou é de p lás ti c o? ( Ref er i nd o- se ao es qu ele to
ordem inici al ou c ont inuada?
exp os to n o lab or at ór i o ) .
Após a visita à expo sição, mediaç ão e ro da de c onvers a com o autor
- E esses ossos, são de animais ou de gente? (Sobre esqueletos expostos na
das obras, as crianças foram convidadas a experimentar o papel vegetal, utili- mesa de entrada do laboratório).
zando uma ponta-seca - neste caso palitos e cabos de pincéis, - estimuladas - Como é feito o osso?
a criar suas narrativas visuais tendo como dispositivo o tema da exposição: - Qual é o tamanho do coração?
as representações do corpo, e evitando questionar o que e por que produzi- - As células são moles ou duras? As células morrem?
ram suas imagens, mas incentivando-as a experimentar novas possibilidades - Quando a célula morre, a gente morre também?
- Quando a gente tá crescendo é porque as células estão crescendo também?
que foram exploradas por meio de diálogos, da investigação do material pro-
- Um corpo sem ossos é mole e cai... fica sem sustentação?
posto, uma vez que, na ocasião, desconheciam os materiais utilizados.
(Perguntas de crianças das turmas de primeiro ano. Arquivo dos autores)
Elas exerci taram o se nti r, o explo rar, o ris car e o concre tizar i dei as:
fra gme nt os corpó reo s, pa lav ra s a lea tó ria s, referência s à e xposi ção, per- Algumas de ss a s pergunta s f o ra m repe ti das inúme ra s v e ze s, po i s a
sonagens invent ados. Percebemos que a a lus ão ao s desenhos infa ntis curiosidade das crianças crescia a cada nova conversa e, assim, desdobra-
ori undos da te le vis ão fo ram s uas principai s e la boraçõ es . 0 pape l, de três mento s oc orreram. At ent as a os obje to s prese nt es no laborat ório de c iê n-
metros por um me tro e me io de la rgura di spos to s obre a mesa, res ulto u na cias, puderam desfrutar e analisar as células, arris car nomenclaturas, palpi-
pro duç ão co let iv a de um pai nel. Foi po ss íve l o bs erv ar que a lguma s c ria n- tar s obre o que v iam, imaginar o que po deri a se r aquela imagem minús cula
ças resgataram em seus desenhos a temática da exposição, outras ficaram dis pos ta no apa rat o. Inc linada s e às ve zes at é s obre a s mesa s, tiv era m a
em seus tema s habituais : casa s, ca chorro s, pe ssoas, flore s, de ntre o utros experiência de aproximaç ão com a áre a da biologi a, por meio de conversas

Ed i t o r a M e d i aç ã o 44 45 Ed i t o r a M e d i aç ã o
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L
Susana Rangel V ieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho (Orgs. l

para lelas com o que viram na exposi ção art íst ica : a pa rtir da s i magens de
acerca do papel da docência , mas por despertar olhares mais atentos aos
i órgã os e me mbros do c orpo humano f ixadas na s parede s do la bo ra t ório ,
processos fo rmat iv os iniciais dos docentes que, muitas vezes , restritos à
recordavam as obras visualizadas na e xposição.
academia, deixam escapar oportunidades de intercâmbio com professores
Conec ta da s ao proc es so de alfa be ti za çã o, quando po ss ív el, eram
que já atuam há alguns anos com a educação de crianças e jov ens. Da
estabelec idos links com letras e pa lavras. Por exe mplo : a part ir da letra c:
mesma maneira, para a docência já instituída, a possibilidade de rever as
corpo , co ra çã o, c érebro , c élula, c oluna, c abeç a. A fo rmaç ão de pa la vras
próprias práticas , a partir de olhares menos impregnados de como dev e
que es tav am di spo sta s sobre as me sas , i ndica ndo qual pa rte es ta ria se n-
ser e comportar-se um professor, fav orece uma construção pautada pela
do a na lis ada naque la lâ mi na , s ervi a t ambé m c omo e st ímulo à a pre ensã o
subjetividade e possibilita examinar as v erdades inventadas desde "sem-
da li nguagem e scrit a e f alada.
pre" sobre a docência vinculada ao assistencialismo.
Di ante da explic a çã o té cnic a, o lha va m co m ansi eda de o s ma te ri ai s
A partir dessa experiência , foi possível perceber as significativ as
dis po sto s no lo cal, te nta ndo des cobri r como seria a expe riê nc ia a segui r.
mudanças que obtivemos na instituição a partir das atividades por grupos
Durante a explicação da proposta, das etapas e dos materiais, a inquietação
de estudos com postos por do centes em form ação inicial. Verificou-se,
para usar todas a s cores possí veis fico u ev idente. As crianç as receberam
ainda , que as reflexões e abordagens que surgiram, após alguns encon-
bandejas com di ferent es fo rma tos e tamanhos, ro li nho s, caneta s e pa lit os
tros, serviram como ponto de partida para discutir situações do cotidiano
para fazerem os desenhos, sulcando a superfície do isopor, tendo como pro-
escolar e que necessitav am ser repensadas . Os relatos , com os quais
pos ta, criar represe nta çõ es das cé lulas que havi am vi sto no microsc ópi o.
tiv emos contato após essas discussões e proposições , apresentaram ev i-
Assim que f oi ini ciado o trabalho , a busca frenét ica pelas cores e suportes
dências de que o efeito que essas práticas exercem sobre o imaginário co-
demando u boa parte da proposição. Em se guida, a cada impres são re aliza-
letiv o dos professores favorece a abertura a outras percepções , de outros
da , um grupo mo ti v a do co nte mpla va c om ale gri a a ma gia impre gna da de
1W rumos que talv ez não fossem descobertos sem esse compartilhamento.
ti nt a que s e materializava no s upo rte . Sucessivamente, uma qua nt i da de
Como argumenta Hernández (2 0 09 , p. 2 08 ),
imens a de células c omeç ou a mult iplic ar-se em diferente s cores, forma tos,
tamanho s, pa ut ando-se , s obre tudo, por uma experiê nci a co let iv a de co m- a co nse quê nc ia ed ucativa d es s a po s iç ão é q ue o de s af io po s tulad o c on-
partilhamento de proc essos e de scobertas. sis te e m ajud ar c rianças , jo ve ns , e d uc ado re s e d if ere nte s tip os de vis u-
alizadores a irem além do prop ós ito d e ensinar a ve r e facilitando -lhe s
exp eriê nc ias artís ticas. E m um mund o do minad o po r disp os itivo s da vis ão
Experiências compartilhadas e tec nolo gias d o o lhar, a finalidad e e d uc ativa p ro p o sta é fac ilitar exp eri-
entre formação inicial e continuada ências crí tic as. Po rque, no f inal d as contas , s e não p ode mos co mpreender
e inte rvir no m und o , é p orq ue não te mo s a c ap ac id ad e d e re pe ns á-lo e
ofe re cer alte rnativas.
Di a nte do puls a r i nv ent i vo das c ri a nça s , pe ns a r s obre a do cê nci a
co mo uma v i a de int ens o trâ ns i to e que ne ce s si ta co nst a nt eme nt e a t en-
Nesse sentido, ao adent rar o universo das arte s visuais pa ra inv esti-
ta r à muda nç a t ro uxe no v o s s e nt i do s f re nte a o c o mple xo c o nt e xt o que
gar que t ipos de narra tiva s são construídas por prof esso res e pro fess oras
vi v enc i amo s a o lo ngo do proc e s so des e nvo lv ido . Nã o s o me n t e no que
em f o rma ç ã o junt a ment e c o m grupo s de do c e nt e s da e s c o la , pude mo s
conc erne às representações e imaginários construídos his to ri camente
que s t i o na r s o bre o s di s t i nt o s "mo do s de v e r" que c oe xi s t e m e m no s s o

Editora Mediação 46 47 Ed i t o r a M e d i aç ã o
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÀO INFANTI L Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho (Orgs.)

ento rno s oc ia l e c ultural, o que nos le vo u a ref le xõe s ma i s ampla s so bre 0 t ermo e du(vo )ca t iv o o rigi na -se , po rta nto , da junç ã o des s as trê s
o pa pel do profe ssor contemporâneo e os giro s ne cess ário s pa ra t rans for- pa la vras : educ at iv o, ev oc at iv o e ca ti vo . É de ss a f orma que nos a pro xi -
mar o s ist ema educa ti vo at ua l e m arte e educa çã o. ma mos da s v i sua li dade s na busc a de uma jus t a po s iç ã o c om a pro duç ã o
artístic a para que a aprendiza gem das criança s seja potencia lizada a partir
des sa vis ualiza ção . L eva mos em co nt a t ambém que as image ns carregam
Explorando a potência edu(vo )cativa das artes visuais particula ridades específic as de na tureza vi sual/afe tiva e que as art es visu-
ais não podem ser conjecturadas dentro de uma única estrutura linguís tica
É notório que o campo artístico potencializa aprendizagens que a lin- a qual no s vinculamo s em nos sos c ont ext os culturai s. As image ns vi sua is
guagem escrita e falada talvez não consiga . Experiências visuais , sonoras, ampli a m o s c a mpo s de pe rce pç ão da s cri anç a s, indo ma is para a e xpe -
olfativas , táteis e outras aguçam /potencializam nossos sentidos e passam a ri me nta ç ão subje ti v a do que pa ra a co mpre ens ão f o rma l de si gni f ic a çã o
exigir diferentes narrativas e produções textuais . Acreditamos que a escrita prev iame nte apreendida . Discursi vame nte se cons tit ui e m potência simbó-
parte de uma vivência, mais jamais corresponde à ação em si mesma, são lic a, rec hea da de eleme nt os ori undos de imagi nário s c ole tiv os produzidos
acontecimentos de naturezas distintas . Isto é , um texto sobre uma expe- culturalment e nos quais ancoramo s nos sas pe rce pçõ es ma is ínt ima s.
riência vivenciada não dev eria pretender sua explicação e/ou tradução de Des env olv er açõ es co mo ess as, dese nvo lvi das em noss a pesquis a,
aspectos que não seriam possív eis serem traduzidos , ilustrados , descritos, de partic ipa ção e de colabo raç ão, promo vendo a part ilha de s abe res e de
uma vez que essas ações estão sempre atreladas a um determinado ponto diálogo entre doce ntes em formação e professores com e xperiência de sala
de vista : de quem narra , de quem seleciona . Somado a isso, temos também de a ula, configurou-se como abe rtura a o di álogo so bre que stõe s at uais no
os aspectos que delimitam a narração : contingências históricas , sociais, que diz res peito ao e nsino da a rte e às abordagens recentes em educação.
culturais, ideológicas , geográficas, etc. Portanto , ao nos referirmos à escri- Apre nder art es v isua is a partir de propo stas edu(vo)cati vas como as
ta, preferimos a expressão " tecido prov ocativo": como cada pessoa sente que dese nvolvemos leva doce nte s a inve ntar proces sos e a rev isit ar s uas
e atribui sentido e/ou significado a determinados aspectos da vida (dentro crenças, suas ve rdades, as s umi ndo uma po s t ura ca da v ez mai s c rít ica
dos paradigmas culturais do qual participa). Dessa forma, entendemos as frente às i númeras s i tuaç õe s c ot i di anas da da s c omo pro nt as . Leva-os a
artes visuais como : a) um artefato educativo que nos ensina modos de ver e não acei tar a realidade como i mutável e a pe nsar em formas de transgredir
de sermos vistos , de ser e estar , envolvendo tudo o que potencializa visões o i ns ti t uí do, c o ns i de rando a do c ê nc i a c omo um pro c es s o em c o nst a nt e
de mundo, de construção e de legitimação de concepções ; b) um artefato transfo rmaç ão, que s e c o nst ró i di a ri ame nt e di a nt e da c o mple xi dade de
evocativo , que diz respeito às percepções que envolv em a memória , aquilo postura s e corporeidades presente s dentro de uma sala de aula e do s con-
que permanece como referencial anterior para cada pessoa e que, na rela- fli to s e xi st enc ia is do mundo conte mporâ ne o.
ção com as novas conexões , pode se reconfigurar em novas conexões, tra-
zendo à tona , fazendo emergir, surgir , novas ideias ; e c) um artefato cativ o
que se duz , que a prisiona , que de té m a te nç ã o , que afe ta , que do mina , uma Algumas considerações
imagem que não apenas mobiliza , mas evoca , potencializa, educa , constrói,
legitima, instrui (HERNÁNDEZ , 20 0 7). Movi ment açõe s ao re dor das mesa s, comparti lhament o de mat eria is,
conversas aleatórias, narrativas fragmentadas, perguntas, muita curiosidade

Ed i t o r a M e d i aç ã o 48 49 Ed i t o r a M e d i aç ã o
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO I NFANTI L

e grande dose de espontaneidade caracterizaram nossas vivências em torno


da produção artística com as crianças ao longo ano em que trabalhamos
com elas. 0 prazer de produzir a sua própria célula , a tinta escorrendo entre 4
os dedos e criando seres imaginários no chão, no papel ou em qualquer ou- VISITANDO E CRIANDO
tra superfície disposta para a criação artística , as impressões em superfícies
A PARTIR DE UMA EXPOSIÇÃO
flexíveis como papel e TNT, ou rígidas , como pisos cerâmicos , provocaram
DE ARTE CONTEMPORÂNEA
nas crianças diferentes percepções em relação aos vários materiais dispo-
níveis . As células , temas centrais da estruturação das isogravuras, feitas
Ma ria Ed ua rda Ran ge l Vi e i ra da Cu nha
em lâminas de isopor, provocaram nas crianças surpresa e encantamento: a
surpresa da impressão aliada à magia da revelação suscitaram no seu fazer
artístico um protagonismo impressionante . As composições , que em geral
beiraram o abstrato , revelaram a ampliação das suas referências artísticas e
o trabalho coletiv o entre turmas diferentes favoreceu o diálogo , a interação,
o compartilhamento de ideias e produções.
Por meio das experimentações , foi possív el reconhecer que as crian- Este ca pít ulo te m c omo objeti vo ref let ir sobre a s rela çõe s das cri an-
ças constroem experiências significativas , que são produtoras de conhe- ça s c o m a a rte c ont emporâ ne a , be m co mo apres ent ar po ss ibi li da des de
cimento , de saberes simbólicos, que efetiv am conexões inv entivas para pro je tos ' de ensi no em a rte s vi sua is , enf oc ando artis ta s conte mporâ ne os
responder , de forma peculiar , às suas próprias questões, exigindo que brasileiros . Anco rada nos e studos sobre infâ ncias (SARMENTO, 2011 ), em
os docentes se reinv entem a cada nov a proposta a fim de acompanhar que a s pro duç õe s v is uai s inf antis s ão ente ndi da s c omo modos co mo elas
f, compre endem e inte rpret am o mundo, e o ensino de art e sob uma aborda-
os desdobramentos que surgem . A potência edu(v o )cativa abre múltiplas
vias de acesso, novos caminhos a experienciar, o que impele os professo- gem s ensí ve l (MARTINS, 1 99 8) e crít ic a (HERNÁNDEZ, 2 009 ), perce bo o
res a adotar posturas pedagógicas menos rígidas , mais abrangentes, bus- intere sse e a curiosi dade das c rianç as co mo se ndo e ngrenagens para pro-
cando múltiplas formas de ensinar e de aprender , fav orecendo crianças e pos tas que oport unize m o des env olv iment o de um olha r c rí tic o.
professores a criar, a inventar. Em mi nha e xpe ri ênc ia co mo prof e ss o ra de a rte s, pe rc e bo que e la s
Descontinuidade , imprevisibilidade , rupturas de espaço e de tempo, esta belecem re laçõ es com obras c ont empo râneas pela sua i nterati vida de,
questionamento de v erdades, desequilíbrio e o inesperado , a irrupção de pelas po ssi bilidade s inusit adas de interpreta çã o, podendo re lac ioná-las a
acontecimentos são matérias -primas da arte contemporânea . Nem sempre sua s viv ênci as, pela uti li zaç ão de mat eri ai s do co ti dia no e íc ones co nhe-
há molduras ou paredes para abrigar quadros , nem sempre as obras artísti- ci do s po r to da s. Bus ca ndo trabalha r arti st as c onte mporâneo s bras ilei ro s
cas se apresentam na perspectiva tradicional a que estamos acostumados. que e st av am expo ndo em Po rt o Alegre, pense i nas e xpos iç ões "A Po es ia
Elas podem ser interativ as , para serem tocadas , sentidas ou modificadas do F i o ", de Art hur Bi s po do Ro s á ri o , e "Rev er", de Ro chele Z anda v alli ,
pelos espectadores , ou nada disso . Cabe a nós , professores , desenvolver
propostas edu(vo )cativ as com as crianças para que aprendam a partir das
possibilidades educativ as, ev ocativas e cativ antes dessas obras. ' Os trabalhos relatados foram desenvolvidos com grupos de crianças de cinco a seis anos no Ateliê
Infantil Azul Anil, em Porto Alegre, de 2013 a 2014.

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que e st av am o co rrendo no Santa nder Cult ural, alguma s pos si bi li da de s de o pro f e s s o r s e ja um gra nde c o nhe c e do r d o grupo c o m q ue e s t á t ra b,
est udá-lo s em projet os de t ra ba lho. As c ri ança s teria m a oport unidade de lha ndo. Bri nc adei ra s e c onve rs as s ão momento s e m que po de mo s ca pt ar
ir às expos iç ões e co nhece r as obras , e st abe le cendo re la çõe s dif erent es cos tume s, pre ferênci as e modo s de pensa r das c ri ança s.
do que se apenas ti ve ss em co nt at o c om reproduç õe s des sa s. Co m o i nt ui t o de c o mpre ende re m o que s eri a a memó ri a , co nt e i a
Ao analisa r a biogra fia de Bis po, presumi que, po r mei o de uma a bor- hi s t ó ri a de um me ni no c h a ma do G ui lhe rme Augus t o Ara újo Fernandes,
da ge m adequada, as crianças fo rmularia m aprendiza gens signifi cativas que , as si m co mo e la s, não s abia o que e ra a memória . Inic io u-se , entã o,
sobre a dife rença, a exc lus ão e o preco nce ito no s mais di versos âmbit os. a le i tura do li v ro ho mônimo , e m que um me ni no, que mora a o lado de um
Ta mbé m e nco ntre i, no s ma te ria i s i nus it a do s ut ili za dos pe lo a rt i st a , uma as ilo, pos sui uma amiga idos a chamada Do na Ant ônia . Ele um dia e sc ut a
relaçã o com o co ti dia no de las . Perce bendo que a memó ri a é um e le mento seus pa is c onve rs ando s obre a perda da me mó ri a da a mi ga . Co mo o me-
de intersecçã o entre as o bras de Bispo e de Zandav alli, busque i aprofundar nino não sa be o que é memó ria , ele sai em busca de res po sta s. Conf orme
junto às criança s o s s eus c onhec ime nto s e e nte ndime nto s sobre o tema. as informa çõe s que rec ebe dos outros mo radores do a silo, Guilhe rme c o-
le ta obje t os que des pe rte m lembra nç a s em Do na Antô nia .
Apó s a le i tura do li vro , e xpli que i que a ss i st i rí a mos a um c urt a -me -
Reconhecendo a memória tra ge m i nt i t ula do "Dona Cri st i na perde u a me mó ri a". 0 c urt a -me tra ge m,
co m dura çã o de 15 minut os , é bas ea do no li v ro Gui lherme August o Araú-
Na pe rs pec t i v a de He rná ndez (2 0 0 9 , p. 23 -24 ), há a nec es si da de
jo F e rna nde s. As s im c o mo na obra lit e rá ri a , e xi s t e um pe rs o na gem que
de uma a lf abet izaç ão v is ua l crít ic a "que permi ta a os a prendi ze s analis ar,
mo ra ao la do de um a s i lo e f az a mi za de co m uma i do s a, Do na Cri st i na ,
interpretar, avaliar e criar a partir da rela ção entre o s saberes que circulam
que s o fre de Alzhe i me r. No f i lme e la po ss ui vá ri o s objet os , o s qua is ela
pelos 'te xt os' orais , auditi vos , vis uai s, es cri tos , c orporais ".
chama de "re lí qui as " e que a a juda m na re co ns truç ão da s ua memória .
Ass im co mo o aut or, a cre di to na ne ce ssi da de da abordagem de múl-
Apó s a s s i s t i re m a o v í de o , c he go u o mome nt o da ro da de c o nv e r-
tiplos alfabe tismos por me io de diversa s fonte s (vis uais, e scrita s, virt uais).
sas . I ndaguei as cria nça s se ago ra sa be ria m res ponde r à no ss a pergunta
Nesse pro jeto, busquei ce rcar as crianças de refe rências sobre a memória,
ini ci a l, s obre o que si gni f i ca me mó ri a . Anima da s , re spo nde ram que si m,
ut i li za ndo o li vro "Gui lherme Augus to Araújo Fe rna nde s ", o c urt a -me t ra -
que no li v ro o me ni no t a mbé m não s abi a, ma s que ha vi a des co berto .
ge m "Do na Cri st i na pe rde u a me mó ri a ", f o to gra f i a s da s cri a nç a s e da s
"Memóri a é a lgo de que v oc ê s e lembre", res ponde u um a luno , repe ti ndo
prof esso ras e obras de arte s do s artist as Bispo e Zandavalli.
uma f ra se do li vro . "Po r e xemplo, dize r o que e u f i z o nte m é c o nt a r uma
0 projet o i ni ci ou c o m o le va nta me nt o de uma que st ão : "o que é me -
me mó ri a", re sponde u o ut ro . Le mbre i a s cria nç as que , no li vro e no f ilme ,
mó ri a? " Em um prime i ro mome nto , as c ri a nça s fi c a ra m pe ns at i v as , co n-
Guilhe rme utilizava alguma s f erra ment a s pa ra de s pe rt ar a me mó ri a da
fusa s e nã o f ormulara m re s po s ta s. Le mbrei , e ntã o, os jo go s de memó ri a
ami ga. Qua i s e ra m e las ? "Os obje to s , que a f azi a m le mbra r", re s ponde -
co nhe c ido s po r t o da s . Que s ti o ne i o po rquê do nome "jo go de memó ri a "
ram. Perguntamos s e o mesmo oco rria cono sco, se o s objeto s nos tra ziam
e no v ame nt e f i que i s em re spo st a s. Es s a rea ç ão da s c ri a nç a s já e ra es -
rec orda çõ es. I ni ci almente a s cri ança s nã o e nt ende ram a pergunta e f ic a-
pe ra da , v i s t o que e s t a s t i nha m ci nc o e s e i s a nos , a i nda c o ns t i tui ndo a
ram co nf usa s para res ponde r. Dei , ent ão , a lguns exemplo s mai s pró ximos
no ç ã o de t e mpo ra li da de . Ressalto aqui a i mpo rt â nc i a de re la c i o na r a s
da rea lidade delas , mos trando o bjet os do at eliê que e vo ca va m at iv idades
aprendi za ge ns às v iv ênci as das cria nç as . Para is so , é indis pe ns áv el que
re alizadas a nt erio rme nt e. Pergunt ei se rec orda va m o que hav ía mo s fe it o

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Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho (Orgs.)
ARTE CONTEMP ORÃNEA E EDUCAÇÃO I NFANTI L

na aula a nte ri or, e res po nde ram que nã o . Mo s t rei , e ntã o , uma da s pro - c a pa z de a rma ze n a r de ze n a s de i ma ge ns s e m c us t o a lgum. Co nte i à s
duç õe s t ri di mens i ona is rea liza das na da t a , e ra pida me nt e lembrara m da cri a nç a s s o bre a a ns i e da de que t í nha mo s na e spe ra da re ve la ç ã o do s
pro po s t a . Expli que i que o s o bje t o s , a s s i m c o mo no li v ro , no f i lme e na fi lme s , f at o que não oc o rre ma is no s di a s de hoje . F ale i que , e m muit a s
aula , t ra ze m-nos me mó ri a s de a c onte c imento s pas s ados . da s no ss a s f ot o s, ha v ia re c ado s no v e rs o , dedi ca t óri as ou a i de nti f ic a -
Pa ra que a di sc uss ão s e i ns eri ss e ma i s no c o ti di ano das c ria nç as , çã o do loc al e da da ta .
eu ha vi a s o li c it a do , na s ema na ant erio r, que tro uxe ss em fo t ograf i as an- A se gui r pe rgunt ei às c ri a nç as : qua l a rela çã o ent re o curt a-met ra -
tigas suas . Eu t a mbé m ha v i a pre pa ra do u m ma t e ri a l de f o t o s da mi nha ge m as s i st i do, a hi s tó ri a de Gui lhe rme e a c o nv e rsa s obre o s re gi st ro s
inf â nc i a , c o m a int e nç ã o de di v i di r es s a s me mó ri as c om e la s , c o nta ndo foto grá fic os? Uma c ri a nç a re s po nde u que e ra po rque a s f o t o s no s f a -
um po uc o da mi nha hi s t ó ri a , re la t a ndo a c o nt e c i ment o s e e nc o nt ra ndo zi a m le mbra r a lgo , a s s i m c o mo o s o bje t o s na s hi st ó ri a s . Outra cria nç a
po nt os e m c o mum c o m a s c ri a nç a s . di s s e : "Nó s e s t a mo s t ra ba lha ndo a me mó ri a , t udo que a ge nt e f a z t e m
0 grupo inic iou a c o nv e rsa f a la ndo s o bre as le mbra nç a s que s e a v er co m e la! "
re lac i o na v am a os mome nt o s re gis t ra do s nas f ot o gra f ia s . Surgi ram rela - Apó s a s c o nv e rs a s , to da s s ent a ra m-s e à s me s a s , na s qua i s no r-
to s s o bre vá rio s ac o nt e c ime nt o s , c omo mudanç a s de uma mora dia pa ra ma lme nt e rea li zamo s os traba lhos . Expliquei , e nt ão , a propo st a da at i vi -
out ra, na sc ime nto de i rmã os, fé ri as ine squec íve is, aniv ers ári os. .. As le m- da de prá t ic a : rea liza r um des e nho s o bre a s me mó ria s e v oc a da s a pa rti r
bra nç a s f o ra m tra zi da s c o m mui t a a ni ma ç ã o , po i s a s c ri a nç a s enco n- da s f o to gra f i as que ha v i a m le v a do . Uma c ri a nç a pe rgunt o u s e de v e ri a
t ra ra m a li um mo me nt o pa ra falar das suas vi da s , s o bre mo me nt o s que co pi a r a f o t o , e u e xpli que i que nã o . A i de i a s e r i a c o lo c a r no de s e nho
as t o ca ra m de a lguma ma ne i ra . Eu t a mbé m le v e i di v e rs a s ima ge ns que elemento s que nã o es tã o pre se nte s na i magem, mas , si m, na s memória s
fo ram es palhada s pe lo chã o . Ca da uma e s c o lhe u t rê s f o t o gra f i a s que que e la no s des pe rta .
se ria m co ment a da s po r mi m. Opte i po r pré-s e le c i ona r muit a s f o to s pa ra A pe rgu nt a f e i t a po r e la , apa re nt e me nt e s i mple s , ev o c a as prá -
que a s c ri a nç a s pudes s em fa zer a sua própria s e le ç ão . Nã o que ri a f i ca r t i c a s a rt í s t i c a s a do t a da s e m s a la de a ula . Percebo que a s a t i v i da de s
falando s obre i ma ge ns que não a s interes sa ss em, po r is so a i mportâ nc ia propos ta s nas escolas tra nsi t a m se mpre pelos me s mo s enunc ia dos :
da a e sc o lha se r f e i ta po r ela s . 0 mo me nt o da mo st ra da s mi nha s f o t o - pro põ e m à s cri a nç a s a có pi a de o bras de a rt e , a repres e nta ç ã o do mo -
grafias foi mui t o ri c o , po i s no s a pro xi mo u e m t e rmo s da re a li da de da s me nt o de que ma i s go s ta ra m no pa s s ei o re a liza do, o de s e nho da his t ó -
no s s a s i nf â nc i a s . To da s a cha ra m muit o di v e rt i do v e r que a pro f e s s o ra ri a na rrada. Enf im, enunci ados que não i ns ti ga m as c ri ança s a irem a lé m
ta mbé m já fo i cri a nç a um di a ! das repre se nta çõ es óbvi as. Para que a propo st a ficasse ma is cla ra,
Enqua nt o mo s t ra v a a s f o t o s , le mbre i a s c ri a nç a s de que a nt i ga - le mbrei a e la s de f a t o s que ha v i a m re la t ado , rela c i ona do s à s i mage ns .
me nt e a s câ me ra s f o to grá f i c a s nã o e ra m di gi t a i s , ma s a na ló gic as . Ex- Após es s a bre ve re ca pit ula çã o , e sc o lhera m o s ma t eri ai s que ut ili za ria m
pli que i que ha v i a uma re la ç ã o mui t o di f e re nt e da que s e t e m ho je c o m na pro pos t a . Pe rg unt e i c o m qua l t i po de pa p e l c a da uma go s t a ri a de
a f o t o gra f i a : co mo o s f i lme s po s s i bili t a v a m a pe na s 1 2 , 2 4 o u 3 6 f o t o s , tra ba lha r: f olha gra nde , pe que na , f i na , gro s s a , bra nc a , c o lori da , e nt re
a s pe s s o a s t i nha m um c ui da do mui t o ma i o r na e s c o l ha da c e na a s e r out ros f orma to s ou c ore s . Após a s e s co lhas , as c ri a nça s pa rt ira m pa ra
fo t o gra f a da . Po de mo s di ze r que a f ot o gra f i a e ra mui t o ma i s v a lo ri za da a prát ic a. Enqua nt o pro duzi a m, e u e s t i mula v a a s le mbra nç a s po r me i o
do que a t ua lme n t e , qua ndo t o d o s po s s ue m uma c â me ra o u um c e lula r de di v ers as pe rgunta s .

Editora Mediação 54 55 Ed i t o r a M e d i aç ã o
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho (Orgs.)

A memória no trabalho de Rochele Zandavalli ou de s e nho s a nima do s , po r e xe mplo . Ac re di t o que a a rte nã o de v a s e r


abo rda da c o m um a s s unt o di s t a nt e de la s , especial, int o c á ve l, c om e x-
A a ula s e gui nt e i nic i o u c o m uma c o nv ers a s o bre a s é ri e "Rev er", pli ca çõ es pro nt as e rígidas , se m abertura para a co ns truç ão de co nhec i-
da a rti s ta Za nda va lli . Co nt e i que a a rt i s t a mo ra e m Po rt o Ale gre . Pedi me nto s . Para He rná nde z (20 0 9, p. 93 ),
às c ri ança s que ha vi am ido à expo si çã o que co nta ss em à s de ma is c omo
era m a s o bra s da a rt i s t a . Ela s di s s e ra m que a art i s ta f a zi a f ot o graf i a s (...) não se separa que m apre nd e e que m ensina (c om suas inq uie tud es ,
temores e desejos) do processo de ensinar e aprender a compreender o
ant i ga s c om a lguma s pa rte s c olo rida s . Explique i que Z a ndav a lli nã o f a -
mundo, as situações emergentes e as relações dos sujeitos com eles mes-
zi a es sa s f ot ogra fi as , ela apenas a s c o le t a v a e m bre c hó s e bri que s e
mos e c om os outros . C om isso , p retend e-s e f avorece r uma concep ção do
nã o t i nha c o nhe c i me nt o s o bre que m e ra m aque la s pe s s o as re t rat a da s . sujeito q ue é capaz d e ap aixonar-s e por aprender d e fo rma c rí tica se tiver
Mos tre i, entã o, vá ria s o bras da sé ri e "Rev er", po is algumas criança s não a o portunid ad e d e f azê-lo.
havi am i do à expos ição . Indaguei sobre o que ha via de dife rent e naque las
ima ge ns . Alguma s di s s e ra m que a a rt i s t a de s e nha v a na s f o t o s , o ut ra s Da me sma f o rma , apo i a da no s e s t udos de Ma rt i ns (1 99 9 ) s obre o
que e la pi nt a v a , a t é que c onc luí ra m que Z a nda v a lli i nte rv i nha c o m bo r- ensi no da arte , a cre di to que a e xpe ri ênc ia e a vi v ênci a e m um pro ce ss o

da do s na s imagens. expres siv o, ali ada s a os conhec ime nto s a rtí sti cos , resulta m e m a pre ndi za-
Nessa interv enção sobre o registro da memória de outra pessoa, sur- ge ns s ignif ic at i va s. Ass i m, a pó s a s di sc uss õe s t eó ri ca s s obre a obra de
ge um co nt exto dif erente do já presente na fo tografia . As ima gens , de sse Za nda va lli , as cria nça s f oram to da s para a me sa c e nt ra l e s e nt ara m-se ,
modo, v ão sendo res signif icadas pela artist a. Segundo Cunha (2010, p. 2), atentas à e xpli ca çã o da pro po st a. F oram di st ri buídas f ot ogra fi as xeroc a-
"a rt i st a s bri nca m c om o c ot i di a no , a hi st ó ri a , o s mit os e c om os no s so s das de colegas de o ut ra s t urma s. As i magens es tav am e m pre to e branco
pensa mento s. Re c o ns t ro e m s i gni f i c a do s e m t o rno do já v i s t o e do s u- e s ó c ont inham a f igura das crianças se m o fundo . 0 de saf io das crianças
f
pos ta mente sa bi do". Perce bo se melha nça s, ne ss as práti ca s dos arti sta s, fo i e la bo ra r um c o nt e xt o pa ra a i ma gem do c o le ga , "c ri a n do " uma me -
com o s proce ss os de a prendi za gem das c ria nç as , que bri nc am de "fa z de mória : co m o que ess a cria nç a go st ava de brinca r, o nde e la e st av a, c om
conta" re presenta ndo vivê ncias co tidianas , fantas iando e dando se ntido às que m, s e t inha algum bi c ho de es t i ma çã o , se mo ra v a em c a sa o u a pa r-

suas experiências. ta ment o, s e t inha i rmã o s , qua l se u no me , ent re o ut ros . Cri ando , elas se
Algumas c ri anç a s co me nt ara m que a quela s i ma ge ns pare ciam ser pe rgunt a va m c omo s e ri a a re aç ã o do do no da f ot ograf i a a o ve r s ua f ot o
mui to mai s anti ga s do que as da profe ss ora, poi s co mpree nderam que a li modi fic ada. Le mbre i, ent ão, a s érie "Rever" de Z anda valli. Como se rá que
havia uma estética fotográfica difere nciada: a roupa das pessoas, os cená- as pe ss oa s s e s enti ria m ao v ere m f o t ogra fi a s s ua s ressignificadas po r
rios, a aus ência das cores, entre out ros e lementos. Também foi salie ntada uma artis ta? E por um co lega?
a ausê ncia de sorrisos nos ro stos das criança s, as poses delas , formais e
contidas, diferente da espontaneidade presente nas fotografias mais atuais.
A conv ersa s obre as obras de Zanda valli foi e ncarada de forma leve, A memória no trabalho de Bispo do Rosário
abe rt a a diá lo gos e a o pi ni õ e s de t oda s . É i mport a nt e que a s c ria nç a s
Introduzi a propos t a expli ca ndo que i ría mo s e st uda r um arti st a bra -
s i nt a m uma na t ura li da de na a bo rda ge m do s t e ma s a rt í s t i c o s , de mo do
silei ro que e st ava e xpo ndo no Santa nde r Cultural, ao la do da Za ndava lli.
que e s se s f a ç am pa rte de s ua s v i das da me s ma mane i ra que o s f i lme s

Editora Mediação 56 57 Editora Mediação


ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho (Orgs .)

Várias crianças haviam visto a exposição , mas, quando perguntei se Com e ss es que st io na me nt os , di re ci onei a c onve rs a pa ra o c ompo r-
sabiam algo sobre o artista , responderam que não. Fiz uma brev e expli- t a me n t o qu e t o do s t e mo s c o m a s pe ss oa s c ons idera da s di f erent es de
cação sobre o local onde Bispo morou por mais de 50 anos : um hospício. nó s . Co nve rs a mo s so bre a s po s s i bi li da de s que no s le v a m a não gos t a r
Nenhuma das crianças tinha conhecimento sobre o que seria esse lugar. de det e rmina da s pe ss o a s . Che ga mo s junto s à c o nc lus ã o de que mui t a s
Perguntei-me se esse fato se dav a em função dos mov imentos antimani- veze s os "di fe re nt e s " s ã o s e pa ra do s da s oc i e da de po rque es t a nã o o s
comiais , que extinguiram grande parte dos manicômios , ou em função de tole ra. Ma s não seriam as singulari dades qua lidades , e m v ez de def eit os?
o tema da loucura não ser abordado normalmente com elas . Pensando na Co me nt ei t ambé m co m as cria nç as que , em mui ta s mús ic as , os c ompo si -
segunda opção , questionamo -nos sobre os motiv os da falta de aborda- tore s ve rsa m so bre ess e te ma.
gem do tema . Chegamos à conclusão de que a loucura é uma diferença, A s e gui r, pe di que a s c ri a nç a s s e nt a s s e m no c hã o e a pa gue i as
uma singularidade que, aos olhos de muitos , precisa ser corrigida, a pes- luze s para a s s is t i rmo s a do i s c li pe s . Pedi que pre s t as s e m at e nç ão na
soa isolada , separada da sociedade . Por meio da fala das crianças , concluí le tra da s mús ic a s, nã o a pe nas na s i ma gens. 0 pri mei ro cli pe fo i de Raul
que não tinham acesso, não conviviam com pessoas que se desv iam dos Se i xa s c a nta ndo "Ma luc o Be le za ". 0 s egundo f o i "Ba la da do L o uc o", de
padrões de " normalidade ", e também não são conv idadas a conv ersar, a Arna ldo Ba t i s t a . Apó s a s s i st i re m a o s c li pe s , a s c ri a nç a s f i ze ra m uma
pensar a respeito , a refletir sobre a diferença . Mostrei às crianças uma ro da , e nó s i ni c i a mo s u ma c o nv e rs a s o bre o qu e di zi a m a s le t ra s da s
fotografia de Bispo , e a reação geral delas confirmou essas suposições: músi ca s. De s t a que i o t re c ho : "Enqua nt o v o c ê s e e s f o rç a pa ra s e r um
ficaram visiv elmente surpresas com a cor negra da pele do artista. s uj e i t o no rma l/ e f a ze r t ud o i gu a l ! e u do me u la do a p re nd e nd o a s e r
lo uc o / ma luc o t ot a l! na lo uc ura re a l". Po r qua is mo t i v os a s pe ss o a s s e
Trata-se de práticas que têm no racismo o seu ponto imediato de conver-
gência , se entendermos por racismo não apenas a rejeição do diferente, "e s f o rç a m" pa ra s ere m normais? Po rque e la s nã o que re m se r lo uca s ,
mas, também , a obsessão da diferença , entendida como aquilo que conta- res po nderam a s criança s. E por que as pes so as não querem s er louca s?
mina a pretensa pureza , a suposta ordem, a presumida perfeição do mun- L e mbre i que , na mús i c a de Arna ldo Ba t i s t a , e le s a li e nt a e xa t a me nt e o
do. A diferença pensada como uma mancha no mundo, na medida em que fa t o de que o s "no rma i s " é que sã o inf e li ze s: "Di ze m que s o u lo uc o / po r
os diferentes teimam em não se manter dentro dos limites nítidos , preci- pe ns ar as si m/ se eu s o u muit o louc o/ po r eu se r fe liz/ Mas lo uc o é que m
sos, com os quais o Iluminismo sonhou geometrizar o mundo . A diferença
me di z/ e não é f eli z/ nã o é fe liz.
entendida como aquilo que, sendo desviante e instável , estranho e efême-
Pa ra "a que ce r" a di s c us s ão , pe rgunt ei s obre a c ont ec i ment os c ot i -
ro, não se submete à repetição, mas recoloca , a todo momento, o risco do
caos, o perigo da queda , impedindo que o sujeito moderno se apazigue no dia nos de luga re s f reque nta do s pela s cri anç as . Uma criança le mbrou que,
refúgio eterno de uma prometida maioridade (NE TO , 2 00 1, p. 108). em sua cla ss e , há um co le ga aut i st a que muit a s v e zes é c a ço a do pelo s
demais . Outro c ont ou sobre um vizinho c ade ira nte que nunc a e ra convida-
A partir das explicações sobre hospício , foram levantadas div ersas do para as bri nca de iras no c ondo mí ni o. Co m es se s exemplo s, pensa mo s
questões : por qual motivo os loucos moravam nesses ambientes ? Por que sobre a exclusão da s dife renças nos mais di versos âmbit os. Pe rgunte i, en-
eles não podiam v iv er liv res, como as outras pessoas , mas presos , consi- tão , se e la s co nheci am a lgum a rt is ta lo uc o. Todos responde ra m que nã o.
derados perigosos? Quem decide se o louco pode ser livre ou não? Todos Voltando para as obras de Bi spo, expliquei que o artista , antes de ser
os loucos são loucos o tempo inteiro? Eles podem ser curados ? A loucura internado, havi a trabalhado na Marinha, por i sso, co nhecia muitos países e
é contagiosa , " desenvolve -se" ou as pessoas nascem com ela? pessoa s. Em suas produções, Bispo recriava o mundo ao seu modo, assim

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como nó s nos utiliza mos de fot ografi as para le mbra r de a conteci mentos , o Na a ula se guint e , o c o rre u uma s e gunda mo s t ra des s e s a rti s t as . A
artista bordava as suas memórias. Bispo não tinha acesso a materiais plás- most ra des ta v ez foi enf oca da nos mat eri ais uti lizados na s o bras . Conv er-
ti co s própri os para suas produç õe s artí st ic as , po r i ss o ut ilizav a em s ua s sa mo s s obre o que ha v i a e m c o mum e m a mbo s : a ut i li za çã o da lã / li nha
obra s o bje t os do co t idi ano do ho spi ta l. Os bo rda dos era m f ei t os co m a s para a re ali za çã o das image ns . Foram forne cidos às crianças diversos
linhas des fia das de seu próprio uni forme, aplica das so bre lençói s e pa nos fio s, lãs , co rdõe s, ca da rç os e linha s, além de fi ta a de siv a, c ola branca e
ve lhos . Ele t a mbém ut iliza va , em suas o bra s tri di me nsi onai s , suca t as do folhas de div ers os ta ma nho s, gramatura s e c ore s.
hospi tal e objetos des carta dos pelo s out ros inte rnos. Ele consegui a sa lvar Expli que i que o o bje t i v o da ativ idade se ria "de s e nha r" na s f o lha s
res tos da cultura indus tri al, i tens desprezado s e e squeci dos , e ress igi nif i- sem recorrer aos materiais grá fico s (c aneti nhas , lá pis de co r... ), desaf ian-
cava -os , c ria ndo uma c omposi ção úni ca e i ndi vidualiza da. do a s c ri ança s a rei nve nt a re m o uso daqueles ma te ri a is . Ela s inve s ti ga -
Mos trei as cria nça s uma f oto grafi a do "Mant o da apres entaç ão ", um ra m o s f i os f o rne c i do s , t e s t a ndo di f e rent e s mo do s pa ra a f orma ç ã o de
trabalho em que o art ist a apres enta uma ri ca gama de co res em dois ti pos des enho s, emaranhados e re le vo s. Algumas delas re so lv era m "bordar" as
de t ec ido. Na f ac e ext erna , fe it a de um c o be rt or, pa lav ra s, s ímbolos , nú- fo lhas : fi ze ra m di v erso s furo s pe que no s co m a te so ura e o s pe rc orre ra m
meros e f igura s sã o bo rdado s em f io s de lã . Na f ace i nt erna , s obre f undo co m a s li nha s. Cunha (20 1 2, p. 2 4) af irma que
de t ec i do branc o , há no me s de mulhe re s, o rga ni za do s e m f o rma de uma
as po ss ib ilid ad es e lim itaç õe s infantis de c riar f ormas es tão tamb ém rela-
espi ral irregula r e m dire ção à a bertura da c abe ça.
cio nad as à d ive rsidad e d e m ate riais ap tos a sof rerem transf orm açõ es atra-
Es se ma nto , v es t ido por Bi s po e ca rre ga do de t anto s s i gnif i ca dos ,
vés da curios idade delas. Quand o s e d ispo nib ilizam diferentes materiais , a
foi re invent ado pe las crianças : dive rsos t ecidos , lãs, linha s, joa ninhas e fi- amp liação d e ide ias , invenç õe s e criaçõe s d as crianças g anham de staque,
tas fo ram di spo sta s à me sa. As crianças , c om a minha a juda, foram cri an- de m odo que elas nece ssitam elaborar m aneiras de lid ar com este de saf io,
do adorno s, e nfei tes e roupas. Sem a ne cess idade de cost urar os teci dos, orig inand o d es e nhos , m od e lage ns, c o lage ns e p inturas c o m marcas p es -
Il-
as roupas foram sendo construídas em c onjunt o. A s ala , c obe rta de pa nos soais e dif ere nciados do s c omum ente realizad os.
colo ridos, transf ormo u-se e m palco para a pre sentaç ões perfo rmáti ca s.
Ela s s e rei nve nta ram no novo ambi ent e que ali s urgiu: pers ona ge ns foram
Reflexões posteriores
to ma ndo fo rma , c o rpo e lugar.

Após a rea li za çã o de qua lque r projet o de t ra ba lho, c os tumo rea li za r


com as cri ança s uma convers a, lev ando em co nta os pro ces sos de apren-
Materiais inusitados
diza gem de cada criança, pensando nas transfo rma ções indivi dua is, ana li-
Bus c a ndo f o rma s pa rt i c ulare s de e xpres s ã o co m a s crianças, por sando o modo como elas rec ebe m os des af io s pro po st os , as di fi culdades
mei o de ssa s propo st as , opo rt unize i o co nta to e o co nhec ime nt o de di ve r- e a s fac ilidade s encontrada s, f aze ndo, as si m, uma aut oa va lia çã o sobre a
sos mat eria is pa ra uti lizaç ão e m suas produç õe s s imbó li ca s. As si m co mo abo rda ge m ut i li za da. També m a c redi t o s e r f undame nta l uma a ná li s e s o -
os art is tas c ont emporâneos a pro ve ita m mat eri ai s i nusit ados em se us tra- bre o ente ndimento das cria nç as (pa ra a lé m de um julga me nt o pura me nt e
ba lhos , explorando -o s em t odas a s s ua s po ss ibilidades , elas t ambé m po - formal) sobre a propo sta do s artis tas tra balhado s. Bus co, para i sso, es tar

de m fa zer o me smo qua ndo s e expre ss am. at e nt a à c o ns t ruç ã o gra dua l de uma li ngua ge m v is ua l própri a , s ingula r,

Editora Mediação 60 61 Ed i t o r a M e d i aç ã o
ARTE CONTEMP ORÃNEA E EDUCAÇÃO I NFANTI L Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho IOrgs.)

afas tada de este reót ipos formais , ev idenciando a s se melhança s e as dife- es pa ço s c ultura is co mo e ss e s de Port o Alegre , Perc ebo que, qua ndo o s
renç as e ntre os trabalho s de las. famili ares se re lac ionam co m a a rte , as cri anças a dquire m uma no va co n-
Acredito que as ativ idade s prá tica s dev em es tar a trela das à reflexão cepção s obre o univers o artíst ico. Observo que muito s pais desvalo rizam o
teórica e c rítica do professor. Primeiro, pe nsar sobre o objetivo que se tem campo artís tico, enxe rgando as aulas de arte e do at eliê como um momento
na ati vidade propo sta ; dura nte o des enrola r da a ula , o bse rva r a re ceptiv i- de di ve rti me nt o, se m re fle xõ es o u a prendizagens. Essa concepção é pas-
dade das cri anças , a s dúvi da s que surgem, os que sti ona me nto s; e depo is sada para a s c ria nça s que ac abam rec orrendo à reproduçã o de des enhos
da a t iv ida de , a na lis ar o que f o i vá lido , o que c o nt ribui u para a fo rma çã o estere otipados, s em ref letir sobre o que estã o produzindo e se m expressar
de um s uje it o mai s se nsí ve l, mais c onhec edor da a rt e. suas si ngulari dade s nos mesmos. 0 c onvi te a fa miliare s para nos aco mpa
Po ss o dize r que , no proje to re aliza do , as c ri ança s vi ve nc ia ra m ex nhar às exposi ções de arte contemporânea foi uma mane ira de atraí-los ao
periê nc ias s ignif ic at iva s que a lt erara m as suas c onc epçõ es so bre a dif e- universo artístico e uma tentativa de mudança das suas concepções de arte
re nç a, analis a ndo o s se us co mpo rt ament os c o m o out ro de uma ma ne ira e ensino da arte.
ma is c rí t ic a. Dus c ha tzky e Skli ar (2 00 1, p. 1 37 ) pe rgunt am: Traba lhei com artistas e suas expos iç õe s em Po rt o Alegre no i nt ui to
de de sfazer a ide ia que muito s adulto s tê m de que a a rte que está nos mu-
(...) s eria po ssível a tarefa de e ducar na diferença? F elizmente, é impos sí- se us é a lgo c omple xo , de di fí c il e nt e ndiment o e impró prio pa ra c ria nç as ,
vel e ducar se acred itam os q ue isto im plica f ormatar po r co mp le to a alteri-
vi s t as mui t a s v e ze s co mo inc a pa ze s de c o mpre e nde r ou t er um c o nt a t o
dad e, o u re gular se m re sistência alguma, o pe ns am ento , a língua e a sen-
mai s prof undo com a art e contemporânea. Co mo profe sso ra de artes , s ou
sibilidade . Po rém p arec e atraente, pe lo me nos não p ara pouco s, imaginar o
ato d e ed uc ar co mo uma c oloc ação, à d is po siç ão d o outro, de tud o aq uilo uma f requenta dora assí dua das e xpos içõe s que oco rrem em minha cidade,
que p o s sib ilite s e r d istinto do q ue é , e m alg um aspecto. Um a e d uc ação poi s, anc ora da em Fra nco (s /d), a cre dit o que, pa ra que o repert óri o c ult u-
que ap os te trans itar p or um itinerário p lural e criativo , s e m regras rígidas ral dos me us a lunos seja ampli ado , é nec ess ári o que o me u próprio est eja
que def inam o s horizontes de po ssibilidade. consta nte mente sendo amplia do, o que s ugi ro a t odo s o s prof ess ore s.
Nes se proje to , t ive a inte nçã o de mos trar às cria nça s que os a rti s-
Com as propostas realizadas, o repertório visual das crianças foi am- tas , quando c ri am a lgo, tê m alguma i nt enci onalida de , algum propós it o em
plia do , de modo que elas e nt ra ra m em c onta to c om dif erente s li ngua ge ns relaç ão à s sua s produç õe s. Entret anto, a i nt erpreta çã o do públic o é algo
(vídeo, livro, c lipe , fo tografi as), art ista s e mate ria is, que normalme nte não impre vi sív el, que a ca ba fugi ndo do controle dos a uto re s.
eram vi stos por ela s como próprios pa ra a re alizaç ão de obras de art e. As- Com a s cri ança s, bus quei trabalhar a s dif erentes pos sibilidade s de
sim, pre te ndi s usc it ar o entendi mento de la s de que o c onhec ime nt o não é signifi cado que uma o bra pos sa gerar, ate nta sempre ao ent endimento de-
fragment ado , div i di do, e que a art e c ont emporâ ne a pode s e r v is t a c omo la s. Co nf orme a co mpree ns ã o que s e obt ém s o bre de t ermi nado as s unto ,
um emara nhado , em que múlti plos fi os se cruzam em v ari ados po nt os. Tal aprof unda mo-nos nas te máti cas e intençõ es do artist a, se m de ixar de lado
como di z Cunha (2 01 0, p. 2 ), "os a rt is ta s ampliam a s no ss as relaç õe s de os sentidos atribuídos pelas crianças ao que está sendo visto. Levo em con-
co nhec imento c om o mundo ao pro po rc io na re m ve rsõ es i nusi ta da s so bre sideração outros aspectos que vão além da relação artista-obra, abordando
as ba na li da de s e e st ra nhezas do mundo ". também a relaç ão obra-es pec tador. Que re lação as cri anças estabe lecem
0 projeto me pe rmi tiu pe rce ber a nec ess ida de de um est ímulo para a entre as obras e as suas vivências e experiências particulares? Que senti-
ida das criança s a e xpo si çõe s, ta mbém pa ra que sua s famílias c onheç am mento s ela s sus citam? Fi nalizo com as reflexões de Ma rtins (200 3, p. 6):

Ed i t o r a M e d i aç ã o 62 63 Editora Mediação
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L

0 q u e no s p a s sa , n o s a c o n t e c e , n o s t o c a q ua n d o é a a r t e q u e p r ovo c a a
exp er i ên c i a? No ss o c or po pe r c ept i vo e p or oso a a c ol he e a ho spe da de nt r o
de nó s , o u r e j e i t a o q u e p a r e c e e s t r a n ho o u a p ar e n te m e nt e se m se n t i d o ? 5
Po r s u a pr ópr i a nat ur ez a, a ar te i n c i t a a ave n tu r a s i n te r pr e ta ti vas , m a s
n e m s e m p r e o s o l h o s e s t ã o c o n vo c a d o s p a r a u m a vi a g e m e s t é t i c a . N e m
RESPINGOS, COLAGENS,
se m p r e n o s d a mo s c on t a d o s c o m p le xo s f l u xo s e r e l aç õ e s q u e p o d e m s e r VOZES, SENSAÇÕES...
es t ab e le c i d o s e nt r e a n o s sa f r u i ç ã o e a pr o du ç ão a r t í st i c a . R e la ç õe s q u e
po d em se r , a pr i nc í pi o , s u pe r f i c i a i s n a s c on s ta t a ç õ e s d e " go s t o" ou " n ã o
Camila Bettim Borges
go st o " , o u q ue po d em n o s le var a um exte n so e i n qu i et o t r a b al ho de c o ns -

tr uç ão de s en t i d os .

Selecionando os materiais...

As c ria nç a s , a s s im c o mo a a rte c o nt e mpo râ ne a , s ã o co ns t i tuí da s


de mui ta s li nguagens. Perce ber e ss as c omple xa s e inst iga nt es manei ra s
de e xpre s s ã o re que r que t e nha mo s um o lha r no v o e o xi ge na do e m re -
la ç ã o a o que c ons i de ramo s a rte c o nt empo râ nea e c o mo v e mo s e c o m-
pree nde mos o que é se r c ria nç a na c o nt e mpora ne i da de. Ne ss e s e nt i do ,
de s lo c ar po s i çõ e s e de se s t abi li zar pos t ura s f re nt e a t a is co nc ei t ua liza -
çõ e s f a ze m-s e impres c indí ve i s . Ass i m, nes t e c a pít ulo , bus c o a pro xima r
cri a nç as e a rte c o nt empo râ nea , t o mando -a s a pa rt ir de s ua s plura li da -
de s e es pe ci fi ci dades , pe rc ebendo -as não c omo po nt o s is olados de uma
reta, ma s c o ngrue nt e s e m sua s li nha s de pe ns a me nt o s , a ç õe s e s e us
proc ess os de c riaç ão.
A art e c onte mpo râne a co ncla ma que c om ela pens emo s o mundo e
as relaç õe s que no s at rav es sa m. As cria nç as c hamam a te nç ão para que
as o lhe mo s c o mo c i da dã s de st e mundo t ã o "pi xe la do " e mult i f a c e t a do .
A art e c ont emporâ ne a , e nt re out ra s propo si ç õe s , inc it a o de s lo c ame nt o
da po si ç ão de a uto ri a i ndi vi dua l para a auto ria co le t iv a , co nsi derando o
o bs e rv a do r c o mo um s uj e i t o que t a mbé m c o mpõ e a o bra . As c ri a nç a s

Ed i t o r a M e d i aç ã o 64 65 Ed i t o r a M e d i aç ã o

1'
Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalha IOrga.l
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO I NFANTI L

experi mentam e viv em os proce sso s de recriaç ão po r meio de aç ões si m- c a da a no , t í nha mo s uma pa s t a mui t o be m o rga ni za da (que v a li a po nt o
bólic as e c onc re ta s, perc ebem-s e out ra s em s uas relaç õe s c om o mundo na médi a fi nal) c om t o da s as po ss i bi li dades de a rt e a pre ndida s e a lguns
te xt os s obre o de se nho i nfa nt i l. Não me re c ordo de vi s i t as a os mus e us
e co m s eus pares.
Pro mo ve r o c onta to da s cria nça s co m a a rt e co nte mporânea re quer o u de di s c ut i rmo s qua i s q ue r a rt i s t a s co nte mporâ neo s , ape na s a lguns
que nó s , e duc a do re s , t e nha mo s t a mbé m uma di s po ni bi li da de e a pre ç o re na s ce nti st a s e rara me nte a lguns mo dernos .
po r ta i s ques t õe s. Nã o há co mo e nxe rgar ou pot e nc ia lizar t a l re la ç ão s e Tanto a pri mei ra le mbra nç a qua nt o a se gunda se rv em pa ra que
nã o ho uv e r de no s s a pa rt e um de s e jo , uma de sa c omo da ç ão , um o lha r pe ns emo s so bre a s fo rma s c o mo a a rt e ade nt ra o s e s paç o s da e s co la ,
"cri anc eiro " (já diri a Mano el de Barros) que bri nca e se dispõe a pe rce ber se ja di re t a me nt e a o s e duc a ndo s ou a os que e st ã o e m pro c es s o de fo r-
a po tê nc i a que e xi st e no inédi to e na s po ss i bi li da des de (re )c ri a çã o, um ma çã o. Não s e trat a aqui de fa ze r juízos s obre c erto s e erra do s ou c olo-
olhar a te nt o que a c ei t e e s t ar junt o c o m a s c ri anç a s e a a rte c ont e mpo - ca r no ba nc o do s ré us o pa ss a do , ma s o lhá -lo de mo do que po s s a mo s
rânea, e m uma re la ç ão que oc orre e ntrelaç ada pela experi ênc ia, pe lo a pre nde r c o m as no va s pos sibili dades que nossa épo c a no s oferece.
0 que me i ntri ga , qua ndo la nç o o lhare s pa ra t rás , é pe rc e be r que a i n-
sensí vel e pelo s process os de cria ção.
da s ã o mui t o pre s e nt e s a ç õ e s de s s e pa s s a do . Ai nda há uma pro f us ã o
ime ns a de pro po st a s de no mi na da s "a rt í s t i c a s " o u de "a rt e na e s c o la "
Do lugar : a escola é um espaço de c unho t e cni c i s ta , que t ê m c o mo re f e rênc i a os me s mo s a rt i s t a s, na s
de arte contemporânea? qua is não se i nt enta o proc ess o cria tiv o da s cri ança s sobre o s mat eria is
ut i li zado s o u s o bre o que a s c one c ta co m de t ermina das obras , ima ge ns
A pe rgunta a c i ma i ns t i ga -no s a pens a r s e , de f a t o, a e s c ola t e m- que s e pro pa g a m e m c a d a o lha r e pe ns a me nto , co nf igurando , as si m,
-s e pro po s to a oc upa r e s s e luga r o u se pe rma ne c e e m si lê nci o . Te nt a r no v a s re la çõ e s e e nt endi ment o s . Percebo, na s propo st a s t ra dic i ona is ,
re sponde r a ta l pe rgunta , lev a-no s a pe ns ar e m no s sa s hi st ória s, i ni ci al- um pe ns a r s o br e a a r t e c o mo um pr o dut o , a i de i a de qu e a s c r i a nç a s
me nt e co mo a lunos , re co rda ndo te mpo s de e sc ola . Da s mi nha s hi st ória s nã o co ns egue m expres sa r s eus po nt os de vi st a, que nã o pe ns am o u que
le mb ro - me d e d o i s mo me nt o s be m espe cífi cos. 0 primei ro , ainda no nã o pro duze m na da de c ria t i vo por s i própri as . At re la da a e ss a ide i a, a
pri me i ro gra u (ho je Ens ino Funda me nt a l), qua ndo t i nha aproxi mada me n- c o n c e p ç ã o de um " bo m t r a ba lho " c o mo s i nô ni mo d e u ma "bo a e be la
te se i s a no s e dev i a pre e nc he r mui t os de s e nho s c om bo li nha s de pape l art e" e , po rt a nto , re t i lí neo , orga ni za do , li mpo e be m f e i to , se m bo rrõe s ,
cre po m o u c o m mi lho de pipo c a e m f o lha s mi me o gra fa da s . Não po dí a - erro s o u de f o rmi da de s de li nha s . Po de mo s a i nda o bs e rv a r uma bus c a
mo s de s e nha r, ne m pi nt a r, ne m i nt e rf e ri r no de s e nho já pro nt o . No s s a de se nfre ada pela repres e nt aç ã o f ie l da rea li dade , pe lo rea li s mo no "t ra -
aç ã o e ra fi c ar c ola ndo bo li nha por bo linha, grã o po r grã o .. . at é f i na liza r ba lho da s cria nç as ".
o v a s t o de se nho que pos s uí a a s dime ns õ e s de uma f o lha ta ma nho A4 . Es s e mo v i me nt o n ã o s e dá à t o a , a f i na l, f o mo s t o do s , educ ado -
0 s e gundo mome nt o, na épo c a e m que re a li za v a o Curs o de Ma gi st é ri o res, ens inados po r mui t o s anos que ess a e ra a f unç ã o da arte, algo
(Ens i no Mé dio ). Ao longo do pro c es s o de f ormaç ã o para t o rna r-me e du- que pe rduro u ao lo ngo de de ze no ve sé culo s. Durant e a lg um te mpo ,
cadora, e m ca da a ula de "didát ic a do ensi no de arte s", a prendí amos uma eram os pi nto res que e xpres s av a m, po r mei o de s uas pi nt ura s , o mundo
"t é c ni c a " pa ra e ns i na r a rt e s , c o mo c ri a r c a rimbo s , de s enho s c o m re t a - exi s te nt e. Era m ele s o s "se nhore s da ve rdade ", e f oi a pa rti r de le s que
lho s de pa pe l, e s f uma ç a r c o m pa lha de a ç o , do bra dur a s . . . Ao f i na l de

67 Ed i t o r a M e di a ç ã o
Editora Mediação 66
ARTE CONTEMP ORÃNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho (Orgs.l

co nst ruímo s no ss a hi s tó ria v is ual. Um exe mplo di s so no Bra s il é o qua - Do modo : como desenvolver
dro "I nde pe ndênc i a o u Mo rt e ", de Pe dro Amé ri c o (1 8 8 8 ), que re t ra t a a experiências em arte contemporânea?
Pro cla maç ã o da Inde pe ndênc ia . Ho je e m di a , e s s a pint ura é c ri ti c a da e
di s c ut ida po r i núme ros hi s t ori a do res que põ e m à pro v a a s re a i s c o ndi - Ao pensa r sobre a arte contemporânea e as crianças na cont empora-
çõ e s e m que o épi c o mo me nt o o co rreu, po rém o f a t o é que e la a s s umi u nei da de , de qual luga r f alamos? Tanto infâ nci a co mo arte co nt emporânea
um lugar no ima gi ná ri o c o le t i v o s o bre aque le mo me nto hi s t óri c o e po lí - encerram conceitos híbri dos, t emas de rece ntes e inqui etante s disc ussões
ti c o do Bra si l a pa rt i r de um t i po de art e pro po s ta pa ra a é po c a : a a rt e e pes qui s a s a ca dêmi c as . No me u e nte ndi me nt o , t ant o a art e c o nt e mpo -
que na rrav a uma rea li da de . râ ne a qua nt o a s c ri anç a s a proxi ma m-s e em t e rmo s do uso de múlt ipla s
Na e s t ei ra da a rt e co nt e mporâ ne a , Ko s ut h, e m s ua o bra One a nd lingua gens, ímpare s e criat iva s, que se co nst ituem de mat éri as do aca so,
three c ha irs' (196 5), ins ti ga -no s a ref le ti r, po r e xe mplo , sobre "o que de experiê nci as e le mbrança s, de t empos -es pa ço s pró pri os . Tal c omo diz
é uma c a de i ra ". Ele a pre s e nt a uma c a de i ra f í si c a , uma i ma ge m e m f o - Ko ha n (2 00 3 , p. 6 3), "a inf ânc ia é int ens idade , um s it uar-se inte nsi vo no
to gra f i a e a de s c ri ç ão e t i mo ló gi c a de la , no s le v a n do a pe ns a r que o s mundo : um s ai r s e mpre do s eu lugar e se si t ua r e m o utro s luga re s , des -
obje to s po de m po s s ui r f o rma s di s t i n t a s de s e re m v i s t o s e pensa do s, conhe cido s, inusit ados, ine spera dos". Por sua vez, "a arte cont emporânea
inc it a ndo -no s a re f let i r so bre as múlt i pla s li ngua ge ns que exi st e m e nã o re s po nde , ela pergunta " (sloga n da 6 a Bie nal do Merco s ul, 2 00 7). É
a ma ne i ra c o mo e l a s re f le t e m no s sa s e xpe riê nci a s e mo do s d e e s t a r abertura pa ra mui tas pos sibilidade s, para o inus ita do, é um a to de a limen-
no mundo . Ao la nç a rmo s o lha re s i ndi v i dua i s pa ra a f o t o gra f i a , pa ra a tar o o lhar c om o que ques tiona e intriga, de ressi gnific ar, de dar uma cara
ca dei ra f í s ic a o u pa ra a de s c ri ç ã o e ti mo ló gi ca da c ade i ra , c o nst ruímo s nova ao que está despercebido, a post uras já estabelecidas, é inquietação.
re la ç õe s s ingulare s para c ada f orma a pres e nt a da . A po nt e e st a be le c ida Ne st e t ext o, t o mo po r ba s e co nce it ual a arte co nt e mporâ ne a c omo
entre o es pe c ta do r e a o bra alte ra -se radic alme nte qua ndo e ss e a vê de "um e nc o nt ro c o nt í nuo e re f le xi v o c o m o mundo " que "lo nge de s e r um
fo rma i nt e ira , pe rc e bendo a s t rês pos s i bi lida des de lingua ge ns exi s te n- pont o fi nal des se proc ess o, a ge como ini cia dor" (ARCHER, 2001 , p. 23 6).
tes e sua s conexõ es . Essa o bra re prese nta uma das fa se s da a rt e e nte n- Da me sma fo rma, part indo de co nc epçõe s do c ampo da Soc io lo gi a da I n-
di da c o mo um proc e ss o do a rt i s ta que nã o oc o rre s ozi nha , ma s pre ci s a fânc ia, vejo a s crianças como "atores indi viduai s e coletiv os empe nha dos
f unda me n t a lme nt e da experi ênc ia do o bs e rv a do r pa ra que reverbere, em agir no s se us mundos de v ida" (F ERREIRA, 20 10 p. 1 55 ).
pa ra que s a ia do es paç o a li c irc uns cri to . Mo st ra que a a rt e nã o pre c is a Percebo, as s i m, e s s a a pro xi ma ç ão e nt re a inf â nc i a e a a rt e c o n-
se r co nf o rma da e m res po st a s so bre o que é , ma s que v iv e das i nda ga - te mporânea e que a a ut enti ci da de e a si ngularidade da a rt e co nt empo râ -
çõ e s e li nha s de pens ame nt o que s us c it a no o bse rva dor. ne a c orrobo ra m pa ra que s e pens e no ens ino da a rte "c om" a s c ria nça s
Re t o rna ndo à ref le xã o f e i t a ant e ri o rme nt e so bre o e ns i no da a rt e e "a pa rt i r" da s s ua s co nc e pç õ e s e v i s õe s de mundo. Ao me s mo t e mpo
vigent e na Educ açã o I nfa nti l, talvez a gra nde quest ão seja c ons ide rarmos e m que e la s v i v e m e c o mpa rt i lha m do mundo do s a dult o s , t ê m c a pa c i -
o que a arte proporcio na às crianças, para o s educadores e para a escola. da de s uf i ci e nte pa ra, c om es s es ele ment os , c ri are m o s e u próprio mun-
A e sc o la nã o t e m a funç ão de f orma r a rti s t as , ma s de ens i na r a pe ns a r do , as suas re alida de s, amplia ndo , s igni fi c ando e re ss i gnif i ca ndo t odo o
"co m a arte ", não a penas sobre a art e. pro ces so de so cia lizaçã o e nv olv ido ne ssa s relaçõ es tão c omplexas ent re
adult os e c ri ança s.
Ver: https://www.morna.org/COIIection/worksl81435.

Ed i t o r a M e di a ç ã o 68 69 Ed i t o r a M e d i aç ã o
Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho IOrgs.l
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L

s
de art e pauta da no s c onc ei tos de o ri ginali da de e de va loriza çã o do ges to
Da ação : apropriação da arte
contemporânea na Educação Infantil cria dor do art ista " (CHIAREL LI, 200 2, p. 2 1). A parti r desse de sloc ame nto
de mat éri a e se nti do , muit os art ist as vã o paut ar sua s o bra s.
"Apro pri a çã o " é uma da s pos s ibi lida de s de pe ns a r/f a ze r a rte co n- Se gundo Arc h e r (2 0 0 1 , p. 3 ), "Duc ha mp pe di a que o o bs e rv a do r
temporânea na infânc ia. A propo sta de a propriaç ão foi inaugura da no prin- pe ns as se so bre o que def ini a a si ngula ri da de da o bra de arte e m mei o à
cí pi o do s é c ulo XX, c o m Pa blo Pi c a s so (18 8 1 -19 7 3 ) e Ge o rges Bra que mult iplic ida de de t odos os o utros obje to s ". 0 que s igni fi c a que a c ria çã o
(18 82 -19 63 ) por me io das suas fa mos as c ola ge ns cubis ta s. pa s s a nã o s o me nt e pe lo a rt i s t a , ma s t a mbé m pe lo o bje t o , pe la o bra e
Alé m de le s, t emo s ai nda inúme ra s re fe rê nci as a rt ís ti cas que s e ut i- po r que m a o bs e rv a, no c a so , o o ut ro - o e spe c t a do r - que t ambé m i rá
liza ram da apropriação para const ituírem seus processos de cri açã o e co mpo r o proc es s o que envo lve a o bra. Is s o não quer di zer s e de sf a ze r
obras. Influenc iados pelos ready-mades: objet os f abric ados e m s érie que do c o nc ei t o de uni da de , mas a a mpli a çã o do s eu s i gnif i ca do, s e u de s lo -
es co lhi a m, c o mprav am, e a se gui r, de s ignav am co mo obra de art e, Ma r camento para outros e spaço s, i ns erindo o ut ro s e nov os e le me nt os . Pa ra
ce l Duc ha mp (1 8 87 -1 9 68 ), Andy W a rho l (1 9 28 -1 9 87 ), Ro y L ic ht e ns t e i n es s e a ut or (p. 2 36 ), "o bs erv a r a art e nã o s i gni f i c a c o ns umi-la pa s si v a -
(1923-1 997) e Nelson Leirne r (193 2) elaboraram suas o bras a partir desse me nt e , mas se to rna r pa rt e de um mundo a o qua l pert e nc e m e s s a a rt e
e e ss e e spec tador".
processo artístico.
Eles busc av am, nas t riv ia lidades urba na s dos grande s c entro s do s As s i m, art ist as, c o mo Duc ha mp, Leirner, Li chte ns te in e W a rho l,
Est ados Unido s, a po tê nci a pa ra quest io narem de maneira irôni ca os mo- no s mos t ra m, c om sua s o bra s e proc e ss o s de c ri a çã o , o quant o a i dei a
dos de vida da soci edade estadunidens e na é poca (1960). 0 vigor art ístico de apropri aç ão é conte mporâ ne a, no s ent ido de se r mai s uma das muit as
consistia, as s i m c o mo f e z R. Mu t t (ps e udô ni mo de Duc hamp), na obra ma ne iras de se falar , pe ns a r e a gi r po r me i o da a rt e . Ma ni f e s t a m s ua s
"F o nt e " (1 91 7), expo r o bje t o s do c o t i di a no e m c o nce i t ua do s loc ais de opi ni õ e s so bre o que a a rt e "po de s e r", pro v oc a ndo no s es pe c t ado re s
$ir
art e, c oloc ando à pro va a s co nc epçõ es de a rt e e de se st rutura ndo idei as surpresas , re puls os , i ro ni as , ri s o s , i nda ga çõ e s e dúvi da s. De rrubam a s
tais co mo originalida de e i neditis mo conc ebidas até então somente a partir ce rt ezas nas qua is a a rt e po r muit o te mpo se a po io u, c omo as repre se n-

do gest o c ria dor do artis ta. ta çõ es fi de di gna s do "rea l" e as no çõ es de c ri a ti vi dade co mo inedi ti smo
Tal processo artís tico resultou na ampliação e varia ção dos materiais e o ri gina lida de , no s le v ando a pe nsa r na s "a pro pri a çõ e s " c omo pro ce s -
de e xperime nt aç ão a rt í st ic a, s usc it ando a pe rgunta : "o quanto uma idei a so s a rt ís t ic os que que st i onam a ori ge m da art e e s ua de fi ni ç ão .
va le ma i s que o s obje to s que a e xpre s s am"? Uma no v a hi s tó ri a da a rt e As co nsi de raç õe s ant eriores s obre "apro priaç ão ", arte co nt emporâ-
co ns ti tui-se a pa rt ir de ss a co nc epç ão . Um s egme nto c onsi de ráv el de ar- nea e inf ânci a me le vam a s uge ri r às es co las de Educa çã o I nf antil nov as
tis ta s pas sa a fazer part e des se no vo e po lê mic o cenário artí sti co , t endo po s si bili da de s de a çã o e c ri a çã o c o m a s c ria nça s . Pa rt i r de "o bje t os e
o c once ito de "a pro pria çã o" co mo idei a-chave e m suas obra s. luga re s c omuns " pa ra de s env o lve r pro c e s so s a rt í s t ic o s "c o m e a part i r
Agora, não se t ra ta ma is de fa bri ca r uma obra a pa rt ir de um ma te - de les ". Ao me s mo t empo , de se nv olv e r pro po st a s "c o m a s c ria nç as ", f a -
ri a l brut o , i nédi t o o u i nexplo ra do , ta mpo uc o de f a bri c ar um nov o o bjet o , ze ndo do es pa ço e duc at iv o um ve rdade iro la bo rat ório de pos si bi lidades ,
mas s im de "c at ar" de te rminados mat eri ai s, e nt re t anto s outros que e xi s- criaçõ es e invenções.
tem, e mo di fi cá -los c om uma inte nç ão e spec íf ic a: "pro blemat izar a noç ão

71 Ed i t o r a M e d i aç ã o
Ed i t o r a M e di a ç ã o 70
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO I NFANTI L Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho IOrgs .l

Do ato : crianças em ação - do cumente tudo c o m fo t os , ví deo s o u grav a çõ es de á udi o e depoi s


comparti lhe com as c ria nças . Es ses proc esso s de criaçã o sã o de las
Ao de s e nv o lv e r pro po s t a s e m art e c ont e mporâ ne a na Educ ação e, po rt a nt o, me rec em "v o lt ar ao s dono s";
Inf ant il, alguns as pec t os dev e m s e r lev a do s em co ns ide ra ç ão pelo e du - e s t e ja di s po ní v e l. As s i m co mo a s c ri a nç a s , apro v e it e e s se s mo -
cador. Ant e s de i ni c i a r qua lque r a ç ã o c o m as crianças, de t enha-s e a me nt o s . Experi ment e e v iv a c o m elas as criações e invenções.

pe ns a r a lgum t e mpo s obre : Entregue -s e'

- o artis ta e a o bra que será apre sentada. Encante -se, fascine-se e


questione sobre a obra e o artista . Este encantamento será de uma Do olhar que acolhe e respeita : afetos e sensibilidade
maneira ou outra captado pelas crianças . Não proponha nada sem
Ao lo ngo de s t e c a pí t ulo , busque i argument ar ac e rc a da pro xi mi -
que não haja um desejo genuíno de fazê-lo;
- considere o artista e a obra como disparadores para pensar na pro- da de que v ejo e nt re as cri ança s e a art e co nte mpo râ nea . Meu de st a que
posta pedagógica, sem que seja uma "releitura"/cópia do artista; final é uma reflexão sobre as relações exis t ente s e ntre c ri anç as , arte

- considere que todo planejamento tem linhas de escape , ou seja, que conte mporânea, s ensi bi li dade e af et o.
a lógica das crianças não é cartesiana e que nem tudo sairá sempre Ao propo rmo s o enco ntro entre a a rte contemporâ nea e as crianç as,
est amo s pos sibili tando que e las nos mos trem caminhos muito ge nuíno s li-
como os adultos pensam;
- leve em conta que o processo de criação não ocorre em um tempo gado s a os seus af eto s e ao que lhes mobili za. As cri anç as most ram que o
específico (3 0 , 4 0 , 50 minutos ), preestabelecido , mas que hav erá sensível reside em cada detalhe, em cada momento e em cada olhar. Olhares

um ir e v ir da criança com o material disponibilizado . Possibilite esse sensíveis atrelados às suas experiênc ias, às referência s que cada uma es-
tabelec e, e que as consti tui co mo cri anças. 0 sens ível pode se r ente ndido,
tempo e respeite-as;
- de preferência , apresente às crianças os materiais disponív eis sem aqui, c omo algo que mexe, cutuca , apro xi ma , ques tio na , intriga. .. "a se n-

que haja um direcionamento prév io ao uso, por exemplo : um guar- sibili dade do i ndi víduo consti tui , a ssi m, o pont o de part ida (e ta lve z, até o
da-chuva , para além de nos proteger da chuv a , pode ser um exce- de chegada ) pa ra no ssas açõe s educacio nais ". Se gundo Dua rte J r. (2 000,

lente suporte de pintura ou um v entilador de gigantes ... Possibilite p. 1 45), a s ensi bili dade res ide exat amente na re inve nção dos sentido s em

que as c ria nças man ipu lem e fa çam usos próprios dos materiais composição c om os novos saberes. As crianças por muitos anos foram vis-
tas como seres de pouc a capac idade, justame nte por "terem vivido menos"
oferecidos;
- ev ite os materiais conv encionais disponív eis nas escolas e desti- po r s a be re m "me nos da v ida ". 0 que e la s no s mo st ra m a t o do mome nt o ,
nados para as aulas de arte , como caneta hidrocor , tinta guache e no e ntanto, é que, c omo adultos, nec essi tamo s olhar a vi da por meio seus
folha A3 branca ... Em tempos de sustentabilidade e de uma cons- olhos, assumindo esse não saber como uma potencialidade, uma capacidade

ciência ambiental global, opte pelo que há de descartáv el: bonecas de olharmos o mundo e as co isa s c omo s e f oss e pela prime ira ve z. Qua n-
velhas e /ou quebradas descartadas , caixas de papelão de diferentes do procuramos o i nédito e m nosso cotidiano ? É prec iso ver, pensar, sentir,
tamanhos , retalhos de roupas , tinta feita d e bete rraba, argila ou afetar-se, "s aborea r e le me nto s do mundo e i nc orporá-lo s a nós , ou s eja,
trazê-los a o corpo para que dele passem a f azer parte " (op. cit. , p. 134).
terra do pátio;

Ed i t o r a M e d i aç ã o 72 73 Ed i t o r a M e d i aç ã o

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AS PRODUÇÕES GRÁFICO-PLÁSTICAS
DAS CRIANÇAS

Andressa Thaís Favero Bertasi


Rodrigo Saballa de Carvalho

Os prime iro s tra ça dos re a li za dos pe lo se r huma no f oram enc ont ra -


do s e m c a ve rna s , grut as , pa re des , t e to s e out ra s s upe rfí c ie s ro cho sa s .
Ca da um dos de se nho s re tra ta do s nes sa s s upe rf íc ie s a pre se nt am expe -
ri ê nc ia s e mo do s de v i da do ho me m pri mi ti v o , que re tra t a va e m gra nde
pa rt e o s a ni mai s que c onhe ci a . Se ndo a s s im, alé m de e xpo r ma rc as de
diferentes époc as, e xperiênci as e modos de v ida, o de senho é uma lingua-
gem que c omunic a, e xpre ss a e co nt a hi st ória s.
É evidente a fascinaçã o que essa linguagem desperta em crianças da
Educ açã o I nfa nti l, que, quando c hegam à es cola, mos tram-se entus ias ma-
das pela descoberta de novas possibilidades de exploração. Entretanto, essa
importante linguagem ainda é mui to desvalo rizada. As práticas pedagógicas
enc ontra da s nas es co las a inda ate ndem apenas às necess idade s bio lógi-
ca s da s cria nç as ou s e preo cupa m demai s em pre pa rá -la s pa ra o Ens ino
Fundamental. Nes sa prá ti ca o a to de des enha r é inexis te nt e. 0 c urrí culo
predominante é centrado na realização de atividades com um fim em si mes-
mas, com ênfase na lista gem de técnicas e datas comemorativas, além uma
ausê ncia de relaçã o entre as pro post as dese nvolvidas. Ass im, nes sa c on-
cepçã o, o desenho é apres entado pro nto para a s cri anças que passa m por
diversas at ividades co m o produt o final mai s valoriza do do que o processo.

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PI ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Sahalla de Carvalho IOrgs.h

ti

Mui to s prof es so re s ainda v ee m o de se nho ape na s co mo uma f orma as produçõ es gráf ic as das cria nça s, pro ble ma ti zando a s relaç õe s que i n-
de apri morar a c oorde na çã o mot ora fina, c omo uma e xpres sã o do de se n- te rf erem nos s eus percurs os c ri adore s. Por f im, de sc rev eremos pro po si -
vo lvi ment o ps ic o lógi co ou c omo um me i o, um i ns t rume nt o pa ra div e rs o s ções de des enho c omo sugestõ es didátic as para os profes sores.
fi ns a s eu s erv i ç o. Corro bo ra ndo o a rgume nto , Augus to (20 0 9 ) de st a c a
que o prof es sor a inda proc ura a f igura ção , o elo gi o, a de st reza, o us o de
Pensando os traçados: escritas sobre o ato de desenhar
certas cores e a habilidade de quem desenha formas próximas da perfeição.
Alé m di ss o, exis te m pro fe ss ore s que seguram nas mã os dos alunos
Qua ndo um pro f e ss o r s e pe rmi t e o lha r c o m a t e nçã o o s t ra ç a do s ,
pa ra que a pi nt ura fi que perf ei t a, dent ro do li mi te impos t o pe lo de s enho
as formas e as co re s a pre se nta das no dese nho de uma criança, v isuali za
aca bado. As c ria nç as que c onsegue m t al fa ça nha s ozi nhas re cebem elo-
ve s tí gio s de s ua s ingula ri dade , cult ura e mo do s de v i v e r. Ao s o li ci t ar,
gi os , so rris os e a plaus os , as que não c onse gue m ac abam s endo menos -
t a mb é m, que e la f a le s o bre s e u de s e nho , verifica que s e u di s c urs o é
preza das, ignoradas e/ou class ifica das c omo i ncapa zes. Em ca sos e m que
pautado e m i nte res ses indi viduai s que surgem a pa rti r de s uas interaçõ es
o a luno t em a poss ibi lidade de produzir se u dese nho , c om tra çados e f or-
sociai s mais relev antes.
mas próprias , o s prof ess ore s a cabam int erf eri ndo e modifi cando os des e-
Para Gobbi (2 0 0 9), os des e nho s inf a nt i s s ã o f o rma s pri v ile gia da s
nhos tendo em v ista a organiza ção, a li mpeza e os traç os pe rfeit os. Essas
de expres s ã o. A a t i tude i nv es t i ga t i va do pro f e ss o r, que o s c o nte mpla a
conce pç õe s do des enho nã o apre se nt am a cria nç a co mo suje it o at iv o no
pa rt i r do s o lha re s das cria nça s pode c ont ri bui r pa ra a çõ es po lí t ic as que
mundo , co m si ngula ri da de s, pe ns amento s e i nt erpret aç ões pró pria s.
as re s pe i t e m e m t e rmo s de s e u mundo v i v i do , imagi na do e c o ns t ruí do ,
Ao contrá rio disso, ne s t e t e xt o , de f e nde mo s a ima ge m de uma
analisando suas co ncepções so bre os fenô meno s s ocia is.
cri ança que, desde que che ga à ce na huma na , vi venci a experiê nci as que
0 at o de des enha r é uma linguagem i mporta nt e a s er c onst it uí da na
vã o c o ns ti t ui ndo sua s i ngula ri da de e t a mbé m sua s ma ni f e st a çõ e s e x-
inf ânci a. Com o de se nho, a s c ri ança s po de m e xpre ss ar o utras f orma s de
pre ssi vas . A pa rti r da int era ção co m o mundo, ela elabora se u pens ame n-
olha r, ima gina r, pensar e s ent ir o mundo à sua volta. Enqua nto des enham,
to , que mui t a s v e zes é de mo nst ra do po r me i o de um de s e nho, que nã o
relembram, dia lo ga m, na rram, fa nt as ia m, pla ne ja m. Com is so, é possível
pre c is a fi c a r pe rf e i to e i dê nt i c o a o o bjet o de s e nha do, mas que , me s mo
perceber como elas pensam sobre a cultura, a história e a sociedade, carac-
ass im, a pres ent a a parti cularida de c om a qua l a cri ança olha os dive rs os
terizando seu ponto de vista e deixando marcas por meio dos seus traçados.
co nt ext os a que t em a c es so .
0 papel da es co la e do prof es so r é o de of erta r uma di ve rs idade de
Por i sso mesmo , é indi spens ável, nos dif erentes e spaç os es cola res,
experiênci as de f orma que a c apa ci dade de cria ção v enha a ser e xerci da
a o bs ervaç ão de c ri ança s debruçadas e co nc entrada s so bre s uport es di-
pelas c ri ança s, propos ta s de qua li dade e que co ns idere m a exploraç ão a
vers ifi cados, experime ntando, co m dife rentes ma teri ais , o s mais va ria dos
se r pro po rci o nada , de f o rma que as c ri a nç a s t e nha m a pos s i bi lida de de
ris cos , rabi sc os, fo rma s e c ore s que se u dese nho pode adqui ri r. Ou seja,
de sf ruta r de at i vi da de s a trat i va s, e nvo lv ent es , apa ixonant es , que permi -
a e sc ola pre cis a propo rc io nar à s cri ança s momentos e m que c ontemplem
tam viv ênc ias ímpares e a evo luç ão do seu de senho.
experi ênc ias única s, em que c ada de senho seja ent endido co mo uma pro-
De a cordo c om Gobbi, (20 10), muitas ve zes, as ri cas manifes taç ões
duçã o c heia de his tórias e s ignific ado s ímpares.
que a s cri anças utilizam para se expres sar s ão enfraquecida s no cotidiano
Nes sa perspec ti va , pret ende mo s trazer a lguns aporte s te óric os s o-
infantil pe la ausênci a de propos tas que ga rantam proc essos de c riação que
bre o tema , alé m de apres entar e analisa r os pensa mento s que perpassam

Ed i t o r a M e di a ç ã o 76
77 Editora Mediação

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ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L Susana Rangel V ieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho IOrgs .)

ti

contemplem que stiona mentos, a busc a cria tiva po r diferentes materia is e o Alé m di s s o , t o rna -s e ne c e s s á ri o um o lha r at e nt o a o s de s e nho s a
respeito pelo pró prio tra balho e do outro. Para que tal enf raquecimento não que a cri a nç a t e m a c es s o no s e u c o ti di a no e que i nf lue nc i a m nas s ua s
ocorra, é preciso observar três aspectos essenciais: os materiais, os supor- cria ç õe s , poi s , qua ndo e la a pe nas te m c ont at o c o m des enhos que a pre -
te s e os es pa ço s'. Qua nt o mai s es pa ç os f orem ut ilizado s, e qua nto mai s s e nt a m uma f o rma de de s e nh a r ma i s v a lo r i za da o u c o m t ra ç a do s pe r-
ampla for a variedade de materiais e suporte s ofe recidos às cria nças para fe i t os , é f re que nte o bse rv á-la di ze r que nã o s a be de s enha r o u so li ci t a r
desenhar, mais c larame nte c onseguirão comunicar seus pontos de v ista. que o utro s c ole ga s , o u a té me s mo a prof e s s o ra , de se nhe po r e la a lgo .
Me s mo que a e s co la nã o pos s ua gra ndes re c urs o s e es paç o s , um Pa ra e vi t a r i ss o , a s pro po s ta s de de s enho prec i s am pro porc io na r o c o -
olhar at ento e dinâmico do pro fes so r permit e enxergar poss ibili da des que nhe ci ment o da s div e rs a s re pre se nta ç õe s que um me smo ele me nto po de
outro s não visualizam. Se não tiv er muitos mate riais industri aliza dos, pode adquirir, po r meio de vi sit as a muse us , o u planeja ndo si tua çõe s de a pre n-
preparar ti nta de terra co m as crianças, disponibili zar gravet os, f olhas , pe- di za ge m em que a s c ri ança s te nham a oportuni da de de a prec ia r um mes -
dra s, grã os , plás ti co s, pa pe lõ es , pa pé is , te ci do s e o ut ro s de bai xo c us to mo ele me nto e m dife re nte s obras de arte , a nalis ando os tra ça dos usados
co mo s upo rt e s. Se a e s co la co nt a r co m e spaç o s re s trit o s, a s pro pos ta s pelos a rti st as e m s eus des enho s.
podem s er e xec ut adas e mba ixo da s mes as da sa la de a ula, na s pa re de s, De a c o rdo c o m lav elberg (2013, p. 16), "prende r a c ri anç a à re-
no chão liso , no c hão á spero, em gra des , árvo res . Enfi m, é po ss íve l pro- pres e nt a çã o do re al é c oloc á -la a qué m de s uas po ss i bi lida de s e m duplo
pici ar e xpe riências de qua lida de quando o profes sor inv esti ga, pes quis a e se nti do : po r de sc o ns i dera r s e us mo do s de de s e nha r e po r af a s ta r se us
pres ta ate nção na s possi bilida des que es tão à s ua volta. de se nhos da a rt e c omo é c once bida na c o nt empo ranei da de". Apres enta r
Para ca da e s paç o uti li za do , é pos sív el di s po r de di v e rs os s upo r- os t ra ça do s que di fe re nt es a rt is ta s ut ilizam e m suas o bras permi te que a
te s que, po r s ua v ez, po de m s e r e xpe rime nt a do s c o m v á ri os ma t eri a i s , cria nç a amplie se u re pe rt ório vi sual e perc eba que nã o exi st e uma únic a
fa ze ndo c o m que as po s s i bi li da de s de e xplo ra ç ã o s eja m a bunda nt e s e fo rma de des e nhar. Com is s o, e la t ende a de mons trar ma is se guranç a e

pra ti ca me nt e inco nt áv ei s. confi anç a no at o de des enhar, explo rando to da s a s pos si bilidade s de tra-
Para la velberg (2 013 ), ao faze r uso de dive rso s mate riai s, a c ria nça çados e c ore s que os ma te ri ai s dis po ní ve is po de m lhe o fe re ce r. 0 at o de
pe rc ebe que des enha r te m magia , que e nv olve i maginaç ão . Nes se s enti - des enha r pa ss a a ser i nt ei ra me nt e da cria nç a, f azendo co m que a be le za
do , uma c ri anç a que e st á ut i li za ndo c omo e spaç o o pis o á spero do pá ti o de se u de se nho es te ja na apro pria çã o da i ma gi na çã o, na de sc oberta , no
da e sc o la e co mo s uport e uma f o lha A3 t e m a po s s ibi lida de de e xplo ra r inusi tado e não e m linhas , fo rma s e t ra ço s perfei to s.
inúmero s ma t eri a i s s e pa ra da me nt e c omo a t i nt a gua c he, t int a na nqui m, Os de senho s "pe rfe it os ", po r o ut ro la do, e xpost os muit as ve zes nos
canet inha s, lápis de c or, giz de ce ra, giz de quadro , gi z pa stel, carvão, en- corre do res das es co la s, pre c i s am s e r s ubs t it uí do s pe lo s de s e nho s do s
tre outros. Cada um do s materiai s te sta dos em seu fazer a rtí stic o i mpri mi- alunos, mo s tra ndo s eus olha re s , suas marca s, suas de sc obe rt as , s eus
rá uma expe riê nci a dif ere nte e única que a mplia rá seu repe rtó rio a rtí sti co inte res ses e, pri nci palment e, suas criaç ões. De ssa maneira, ao v isuali zar
e t ra ns fo rma rá s ua s f ut uras produç õe s. co mo o s c o le gas re t rat a ra m de t e rmi na da pro po s t a , e le s tê m a pos s i bi -
li da de de v e r o ut ra s f o rma s de pe ns a r, o ut ro s t ra ç a do s , outras c ores .
Nes se proc ess o, inte rna li za m essas i ma ge n s e pe rc e be m que e xi s t e m
' Mat eri al é o in s tr um en to qu e pos s i bil it a a r ea li z aç ão do s tr aç a do s , fo rm as e c o res n o a to d e d es e- di v ers as f ormas de e xpres s ar s eu pe nsa me nt o . Exe mpli f ic a ndo : s e uma
nha r. Su por te é o m ei o q ue fo rne c e a base para que o des enh o a c on teç a. Es paç o é o loc al em que o
s uport e s er á c ol oc ado para a rea liz aç ão do proc e s s o d e c ri aç ão.
cri anç a s empre ut i liza o azul e o v erde e m s eus de se nhos e, durant e a s

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Editora Mediação 78
Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho (Orgs .l
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L

socializações, obs e rv a r as o ut ra s co re s que os colegas ut ilizaram, ou Marcas visíveis : revelando os pensamentos das crianças
ai nda, s e algum co le ga lhe que st io nar s obre e ss as c ores , obse rv ará que
po de ut i li za r o utra s no s pró xi mo s de s enho s. Por c ont a di s so , te rá ma i s Os de senho s das cri anças reve lam seus traço s cultura is e ponto s de
li be rda de na e xplo raç ão do s ma te ria is di sponí ve is . A perc epçã o e mpre - vista distintos. A reflexão e a observação atenta, durante o percurso criador,
gada nes se proce sso pos sibi lita rá a re cons truç ão e labo rada de sua s cria- possibili tam ao professor o acess o a eleme ntos que influenciaram a consti-
çõ es , além da amplia çã o da habilidade de a çã o e re flexão . De ss a fo rma, tuição do desenho, levando-o a refletir mais profundamente sobre a criança.
o de se nho f a vo re ce s eu des e nvo lv ime nto i nt e gra l, po i s , po r me i o de le , Co m ba se na s pa ss agens s elec io na das para no s sa a ná li se , obser-

sua s c apaci da des i nte lec tuais e co gniti vas s ão aprimorada s. va mos que as cri a nç a s o rga niza m o s pe ns a ment os que pe rme i a m a s ua
Outra ques tão a dest aca r é que o ato de des enhar não pode o correr pro duç ã o t endo e m vi s ta e xpre ss á -lo s e c ons trui r uma narra çã o . Dessa
is o la da me nt e , uma a t i v i da de c o m um f i m e m s i me s ma , é pre c i s o c ri a r fo rma, é i ndis c ut ív el a nec es s idade de pro ble ma ti za r suas ve rbalizaç õe s
si t ua ç õ e s de a pre ndi za ge m na s qua is a c ri a nç a t e nha o po rt uni da de de durant e a aç ão grá fic a e ao fi nal do s dese nho s.
apreciar obras de artistas, explorar o f azer artístico e ref letir sobre as suas Exemplif ic ando , co ment are mo s alguns coment ári os das crianças
pro duç ões e as de seus c ole gas pa ra amplia r s eus po nto s de v ist a. durante a produç ão de auto rre trat os. Para essa ativi dade, ut ilizamos ,
É i mpo rta nte o prof e s so r pe nsa r s o bre os des e nho s da s c ria nça s , como es paço , a sala de a ula, as mes as e, c omo suport e, uma folha s ulf ite
po i s , pe lo f at o de e st a re m re la c i ona dos à v i da de las , co nt am his t ó ri a s . 60 . No c e nt ro da me s a , co lo ca mo s mat eria is , co mo pinc éi s , na nqui m,
Sta cc io li (2011) acredi ta que os des enhos são o e s pe lho dos pensa- ca net õ e s, c ane t inha s, lápi s de co r, gi z de ce ra e t int a gua che pa ra que
me nt os das c ri a nça s , re f le t i ndo , a pe na s em part e , a s pro po s t as que s e as c ria nç a s ti v es se m a o portunidade de e sc olher o s que co ns i de ra s se m
fa zem. Ao o lha r s uas pro duçõ e s c o mo s imples repre se nta ç õ es da re ali - ma is a pro pria do s. Além dis s o, a o fi nal da pro po st a, s o li ci ta mo s que e la s
da de , de sc o ns i de ra -s e a mult i pli c ida de de pe ns a me nt o s e de e mo ç õ e s falas se m so bre se us des enho s, t endo e m vi st a ouvi r se us c omentá ri os e
env o lv i do s no s e u proc e ss o de criação. Po rt anto , e s t a mo s a f i rma ndo dese nca dear di scus sõe s, diálogos e transfo rmaç ões grá fic as.
que o de s e nho da c ri a nç a a c o nt e c e na re la çã o e nt re o s e u re pe rt ório Re produzimo s s e us c o ment á ri o s ne s te t ext o ta l co mo f o ram f ei t o s
vi sua l e o s eu pe ns a me nt o . Ou se ja , no a to de des e nhar, e la re sga ta de e usa mos no mes fi c tí c io s pa ra a s c ri a nç a s t endo e m v i st a pres e rv a r a s
sua me mó ri a as i ma ge ns s o bre de t e rmi nado te ma e c ria uma i de i a pa ra sua s i de nti dade s. Alguns e pis ó di o s f o ra m a qui re lat a do s pa ra exe mplif i -
ca r o pro ce s s o de aná li se que le v ou e m c o nsi de raç ã o o de se nho c o mo
seu dese nho.
Nes se proce sso de c ri açã o, se u pens ament o vai se ndo e laborado e pro duçã o di sc ursi va (CUNHA, 20 15 ). Durante a produç ão , ci nc o cria nç as
sua i de i a pas sa a t er uma repres e nt aç ã o v is ual. Olha r o s de s enhos da s de ci nc o anos f oram i nc enti va da s a uti li za r o es pa ço , o supo rt e e os ma-
cria nça s é re f le t i r s o bre se us pe nsa ment os , sua s pe rce pç õ es e s ua s teri ais dis poni bili zados para explora r a linguagem do desenho, usa ndo sua
imaginaçã o e cria tividade , expres sando, as sim, sua s vivênc ias, narrativas,
fo rma s de co mpre e nde r o que e s t á à s ua v o lt a .
As c ons ta nt e s inte rpret a çõ es que a c ri ança re ali za no diá lo go co m mo do s de olha r o mundo à sua v olta .
os se us des e nho s e c o m os de se us c o lega s pro pi c ia m uma criação No de co rrer da pro po sta , pe rc ebemo s que a int eraç ão c om os c ole-
ta le nt os a. Ela é res ponsáv el por sua co ns t ruç ão . A c a da no v a i nt e r- ga s e c o m o s mat e ri a is re sulto u na mo di f ic a çã o das pro duç õe s gráf i ca s
pre ta çã o, o pe ns a me nt o i nf a nt i l é re de f i ni do , ge rando repres e nt a çõ e s de quat ro da s c inco cria nça s à medi da que ia m o bs e rv ando, no des e nho
do s c o le gas , a lgo que lhes cha ma s se a a te nçã o , o u a inda, po r c o nt a de
renova das e origi nai s.

81 Ed i t o r a M e d i aç ã o
Ed i t o r a M e di a ç ã o 80
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO I NFANTI L Susana Rangel Vieira da c unha e Rodrigo S aballa de Carvalho (0rgs .)

comentários deles que suscitaram nov os temas para o desenho , conforme hav ia mais espaço, já que a intenção inicial não era desenhar um arco-íris.
pode ser observado na transcriçãoz a seguir: Parece -nos que, a partir da fala do colega e de o traçado da linha laranja
lhe sugerir um arco -íris, ocorreu uma mudança no pensamento de Maria-
Episódio 1 na que ficou ev ide nte por meio de s ua fala. Além diss o, pelo que disse
Paulo: Mas s ó que , não, não tava f rio . T ava o s o l as s im grand e , m as s ó
Mariana , verificamos que ocorreu uma mudança em seus planos de fazer
que tava c ho ve nd o.
Pe sq ui sa d or a: H u m, t i n h a c h uva e s ol ?
a escuridão, já que ela sentiu a necessidade de mudá-la de cor logo na
Paulo: Sim, é por isso que aparece o arco-íris. parte superior da folha, em que utilizou as cores rosa-claro, rosa-escuro e
Mariana: A h, p ro f e, vai te r a e s c urid ão e vai te r um arc o-í ris aq ui na e s - azul-claro para expressar seu pensamento.
curid ão, po rque tá c hove nd o e te m s o lzinho . Posteriormente , quando Paulo percebeu que Mariana desenhou uma
escuridão , também modificou seu desenho, passando nanquim preto so-
Paulo: Olha as ondas. As ondas tão aumentando por causa que tá chovendo
bre todo o seu arco-íris. A ação gráfica de Paulo pode ter a intenção de
muito. expressar um fenômeno que ocorre na natureza, provavelmente já v iv en-
Mariana: (...) A escuridão também tô fazendo de preto. (...) Vou ter que ciado por ele , em que sai o sol, começa a chov er, surge o arco-íris e de-
mudar de cor a escuridão. Eu vou fazer uma escuridão super colorida, pois só permanece a chuva.
sabe, profe? No ato de desenhar de Mariana e Paulo , ocorreu, segundo nosso en-
Paulo: E a escuridão minha tem que colocar essa cor (referindo-se ao nan- tendimento, um processo de imitação , não de cópia. Explicando a diferença
quim).(Arquivo dos autores) entre imitação e cópia , De rdyk ( 2015) ressalta que a capacidade de imitar

Nesse epis ódio , percebe -se que o s des enhos de Paulo e de Mariana decorre da experiência pessoal de cada criança , sendo uma maneira de se

pa s sa ram po r t rans fo rma ç õe s gráf i c as po r c o nt a do s c ome nt á ri o s e nt re apropriar de determinada representação . Observando o desenho do Paulo e
M' o da Mariana , pode -se, assim, dizer que não são iguais. 0 que significa que,
eles dura nt e o a to de des e nhar. Pri me i ra me nt e , quem re ali za a muda nç a
é a Ma ri a na , que e s ta v a co me ç ando a pi nt a r a e s c uri dã o e , apó s ouv i r mesmo que uma criança imite a ação de outra, estará representando a mes-

Pa ulo c o me nt a r que f e z um a rc o -í ris no s e u de s e nho , re s o lv eu no me a r ma ideia de uma forma própria , singular, neste caso, o arco-íris e a escuridão.

de arc o-í ris a linha la ra nja que c o me ç a v a e m uma e xt re mi da de lateral


Episódio 2
da f o lha pa ra a o ut ra e m t o rno da me ni na que e la já ha v i a de s e nha do .
Pesquisadora: Me fale sobre o seu desenho.
Insa ti s fe it a c om s e u arco -íris , Ma ri a na i nc lui o ut ra li nha , de s s a v e z na João: Um menino que tava na escuridão , que apareceu um arco-íris.
co r ma rro m so bre a li nha lara nja , Qua ndo Ma ria na c o meç o u a de s e nha r Joana : Eu fiz uma menina , só que ela tava na chuva, molhou tudo e tava
a e s c uri dã o , o bs erv a mo s que a s ua li nha marro m f i c av a mui t o pró xi ma queimando.
da li nha la ra nja na s duas extremidades . Ta lv ez po rque e la não des ejas se (Ar quivo dos aut or es)

que s ua li nha ma rrom f i c as s e e sc o ndi da na es c uri dã o que c o me ça v a a


ga nha r es paç o no la do e s que rdo da f olha e po rque , no la do dire i to , nã o Nesse episódio , observamos que, apesar de João não ter verbalizado
seu pensamento durante a produção gráfica, sua fala, no encerramento
do desenho, seguiu o mode lo d o de Maria na e Paulo . Corroborando o
2 Todos os episódios descritos no decorrer das análises referem-se às narrativas orais das crianças
argumento , Silva (2 00 2) destaca que, durante o desenho , os colegas
durante e após a produção dos desenhos.

Edi t o r a Me di aç ão 82 83 Edi t o r a M e di aç ão
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO INFA NTIL
Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho IOrgs.l

vã o a po nt a do pi s ta s que pe rmi t e m que c a da c ri a nç a a v a nc e po r c o nt a const ituem se u fazer gráf ic o. Durante a aç ão, a s cri anças v ão de senha n-
pró pri a , a pli c ando o re pe rt ó ri o grá fi c o a que t e m a c e s s o . Em s e us c o - do e as figura s vão a ssumindo posiç ões variadas (DERDYK, 2015). Assim,
mentá ri os , Jo ana inc orpo ro u a fa la dos co le ga s pa ra e xplic ar o res ulta do a c ada t raç ado que re aliza m, no va s f ormas vã o se co nfi gurando , s ugeri n-
da s ua pro duç ão gráf i ca . Dura nt e o epis ó di o 1 , Mari ana e Pa ulo f ala ra m do outro s rumos e narraç ões dos de se nhos. Alé m dis so, a hist ória do de-
so bre a que st ã o da chuv a. Co mo é po ss í ve l obs erva r, Jo ana i nt erpre to u se nho e s tá pa uta da na int erpre t aç ã o que f a ze m do s e u de s enho. Mui ta s
a c huv a de uma ma ne ira si ngula r, poi s , e nqua nt o o c e ntro do deba t e de co nt am his t ória s ba s ta nt e de ta lha da s, prov av elme nt e porque s eus de se -
seus cole gas eram o so l e a chuva, a fo rmaç ão do arc o-íris e a es curi dão, nho s repres entam s ituaç ões vi vi das , alé m dos pens ame nt os que res ult am
o pe ns a me nt o de Ma ri a na pe rpa s s o u o mo lha r da c huv a e s ua re la ç ã o da relação e ntre s ua ima ginaçã o e o seu co tidiano. Olhar os desenhos das
com o que imar. Des sa f orma , pode se r que a i de ia i ni ci al de J oa na f os se cria nça s e a c ompa nha r o s e u pe rcurso c ria do r c o m at e nç ão é e ss enc ia l
out ra, mas , a pa rti r das o bs e rv aç õ e s do s c o lega s , ho uve uma muda nç a para que o profe sso r poss a c ompree ndê -la s e m s ua singulari dade, des en-
de s i gnif i ca do em se u des e nho , re s ulta ndo em uma narra ç ão inédi ta . vo lv endo sua se nsi bi li da de pa ra vi sualiza r as hi st ória s que o s des enho s
Nos t re cho s anali sa do s, re para mo s que a es trut ura do s mat eria is , das c ri anças c onta m.
pri nci palmente a c or, ga nho u bast ant e dest aque, pas sando, em muito s c a-
sos, a orientar o desejo de as crianças tornarem visíveis seus pensamentos.
Propostas de desenho: algumas sugestões
Ma r i a n a : A c h o q ue a g o r a vo u p r e c i s a r d o m a r r o m .
Mariana: Ah... b ranco ! V o u p rec isar f aze r o q ue de branc o ? V o u f aze r o s
A partir dessas considerações sobre a pesquisa realizada, apresenta-
po ntinho s de branc o . Eu me es q ue ci antes .
mos algumas sugestões de propostas de desenhos que propiciem às crianças
Ma r i a na : Ol h a e u f i z o s o l h o s e a b o c a . 0 q u e m a i s e u vo u p r e c i s a r f a -
a investigação de soluções gráficas de expressão dos seus pensamentos.
ze r de p r et o ? Ah . . . vo u f a z er a e s c u r i d ã o . E u vo u p i n t a r t u d o i s s o a q u i
( r ef er i n do - s e à l at er al e sq ue r da d a f o lh a) .
(Arquivo dos autores) - De sen ho na parede : t o das a s c ri a nç a s gos t a m de des e nhar na s
paredes . Po r co nt a di ss o, o pro fe ss or pode apro ve it ar e ss e de se jo nat u-
Nos comentários de Mariana observ am -se du as fo rmas de ela re- ra l, e s co lhe r uma pa rede da es c ola , i nt erna o u e xte rna, fa ze r uma f ai xa
lacionar-se com as cores . Primeiramente , menciona que a cor de que co m f o lha de o f íc i o pre t a e o f ere ce r gi z de quadro para que a s c ri a nç a s
precisa para que seu desenho esteja de acordo com seu pensamento é a faç am dese nhos . Geralmente , as cria nç as de se nha m apena s se nta da s e/
marrom , mostrando que essa deve satisfazer uma ideia preconcebida. No ou a poi a da s e m mes a s de ntro da s ala de a ula . Qua ndo o pro fe ss o r pos -
entanto , a seguir , o processo se inv erte. Mariana tem a cor projetada para si bi lit a que o at o de de s e nha r ac o nt e ça e m e s pa ço s di st i nt os de f o rma
um pensamento que ainda está em elaboração . Em ocasiões como essa, que a s e las f iquem em o ut ras po s iç õ e s: em pé , de i ta das , a c o co rada s -,
percebemos que a exploração dos materiais nutre os processos de forma- o prof es s or f av ore ce nov as expe ri ênc ia s es té t ic as que amplia m o reper-
ção conceitual das crianças (SIL VA, 20 0 2). Quando elas refletem sobre tório grá fi co das c ria nça s.
qual cor precisam ou quando pensam em qual parte do desenho precisam
empregar determinada cor, estão em elaboração dos pensamentos que - Desenho embaixo das mesas : para ampliar a perce pçã o es pa ci al
da s c ri a nç a s e de s a f i á -la s a e xpe ri me nt a r s e u c o rpo a li a do a o a t o de

Ed i t o r a M e d i aç ã o 84
85 Ed i t o r a M e d i aç ã o
A RTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO INF A NTIL Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho (Orgs.1

desenhar em diferentes posições, pode -se coloc ar fo lha s A3 em baixo - Introduzindo suportes diferentes : nossa sugest ão bas eia -se na
das mes as e o ferece r cane tinhas , can etõ es e g iz de ce ra para q ue as le it ura de "0 l i v r o c o m um buraco ", de He rv é Tulle t (2014), uma o bra
crianças ali desenhem. de lit e ra tura infa nti l. Ne le , e xi st e um bura c o na la te ra l e squerda da c apa
Durante o ato de desenhar , o pensamento das crianças v ai sendo que , qua ndo o livro é a be rto , pas sa a es tar no mei o de todas as pági na s,
colocado em ação por meio dos seus traçados . Segundo Barbieri (2012), permit indo que as cri anç as inv ent em dif ere nte s mane ira s de i nte ragir com
a crianç a só é c apaz de pen sar com o mo v ime nto , ou seja , a ação da ele. Para dese nvo lve r e ssa pro pos ta, o prof es so r irá se lec io na r fo lhas ,
criança está incorporada ao seu pensamento . Por isso, ao proporcionar pa pé is , emba la ge ns , et c. de di fe re nt es t amanho s, f azendo neles burac os
que a ação gráfica aconteça com o corpo em uma posição div ersificada, de di fe rente s f o rma s e t ama nho s. I rá dis pô -lo s no c hã o da s a la de a ula ,
contribui-se para o aperfeiçoamento de mov imentos e diferentes respos- e as cri anç as po derã o uti li zar em se us des e nho s ca net i nha s, ca net õ es ,
tas do corpo na expressão do pensamento infantil. lápis de co r, co la co lorida, nanquim, t int as co loridas, c arv ão ve get al e os
mai s di verso s pi ncé is , tendo por obje ti vo cria r algo que lev e em co nt a os
- Desenho em saco plástico : inicia lme nte o profe sso r de verá co lo- bura cos exi stentes nes ses dif ere ntes suport es.
ca r, de nt ro de um sa c o plá st ic o, uma fo lha s ulf it e A4, o fe rec endo um s u
porte vis ual à cri anç a, e, ent ão, di spo nibili zará c ane tõe s à ba se de álc ool - Desenhando com pedrinhas : pedrinhas são um material mais pe-
para a aç ão grá fic a. Depois de de senharem nos sa cos plást ico s, irá le var sado, por isso , para essa proposta , sugere-se ut ilizar pranchas de madeira
as c ria nça s a uma sa la esc ura ou es cure cer a pró pri a s ala, proje tando luz ou papéis mais resistentes. 0 prof e ss or of e re ce rá pe dri nha s de vá ria s
na pare de com uma lant erna e pro pondo que elas e xplore m a s s ombras do cores e c ola . As cri anç as us arã o a c ola pa ra pre nder as pedri nha s no s u-
seu pró pri o co rpo na pa rede, perc ebendo que se transf ormam (tamanho e po rte . De poi s da pro duç ão dos de s enho s, orga ni zar uma ro da de leitura
forma ) so b o ef ei to da luz. grupa l c om to da s a s produçõ es di spo st as no c ent ro , c onvidando as crian-
Da ndo c ont inui dade a e ss a pro pos ta , e la s i rã o pro jet ar se us de se - ças a falare m entre si s obre s uas criações e as dos co legas.
nho s no plá st i c o junt o a o s e u c o rpo c o loc a ndo -se na frente da luz. I rão
obs e rv a r que o s t raç o s nã o pode m s e r to c a do s o u e s c o ndi dos e que a Por meio dessas e de outras propostas criadas por cada professor,
so mbra do s traç os se ref le t e ta mbém em s ua s roupa s, c o rpos , et c ., des - adaptadas , é claro, às possibilidades e limites de sua escola , as crianças
co bert as que , e m gera l, f as c ina m a s c ri a nç a s. Um t erc ei ro pas s o des s a irão aperfeiçoar seus desenhos e encontrar diferentes formas de represen-
pro po st a se rá pro por que f aç am um des enho mai or t ambém no sa co plá s- tar seus pensamentos . 0 ato de desenhar passará a ser mov ido por nov as
tico . Entã o, o profe sso r i rá prender outro plá sti co do tamanho da proje ção motivações e interesses , que, por sua vez , suscitarão novas investigações
na pa re de , e a s c ri anç a s i rã o re cri a r o de s e nho pro je ta do , pa ss a ndo a e vivências estéticas. A preocupação do professor em oferecer novas
cane ta s obre o seu tra çado amplia do. Ao fina l, esse po de s er c olo cado no propostas dev e alimentar as práticas diárias, pois, quanto mais a criança
chã o, pi nta do c om co la c o lo rida e , quando e st i ve r pro nt o , s erv ir de co r- explorar os materiais, mais aperfeiçoará seus processos de elaboração
ti na o u c e ná rio de a lguma bri nca dei ra de f a z de c o nt a , i nce nti v a ndo -s e , conceitual, com mais liberdade e confiança para falar sobre os seus dese-
ta mbé m, o jo go s i mbó lic o . nhos e narrar as histórias que eles contam (SI LVA, 20 02 ).

Ed i t o r a M e d i aç ã o 86 87 Editora Mediação
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO I NFANTI L

0 desenho : um universo de pensamentos

0 desenho é uma importante linguagem de comunicação humana,


7
e a escola tem a responsabilidade de promover o desenv olv imento inte- C R I AN Ç AS , F OT OG R AF I AS , D ER I VAS
gral de todas as linguagens . Visualizando as práticas escolares, contudo,
percebe -se que o desenho s empre foi encarado como um instrumento Ma rcia Ap a rec ida Gob b i
pedagógico a serviço exclusivo do professor. Ou seja , a preocupação com
o desenv olv imento do grafismo e da capacidade produtora das crianças
nem sempre está presente nas propostas apresentadas nas escolas.
Por meio das propostas de desenho desenv olvidas com as crianças
em nossa pesquisa , descobrimos que o percurso gráfico dos seus desenhos
é constituído na interação com o modelo , com a fala do outro e com os
materiais , pois, no decorrer dos desenhos, algumas delas modificavam seus
traçados por conta de verbalizações e modelos que sugeriam outro percurso
G alá xias
gráfico , além de discutirem a aplicação das cores enquanto desenhav am.
e c o m e ç o a q u i e m e ç o aq ui es t e c o m e ç o e r e c o m e ç o e r e m eç o e
Além disso , nossa atenção constante aos gestos e comentários fei-
ar r e m es s o e a qu i m e m e ç o q u an d o s e vi ve s ob a es p éc i e d a vi a ge m o qu e
tos pelas crianças, durante o percurso criador , possibilitou -nos perceber i m p or t a n ã o é a vi a g em m as o c o me ç o d a ( H ar o l do de C am p os ) .
muitas ideias que perpassaram a elaboração dos seus desenhos . Os seus
comentários exerceram uma função autorreguladora , influenciando e redi- Com ce rto re ceio, a pes quisad ora pe rg untou ao menino : Raf ael, p ara onde
recionando a ação gráfica (SI LVA, 2 002 ). Afinal, com o acesso ao suporte nós vamos ? V ocê co nhe ce o c aminho ? Eu não se i andar p or aqui. Tranqui-

e aos materiais disponív eis, elas planejaram sua ação e buscaram formas lo, s em titube ar, e le resp onde u: Eu te levo. E u conhe ço po r aq ui. E p eg ou
nas mãos d a pe sq uisado ra, um tanto surp re sa (Arquivo da autora).
de traduzir em traçados suas reflexões, pensando sobre os desafios pro-
postos a tomando decisões eficazes para concretizar suas soluções.
Entender o desenho da criança como pensamento v isual é afirmar
Com os pés na rua,
a criança como sujeito ativ o e participativ o na construção da sociedade,
derivas , princípio de viagem
alé m d e e nte ndê -la c omo protagonista e construtora de seu conheci-
mento e de sua história , oportunizando propostas ricas de desenho que
A v o z f o rt e lá no f undo e nt o a uma ca nç ã o de s t emi da e s e mis t ura
auxiliam no seu desenv olv imento integral.
ao s om dos c arro s, ô ni bus, v ende do res , ta nt os t ra ba lhadores que a pres -
Para finalizar , desejamos que este texto incentive professores a
sa da ment e pa s s a m po r nó s . Va mo s, pe s so a l, s e m fi la s , ma s , s e po s s í -
contemplar com mais sensibilidade as diferentes manifestações artísticas
ve l, a nda ndo junt os . De s lo c a me nt o s . Rumo s i nc e rt o s e n e m t a nt o , ao
produzidas pelas crianças no contexto da v ida coletiva, bem como contri-
sa bo r do ri tmo do grupo o u de c a da parti c ipante . Andar no rit mo de c ada
bua para a realização de nov as pesquisas sobre o univ erso fascinante que
um, o que se co nf orma ao t empo do o utro, o ra ma is v a ga ro so , o ra mai s
envolv e o desenho das crianças da Educação Infantil.

Ed i t o r a M e di a ç ã o 88 89 Ed i t o r a M e di a ç ã o
ARTE CONTEMP ORANEA E EDUCAÇÃO I NFANTI L Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho (Orgs.)

apres sado e da í ao sabo r dos espa ços por o nde se pa ssa. E as sim v amos Est e te xto a bo rda rá uma expe riê nc ia re sult ant e de pe squi sa em que
conhe ce ndo o o ut ro e à ci dade (que é co mpos ta de v ários o ut ro s) e, c om se busco u a pro dução de fotografias por cria nças de até sei s anos de ida-
is so , c onhec endo e c ons trui ndo a si me smo e à que le co m o qua l nos re - de e mo rado ra s da c i da de de Sã o Pa ulo ', re s pe i ta ndo e va lori za ndo se u
la c io namo s. Câ me ra s f o to grá f i ca s à mã o re v ela m e c o ns t roe m je it o s de mo do de f o to graf a r e o pont o de v i s ta dela s. Ass i m, c onv ido os le i t ore s
olhar os a spe ct o s à vi s ta de a lguns , pe rmi t em va s c ulhar o c o ti dia no e m a ac o mpanhar e s se e nsa i o so bre f o to gra fi a, inf ânci a e c i da de . Câme ra s
sua s repe ti ç õe s e no inusi t ado . Vão surgi ndo bre cha s para s ubv e rs õ es , fo to gráf ic as fo ra m ut ili za da s pa ra promov er a c a pt aç ão de modos de ve r
ai nda que pe que na s e que pode m s e r c a pt ada s . Ass i m f omo s nó s, di a s de me nino s e me ni nas em dis t int os ba i rro s de Sã o Paulo, o que po deri a
a f io po r di s ti nto s ca minhos na paulis t a na ci dade . se r fe it o em qua lque r outra es fe ra públic a ou pri va da a depende r do s ob-
jeti vos e dese jos que no s levem a inve sti gar o e spa ço.
A e xpre ss ã o "de ri v a s" é e mpre ga da no t ext o , c o nf o rme a a c e pç ã o
Que as crianças fotografam, já de Guy Debord (20 03), que a s def ine c omo pri nc ípi o met odológi co orie n-
sabemos , porém , o que e como elas fotografam? tador das sa ídas . Ela s po de m s er def ini da s co mo po ss ibili da de s de pa rt i-
ci pa çã o na ci da de que se dá, e ntre outra s fo rmas , v ia a ndanç as s em um
A fotografia rumo pre v ia ment e o ri e nt a do , proc ura ndo apree nde r ruas , a v eni da s , pra -
ças, a part ir da obse rvação das relaç ões e usos socia is de sses diferentes
A m e nina tim id am e nte s o rri e, deb ruç ada so bre os braço s, inc lina sua
cabe ça p ara um do s lad os , e xibe s eus d ente s ainda c ham ad os " de le ite" . espa ços públi cos, co mo espaço a deci fra r e a desc obrir.
A m e nina f o to g raf ad a f e z d e um dos largo s vão s entre muro s na Rua Essa experiência se rá ponto de partida para as ref lexões que s e fará
Maria A ntô nia, e m S ão Paulo , a m o ld ura a d ar fo rm a e c o nto rno à im a- so bre f o to gra f ia s e labo ra da s po r c ri a nç a s e que no s pe rmi te m c o nhe ce r
ge m que de cidiu ete rnizar via image m f otog ráfica. Po se so b a luz do c éu, aspec tos do c ot idiano cit adino pela v is ão infanti l.
que naq ue le d ia g ritava azul, d e um a c ap ital tid a p o r m uito s c om o c inza, A fotografia aparece em recentes pesquisas com cria nças em diferen-
cham a a ate nção d o s trans eunte s q ue , em s ua rap id e z d iária, aind a não
tes contextos socia is e culturais, po ssibilitando compre ender como meninos
haviam perceb ido esse es pacinho na parede. Passam em seus ritmo s
e meninas concebem espaços, relações sociais e valores, dentre outros, por-
de ac e leraç ão m atutina. T o do s pare ce m q ue re r fre neticam e nte che g ar a
alg um lug ar, re pe tind o s e m p erc eb e r a id eia d e que S ão P aulo não po d e tanto , co mo objeto material portador de história, disparador e provocador de
parar e , ainda m e no s, quem ne la habita. C ria-s e uma ro tina que voltas d á memórias, fonte indiciária e expressiva do ser humano como "agentes" 2 que
em to rno d e s i m es m a a c ad a d ia. Num se g undo d e ate nç ão , p e rce b e m são (crianças e fotografias), na acepção sociológica do conceito.
a q ue b ra d is s o com crianç as f o tog raf and o e , mais , dis c utind o s ob re a
co mp os iç ão da c e na que se dava num f un d o flo rid o. Ce nário prec isa-
me nte es co lhido p ara q ue a c ole guinha f oto graf as se e fo rjad o p elo go sto
Referência ao projeto MCTI /CNPq /MEC/CAPES n°. 18/2012 - Ciências Humanas, Sociais e Sociais
já c ultivad o p ela g arota e m ce na, q ue le ntam e nte orie nto u a c o leg a q ue Aplicadas. Olhar sobre a cidade: fotografia e desenho na construção de imagens sobre São Paulo a
partir de crianças das escolas municipais de Educação Infantil.
c ap tava a im ag e m . d iq ue ... 2 Próprio da sociologia, o uso do termo tem tomado Vultos mais amplos e que podem distanciá-lo
( A r qu i vo da au t or a ) de sua acepção original. Afirma-se aqui a criança como ativa, tendo iniciativas que a afirmam como
"agente ", recebendo, com isso, toda sorte de respostas e trocas positivas e negativas marcantes e
presentes nas relações estabelecidas socialmente e em diferentes grupos.

Ed i t o r a M e d i aç ã o 90 91 Editora Mediação

4,
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho IOrgs. l

Conhe ce r os usos s oc ia is dado s à fo to grafi a, t al c omo pre co ni za do tomados de forma testemunhal e fiel à realidade captada , mas, sim,
po r Bo urdi e u (2 0 0 5 ; 2 0 0 6 ) e F re und (2 0 0 6 ) , é f u nda me n t a l po nt o de como representação social , objetos de análise de diferentes contextos,
pa rt i da pa ra s e s abe r ma i s e me lho r s o bre a s c ri a nç as a pa rt i r do que reafirmando v alores e normas , modos de v er e agir das crianças em es-

ela s f ot o gra fa m. colas e na sociedade.


É i mporta nte c onsi de rar t ambé m o que Kos so y (20 02 , p. 12 9) a po n- Nesse sentido , pretendo trazer algumas reflexões e propostas so-
ta so bre a s pos sibilidades da foto grafi a para se compreender os modo s de bre trabalhar com fotografias na Educação Infantil, propostas essas
ver o cot idi ano da s c ida des , t ais co mo que estarão presentes no decorrer deste texto de modo "esparramado".
Af i r mo , sobretudo, que as crianças são capazes de criar imagens com
res gatar nom es , háb itos e o dia a d ia do s morad ores que hab itaram de te r- diferentes suportes , e a foto grafia é a exp re ss ão de u ma en tre e ss as
minad a c as a e m fo to s antigas , de talhe s s ob re a arq uite tura d as e d if ic a- manifestaç ões expre ssiv as. Ob serv ei qu e o manuse io da câm era foto-
çõ es , o traç ado das ruas , a veg e tação o rname ntal, partic ularidad es ac er- gráfica se comprov a familiar para elas , mesmo para as de b em p ouca
ca do co m érc io atravé s d as p lac as nas f achadas , c artaze s p rom o cio nais
idade , e o equipame nto se mostra fecu ndo no proc esso de inv estiga-
anunc iand o alg um p rod uto m e d ic inal o u alg um a ap res e ntaç ão teatral, o
çã o do e no cotidiano d a cidade , rev elando aspectos não percebidos e
tip o d e transpo rte urbano, a c alm a d e c ertas ruas e o burburinho d e o utras,
a mo d a, o g es to, um ce rto ritmo no and ar, a malíc ia no o lhar, o c om um e
lhes conferindo os mais div ersos sentidos, assunto que irei tratar mais
o suspe ito , o explí cito e o implícito. adiante neste texto.

Por essas conside rações, percebe-se a impo rtância de consi derar as


fo t ograf i as c omo t e xt o s i magé ti c os que inf orma m s obre a s re la ç õe s e s - Atravessa logo menino , o farol3 vai fechar!
tabele ci das e ntre menino s e meni na s nos di ferentes e spa ços , com o utras
f
cri anç a s e co m os a dult os , ao mes mo t e mpo em que i nf o rma m so bre a s Es t a r c o mo t ra ns e unt e e m ruas e pra ç as , da ndo di f e re nt es e pa r-
própri as c ri a nç as e s ua ca pa ci da de i nve nt iv a de cria r imagens f ot ográ fi - ti c ulare s us o s ao s e spa ç o s públi c o s , pa re c e s e r v e t a do , a i nda que de
cas, faze r es colha s e inve stiga ções sobre os ass unto s esc olhi dos. mo do implí c it o , a ce rt os grupo s , so bre t udo àqueles co mpo s t o s po r
Na s e sc o la s é pe rce pt í ve l certa di f i c ulda de na ac ei t aç ã o e apli- cria nça s de bem po uc a i dade. Sa bemos que s ão es paç os de ci rc ula ç ão ,
cação da s f o t o gr a f i a s c o mo c a mpo de inv est igaçã o, em espec ial, na ma s de que m? Pla ne ja do s pa ra que m? Pa re c e-me , gros s o mo do, que a
Educ ação Inf ant il. As f o t o s , tais co mo as image ns , ai nda s ã o consi- ide ia de pri va c ida de , i mpo rt a da da Euro pa pa ra o Bra s il, na v i ra da do
dera das meras fo nt es ilus trat iv as de te xto s , não se ndo est abele ci do sé culo XIX pa ra o s éc ulo XX, ma i s rec e nt eme nt e t em se ali ado a o medo
qua lque r d i á lo go e n t re o i ma g é t i c o e o e s c ri t o . Ne ss e s e nt i do , des ta- do o ut ro , o qual t e m s e i nt e ns i f i c a do brut alme nt e na s re la ç õ e s s o c i a i s
co a qui o s e s t udo s e m s o c i o lo gi a (MARTI NS, 2 0 0 8 ; NOVAES, 2 0 0 9 ; brasileiras. 0 c o n f i n a me n t o de t o do s e d o s gr up o s i n f a nt i s e m de t e r-

SAMAI N, 2 0 0 0 ; 2 0 1 2 ). mi nado s e s pa ç o s t e m si do a t ô ni c a . Cria m-se co ndo míni o s , escolas,


Fo t o gra f i a s sã o c o nc e bi das pe lo s pe s qui s a do re s c omo f o nt e s de crec hes , pa rques de ntro de sh op pi ng s, praç a s c om grade s de pro te ç ão ,
pe squis a s s obre as inf ânc ia s nas ci ê nc i as so ci a is , e duc a çã o e s o ci o lo -
gi a . Is s o não s i gni f i c a t ê -I a s c o mo t e s t emunho s e mpí ri c o s , i nc o nte s t á -
a A f r a s e f o i d i t a e m S ã o P a u l o , p o r i s s o m a n t i ve o t e r m o " f a r o l " . E m o u t r a s c i d a d e s , o m a i s c o m u m
ve i s da re a li dade o u de f a t o s hi s t ó ri c o s , ou s e us di f e re nt e s e leme nt o s é di z er s em áforo. Há quem di ga que es s e é o j ei t o paul i s t ano de fal ar.

Editora Mediação 92 93 Ed i t o r a M e d i aç ã o
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO IN FA NTIL Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho (Orgs .l

si na i s de enges s ame nt o pro i bi t iv o de c onví v io e s oc ia liza çã o , re s ult ado a nos sa v is ão s obre lugares , obje to s, s it ua çõ es . A rua, que é lut a e de s-
da i mp o s i ç ã o de um mo do de v i v e r pa r t i c ul a rme n t e re gula d o . As c o n- lumbra me nt o , di s put a e co nqui s t a , vivências, experiê ncias, sensações,
tra di çõ es e me rge m, rev elando-se o ra no ac ess o, o ra na pro ibiç ão da en pe rc epçõ es e s enti me nt os div erso s, permi te v ia ge ns pelas e a parti r da s
tra da de cri a nç a s e m de te rmi nado s lo ca i s, vi s í ve i s na pai s a ge m urba na de ri va s . Sã o Paulo, c i da de ti pi c amente urba na, c o m sua s inúme ra s c on-
o u s ut i l me nt e o c ult a s . Há que a nda r pe la c i da de e o bs e rv a r, regist rar tra di çõ es, f oi pa lco , em minha e xperi ê nc i a , de de riv a s c o m a s cri a nç a s
e re f le t i r. Ma s c o mo a s c ri a nç as e s t ão pe rc e be ndo e ss e s es pa ç os do s em dias dis tint os, em loc ais div erso s, que pudemos ve r de outros je itos , a
qua i s f a ze m p a rt e e que a s ma rc a m e m s e us mo do s de s e r e de v e r o part ir das próprias cria nça s e/ ou c om e las. Andar pela cidade apro xima -se
ento rno , a s i mes mas e ao s o ut ros ? da pro po sta de Spec k (20 16), que elabora uma teo ri a gera l da caminhabi-
lidade , dizendo que ca mi nha r dev e a te nde r qua tro c ondiçõ es bá sic as : s er
prov ei to so , se guro , co nf ortá ve l e inte re ss ante . Ele nut re a pre oc upa çã o
Fotografar a cidade sem pressa de chegar sobre a ausê nci a de pos sibi lidades (de riva s) de c aminhar des preo cupa da-
me nt e pela s rua s, ho je, nã o s oment e pelo medo da v io lênci a , c omo pela
Te ndo a f ot o gra f i a e a s c ri anç a s c o mo po nto princ i pal a s e r abo r- co nf i gura ç ão de c i da de s que s upri me m, c a da v e z ma i s , os e spaç os de
da do , e s te te xto pre te nde c o nv i da r o le i to r a pe ns a r s obre a to s de f o to - enco ntros. A parti r disso , prete ndi invest iga r: c omo cri anç as i rão regist rar
gra far da s c ria nç as de até se is anos e f ora do c ont ext o e sc ola r. A c ida de image ns da c i da de de Sã o Paulo e m sua s f ot ograf i as ? Como s eu co rpo ,
to rna -se a qui um e nt re t ant o s lo c a i s f o t o gra f á v e is po r e la s . A que s t ã o seus olhos e s ent imento s regis tra m pa isa ge ns e si tuaç ões usa ndo c âme-
que fa ç o é: o que é c a pta do e c o ns t ruído pela s c ri a nç a s a pa rt i r de s s a ras fotográficas?
açã o em t empo s e es pa ço s dis ti nt os e que s e co nfi gura m e re co nf iguram As f o t o gra f i a s que re s ult a ram das deri v as pela s c ri anç a s re ve la -

diante dos se us olhos? ram-s e como vi age ns pes soa is e no c olet ivo por di ve rs os lo ca is , a brindo
A fo to gra fi a não é e nte ndida a qui c omo o lho da hi st óri a. A c o nc ep- no v as pos s i bi li da de s de a s c ri anç a s e eu, pe s qui s ado ra, t ermo s o utro s
çã o de fi dedignidade , em te rmo s de eleme nt os da re alida de f o to gra fa da , olha re s po r o nde se a ndo u, rec onhe c endo -s e ou nã o ne ss es .
exige olhares e di sc us sõ e s ma is a c uradas . Nã o pre t endo aqui t o má-I a s Mui ta s que stõ es s urgiram de t ais a nda nç as fo to grá fi ca s. Uma delas
co mo "v e rda de s ", ma s s i na is a s ere m t ra duzi do s . Uma f o to gra f ia apo nt a é que o s e s pa ç o s públi c o s f re que nt e me nt e ge ra m o pe ns a me nt o o u a
pa ra a exis tê nci a de element os c apt ados pe la c âme ra , ma s não s e pode cre nç a de que , s e ndo públi co s , s ão pa ra t o do s . Ma s , qua ndo o bs erv a -
asse verar que se t rat a de um do c ume nt o c o nf i á v e l e m si, inf ormaç ão mo s ma i s a c ura da me nt e a s re la çõ e s ne les e st a bele c ida s , pe rgunt a-se :
úni ca e i ndi sc utí v el. Ao fo t o gra fa r, inve nta m-s e pes so a s e lugares, re- a que m, de fa t o s e de s ti na m? Qua i s grupo s ne le s pre v ale ce m e e m que
cria m-se imagens, a pes ar do ca rát er a pare nte ment e fi el das foto gra fias , e perí odo s e lo cais ? Conc ernente às crianças , o uso do s e spaç os públic os,
apre nde -se a v er com elas a o longo de se u proc ess o de criaç ão. pautado e m normas e regras, se gue dete rmi nadas lógica s que, po r v eze s,
Conc erne nte àquele que vê suas ima ge ns fotografa das, Barthes aparta m as c ri a nç as da co nv i vê nc ia e das e xpe ri ênci as urba na s, e m es -
(2 0 0 6 ) af i rma que a f o to gra f i a é a pe rc e pç ã o de mi m co mo o ut ro . Sa i o pe ci a l a s me nore s, princ ipa lment e qua ndo s urge a ques t ão de um t e mpo
de mi m e me v e jo e m po s e s, e m ge s to s e a pre ndo s o bre mi m pe lo o lho sempre apre ssa do.
alheio. De ss a f orma , po de s e r uma o po rt uni da de para c o nhe ce rmo s a s 0 te mpo , mais que o próprio es paç o, é se nho r do encontro ou do de-
cri anç as que fo tograf am e o que f oi fot ografa do, ampli ando/t ransfo rma ndo se nc ont ro na s grande s c i dade s . 0 "a c hame nto " do o utro se dá s o me nt e

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Ed i t o r a M e d i aç ã o 94

4,
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho (Orgs .)

ent re i gua is , o que masc ara o c onví vio c om as dif ere nç as e na turaliza as Quanto às deriv as que originaram as fotografias , podemos pensar
des igualdade s. "A força da grana que e rgue e de st rói co isa s bela s", co mo nelas como um método de captação e mudança do espaço v ivido e alte-
di z Ca et a no Velo so , af a st a a quele s que não co mpõ e m e s se ce ná ri o , o u rado por quem v iv e nele , posicionando-se de modo contrário à concep-
que, po rv ent ura, t e nham ri tmos di fe rente s da pro duçã o que e rgue e des - ção espetacular que, há tempos , envolve a todos e em distintas cidades,
trói v oraz e i mpie do sa me nt e co rpos e mente s, já que so mo s ensi na do s a conforme Debord (20 03 ). Encontramo-nos aqui com a fotografia como
dese jar o que conf irmam c ert as narrativ as rati fic adoras do que é propo sto recurso fundamental para olhar, descobrir e agenciar a cidade.
pela s oci eda de. 0 próprio des enho urbano é des fav orá ve l à s c ria nça s e à Nas deriv as foi possív el v aguear com as crianças por esquinas, gra-
cons truç ão do pe rtencime nto. Dia nte da ausê ncia de espa ços para enc on- fites em grandes paredes , bichinhos e flore s em outras fenda s que se
trar o o utro , o dese ncontro acontece . 0 dif erente e stá pres ente , po rém re- abrem tão tímidas sobre as calçadas . A fotografia , assim como diferentes
duz-se ao c ruzamento de pe ssoas que sequer se o lham. Acelerar, produzir, linguagens, permite demonstrar ou informar de outras maneiras o que se
urgir le va à ini bi ção de c ontat os e a olhares ma is profundos, c ria ndo uma nota ou se sente, sobretudo um ato de imaginar , apesar da conturbada
inte rdiç ão da po ssibilidade de cada pes soa olha r, conhecer e a propriar-se cidade . Fotografar proporciona o não ocultamento da cidade e que esta
do e spaç o pa ra a lém de si própria. Fot ogra far pode nos le var a pe nsar em possa ser descrita ou narrada pelas meninas e meninos, sem esquecer do
"te mpos ma is lentos " da busc a e de sco be rt as do i nusi tado no c oti di ano. exercício da dúv ida sobre as imagens , sobre o que nos mostram, pois,
não necessariamente deve haver consenso sobre elas (DIDI-HUBERMAN,
20 1 2 ), já que ensejam descobertas, aprendizagens sobre si mesmo e
Como as crianças fotografaram a cidade de São Paulo? sobre o outro , seja ele o que for . Comentar as imagens fotográficas cap-
tadas pelas cria nças é tam bém u ma ma neira de m anter v iv a a própria
Ainda s e pe rc ebe uma grande des pro po rç ão e nt re o que é v is to s e- infância e as singularidades inerentes aos grupos infantis de distintos
gundo a elaboraçã o infanti l e a s re spe ct iv as re prese nt aç ões f ot ográf ic as contextos históricos , sociais e culturais. Mas, para isso, é necessário
de a dult os , que his to ri ca me nte s ão mai s co nhe ci da s e re s pe it adas c omo nutrir -se, e esse alimento v em também das deriv as , das caminhadas em
váli das . F otograf ias e dese nho s pode m vi r a es tabe lec er um diálogo entre que a conv ersa anima a ver e a registrar.
os mundos inf ant il e a dulto, co mpreendendo a s c ria nça s c omo criadora s e Propõe -se, a partir da experiência realizada , as derivas somadas à
partíc ipe s dess e univ ers o represe nta tiv o a té ent ão pre valent eme nte adul- fotografia como prática dentro e fora da escola de Educação Infantil. Uma
to. Cria nça s regi st ra ndo fo to gra f ic ame nt e e spa ço s públic os pressupõe, prática de duplo sentido: o de conhecer cidades dentro da cidade a partir
de moc rat i ca ment e, as s egura r-lhes o dire it o a expre s sa r s e us po nto s de dos registros de meninos e meninas e de compreendê -los como agentes
vi st a e m te rmo s de c las se s s oc ia i s, de e tnia s, de ge ra çã o, de grupo, de a registrar e modificar o espaço urbano em sua complexidade. Fazemos,
gê nero , e tc . Mas, ao c onsi de ra rmos i ss o, no s pe rgunt a mo s : po r q ue a desse jeito, uma provocação aos professores : a ocupação de outros es-
ausê nc ia de cria nç as , so bret udo quando bem peque na s, e m praç as , ruas paços possíveis de aprendizagens, o que já é sabido e concebido como
e dema is espaço s público s de c onv ívi o e m São Paulo? 0 que e como e las necessário, porém ainda pouco materializado ou aproveitado como opor-
pe rc ebem o co ti dia no da s grande s c idade s? 0 que e co mo re gi st ram t ai s tunidade de v er, observar e registrar o visto e o sentido por meio da foto-
percepçõe s? Nó s e nxergamo s e v alo ri zamos seus regist ro s, os ut ili zamos grafia e de outras formas.
como mo dos de ve r e est ar de cri anç as de t oda s a s i dades?

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ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho IOrgs. l

Câmera na mão, crianças , fotografias pe s qui s a dora , e pa ra a que le s que obs e rva ra m o res ult ado do pro ce s s o
de cri açã o das cri anç as.
A relação com a imagem e com o espaço se apresenta sob um duplo aspec- A pres ença da câme ra fot ográfi ca ao longo de uma andança, se ja ela
to: recebem-se as imagens (fixas ou móveis ) e elas são fabricadas. Fabricar por onde for, suscita mudanças nas relações estabelecidas entre os partici-
imagens é, ao mesmo tempo, se apropriar do espaço, transformá -lo e, de
pantes dos grupos. Pa ra-se, de tempos em tempos, nã o só para observar o
certa maneira , consumi-lo. Essa maneira de vivenciar o lugar tem por fim
entorno, mas a pró pria câme ra e a imagem nela produzida que pre senti fica
olhar o espaço e a história que se desenvolve no local . Assim, tal como em
o que se vê e re gis tra. 0 v is or da câ mera rec orta o o bjeto e lhe e mpres ta
um espetáculo , esses elementos fornecem a matéria-prima, mas impõe mu-
danças na natureza do lugar e em sua temporalidade (SARL O, 2 013, p. 58). outra f orma. Com is so, enseja o utras prática s e fo rmas de olha r. Dinamiza,
reconfigura o modo de ver o que e stá diante dos o lhos, uma experi ência de
Olho s f at i ga do s a liment ados pe la curio si dade. Olho s di li ge nte s a li - imagem para além da f oto gráf ica . Criam-se na rrat iva s vi sua is com ou sem
me nt ando e mos t ra ndo mo do s de ve r. Via ja nte s à proc ura do de sc onhe - inte nção vis ual. Açã o que muda a os o utro s e a si mes mo.
cido, ma s nã o s ó. Vi anda nt e s que pro c ura m rec o nhec e r-s e naqui lo que Es s e e xe rcí c io de obs e rv a çã o e es t ra nha ment o , por me i o da f ot o -
o lha m, e m s ua s de s c o be rt a s , no que e s t á po r v i r e que é muni do pe la gra fi a , nem se mpre re ali za do, é um gra nde de s af i o e po de se ins eri r e m
curi os i da de que f a z v a sc ulhar o es pa ço i nqui e ta nt e e lent a ment e . Uma prát ic as pedagógic a s na s es co la s re la c io na da s ao o lhar, re s ult ando e m
fot o. Um pro je t o . Crianças. Espaç os /a mbie nt es de a co lhida, co nf o rt o e de snat uralizaç ão do cot idiano, pro blema ti zaç ão e mudanç as . Po r me i o
des lo ca me nt os pelas rua s, praç as e merca do s. F oto s co mo diá ri os a s e- do s s e nti do s e de po s s ív e i s e mo ç õ e s e st é t i c a s, um no vo e s pa ço é f a -
re m obs e rv a dos e m c a da t re c ho, e m c a da o bje t o que t raz narra ti v a s de bric ado, o que env olve a pro pria r-se de le , tra ns fo rmá-lo e trans fo rmar-s e
cida des , luga res, se nti mentos evo cados. (fotógrafo) co nc omi t a nt e ment e . Apre nde r a ve r é tra duzir, e t ra duzi r é
No i ní c io de s t e t e xt o , pro c ure i f aze r bre v e de s c ri ç ã o de uma da s inv entar e re inventa r-s e. 0 que i mpli c a v e r e t a mbé m e s c ut a r. Embora
ce na s f ot o graf a da s em no ss as a ndança s por uma de t e rmi na da região com prevalência do v isual, a f otografia envolve o corpo todo e os sent idos
ce ntra l da c ida de : a s i medi aç õ es da Rua Co ns o la ç ão , na re gi ã o c ent ra l das criança s, fa vorec endo diferentes traduções do se u cot idiano. Imagens
da ca pit a l pa uli st a , a pre s e nt a ndo o regi st ro de uma s i tua çã o c ri ada po r pe rt e nce m a o s c a mpos do se ns í v el e do s o c i al, e em mui to c o ntri bue m
dua s me ni na s : f ot ó gra f a e f o t o gra f a da . A f o t o gra f i a de s c ri t a po r mi m, pa ra melhor a pre ende rmo s e co mpree ndermos o que es tá di ante de nós ,
ass im co mo a s demais res ult ante s des sa e de outras ta nt as ca mi nha da s, consi de ra ndo as f ot os c omo fo nte doc umenta l e re pres enta çã o.
fo ra m fe it as a parti r de c âmeras digit ai s. Consi de ra ndo as c ri ança s e as
imagens fo tográf ica s c omo agent es capaze s de i nte rvi r e ge rar mudanças
nos grupos so cia is do s qua is pa rt ici pa m, va le frisa r que o bse rv ei o que o Olhar, ver, receber , guardar
ento rno ca us a à s cria nç as e m s eu pro ce ss o de co ns truç ã o de modos de
ver, e as mudanç as no ent orno, nas relaçõ es e i nte raç ões so cia is daque- Inv e st i ga r mi nuc i o s ame nt e a s fo t o gra f i a s pe rmi t e co nhe ce r o u le -
vantar hipó teses sobre como as relaç ões s ociai s est ão se ndo c onstruídas
les que a s v ee m fo togra fa r.
tanto pe lo s fo t ogra fa do s c o mo pe lo f o t ó gra f o e t a nt o s o ut ro s que, às
No que di z re s pe i to à s c ri a nça s , e m e s pec i al, de u-s e uma i nt ens a
U vezes, anoni ma me nte , env olv e m-s e da s ma i s div e rsa s ma ne ira s c o m o
tro ca ent re pa res , o que c o nt ri bui u pa ra a c o mpo s i ç ã o de o ut ra s i ma -
at o f o t o grá f i co . A f o t o nã o é í ndi c e de v erda de , c o nt udo f o rne c e bo a s
ge ns . A e xpe ri ê nc i a mo s t ro u-s e , t a mbé m, mui t o i ns t i ga nt e pa ra mi m,

Ed i t o r a M e di a ç ã o 98 99 Ed i t o r a M e d i aç ã o

Ii
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO I NFANTI L Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho IOrgsd

pist as para re fle tirmos sobre o co tidiano e o que e stá sob suas dife rentes e inv entadas pelas crianças ou demais fotógrafos , sem esquecer delas
cama das. A part ir de s sa s e xpre s sõ e s i ma gét i ca s , é pos sív el co nv ers ar ao nos debruçarmos sobre as fotografias . Afinal, nossa capacidade cria-
co m as c ri ança s fo t ogra fa da s e co m i ss o co njugar t ai s i ma ge ns a o ut ra s dora recria o v isto quando v ê, o que também o transforma . Fotografias
linguagens , c ompondo na rra tiv as de uma inf ânc ia que não es tá em est ado apresentam -se como narrativas culturais criadas também pelas crianças,
de e spera da quilo que vi rá po st erio rmente , numa expe ct at iv a de pro duzi r comportando nisso a imaginação e os demais elementos do cotidiano. Há
home ns e mulheres pront os, modelo s a se rem seguidos. Ao contrá rio , t ais ainda outras maneiras de pensarmos sobre as fotografias e as relações
est udo s e pe squis as se pro põe m a perc ebê -lo s c omo quem se re pre senta estabelecidas a partir delas , pontos para reflexão que n elas residem o
e c onstrói a si me smo e a os co nt ext os no s qua is e stã o ins erido s no te m- que podemos chamar de dádiv as, aproximando -se da compreensão de
po v i v i do de mo do s i ngula r e c o nc omi t a nt e . Na pro jeç ã o , o u me s mo na Mauss (20 03 ). Isso se encontra não no objeto presentificado pela foto
exi bi çã o da s fot os , de modo rit ua lí st ic o ou co mo mera exibi çã o de c enas propriamente , mas na relação e stabele cida entre aquele que a recebe,
seque nci adas da vi da , a spect os do c oti di ano s ão re cri ados e aprende-se olha a foto em si e seu conteúdo, implicando reciprocidade entre sujeito e
com elas , numa dinâmica contínua e às ve zes pouc o percebida por aqueles objeto , foto e teor. A foto, ao env olv er a imagem, não se resume à mera
que estão envolvidos na pro dução ou recepção de tais i magens. Sugere-se troca mercantil e, sim, manifesta -se como retribuição e permuta. Não se
olha r de modo de ti do e c urio so , pe rs crut ar o que e st á di ante de nó s co m v ê a foto se m dar algo d e si para a imagem v ista , traz-se algo para ela
olhare s inve stigat ivos. Não deixare i aqui um receituário sobre procedimen- e além dela, há reciprocidade entre quem vê e a imagem vista que pode
tos prá ticos a serem realizados di ante da s image ns. Co m o int uito de fina- modificar a ambos.
lizar a s re flexõ es des ta co apenas mai s algumas que st õe s que podem s er
ampli adas, inv estigadas e ce rtamente apro funda das.
Polissêmicas, as imagens pe rmit e m as mais variadas fo rmas de Dar, receber , retornar
compree nsã o, o riginadas da s his tó ri as de v ida daqueles que as o lha m ou
ve e m; do ca pi t al s o ci a l elo u cult ura l co ns t ruí do s i ndiv i dual o u c o le ti v a - Nã o há uma fó rmula que i ndique a exat a po st ura que dev e s er a do -
mente , da ca pa ci da de apre ndida de olha r e v er; do cult iv o da imaginaç ão tada pa ra e nt ende r o po nto de vi st a da s cria nç as quando o a ss unto é f o-
e da des na tura lizaç ão do obje t o, que , de t ão vi st o, pode de i xa r de s ê-lo . togra fi a. A me to dologia co ns is te em o lhar e es cutar a s cri ança s, olhá -las
As s i m co mo di ri a Brec ht (1989, p. 149), não po de mo s "a c ha r na t ura l em a ç ã o e à s i ma ge ns c ri a da s , me rgulhar i ns i st e nt e e pra ze ros a me nt e
aqui lo que muit o s e re pet e" e , e m image ns , is s o ta mbém po de s e r co ns i nos a ss untos , na s cores , na s forma s apres enta da s e repre se nta da s. F o-
derado. Pa ra c ompre ende rmos es sa s ima ge ns , é i nt eress ante c ons iderar to gra f i as s ã o c ompre e ndi da s a qui c o mo a rt e f a t os c ult ura i s e labo ra do s
a c omunic aç ão com o grupo so cia l no qua l os env olv idos est ão inserido s, pela s crianç as e que no s di zem sobre e las, suas repre sent açõ es, por ve-
lev ando em c ont a que o s mes mo s não e stã o se parados do c oti di ano v iv i- ze s de sc onsi deradas no uni ve rs o adult o. Ela s nos c onduze m à pre se nç a
do, co nc ebi do ou i magina do alus ivo à elabora ção das fo togra fia s. de fa t os e c oi s as e nos ori ent am qua nt o à s re la ç õe s c o ns t it uída s pela s
É i mpo rt ant e , e m a lguns ca s o s, i nv e s ti ga r a pe rc epç ã o e a re ce p- na rra t i va s da ima ge m, ent re o que mo s tra m e o que e s co nde m, e xpe ri -
çã o da s f o t ogra f i a s e m di f e re nt e s c o nt e xt o s , be m c o mo a s condi ções menta çõ es e de saf io s.
culturai s , s oc i ai s e ec o nô mic a s que e nv o lv e m a produçã o da s i ma gens . Consi derar o que trazemo s para as imagens - de nossa s his tória s de
Trata-se nã o de to rnar vi s í ve l, ma s de ga ra nti r v i si bili da des es c olhida s vi da , fo rmaç ão , di spos iç ão e t empo pa ra e st ar c om e la s - e o que es sa s

Editora Mediação 100 101 Ed i t o r a M e d i aç ã o


ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO I NFANTI L

no s t ra ze m, c e rt a me nt e é um bo m i ní c i o de c o nv e rs a e nt r e i ma ge ns e
pess oas que as olham.
Nã o pre t endi, ne st e t e xt o, apres e nt ar uma a nális e da s f ot os fe i ta s
8
pelas crianças nes sa s deriva s. Mais do que pe nsa r s o bre "o que " as C R I AN D O C O M PE D AÇ OS D E P APEL
cri ança s fot ogra fa ra m, pret endi de st ac ar o quanto es sa f orma de c ri aç ão
imagét ic a po ss ibilit a ao s prof es so re s , em dif erente s inst ânci as , co mpre - Cayen ne Rusc he l da Silv eira
e nde r o s mo do s de v e r da s c ri a nç a s , c o mo f i o s que , qua ndo puxa do s , Sté fa n i Vieira
pe rmit em v ia ja r c om e la s, c o m aqui lo que c ria m imaget ic a me nt e em s ua s
fot ografi as. De s s a f o rma , c o mo di z Ca lv i no (20 10, p. 18), "t a l v e z um
No vo Mundo s e abra a os nos so s olho s to do s os dia s e nã o o ve ja mo s".

Pe gue uma f o lha , co rt e e m pedaços, o u me s mo ra s gue -a de fo r-


ma aleatória . Ago ra junt e o s peda ço s, po de adi ci ona r um po uco de c o la ,
co re s , fi t as s e qui s er. Não t e m ma i s uma f olha, nã o é? Ma s s erá que a s
po ss ibi li da des a c abara m? Na a rt e e t alv ez na v ida, a re laç ão pa rt e /t odo
não a conte ce de f orma lógic a.
Pedaços. So mos c ons t it uí do s de les e e nc ont ramo s v á ri o s durant e
a v i da . Um peda ç o de bo lo, um pe da ç o de di a, um pe da ç o de uma f o t o .
Juntam-se os peda ços de vi da e cri am-se hi stó ria s, ou nã o, também po de
se r s ó uma pa rt e da hi s tó ri a. Temo s t a nt a s pa rte s na v ida que no s pe r-
gunt a mos po r que e s se s pe daç o s t ambé m não e s t ão pre s ent e s na a rt e
na e s co la ? Por que que re mos da s cri ança s pro duç õe s i nt e iras , i ma gens
completa s, f olhas pint adas at é nos c antinho s?
A propos t a aqui re la ta da fe z pa rte de uma s érie de a çõ es pe da gó -
gi c as pe nsa das e des e nv o lv i da s dura nte a rea liza çã o da "Pes qui s ac o n
ve rs AÇÕES: a rte co nte mpo râ nea e cri anç as '". 0 es tudo t ev e a i nte nçã o
de inv e st i gar co mo a s cri a nç a s e xpe ri enc ia v a m e se rela ci o nav a m c o m
os ma te ria i s e xpres s iv o s e o s di fe rent es suport es , trans fi gurando s ua s

1A p e s q u i s a f o i de s e n v ol v i d a e m 2 01 3 - 2 01 4 p o r n ó s , Bol s is tas de In ic i aç ã o Cie ntífic a d a UFRGS,


orient adas pela Profe s s ora Dra. Sus an a Ran gel Vieira da C unha.

Editora Mediação 102 10 3 Ed i t o r a M e d i aç ã o

4,

-
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L
Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho (Orgs .)

pro duç ões em artef at os singulare s. O concei to de experiência de La rro sa


Cunha (20 1 3 , p. 11 5) apo nt a que , na a bo rda gem e s po nta ne í st a , o
(2 00 2 ) e a pe s qui sa / int erv enç ão de Ca st ro e Be ss e t (20 0 8) pe rme a ra m
pa pe l do pro fe s s o r é fa v o re c e r um ambi ent e c o m v á ri os mat e ria i s , ma s
nossas ações/reflexões e auxiliaram no planejamento e no desenvolvimento se m e le re aliza r int erve nçõ es . Em ge ral, elo gia m-s e a s pro duç õ e s e s e
da pesquisa. Assim, dentre uma série de outras proposições, selecionamos, fazem es cassas reflexõ es sobre as produções dos alunos. Sem a interven-
para este capítulo, aquelas que envolvem pedaços e junções de papéis. ção dos prof essores, as crianças aca bam por explorar os mate riais sempre
do me smo mo do . A a ut ora ai nda a fi rma que, de ss a ma ne ira, "a s cria nç as
ac abam ref é ns de si própri as , [. .. ] o nde o s de se nho s, inde pendente da s
Arte contemporânea
singula ri da de s de c ada uma, s ão mui to s emelha nt es ".
e propostas pedagógicas
Ao co nce be rmo s a c ri anç a c o mo at i va e m s eu pro c es s o de a pre n-
di za ge m, nã o s o ment e c o mo re c e pt o ra pas s i va da s no rma s es t ipulada s
Ao observa rmo s dua s turma s de Educa ção I nfa nt il de es co las públi-
pe lo s a dult os , c omo a f irma Sa rme nto (2 00 5 , p. 37 3 ), ve mos o qua nt o
cas lo caliza das na c ida de de Porto Alegre, percebemo s que as at ivi dades
em arte s, pro po st as pelas pro fe ss oras, na ma io ri a da s ve ze s, v is av am a
as crianç as s ão c om pe te ntes e têm c apacidade d e fo rm ularem interpreta-
um f i m, a uma c o nc lus ã o , a um de s f e c ho . Ta mbé m no t a mo s que ha v i a
çõ es da s o cie dade , d o s outro s e d e s i p ró p rios , d a nature za, d o s pe nsa-
o i nc ent i v o pa ra o s de s e nhos s e re m "be m pint a do s" c o m lá pis de c o r e me ntos e d os s e ntim ento s, d e o f azerem d e m od o distinto e de o usare m
co nt o rna do s c o m ca ne t i nha s hi dro c or. As f o lhas branc a s , uti li za da s na para lid ar c om tudo o que as rod eia.
horizontal, era m o imperativo , e o mai s tra nsgressor era faze r olhos no sol
ou pi nta r fo ra da s marge ns impo st as pe lo s des enhos i mpres so s. Para o a uto r, o imagi ná ri o i nf anti l é a c apa ci da de que as c ria nça s
Ao v e rmo s e ss a s prá ti c as na s e s co las , que s t i o na mo s o qua nt o o apresentam para criar novos mundos (ressignificar), tendo em vista que não
Ir ens ino da arte es tá relac ionado ao produto fi nal, tendo como parâme tro o exist e um mundo a representar t al qual e apenas uma poss ibili dade rea l de
que o adult o e nte nde po r c o rre to ou bo nit o . Ao s ere m lev a do s e m c o nt a repres entá-lo, mas, si m, interpreta çõe s (SARMENTO, 200 3; 20 07). Qua n-
so me nt e a a qui s i çã o da c oo rde na ç ã o mo t o ra e um mo de lo a s er i nc o r- do nós, profess ores, acreditamos na possibili dade de a criança transformar
po rado pe la c ri a nça , é i gno ra da a import â nc i a do i magi ná ri o i nf a nti l, da a re ali dade em algo nov o a partir da sua imagi naçã o, pro pic iamo s que en-
ca pa c idade que ela t em de trans fo rma r o rea l e m nov o s mundo s , nã o s e contre formas de se expressar através de múltiplas linguagens, a criança se
va lo riza ndo o pro ce s so da cri aç ã o, o u s e ja , o que a cri anç a diz, pensa, torna prot agoni sta de sua apre ndiza gem.
ima gina dura nte o pro ces so cri ati vo. No intuito de possibilitar à s crianças dif erentes formas de se expres-
Ne s s e s e nt i do, t ambé m é ne c e ss á ri o f a ze r um c ont rapo nto a o e x- sar at ravés de s uas produç ões gráfic o-plás ticas , repensamos os mate riais
ce ss o da li vre pro duçã o nas prá t ic as pe da gó gi c as : co st uma -s e o fe re ce r ofereci dos pa ra elas criarem, de senhare m., . Perc ebe mos que as crianças
sempre a s me sma s fo lhas , o s me smos lá pis e a cri ança s re pli cam, a c ada cos tuma va m usa r lá pi s de co r, ca ne ti nhas hi droc or e gi z de c era e , co mo
ve z, os me smos de se nho s. Ente nde mos que há a ne c es si dade de o pro - suport e, f o lha s A4 . E s e mudá ss e mo s i s so ? Que rí a mo s opo rt uniza r à s
fesso r pro picia r aos alunos de safio s em suas propostas , para que a crian- cri ança s a c ri aç ão de c oi sa s dif erente s, ut ili za ndo o utro s ma t eri ai s grá -
ça experi mente nov as fo rmas de e xpre ssão , indo além da quilo que já sabe ficos. Ma s c omo f azer? Inúme ras hi pót e se s f o ra m le va nta da s , at é que ,
fazer com os ma teriai s. ao o lha rmo s alguns ví deo s fe it o s dura nt e as se ma na s de o bs erv aç ão ,

Ed i t o r a M e di a ç ã o 104
105 Ed i t o r a M e d i aç ã o

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ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalha IOrgs.l

perce bemos a quantidade de pa pel que era pos to no lixo nes sas e sco la s, e cla ssif icaçã o. J unto com o mat eria l, ha via, cola , te soura , fi tas a desi vas,
pa péi s que so bra v a m do s rec o rte s , pa pé i s de de se nho s "e rra do s", e tc . giz pastel seco e ole oso, canetinha, lápis de cor, giz de cera.
L e mbr a mo s do a rt i s t a Vi c k M uni z e t a mbé m de o ut ro s t a nt o s a rt i s t a s De i níc io, as cri ança s hesi tara m, olhando -no s c omo se faltass e a lgo
co nt empo râ ne os que uti li zam o que , na mai oria da s ve ze s, s eria mat eria l pa ra que pudes s em i r e m f re nt e . Uma das prime iras pe rgunt as fo i: "o nde
de sc a rt ado . Ass im co mo os pa péi s pic a do s nas sa la s de a ula s, obje t os , é pa ra c olar? " "Me dá uma fo lha branc a pa ra e u c olar e le s? " I nt enci onal-
linha s, f ios , e outros po de ri am se r le va dos para a sala de a ula, po de ri am mente, nã o dis ponibili zamos fo lha s para s erv irem de suporte, po is querí a-
faze r part e das pro duç ões, de ses tabili zando os traç os, propo ndo de saf ios mos que e las inventas sem po ssi bilidade s c ons trutiv as ape nas co m o s pe-
àquela s cria nças. daç os de pa pe l. Of ere ce r f olhas c omo supo rte a ume nt ari a a pos sibilida de
de a s cria nç as c onti nua re m a re produzir des enhos e st ereo ti pa do s, c omo
casas, céu e sol sorri ndo, me ni na s. 0 desafio es t a v a jus t a me nt e e m
Pedaços de papel busc ar fo rmas no va s, outros de se nho s, o ut ras mane iras de c ri ar, o ut ra s
monta gens que f ala ss em muito mais s obre ela s, suas pref erê nc ias , sobre
De t oda s a s pe rgunt a s que f o ram s urgi ndo , a pa rt i r de nos s a s o b-
seu i ma gi ná ri o. L arros a (2 00 2) e nf at iza a i mportâ nc ia de o po rt unizar mo-
se rv a çõ e s e c onv ers as , o pt a mo s po r mo dif i ca r o s mat e ri a is o f ere ci dos ,
mento s de aprendizagem nã o bas ea dos e m a pe na s i nf ormaç ões , mas que
re pe ns a r a f o lha A4 , t ro c á -la po r o ut ra s de c o re s , t a ma nho s e f o rma s
no s to quem, que po s s amo s s e nti r, c he ira r, t o ca r pa ra a prende r, e ss e é
difere ntes, o f e re c e ndo t a mbé m materiais diferenci ados para desenhar.
o se u c onc ei to de "e xpe ri ênc ia ". Es pe ráv amo s, is so me smo , opo rt uni za r
Querí amo s des c obrir o que a s c ria nça s f a ri a m, o que produzi ria m, c omo
às cria nç as expe ri enci are m es se s ma teria is , to cando , de sc obrindo o que
agiriam ao lidar com o i nus itado, c om a lgo dife rente do que es tava m ac os-
poderia m fa ze r e criando a parti r de le s.
tuma das . Querí amo s que desc obrisse m o s diferent es mate ria is, sua s pos-
Aos po uco s e las co meç ara m a to car no s peda ços es palhados: "c hu
si bili da des grá fi c as e pic t óri ca s , e o s ut ili za s se m c o mo fe rra ment a para
va co lo ri da", di ss e uma , "é purpurina", dis se outra me nina. Dei xamos que
contar um po uc o mais so bre s i, sobre o que ve em, do que gos tam, do que
elas se f amilia ri za ss em e se apro pria ss em desses peda ços, toc ass em,
nã o go st am. Ass im, surgi u a propo st a inti tulada: pedaç o s de papel.
rasgass em, brinc ass em, vis sem "c ois as". E as sim, de pe daç o e m peda ço,
Era mais um dia de visita às escolas, as crianças já sabiam que, quan-
se le c io nara m, agrupara m e i magi na ram: "o lha, e s se pare ce uma co ro a",
do nós, estagiárias, está vamos na sala, coisas di ferentes das que estavam
"es se aqui vai se r o banc o da menina ".
ha bit uada s a f a ze r a c ont ec i am: o pa pel já nã o e ra mai s branc o, o c hã o ,
Dessa exploração começou a surgir a ideia de unir as pequenas formas
as pa re de s , o t ape t e o u qua lque r o utro luga r po de ri a s e r ut ili zado co mo
de papel umas às outras, juntar as partes e criar pessoas, objetos: "aqui era
apoio aos suportes e não so mente a mesa. Naquele dia, não eram somente
um me ni no e e le t i nha a sa s "; "e a bruxa t i nha um ca lde i rã o, ma s e la nã o
os o lha res curios os dela s que nos cercav am, era m o s no sso s, ansi oso s e
era má ". A c ola e a fit a junt aram as partes , que de ixa ram de s ere m part es
inquie tos que a s f ita vam, sentadas em roda, a e spera r o que a que la tarde
e s e to rnara m outras co is as : "olha , pa re ce um o vo ! Ago ra e u vou c oloc ar
tra ri a. Of ere ce mo s, então , ma is de uma cente na de peda ço s de pa pel: pi
mais esse e fazer um sanduí che, tem pão em ci ma e emba ixo". 0 s anduíche
cados, rasgados aleat oriamente, picotados, de tamanho s, cores, texturas e
virar uma monta nha, o c arro v irar ô nibus .. . a ca da pedaç o o fa z de c onta
gramaturas diversas e pequenos, variando de 5 a 10 cm. Foram todos colo-
tem possibilidade de recomeçar. Para as crianças foi uma brincadeira, como
cados à disposição em um balcão da sala, não havendo qualquer separação
brincar com os blocos de monta r e criar cois as diferentes das anteriores.

Editora Mediação 106 107 Ed i t o r a M e d i aç ã o


ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo S aballa de Carvalho (Orgs.l

C r i anç as, ar t i s t a s , f a z em d e c o n t a q ue u m r a b i s c o , u m o b j e t o , u m f r a g - pas tel s eco , e tc ., mat eriai s que es ca pam ao t raç o e que fa zem de ss a e s-
m e n t o , u m p e n s a m e n t o s e t r a n s f o r m a m e m u m a o u t r a c o i s a . Ta n t o as ca pa da , não uma f rus traç ão , mas no va s de sc o be rt as . Diz L opont e so bre
c r i a n ç a s q u a n t o a q u e l e s a d u l t o s q u e p e r s i s t e m em d e s l oc a r a o r d e m e s - is so (20 08 , p. 11 6):
ta b e le c i d a d o m u n d o c o m pa r t i l h a m d e um p e ns a m e nt o si m i l ar , no s e nt i d o
de q u e a mb o s pr o põ e m s i m ul a c r o s o u f i n ge m q u e um a c o i s a é o u tr a c o i s a
Talvez e ste ja um pouco aí a razão da dificuld ade de aproxim aç ão com
( C U NH A , 2 0 13 , s . d. ) .
es se mo d o co nte m po râneo de ve r e p ro d uzir im age ns, s e e s tamo s aind a
marc ad o s pe la es tabilid ad e, fixide z e line arid ad e c om q ue ap re nde mo s a
As pro duç õe s da s c ri ança s a pres e nt aram mo vi me nt o , as pe c to raro interpre tar o m undo . A prendem os , mod erno s q ue s omo s, a am bicionar um
de e nc ontra r na s pro duçõ es c o m co la ge m: os c orpo s a ndav am e co nv er- mund o-ve rd ad e , um m undo s e m co ntradiçõ e s, s em m utaç ão, s em d or.
sav am, o s carro s f aziam barulho e a nda va m nas pi st as. I nte re ssa nt e o b-
servar que percebemos as crianç as ligadas e atraídas por suas produções,
ta nt o que ins i s ti ra m em le vá -la s pa ra c a s a . Que ri a m bri nc a r c o m o que Conclusão: o que os papéis
produziram, inte ragira m ent re si , sentindo-se orgulho sas de suas cria ções. picados nos ensinaram?
Ao finda r a a tiv ida de , uma da s c ri anç as ve io at é nós co m uma no va
idei a: "po r que v ocê s nã o f aze m is so de novo e daí a gent e junta tudo que Papéi s pi ca do s, gra ndes o u pe quenos , de t odos o s je it os e f orma s,

ca da um fe z?" De ac o rdo c o m a pe rs pec t iv a t e óri ca de Ca s tro e Be s se t mat eriai s tão s imple s torna ra m-s e molas propulsoras pa ra produç ões i nu

(2 00 8 ), busc a-s e mi nimiza r a hie ra rqui a pe s quis a do r-s ujei t os da pes qui - sitadas pelas crianças. Re e nc o ntro c o m a c ri ati vi dade, co m o incrível,

sa . Entã o , bus c a mo s no s a pro xima r das cri a nç a s, indo a o e nco ntro a o s com o s urreal, ro mpe ndo com os padrõe s e stét ico s que a s e sco las mui tas

seus modos de agir e pensar. Des sa manei ra, noss a propos ta s egui nte foi vezes impõe m. No s pri me iro s momentos , not av a-s e o a pe go da s c ri anç as

baseada nisso. Co lo ca mos à di spos iç ã o de la s o s pa péi s e mat eria i s no - com o que es ta vam ac ost uma da s a fa zer em a tiv ida des artí sti cas a des e-

va me nt e, e la s cria ra m co is as dif ere nt es e , quando t ermi na ra m, junta mo s nha r o so l, nuvens e mont anhas . Até que, pouco a pouco , a mi sc ige naç ão

tudo em uma grande c ena , em que a fada de uma cria nça andava no ca rro entre o a nt i go e o no v o ac o nt ec e u. Ela s bus c aram em nó s, prof es s oras ,

da outra, enquanto a ca sa c om asas voav a pelo cé u imagi nário. a permi ss ã o , pa ra ire m e m fre nte . A part i r da í, permi ti ram-s e i nve nt ar e

Da ndo c ont i nui dade , no ut ro mo ment o , re pli c a mo s a pro pos t a c o m suas pec uli aridade s af lo ra ram, tra ns bo rdara m os res ult ados . Resultados

pa péi s gra nde s , c a rto lina s e papé i s Al pa ra rec o rt ar di fe re nt es fo rmas . que s empre pode m s e tra ns fo rma r e m t anto s o ut ros .

Pe rc e be mo s que nã o s ó a s pro duçõ e s fo ra m di f e re nt e s, ma s t a mbé m a


manei ra de ma nuse ar o mat eria l. As fo lhas gra ndes e xi gi ra m mo vi me nt os
do c orpo t odo , e os pé s das cri anç as também entra ram na da nça da s pro-
duçõ es, press ionando a s fo lha s para se co larem.
Na perspe cti va da arte co nte mporâ ne a , sugere-se oferecer às
cri a nç a s "me no s c e rt e za s ", o u s e ja , ampli ar a pos s ibi li dade de re cri ar,
re pe nsa r, rev i si t ar ve lho s ma te ria i s, i ntro duzindo no s eu re pert óri o grá -
fi c o ma t e ri a i s a t é e nt ã o de s c o nhe c ido s , c o mo o c a rv ã o v e ge t a l, o gi z

Ed i t o r a M e d i aç ã o 108 10 9 Ed i t o r a M e d i aç ã o
9
A EXPERIÊNCIA DOS BEBÊS
COM A ARTE

Silv ia Pillotto
Ca rla Clau be r

A i nt e n ç ã o do pre s e nt e t e xt o é pe n s a r no s be bê s c o mo s u je i t o s
de a ç ã o / i nt e raç ã o e , ne s s e luga r de c o mple xi da de s , c o mo a a rt e po de
es t a r i ns e rida e m s ua s e xpe riê nc i a s no co nt e xto do s e s pa ço s e duc a t i -
v o s . I ni c i a lme nt e , uma que s t ã o no s t o ma po r c o mple t o : o que e nv o lv e
os t erri tó ri o s do s se nt i do s se nã o a e xperiê nc ia se ns ív el dos so ns , chei -
ro s , s a bo re s , t e xt ura s , i ma gens , mo v i ment o s , de e s t ra nha ment o s e do
corpo i nte iro?
Co m ba se nes s e pre s s upo st o , é impre s c indív e l pe ns a r t a mbé m no
prof esso r que a tua na educ ação co m be bês : uma educa ção pelo se nsív el,
em que e le s e s e nt e um pro v oc a do r de a f e to s , que po de re a li za r e xpe -
ri ênci as e nv o lv endo ple namente o s s enti do s, a s pos si bi li da des s onoras ,
corporais e visuais.
Pa ra dar sus te nt aç ão a tal diá logo, alguns a ut o re s c o nt ri buí ra m
si gni f i ca t i v a me nt e pa ra a pro duç ã o de st e t e xt o s o bre o s be bê s e s ua s
singularida de s e s ubjet ivi da des . Com es se s pes qui sa dores , c ujas te ori as
se rão de s ve lada s a o lo ngo do t e xt o , a dent ra mos em zona s des c onhec i -
das , nov os te rritó ri os de e xpe ri ênc ia s, no intuito de ref le tir s obre conce i-
tos que t ra ze m à ba ila os bebês , os s enti do s e a arte que habit am e ss es
lugare s de saber, s abo r e s ens ibili dade.

lii Ed i t o r a M e d i aç ã o

4.
ARTE CONTEMP ORÂNEA E EDUCAÇÃO I NFANTI L
Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho IOrgs.l

0 te xt o t ra z algumas pis t as para o pro fe ss o r prov o ca do r de af et os , a enfre ntar obstáculo s, experiênci as que contribuem pa ra que se sint a par-
que s e de s nuda de i dei a s pre c o nc e bi das e m bus c a de ha bi t ar um o ut ro tícipe do lugar onde está e do lugar que s ente.
te rri tó rio - o da i magi na ç ão , da c ria ç ão , da e moç ã o, do s a f et o s e e s pe - Em c ont ato com a arte em suas mais variadas express ões , ele pode
ci alme nt e o do es ta r co m o bebê, a be rto a o impre vi sí ve l, a o i nusi ta do , à explorar se nt ido s e ampli ar s ua s pos si bi lidades , t endo c o mo ref e rê nc ia s
magia pres ente em práticas e ducativas repletas de experiências s ensíveis. os objet os , o s espaç os e as pe sso as do s eu entorno . Seu co rpo c onstrói
conexões c om o uni ve rso , o que impulsi ona s eu se r curio so e ima gé tic o.
Pa ra Holm (20 07 ), há uma si nt oni a entre o s be bê s e a arte, e nada
Bebês , sujeitos de ação/interação ac onte c e is ola da me nt e , po is es se s, no a to de s e e xpre ss a re m na s mai s
va ri ada s fo rma s - a o s enti r, ve r, ouv ir, pensa r, ba lbuci a r - des env olve m
É se mpre um de s af io pe ns a r na expe riê nc i a do s bebê s co m a a rte , també m s ua po tê nci a corpo ral e cria tiv a.
es pe ci alme nte no co nte xt o educ a ci onal e m que a s va ria nt es s ã o muit as : A a rt e i nva de e s se lugar da c ri a çã o , qua ndo o i mprov i s o na a ç ã o
a f i lo so f i a da i ns t i tui ç ã o , o s ge st o re s , coordenadores, prof es so re s e a do bebê , co mo s e u ra bi sc a r, s e nti ndo o mov i me nt o do s dedo s , do lá pi s
co muni da de co m sua s infi ni t as div ers idades . ou pinc e l, por e xe mplo , c orre de um lado a o utro da f o lha , i nv es t i ga ndo
A pa rti r des sa ve rt e nt e , pe rgunt a mo -no s: quem é es s e be bê, s uje i como um pes quis ado r traje tos espacia is dess a fo lha e do s eu c orpo. Nes-
to de a ç ão / i nt e raç ã o que s e enc o nt ra no s c e ntro s de Educ aç ã o I nf ant i l se process o há um misto de se ntime ntos e emoções dive rsos , int erligados
ao s c uida do s , de ges to re s e prof es so re s? Um b e bê a be r t o p a ra viver à surpre sa de ve r/s e nt i r se us t ra ç os pre se nte s e m um s upo rt e , que sã o
experi ência s, de sc obrindo ca da frest a que lhe é a prese nt ada , curio so em també m a exte ns ão de se u própri o co rpo.
abri r ca da uma de la s, av entura ndo -s e ao des c onhe ci do ? 0 be bê ma ni f e s t a-s e po r me i o do s mo v i me nt o s , s alt o s , ro do pi o s ,
Fazem pa rt e do seu univ erso de de sc obe rt as cheiros , s ons, pa lada- sons, ra bi sco s, obje t o s de f orma rela c i o na l e ple na . Na da pa ra o be bê
re s, te xt ura s, te mpe ra turas , image ns e c orpos , o que po de re s ult a r e m é i s o la do e de fi ni t i v o. Ne s s e jo go de pra zer e de sc o be rt as , pre ci s a do
experiê nci as dife re nt es pa ra ca da bebê , fo rma ndo um co njunt o de se ns a- c o nv í v i o c o m o ut ro s be bê s e c o m a du lt o s . No c o nt a t o c o m pessoas,
çõe s, c omo be m af irma Ba rbie re (20 12 , p. 49 ): "se é muit o quente , impri- objet o s e e s pa ç os ele i nic i a s eu pro ce s so de co nst i tui çã o de s í mbo lo s ,
me um ri t mo ; se o ambi ente é agra dáv el, embai xo de á rv ores o u e m uma si gnif ic ados e s enti do s.
sa la c o nf ortá v el e i lumina da , impri me o utro".
0 espaç o, os o bje t o s e as int eraçõ es e nt re o s bebês e de ss es
c o m o s a dult o s ac o nte c e m pela f o rma de oc upa ç ã o de s s e e s pa ç o e Territórios de experiências e de sentidos:
pe lo s e nt i do que da mo s a e le o u c ri a mo s pa ra ele . Es t a mo s a f a la r da a arte habitando esse lugar da educação
expe ri ê nc i a de bri nc a r co m a re i a , t e rra , ba rro , pa pe l, t i nt a , c o m o s e u
pró pri o co rpo, c o m o espaç o, v i s lumbra ndo cores, sabo res e af e to s A arte habita territórios de sentidos, e toda experiência acontece
(BARBIERE, 20 12 ). quando os sentidos corpóreos são ativados . Como nos provoca Meira
Um be bê ne ce ssi ta da e xperiênci a de se nti r o gos to e a te xt ura das (20 14, p. 53), "o desdobramento de uma experiência funciona desde um
co is as a o se u re do r, de te r co nt at o vi sual, so no ro e t át i l co m di fe re nte s agir em direção a uma atuação que se configura como perform ance pesso-
objeto s, de engati nhar e m espa ços que lhe ofereç am des afios, aprendendo al", uma v ez que nossos sentidos são singulares e subjetivos . No entanto,

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essa singularidade/subjet ividade é co nstit uída de marc as c ulturais que , no si gnif i ca ti v amente ne ss e pro ce s so e m que a expe riê nc i a vi sua l, s o no ra ,
trajeto de nossa s vi das, vão agrega ndo a no ssas bagagens outras experi co rpo ra l e e s pac i al do bebê dá iní c io à s ua i ns e rçã o e i nt e ra ç ã o c om o
ênc ia s e , as sim, vã o i mpri mindo quem s omos nó s. mundo , co m a s pes so a s e c om tudo que o s ce rca .
0 q ue é "e xpe ri ê nc i a que no s habi ta"? Para Larrosa (2015), essa Nas relaçõ es/ interaçõ es c o m as li ngua ge ns /e xpre ss õe s da arte
expe ri ê nc i a s e dá qua ndo a lgo no s t o c a e no s a f e t a , re que r um t e mpo (so no ra s, c orporai s e vi sua is ) e o espaç o/ luga r em que se e nco nt ra , jun-
pa ra o lhar, um t empo pa ra e sc ut ar, um te mpo pa ra s enti r, pa ra c ulti va r o ta me nt e co m o o ut ro , o be bê co me ça a o rgani za r "s ua s experiê nc ia s e a
mo me nt o do enc ontro, da ndo v azão a o t empo / es pa ço . se co mpre e nde r, c ria ndo um s e nt i do para s ua v i da a pa rti r de se u me i o
Como se dá e ss a expe riê nc ia na inf ânci a? Muit as v ezes os a dult os e do s ma t e ri a is de que di s põ e " (DUARTE JR. , 1 99 8 , p. 113).
t e nt a m, ma s nã o c o n s e g ue m s a b e r de i me di a t o q ue m é o be bê c o m Porta nt o, ima gens, sons, pa la v ra s e ges t os prec is a m co nec ta r-s e
que m co nv iv e m. Na t e nt a t i v a , bus c a m falar, co munic ar-se , c o mo in- em diá logos div ers os, opo rt uniza ndo e agre gando ge s to s c orpóreo s à s
te rlo c ut o re s que s o mo s , e m uma língua / c o muni c a ç ã o e m que "o be bê " at it udes de apro pria çã o e co mpre ensã o fi lt ra da s pe lo s educ adores , pa ra
po s s a e nt e nde r/ s ent i r a s me ns a ge ns na s e s c o la s o u Ce nt ro s de Edu- que s e ajus tem à prá ti ca da i ma gi na ção /c ri aç ão de le s e do s bebês qua n-
cação Infa nti l (L ARROSA, 20 1 3). Ne s sa rela ç ão e nt re nó s e o bebê, do ga ra tujam, mo v ime nta m-s e , ba lbuc ia m, ge st i cula m, mo de la m, quando
é i mpo rt a nt e c o mp re e nd ê -l o c o mo u m o ut r o , que no s i nqui e t a , que s - expe riment am o no vo , des c obri ndo o utras ma ne i ra s de se expre ss ar, o u
ti o na ndo a c a da mo me nt o no s s as prá t i c a s educ a t i v a s ; co lo c a ndo -no s ainda , quando do co nhec ido, e nc ontra m outras f orma s de sc onhe ci da s de
to do o t empo em uma linha tê nue , e ntre o e u e o out ro , e nt re as no s sa s se c o munic ar co m o outro e o mundo (MEIRA, 20 1 4).
experiê nc ia s e as e xperiênci as dele (do be bê ). "Pens ar a i nf â nc i a c omo Na intera ção corpórea ent re o s be bês e ent re e les e os educado res,
out ro é, jus ta ment e, es s a i nquie t aç ã o, es s e que s ti o na ment o e e s se va - confi gura m-s e expe riê nc ia e a conte ci me nto , uma fo rma çã o de tribos c om
zi o " (L ARROS A, 2 0 0 4 , p. 184). interesses comuns e ao mesmo tempo singulares, com cada um brincando à
0 que c a ra c te riza a no s sa experi ênc ia , pro fe ss ores , e a do bebê? sua maneira, aguçados pela curiosidade em desbravar lugares antes desco-
Ta lv e z um a co nt e ci me nt o, que é s e mpre algo que a c abo u de pa s sa r o u nhecidos, apostando na potencialidade dos processos criativos e imagéticos.
que va i se pas sa r, t udo de f orma s imultâ ne a (DEL EUZE, 19 9 7 ). 0 a c o n-
te ci me nto c o ns ti tui , po rta nt o, es tre it a re laç ão entre e spaç o /t empo , c on-
fi gura ndo-se no pró prio s enti do . 0 professor: provocador de afetos?
0 q u e é o "s e nti do " na expe riê nc ia do ac onte ci mento ? Confo rme
Dua rt e J r. (2 01 0), os ó rgã os do se nti do s ão c o mpos to s da s perce pç õe s 0 af et o es tá i nt imamente ligado à amoros idade, e m uma re la çã o in-
da audi çã o, da vi sã o, do t at o, do pa la da r e de o utras t anta s, que s e pre- tensa e pontua l na reinvenç ão do amor, buscando o sentido da experiência
sent ific am e m nossa s experi ênc ias. Algumas ma is i ntensas que out ras, de sens ível re nova da pelo corpo e pe la ment e. Na e duca ção pelo af eto , tran-
acordo c om os repe rtórios culturais e vi venciai s que v amo s agregando ao sita m dent ro e fo ra do corpo express ões pe la v ia do tat o, do o lha r, da pa-
longo de no ss a exis tê nc ia . A inte ns ida de v ai depende r muit o de c omo as lavra , da esc uta, do gest o e do movime nto, manifes tando-se em sent imen
es co la s e Centro s de Educ aç ão I nfa nt il de se nv o lv em a s prá ti ca s e duca - tos. São eles que mobilizam processos simbólicos e construções cognitivas
ti va s c o m o s be bês . As lingua gens /e xpres s õe s da a rt e po de m c ont ri bui r e sensív eis. Po rtanto, a expre ssivida de pode ampliar a possi bilidade de os

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educadores identificarem comportamentos, ações e situa ções d o bebê


Percursos possíveis nas práticas
que poderiam não ser perceptíveis (MEIRA ; PI LLOTTO, 201 0).
educativas (sonoras , visuais e corporais)
Para isso, é preciso que educadores busquem meios para também
compreender e articular os próprios afetos a partir de situações que sur-
No c ont e xto da s e s c ola s e de Ce nt ro s de Educa ç ã o I nf a nt i l, c o m-
gem ao acaso , de pequenos detalhes em suas práticas educativas e sua
ple xo s e reple to s de subjet iv ida de s, e nc ont ra -s e o e duca do r/ prov oc ador
interação com os bebês . Por exemplo: a organização espacial do ambien-
de a f et o s . Ta mbé m para es se pro fis si ona l, o pre s e nt e t e xt o pret e nde
te onde fic am os bebês , os fluxos da iluminação , os objetos instalados
apo nt a r a lguma s pi s ta s so bre pos s i bi li da de s de e xpe ri ênc i as s ens í ve i s
naquele lugar de experiências , o som e a entonação das palav ras, entre
pa ra que po ss a , junta ment e c om o s be bê s , c oloc á -la s e fe t iv a e a f et i va -
outras tantas práticas (idem).
me nt e e m prá ti c a .
A articulação en tre elementos ma teriais e imateriais começa pelo
Co mo e ntã o des env olve r prá t ic as educ a ti va s c om os be bê s, e nã o
desa fio de lidar co m a incerteza e o improv áv el . Nessa trama, está o
pa ra o s be bê s? Tra ta -s e de uma e s c o lha t a mbém f i los ó f i c a, po i s i mpli
devir , atravessando o processo e o produto da criação de educadores e
ca o e s t a be le c i me nt o de açõe s se nsív eis ou não, int e grada s o u não,
bebês , cada um a seu tempo e em suas singularidades (CUNHA, 2 0 1 4 ).
de e xpe riê nc ia s se ns ív e i s o u nã o , pi st a s pa ra uma a ç ão e duc a ti v a que
Envolver -se e env olv er os bebês nesse lugar de magia é imprescindí-
pe rme i e a s ens i bi li da de e co m ela ele ment o s que diga m re s pe i t o à pe r-
vel aos processos de apreensão de mundo e construção simbólica e de
ce pçã o , c ri a ç ão e i ma gi na ç ão ; pa ra que sa bore i e de f orma li vre o s mo -
sentidos , entendendo que os afetos ocorrem na interface dialógica, no
mentos s oli tá rio s e c ole ti vos ; para que bus que, por mei o do se r curi os o,
entre laçam entos de força s e forma s em que u m mod ific a o o utro pela
o des a f io de e st a r v i vo - a pró pri a e xis t ê nc i a no c o nt a t o c om o o utro .
qualidade da comunicação a que se propõe.
Qua ndo atuamos c o m bebês, to rna -s e f unda ment a l co mpre ende r
0 afeto é um mapa sensível do que acontece nas relações entre bebê
que nada acont ece isola dame nte; todo s os sent idos estã o em ação : ouvir,
e educadores , transmutado em valor para a vida pessoal, social e cultural.
ver, ba lbuc iar, mo vi me nt ar, e xpre ss ar. .. 0 bebê dev e se nt ir-se um co pa r-
Tal mapa é formado por experiências v iv idas no dia a dia , que sinalizam
ti c ipa nt e na s a çõ e s, e nã o s endo c ont ro lado pe lo a dulto (HOLM, 2 0 07 ).
impressões importantes nos processos educativ os (MEIRA , 2 014 ).
Os bebê s ma ni f es ta m-s e expre ss iv ame nt e de ac ordo co m o i nt erlo c ut or/
0 ed uca dor prov o cad or de afe tos é também o pesquisador/cria-
educa dor, que a compa nha e part icipa dos seus proce ssos de apropri ação/
dor e , junto co m o s be bês , v ai percebendo suas necessidades e rea-
aprendi za ge m s e ns í v el, 0 ba nho , no co nt ext o da cre c he , é um do s mo -
ções : "ouv indo-os, observ ando -os, traduzindo seus olhares e so n s e
me nt os c ons i de ra do s re le va nt e pa ra nó s e m t e rmo s de c ui da do s e c o m
ampliando suas questões" (BARBIERI , 2 0 12 , p . 19). 0 lugar ed ucador é
a hi gi ene do be bê . A re la ç ã o c o m a á gu a é má gi c a pa ra o b e bê , e o s
transitório e de constante mov imento ; é o lugar d a escuta, da atenção
primei ro s co nt at os , a inda no ve nt re da mãe , re me te m-no pa ra o pra ze r e
ao outro , de afetamentos (DELEUZE, 19 97 ), É tam bé m o lug ar d e um
o aconchego que a água lhe proporcio na. Po r que , ent ão, não aprovei tar o
v iajante curioso, que busca o não c onhecido, ao "fazer caminhos dife-
banho ou qualquer outro conta to com a água como experiênc ia sens ível? 0
rentes e conhecer lugares antes nunca visitados. Também é reparar na
que signi fica o to que das mãos na pe le do bebê? Qual a sua rela ção com a
natureza , nas pessoas , nas informações sensoriais que o mundo traz"
textura e a temperatura da água? Um momento de prazer e descoberta? Um
(BARBIERI, 2 012 , p. 36 ).
mo me nt o de di álogo e nt re o prof es so r e o bebê? Um momento de e sc ut a
interna ou de música que embala esse encontro com o banho? Para além do

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banho, como descons iderar a alegria de brincar co m a ma ngue ira jo rra ndo textura s, e os s e nt ido s v ã o s e c o ns ti t ui ndo em pro c es so s imagétic os,
água ou co m as mã os e os pé s em co nt ato c om a água? E o co nt ato c om mis tura ndo-se a tudo que é vi vi do . Co nc ordamos c om Tua n (19 83 , p. 2 0)
a terra , a are ia e o barro? Que po ssibilidades se oferecem a os bebê s para ao e s c re v e r que "um o bje t o ou um luga r a ti nge s ua re a lida de c o nc re t a
que tenham essas experiências? Como organizar ações que propiciem esses quando no s s a e xperi ê nci a c om e le é t ot a l, ist o é, at rav é s de to do s o s
lugares e experiências de prazer/alegria? se nti dos , co mo t ambé m c om a me nt e a t iv a e ref lexi v a". No me s mo pe r-
So bre a inge s t ã o e de gus t a çã o do s ali me nt o s pe lo s be bê s , c o mo curso de pe ns a ment o, v ale de s t ac a r a impo rt â nci a em ouv i r e pe rc ebe r
po de m se r pe nsa da s? De que f orma podemo s transf ormá -la s ta mbém e m os bebês , re s pe it ando s e u te mpo na s a çõ es pro pos ta s. Alguns pre ci sa m
pra zer? Quando es sa açã o s e torna experi ência se nsí vel? (Ta lve z no mo- de um t e mpo ma i o r pa ra re s po nde r à s pro po s t a s , o ut ro s re a ge m ma i s
me nto em que de i xa mo s que as s ens aç õ es do gos t o/ pa la dar, da s t e xt u- ra pida ment e. Cada um te m s e u t e mpo e perc e pç õ es pró pri a s . 0 que i m-
ras e do v is ua l tomem nos sas a lmas po r co mplet o? ) Mas o que po de m os porta rea lmente no proc es so é a c onvi vê nc ia e nt re bebês e do educ ador
be bê s expe ri enci a r co m os a li me nt o s? As se ns aç õe s dos a li me nt os c rus co m os be bê s dura nte o s mo mento s de cria çã o , po is ne ss e inst a nt e nã o
e c ozi dos , sólido s e líquido s, os co ntrast es de co res , texturas e sabore s, de v e e xi s t ir o f aze r c e rt o o u errado , o bo nit o o u o f ei o (HOLM, 2 0 07 ).
os ali ment os da nat ureza e o ri giná rio s de ca da c ult ura. . . Ca da co njunt o Um be bê que r e xp e ri me nt a r t udo à s ua v o lt a : s e n t i r o go s t o da s
de es t í mulo s (co r, o lf at o , pa la da r. . . ) é um da do s e ns o ri a l co mpo s t o de coi sas , a t ext ura, cheiros, e nga ti nha r, pe gar, segura r, enfi m. Perce bendo
signi fi ca do s e s enti do s (OLIVEI RA, 20 10 ). as suas nec es si da de s, é i mpo rt a nt e que se o rga ni ze m os e s pa ç o s no
Qua ndo o pro fe s so r o rgani za os ali me nto s pa ra o s bebê s e o s e n- se nt ido de lhe s oportuni zar e ss as e xperiê nc ia s, que de ve m po te nc ia li za r
vo lv e no i nt ere s s ant e pro ce s s o de se a li me nt a r, e s t á t a mbé m f a ze ndo a curio si dade deles e, pa ra i s so , se re m o ma is di ve rsi f ic ado s pos sí v el:
uma c uradoria , a qua l indi ca e sc olha s de luga re s, a li mento s, c onfo rmida- abe rt o s , ilumi na do s o u à s v e zes c o m me ia luz; f o rma do po r ca nt o s e n-
de de ss es a li mento s - co re s, te xt uras e s abo re s, a mbie nt açã o e di álogo. c a nt a do s - t e nda s , ca ixas , li vro s, o bjet os , bri nque do s , e t c . Ta mbé m é
Portanto, ao de i xa rmo s no s e mba la r pe lo c o nhe c i do , que s e t o rna por poss ível explora r e spaç os e xternos em açõe s intere ssantes que pos sibi li-
ve ze s de s co nhec ido , ta mbém os bebê s se rã o e nv olvi do s pela ale gria de te m ao s be bê s o c onta to vi sual, so no ro e olfa ti v o co m a na tureza: t erra ,
sa bo re a r, de sc o brindo , e m c a da um do s ali ment o s e no c o njunto dele s , arei a, á gua, a ni ma is , pá ss aros , grama, pedra s, e tc . 0 be bê é t odo co rpo
uma fo rma i nt e re s s ant e de i nte ra çã o e nt re na t ure za e c ultura , e nt re o s e sentido s, desve ndando es paço s, o bjeto s e pess oas.
bebês, dos be bês c om os adult os e co m a expe riê nc ia vi vida. Nes se proc ess o, o as pe cto s oci al é ta mbém de senvo lv ido , uma v ez
Out ro mo me nt o do c o t i di a no da s e s c o la s po de t a mbé m t o rna r-s e que c o mpa rti lha m objet o s e es paç o s c o m o s o utro s, i nt e ra gem e a pre n-
ai nda ma is e spec ia l e si ngular - a lei tura para os bebês . Le mbra ndo aqui de m a di vi dir, ne go ci a r e a rgument ar, mes mo que ape na s c om ge s to s . 0
das palavras de Tei xe ira (20 06 , p. 21 3): "ao dar so m e ima ge m à palav ra as pe ct o f ís ic o t ambé m s e fa z pre se nte qua ndo s e "agac ha m e lev a nt am,
do c o nt o , o c o nt a do r de hi s t ó ri a s t e m o po de r de (re )e nca nta r o mun- fi ca m na ponta do s pés , pulam de uma ext re mi dade à o ut ra. .. enfi m, mo -
do , le v a r o out ro para o mundo da f a nt as i a qua ndo o c onv i da a bri nc a r vimenta m o corpo o t empo to do " (o p. ci t. p. 67 ). Co mo o rganiza r prát ic as
co m s eus própri o s pensa me nt os ". Os bebês, à sua maneira , desv elam educ a ti va s para que os be bê s e xplo rem e s pa ço s , suporte s e ma te ri a is ?
as pa la vra s c o nt a das pelo pro fe s s or e grada t iv a ment e f o rma m i ma ge ns Alguma s pis t a s: prende r uma o u mai s fo lha s (e xemplo: pa pe l kra f t ) c o m
e s ons com o que é li do e, a ss im, s e fa vorec e o s eu pro ces so s imbólic o. fit a ades iva para que, ao garat uja r na s folha s, não ha ja o ris co de e ss as
As histó rias na rradas v ão s e t rans formando de palavra s em so ns, odores, fi ca rem embola da s , des pre nde ndo -s e do c hão . Ela s t a mbé m po de m s e r

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pres as em o utros s upo rt e s: pare de s, ca ixa s, mes a s, e t c. 0 i mpo rt a nt e é atuantes que i nflue m em todo pro cesso artí stic o-pedagógico". A c urado ria,
cri ar s it ua çõ e s e m que os bebê s s e si nta m li v res e c o nfo rt áv e i s no a t o portanto, pode ser uma excelent e ferrament a pedagógi ca, mediante a expe-
de fa ze r sua s ga ra tujas e e xperiênci as . Como af irma Ho lm (op. cit .), do is riência e a atitude colaborativa (educador e bebês), fomentando o comparti-
as pe ct o s s ã o i mport a nt e s durant e o pro c e ss o do f aze r: t e r a lgué m c o m lhamento dos saberes e devires por meio das experiênci as com linguagens/
que m co nve rs ar, e sc ut ar ou s imple sment e es tar pre sente ; ter v ontade de expressões da arte. Ao pensar a curadoria como uma atitude pedagógica, o
co nt i nua r, a ale gria do mo me nto . professor constrói uma dinâmica em relação aos demais professores, à ges-
Vale destacar que, para os bebês, importam o processo e a experiência tão, às outra s c ria nça s, à c omunidade , a o mundo, expandindo o proce sso
no ato do fazer (garatujar, balbuciar, modelar, movimentar, sonorizar...). É o de c onsc iência crí tica , perce pção imaginati va e identi fica ção cultural pelo
adulto que muitas veze s lhe impõe significa do, determi nando o pro duto final viés da experiência sensível (VERGARA, 1996).
como até mais importante que o ato criativo. Uma sugestão para o educador Expa ndi r a e xpe ri ênc ia do o lha r e da perce pçã o da c omuni da de in-
é apro ve i ta r ao má xi mo o t e mpo de co nv ív io co m os be bê s, dei xando -o s terna e externa da insti tuiç ão educat iva, potencializando a c uradoria como
livres para explorar suas várias formas de expressão. ação cria tiva e c riado ra, pode ser um c aminho i nteressante na co nstrução
A inte nçã o do educ ado r po de se r t ambé m a de s oc ia li zar a s pro du- de e spaç os com signifi cados e se ntidos vári os.
ções do s bebês entre ele s mesmos e co m o contexto inte rno e exte rno da Ess as experiência s, ta nto no s espaço s int ernos quant o e xt ernos da
ins tit ui ção de Educaç ão Infa nti l. Sugerimos que pense em uma curadori a. es co la , po de m propic ia r ao s be bê s as pri me iras prá ti ca s so ci ai s e cult u-
Para Chi arelli (199 8, p. 1 2), o curador/e duca dor "é sempre o primei ro res- rai s. Co m base nas experiência s, "v ai de sco bri ndo o mundo f ísi co , psic o-
ponsáv el pe lo co nceit o da mostra a se r exi bida, pelas esco lhas das o bras, ló gi co , s oc ia l, es t ét ic o e c ult ural que lhe é a pre se nt ado pelo s adult os (e
da cor das paredes, i luminação, etc. " Aqui não esta mos pensando em obra outras cria nça s) no di a a dia " (FERRAZ; F USARI , 1 9 9 9 , p. 4 3 ) . 0 me i o
art ís ti ca, mas , s obre tudo, nas produçõ es /mani fe st açõ es e xpres si vas dos afe tiv o e c ult ural va i s e c onstrui ndo po r mei o de experiênci as com o utras
bebês , por is so ac re sce nt amo s a nomencla tura curador/educ ado r, aque le pes so as , c om o s lugares, c om os o bjeto s e com t udo o que po ss a contri-
que cultiva um lugar de sabe res/de vires não a penas sobre as e xperiê ncias buir para o seu proce sso de soc ialização.
dos bebês, co mo t ambém, e especia lme nte , s obre a experi ênc ia. 0 que pre te nde mo s af i rmar co m es t e te xt o é que a experiê nc i a do s
Essa a ção, de cert a forma, env olve a organização de to dos os espa- bebê s c om a a rte es tá na dime nsã o da e xpe riê ncia se nsí vel, um mome nto
ços desti nado s ao s bebês, em proce ssos cria tivo s, no fazer c otidiano dos de de s bra v a r c a mi nhos e m uma e xpe diç ã o que nã o f i nda . . . Um c a minho
bebês e em outros moment os de experiências e de socialização com os ou- de se nsi bi li dade s - um e nc o nt ro e ntre o e duc ado r e os bebê s. Enc o nt ro
tros : engati nhando, em cont ato com objetos e e spaç o, o uvi ndo, balbuci an- de co rpo s que f alam, de olhos que busca m e de mã os que se entrela ça m,
do, etc. A cura doria, nessa perspectiva, pode ser compreendida como ação carre ga da s de "porquês ". Ba ga ge m che ia de graça , uma oraçã o do s se n-
criativa, que, mante ndo la ço s afe ti vo s, e st abele ce diá lo go s, provo cando ti do s e do ime ns o pra ze r/ do r de nã o "pa s sa r" pela e xpe ri ê nc i a , ma s de
sentidos, saberes e fazeres. Mobiliza, assim, as manifestações expressivas est ar dentro dela, t ota lmente envo lv ido.
do outro para o outro e com o outro. Tal ação pode ser considerada um pro- Fi na li za mos o t e xt o c o m a s pa la v ra s de De le uze (1997, p. 78 ): a
ce ss o artí st ic o/ cult ural/pedagógic o, c omo be m assegura Marinho (2014, art e "a ti nge es sa e st ada ce le st ia l que já nada guarda de pe ss oa l ne m de
p. 63): "t anto na c ri aç ão co mo no a prendi za do, a c ri a ti vi da de , a t omada r raci ona l. À sua mane ira , a art e diz o que dize m a s crianças . Ela é fe ita de
de dec i sã o, a ci nes te s ia c o m os outros e co m o mundo s ão di spos i ti vo s trajeto s e dev ires , por isso fa z ma pas , extensiv os e intens ivo s".

Ed i t o r a M e di a ç ã o 120
12 1 Ed i t o r a M e d i aç ã o
Susana Rangel Vieira da Cunha e Rodrigo Saballa de Carvalho (Orgs .)

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ZI ELI NSKY, Môni c a. I ber ê C amar go Mode r no no Li mi te 19 1 4 - 1 9 9 4 . Por to A legr e: CAMILA BETTIM BORGES
Fundaç ão I ber ê C amar go , 2008. D i sponí vel em: < h tt p: / / ww w . i be r e c a m ar go . o r g . PED AGOGA E MESTRA EM ED UC AÇ ÃO PELA UFRGS, PROFESSORA D E ED UC AÇ ÃO
INFANTIL E DE CURSOS DE FORMAÇÃO DE EDUCADORES DAS INFÂNCIAS, PESQUISADORA
br / si te/ up loa ds / mu lt i me di aExpo si c ao / 26 04 201 2 321 8 I be r e % 20 C a mar go % 20 Mo
E I NTEGRANTE D O GEI N/UFRGS.
de r n o% 2 On o% 2 0L i m i te . p d f > A c e s so e m : 12 se t. 20 17 .

CARLA CLAUBER
GRAD UA D A EM PED AGOGI A PELA ASSOC I AÇÃO C ATARI NENSE DE ENSINO ( 1990) ,
MESTRE EM EDUCAÇ ÃO PELA UNI VERSI DADE DO VALE DO ITAJAÍ (2003), DOUTORA EM
ED UC AÇ ÃO PELA UNI C AMP (2015) , ATUALMENTE ATUA C OMO COORD ENAD ORA D A
CASA DE CULTURA, TEM EXPERI ÊNCIA C OMO PROFESSORA NA ED UC AÇ ÃO INFANTI L,
NOS ANOS I NI CI AI S E C OM FORMAÇ ÃO DE PROFESSORES.
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CAYENNE RUSCHEL DA SILVEIRA
GRAD UAD A EM PED AGOGIA PELA UFRGS, PÓS- GRADUADA EM ESPEC IALIZAÇÃO EM
ED UC AÇ ÃO E ESTUD OS C ULTURAI S PELA ULBRA/ BRASI L, PROFESSORA D A RED E
PRIVAD A D E ENSINO NAS C ID ADES D E LAJEADO E ESTRELA! RS.

JÉSSI C A MA R IA F R EISL EB EN
MESTRAND A D O PROGRAMA D E PÓS- GRA D UAÇ ÃO EM E D UC AÇ ÃO D A UFSM - LP4
- ED UC AÇ ÃO E ARTES, LI C ENC I ADA EM ARTES PLÁSTI C AS PELA UFSM.

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ARTE CONTEMP ORÃNEA E EDUCAÇÃO INFANTI L

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Susana R angel Vi ei r a d a C unha ( Or g. }


LU TI ER E D ALL A VA LLE
D OUTOR EM ARTES VI SUAI S E ED UC AÇ ÃO PELA UNI VERSI DADE DE BARC ELONA! Este li vr o s e pr opõe a o f er e c er uma
ESPANHA), MESTRE EM EDUCAÇÃO PELA UFSM, ESPECIALISTA EM ARTE E VISUALIDADE
am pl a ab or da ge m so br e os p r o c e ss os
PELA UFSM, BACHAREL E LICENCIADO EM ARTES VISUAIS PELA UFSM, LÍDER DO GRUPO
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ARTES VI SUAI S E (IMEDIAÇ ÕES (C NQP/ UFSM) , LÍ D ER D O GRUPO CEC ED - GRUPO
ESTUDOS CI NEMA E ED UCAÇÃO (C NPQ/UFSM) . di f e r ent es l i ngu agen s: a r tes plá sti c as,
jog o, te atr o, mú si c a e d anç a.
MARCIA APARECIDA GOBBI Os te xto s f o r a m to d os pr o du z i d o s
GRAD UAD A E LIC ENCIADA EM CI ÊNC I AS SOC IAI S PELA USP ( 1992) , MESTRE EM par a di alog ar c om os pr o f ess or e s e
ED UC AÇÃO NA ÁREA DE CI ÊNC IAS SOCI AIS, C ULTURA E ED UCAÇ ÃO PELA UNI C AMP out r o s p r o f i s si on ai s q ue at uam n as
(1997), DOUTORA EM EDUCAÇÃO PELA UNICAMP (2004), PROFESSORA E PESQUISADORA esc ola s, alt er n and o a por tes te ór i c os
DA USP, TEM EXPERIÊNCIA NA ÁREA DE EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO DE SOCIOLOGIA, c o m exem p lo s de d e se nh os , d e f a la s
ATUA NOS SEGU I NTE S TE MAS: ED UC AÇ ÃO INFANTI L E I NFÂNC I A, FOTOGRAFI A E e d e pr o du ç õ es i n f a nti s. A o l on go
DESENHO D E CRI ANÇ AS PEQUENAS E ENSINO D E SOC IOLOGI A. do li vr o , a par ec em i nt er ess ant es
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MARIA EDUARDA RANGEL VIEIRA DA CUNHA as ár ea s de ma nei r a a valor i zar as
LI C ENC IAD A EM ARTES VI SUAIS PELA UFRGS, APERFEI ÇOAMENTO EM A NA TO MI A
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SP), FUND AD ORA, DIRETORA E PROFESSORA D O AZUL AN I L - ESPAÇO DE ARTE, ap o nt a nd o a s pe c to s i m po r ta n te s
PROFESSORA D E ARTES VI SUAI S E ARTE C I RCENSE PARA AD ULTOS E C RI ANÇ AS, a l eva r e m c ons i de r aç ão no
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A DI SCI PLI NA ARTE, FOI U M A D AS ELA BO RAD OR AS E C O OR D E NA D O RA D OS TE A TR O E D A N Ç A
PARÂMETROS C URRIC ULARES DO CENTRO UNIVERSITÁRIO MARIA ANTONI A/ USP ( 2003
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A 2006) , TRABALHA C OM FORMAÇ ÃO NA ED UC AÇ ÃO ESC OLAR E SOC I AL, Ê LÍ D ER
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Mar i a Fon sec a F alk emb ac h
SILVIA PILLOTTO
PÓS-DOUTORA NO INSTITUTO ESTUDOS DA CRIANÇA (IEC) NA UNIVERSIDAD E DO MINHO A i nte nç ão des ta pu bli c a ç ão é
- UMINHO, BRAGA/ PORTUGAL, D OUTORA EM ENGENHARI A D E PROD UÇ ÃO ( GESTÃO) c on vi d ar tod as as esc ola s d o p aí s
PELA UFSC, MESTRE EM EDUCAÇÃO PELA UFPR, GRADUAD A EM EDUCAÇÃO ARTÍ STICA a pr ati c ar o te atr o e a dan ç a,
PELA UD ESC, ATUA NO PROGRAMA DE PÓS- GRAD UAÇÃO - MESTRAD O EM ED UC AÇ ÃO op or tu ni za nd o, p or m ei o de
E NOS C URSOS D E ARTES VI SUAIS E PED AGOGI A NA UNI VALLE, COORD ENAD ORA ati vi dad es p r aze r os as e lúd i c as , o
DO NÚC LEO D E PESQUI SA EM ARTE NA EDUC AÇ ÃO - NUPAE D ESD E 2003, POSSUI de s e nvo l vi m e nt o mo t o r , a f e t i vo e
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ED UC AÇ ÃO, AU TORA D E VÁR I OS LI VROS, ATUA EM PROGR AMAS D E FORM AÇ ÃO
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Ar ti c ul ada s à te or i a, enc ont r am - se
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STÉ FAN I V IEI R A
PEDAGOGA GRADUADA PELA UFRGS, PÓS-GRADUADA EM PSIC OPEDAGOGIA CLÍNICA E pr á ti c as pe dag ógi c a s, pr o vo c an do os
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Ed i t o r a M e d i aç ã o 12 8 esc ola r d o Ens i no Fu nd ame nta l.

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