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HARRY POTTER: ENTRE A MAGIA E A TRANSFOBIA

A saga de sucesso retorna aos cinemas dividida entre fãs devotados e revoltados
Lançado em 1997, o primeiro livro da saga Harry Potter tornou-se um fenômeno imediato.
Tanto sucesso rendeu a franquia de oito filmes iniciada em 2001, com a adaptação do
primeiro volume “A Pedra Filosofal”. Vinte anos depois, o bruxinho está de volta às
telonas em exibição comemorativa e com a pandemia da covid-19 em baixa, cinemas do
mundo todo reabrem suas portas para os fãs reviverem a magia desse universo. Mas nem
tudo são flores. Em 2020, a autora da saga, J.K Rowling, polemizou ao usar o twitter para
criticar uma matéria que fazia uso da expressão “pessoas que menstruam”. O texto tinha
como objetivo tornar a linguagem mais inclusiva, contemplando também homens trans
que, por nascerem com o sexo biológico feminino, poderiam menstruar.
Foi o suficiente para que a comunidade trans se manifestasse acusando-a de transfobia.
J.K, contudo, não parou por aí. A autora justificou seu posicionamento, declarando que
“não se pode negar a existência do sexo biológico, pois trata-se de um fator decisivo
para a experiência de cada indivíduo”. Mas, afinal, o que é transfobia?
Primeiramente, é preciso saber o que define uma pessoa transgênero. “São pessoas que
têm uma identidade de gênero diferente do sexo biológico. Pessoas trans se sentem
genuínas e confortáveis com elas mesmas quando entendem e aceitam uma nova
identidade de gênero. A transfobia, portanto, é a discriminação contra as pessoas
transgênero, causando consequências irreparáveis às pessoas que sofrem com essas
ações”, aponta a jornalista e psicóloga Millena Marinho.
Não satisfeita, Rowling publicou em seu site oficial a sua visão sobre o assunto. Entre os
argumentos, um específico é o mais usual e prejudicial à comunidade trans:“Quando você
abre as portas de banheiros e vestiários para qualquer homem que acredita ou sente que
é uma mulher – e, como eu já disse, certificados de confirmação de gênero podem ser
dados sem qualquer necessidade de cirurgia ou hormônios –, você abre a porta para
qualquer homem que desejar entrar. Essa é simplesmente a verdade”.
O discurso foi largamente criticado pela comunidade LGBTQIA+, bem como por aliados
cisgênero (pessoas que se identificam com o sexo biológico), como Daniel Radcliffe,
intérprete de Harry Potter nos filmes, que declarou: “Mulheres trans são mulheres.
Qualquer declaração ao contrário apaga a identidade e a dignidade de pessoas transgênero
e vai contra todos os conselhos dados por associações profissionais de saúde que têm
muito mais experiência no assunto que Jo ou eu”.
O jornalista e fã, Rafael Pestana, foi assistir à projeção especial de “A Pedra Filosofal”
no cinema. “Minha paixão pela saga nasceu exclusivamente dos filmes exibidos na TV
aberta. Minha ligação com esse universo não é tão forte literariamente. Então, Rowling é
meio irrelevante para mim, ainda que ela seja a autora dos livros, os quais eu passei um
bom tempo sem saber que existiam. O posicionamento dela sobre pessoas trans é
equivocado e eu, como LGBTQIA+, estou decepcionado”, disse.
Já a cientista da computação, Thamyres de Sousa, diz sentir-se traída. “Fui adolescente
com Harry Potter e isso ajudou a me aceitar como mulher trans. Agora é como se a J.K
dissesse que sou uma farsa. Logo ela que escreveu sobre a luta contra o fascismo
e preconceito sob a alegoria da magia. Alguns fãs querem parar de consumir. Não acho que
isso seria uma solução”, afirma.
Dia 1° de janeiro de 2022, celebrando 20 anos do primeiro filme, o streaming HBO MAX
exibirá um especial com o elenco principal de Harry Potter. Rowling não foi convidada.

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