Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Livreto para o Baralho Da Mandala Florestal
Livreto para o Baralho Da Mandala Florestal
Criada por Maria Lalla Cy Aché, é um ciclo de 31 danças rituais inspiradas nas energias
femininas da Mãe Natureza que revelam em nós aspectos do sagrado feminino. São como 31
arquétipos da mitologia nativa brasileira que se manifestam dançando trazendo para o mundo sua
oração corporal.
São representações das múltiplas faces da Grande Mãe: a água do rio, o sol, a lua e as
estrelas, o som e o silêncio das matas brasileiras, bem como as sereias, as árvores, as pedras, cobras,
pássaros e onças, cada uma com o seu ensinamento/iniciação.
A Mandala Florestal nos ajuda a recontar essa História do Brasil “esquecida”. E nos lembra
também que houve o tempo das Amazonas, mulheres guerreiras, a última resistência desse
matriarcado, as que fugiram de suas tribos por não quererem se submeter a nova lei estabelecida
com a chegada de uma nova mitologia “o mito de Jurupari, o filho do sol”. Pela nova lei, as mulheres
passavam a ser propriedade dos maridos e não podiam mais escolher com quem iriam se deitar. Os
filhos não eram mais de todos. Elas não podiam mais cantar, dançar, rir e nem sequer falar, sem a
permissão dos maridos. Não podiam mais participar das festas sagradas e os rituais eram para a
incorporação do espírito do Jurupari (o nome Jurupari significa de boca fechada) à fim de estabelecer
as novas leis. Diz-se que esse foi o tempo do “ kiriri”, a tristeza das mulheres. As que se negaram a
obedecer, foram punidas e até mesmo condenadas à morte. O mito de Jurupari e a nova lei coincide
com a chegada dos colonizadores a essas terras e o mito persiste até hoje em muitas tribos
amazônicas, inclusive na Colômbia e no Peru. O mito de Cy foi aos poucos sendo esquecido. Contam
que ela foi punida por desobediência e transformada na estrela mais brilhante da constelação das
Plêiades.
Relegada a condição de lenda, essa parte da história do Brasil precisa ser contada para
honrar a resistência e a coragem de nossas ancestrais, para o benefício e autoestima de todas as
mulheres. As Amazonas fugiram do convívio com os homens e estabeleceram seu próprio território:
o reino das Pedras Verdes, no coração da Amazônia, próximo ao rio Nhamundá.
Através da música e da dança celebramos e nos conectamos com estes aspectos do Feminino
Iluminado, da nossa alma selvagem, não domesticada, sempre disponíveis para nos ajudar a
reconhecer dentro e fora de nós: a Força, a Beleza e a Sabedoria que nos habitam, nutrem e nos dão
coragem para enfrentar os desafios da existência.
Um desdobramento do trabalho anterior que tem no Livro e no CD “Juremar Yaci Uaruá” (de
Maria Lalla Cy Aché), seu primeiro movimento, a “Mandala Florestal” tem criado nas mulheres que
participaram destes círculos um sentimento de pertencimento a essa nova tribo urbana, suburbana e
rural: a tribo das Tekoimãs, que significa mulheres loucas e sem lei.
A Fruição Criativa da Natureza Feminina é Agora.
Trabalho dedicado a memória de Rui Pereira, amor e companheiro nessa vida e para sempre.
A Dança da Vida habita o tempo, vive o mundo e suas utopias. Na nossa Mandala
Florestal todas as forças estão disponíveis para a recriação e afirmação de um Feminino
sábio e potente. Tudo fica mais fácil quando o mundo ou o outro passam a fazer parte,
assim como você, de uma totalidade orgânica e sustentável.
A natureza não pode ser dissociada da cultura. Neste momento o mundo passa por
grandes transformações e o vírus covid 19 coloca em xeque o que chamamos de civilização.
O modelo antropocêntrico cede lugar ao biocentrismo, numa perspectiva plural aberta
também aos saberes não humanos, dos vegetais, dos animais, os geológicos etc. A
chave está na substituição da visão antropocêntrica e hierarquizada na relação do
homem com a natureza por uma cultura em rede, na qual o ser humano é apenas um
ponto em complexa rede interconectada. No contato com a natureza, na contemplação
dos ritmos de desenvolvimento natural, nós, mulheres vamos percebendo nossos ciclos
como formas de desenvolvimento espontâneo e sem esforço.
Sinta o chamado para um novo tipo de “enraizamento” e de contato com a terra, como a
comunicação invisível das árvores através da rede micelial que se oculta no subterrâneo.
Assim também, no mundo inteiro, temos nos reconhecido e dado muitos passos a
frente, ocupando lugares estratégicos na sociedade e promovendo mudanças.
“Estou no meio da tempestade por minha própria vontade, para que todas as
minhas folhas mortas caiam e sejam levadas pelo vento.” Ruth Saint Dennis.
Mandinga: Faça uma lista de tudo que você quer soprar para bem longe do
seu campo magnético agora e conscientemente vá soprando e permitindo que
novas possibilidades surjam. Utilize também o som do seu maracá ou do seu
instrumento predileto para espalhar a energia que precisa ser mudada. Em breve
, novas configurações surgirão. Prepare-se para o novo com alegria!
Carta / Força 2 - Divina Caeté . A Mata Virgem – o Silêncio e o Som
Se você entrar na mata virgem e parar para escutar os sons que ali
habitam, vai perceber a sinfonia cósmica da vida que pulsa ali. Da mesma forma,
se você parar para meditar e contemplar suas vozes internas, vai ficar
impressionado com a polifonia. Esta é a selva da tua alma. Esta prática é
fundamental para reconhecer aquilo que está harmonia e o que pode estar
precisando ser transmutado para gerar mais beleza e abundância na vida.
Esta escuta vai fazer de você uma pessoa menos responsiva, mais
acolhedora e empática consigo mesma e com os outros. Quantas vezes tudo o
que precisamos é de alguém que saiba escutar. Artigo raro hoje em dia, são
preciosas as pessoas que não precisam emitir opinião sobre a vida do outro,
sendo apenas alguém que está silenciosamente ali, testemunhando o processo
de busca do outro, amorosamente, generosamente, respeitando os tempos da
respiração de cada um, para encontrar suas próprias respostas.
Pergunta: Você tem parado para ouvir as respostas que estão vibrando em
você neste momento? Você tem sido capaz de seguir a sua intuição?
Essa linda e poderosa cabocla nos ensina que nenhuma dificuldade que se
apresente a nós é maior que a nossa coragem. Com ela conseguimos suportar com
paciência todas as situações difíceis que se apresentam em nossa vida. Caso você
esteja encontrando dificuldades para encontrar a coragem dentro de si, chame a
Cabocla Jurema, ela sempre irá lhe amparar.
Uma pessoa em harmonia com seu espírito é como um rio fluindo. Ela vai
aonde quer, sem pretensão, apenas sendo ela mesma. Ela também tem margens,
curvas, profundidade, pedras e... ao mesmo tempo, é a água que flui e o
movimento é a força invisível que faz as águas fluírem. Água e Terra em
harmonia e complementaridade. Dois princípios femininos que juntos nos
harmonizam e modelam nossas personalidades, trazendo refinamento emocional
e beleza.
O interessante dos mitos é que ambos tratam do equilíbrio que vêm das
alternâncias. Não há mal que sempre dure , nem bem que nunca se acabe.
Na nossa Mandala Florestal, Tatacy rege as transições, do mais denso ao
mais sutil, da escuridão para à luz. Ela nos ajuda a entrar em contato com
nossos aspectos inconscientes, egóicos para tornar consciente o trabalho de
transformação interior, trazendo luz ao que está na escuridão da ignorância,
permitindo-nos fazer escolhas que tragam amadurecimento, crescimento e
benefício para si e para todos.
Pergunta: O que está precisando ser equilibrado para trazer mais
beleza, amor e harmonia para minha vida?
Mandinga: Tatacy nos dá a permissão para brilhar. Quais os aspectos
luminosos, dons e talentos que tenho deixado de cultivar e manifestar no
mundo. Entre em contato com o que nutre a sua alma com o fogo do
entusiasmo. Faça aquilo que mais gosta e compartilhe com o mundo toda a
sua luz e o seu amor.
A Mãe do ouro é um mito que conta que existe uma bola de fogo que com sua
presença mostra a localização de jazidas de ouro que não devem ser exploradas.
Ela é a guardiã dos segredos e riquezas da terra, como ouro e pedras preciosas. Por
esse motivo, ela é conhecida como a protetora da natureza, principalmente dos rios
e montanhas. Acredita-se que por conta de sua atuação, ainda existam algumas
jazidas de ouro que não foram exploradas.
É nas noites de lua nova ou nas madrugadas que essa bola de fogo se
transforma numa bela mulher, voando pelos ares. Ela habita cavernas, e, cuida das
mulheres que são maltratadas pelos maridos e, portanto, infelizes nos casamentos.
Assim, com sua beleza estonteante ela leva os maridos indesejados para uma caverna
longe de sua família. Ali, a Mãe-de-Ouro os prendem o resto de suas vidas.
Igualmente, ela arruma outros maridos que farão felizes as esposas.
Nossa história tem um final mais feliz e ensinamentos sobre o desejo e como
ele nos move em boa direção desde que não nos deixemos capturar pela ambição
desmedida. Maria era uma mulher simples que apreciava a natureza e as luzes do
pôr do sol num magnífico final de tarde. Caminhava pela estrada que corria à beira
do Rio Grande, quando viu sair de uma caverna uma nuvem de vaga-lumes e no
meio deles uma grande bola de fogo que se transformou numa linda mulher que
voava pelo céu com seus cabelos de arco-íris que pingavam gotas que ao tocarem a
terra se transformavam em pedras preciosas: ametistas, esmeraldas, topázios, rubis
e turmalinas. Imediatamente, Maria se lembrou da lenda que dizia que se você
fizesse um pedido à Mãe do Ouro no intervalo de tempo em que uma gota caia de
seus cabelos e antes de tocar a terra, a Mãe do Ouro atenderia o seu pedido. E
assim, maravilhada com aquela visão, Maria pediu para ser filha da Mãe do Ouro. A
visão sumiu e Maria seguiu seu caminho para casa.
Estava cansada e naquela noite foi dormir cedo embalada pela visão
deslumbrante da Mãe do Ouro. Acordou de madrugada e viu ao lado de sua cama
uma nuvem cor de rosa. Ainda sem saber se estava sonhando, Maria rolou da cama
para a nuvem que a transportou pela floresta até a beira do rio, onde ficava a gruta
onde Maria tinha visto a Mãe do Ouro. A nuvem entrou na caverna e lá Maria viu
maravilhada um palácio de pedras preciosas, onde uma festa acontecia com pompa
e circunstância: boa música, os melhores vinhos, as mais apetitosas comidas,
homens e mulheres belíssimos se acarinhavam amorosamente. Um deles convidou
Maria para dançar e era como se voassem pelo espaço luminoso. Rodopiaram até
uma cama perfumada de ervas, com lençóis macios e ali Maria experimentou uma
noite de amor inesquecível! Na medida em que se vislumbrava a luz da manhã,
Maria percebeu outras mulheres que lhe disseram que se ela quisesse voltar na
próxima lua nova, tinha que guardar segredo do que acontecia ali e assim ela
permaneceria tendo o privilégio de ser mais uma das filhas queridas e protegidas
pela Mãe do Ouro. A nuvem cor de rosa levou Maria de volta a sua cama e ela
acordou para mais um dia ordinário com o coração leve e a alma nutrida por aquela
noite especial.
Pergunta: Quais os seus desejos mais profundos? Você está apegado a alguma
crença antiga que ainda impedem o desfrute do prazer?
Mandinga: Imagine a visão da Mãe do Ouro e cada vez que uma gota se desprende
de seus cabelos, faça rapidamente um pedido, antes que a gota toque o chão.
Mantenha segredo dos seus desejos mesmo depois de concretizados. Consagre um
cristal com a intenção de realizar um desejo e enterre-o em um vaso com uma planta
guardiã que deve ser muito bem cuidada.
Com a chegada dos europeus na Terra Pindorama, surge também uma nova
mitologia, fruto da tentativa de aproximar as narrativas do sagrado para estabelecer
conexão entre o colonizador e o povo originário. Veja como o novo mito tem muitas
analogias com a narrativa do Velho Testamento para o mito de Adão e Eva.
Ceucy comeu de um fruto que era proibido às mulheres em período fértil. O
sumo da fruta mapati escorreu pelo seu corpo até as suas partes íntimas e assim,
ela engravidou e deu a luz ao filho do sol: o Jurupari (que significa boca fechada).
Ele veio trazendo a nova lei que decretava que a partir daí; as mulheres passariam a
ser propriedade dos maridos e deviam ser obedientes a eles, permanecendo
caladas, cuidando das tarefas da oca, da colheita e dos filhos. Não deveriam mais
cantar, nem dançar, nem tocar flautas, o que passava a ser prerrogativa dos homens
em dias especiais de festa na grande maloca. As flautas quando tocadas, de certa
forma secreta, faziam com que o espírito do Jurupari se manifestasse trazendo
novas leis e ordens superiores. As mulheres não podiam participar da cerimônia e
nem mesmo se aproximar da grande maloca sob pena de morte.
Ceucy, com muitas saudades do filho, resolveu se aproximar da maloca nem
que fosse para vê-lo de longe e foi fulminada por um raio e morreu. Jurupari foi
chamado para ressuscitar a mãe, mas decidiu que assim ela serviria de exemplo
para as outras mulheres que ousassem desobedecer. Como concessão especial,
por ser ela sua mãe, Jurupari a transformou na estrela mais brilhante da constelação
de Plêiades e elevou-a ao céu, de onde se diz que olha tudo o que acontece no
mundo que ela criou.
Essa nova mitologia que marca a passagem do matriarcado para o
patriarcado no Brasil, inaugura também o tempo do “Kiriri”, a tristeza e o silêncio das
mulheres. O mito da Grande Mãe Brasileira Cy desaparece e as mulheres passam a
ter que obedecer cegamente aos seus maridos.
Muitas delas não quiseram se submeter a nova lei e fugiram de suas tribos,
levando suas filhas, deixando que os homens cuidassem e educassem os filhos
homens e se organizaram na tribo das Icamiabas (mulheres sem marido) ou
Tekoimãs (mulheres loucas ou mulheres sem lei).
O mito de origem da lenda das Amazonas é da etnia kamaiurá e narra a
história das Icamiabas, mulheres que combatiam em pé de igualdade com os
homens que se aventuravam em terras Amazônicas nos séculos V e VI e está
relacionado com a descoberta do Eldorado. Quando o conquistador
espanhol Francisco de Orellana desceu o rio pelos Andes em busca de ouro, a
vitória das Icamiabas contra os invasores espanhóis, foi narrada ao rei Carlos I.
Muitos embates com as Amazonas aconteceram depois disso segundo relatos de
diferentes navegadores.
A Grande Mãe das Icamiabas era Yaci, a lua. A tribo vivia nas proximidades
do rio Nhamundá, mantendo seus rituais e tradições. Na Festa da Vitória recebiam,
durante uma noite, os guerreiros Guacaris, de uma tribo vizinha, para uma noite de
amor. Preparavam um banquete à beira do Lago de Yaci Uaruá, no reino das Pedras
Verdes. Quando a lua cheia estava a pino, caminhavam em procissão, levando nos
ombros potes de água de cheiro que derramavam no lago cristalino para o banho de
iniciação das cunhãs que tinham sangrado pela primeira vez. As jovens índias
mergulhavam no lago e traziam um barro verde que, depois de modelados e, em
contato com o ar, endureciam como pedra. Confeccionavam amuletos mágicos e
protetores em forma de animais ou genitálias, chamados de muiraquitãs. Eram
oferecidos como salvo conduto para os guerreiros guacaris poderem circular pelo
território do Reino das Pedras Verdes. Fazia parte do ritual o mergulho na água sob
o reflexo da lua. Essa descrição contempla o princípio feminino em sua forma mais
pura. Durante o ritual, as índias mais velhas, tomavam uma bebida feita da casca de
uma árvore sagrada e empunhando seus maracás, cantavam a noite inteira. Depois
de nove meses nasciam as crianças, fruto de uma noite de amor na festa da Vitória.
Se nascesse um menino, era entregue aos guerreiros para criá-los após o tempo da
amamentação, mas, se fosse uma menina, ficava com elas.
Naruna, era o nome da líder das Amazonas ou Icamiabas, precursora de uma
resistência feminista. Ela nos inspira a criar as nossas próprias leis, a dar um passo à
frente em direção ao protagonismo de quem luta pelo que é justo, para preservar a
Mãe Terra. Treina as mulheres da tribo para serem excelentes arqueiras e a saber
como se defender. Propõe uma liderança não hierárquica, horizontalizada, onde o
trabalho e as responsabilidades são distribuídos entre todos. Lidera com naturalidade
e organicidade, levando em conta a segurança das mulheres da comunidade.
Passaram a se pintar e usar ornamentos. Fazia parte do ritual dançarem e cantarem
incessantemente, para abrir os caminhos da floresta. Exaltam o ritmo, a
musicalidade e a dança, usando linguagens expressivas importantes para o
padrão de consciência matriarcal, onde o espírito-lua que celebra os ciclos e a
impermanência se sobrepõe ao ego cristalizado e individualista.
Não se sabe da total veracidade da história, e também não se sabe se as
Icamiabas de fato existiram ou não. Mas elas estão presentes em relatos dos
colonizadores espanhóis e, até hoje, suas histórias são contadas na região. Elas
existem, ainda que no imaginário coletivo.
Pergunta: Você sabe para onde está direcionando a sua vida? É capaz de
fazer escolhas conscientes em fidelidade a si?
Mandinga: Estabeleça uma meta e dedique-se diariamente a fazer uma ação
na direção almejada. Um bom arqueiro alinha o seu centro cardíaco com o centro do
alvo a ser atingido.Trabalhe para manter a energia constante e não perder o foco.
Ajude suas amigas a conquistar suas metas. Faça o que estiver ao seu alcance.
Ter Sabará, a pedra reluzente, como energia aliada nos ajuda a manifestar a
coragem de Ser quem se é, a ter clareza e discernimento no pensar, a fazer a
palavra andar, a alinhar pensamento, sentimento e ação. É uma ousadia pensar
originalmente, além do que está pré-estabelecido e velho. Ela é aquela que tem a
audácia de derrubar velhos altares e abrir novos caminhos para solucionar velhas
questões.
Depois disso, deixe o cristal no bolso, num lugar onde você possa vê-lo com
frequência, ou use-o como um amuleto em um colar ou pulseira.
Viemos a este mundo com um tempo certo para viver nossas experiências e
aprendizados. É um tempo curto e precisamos aproveitá-lo para cumprir nossa
missão na Terra. E que espécie de missão é essa? Num mundo de sofrimento,
viemos aqui para desafiar o tempo/espaço desta existência para aprender como
sermos felizes e trazer benefício aos seres com quem convivemos neste planeta.
Então, a Avó Árvore, com o desejo de nunca mais separar-se deste bosque
de donzelas e num ato de amor profundo pelas suas filhas, abençoou todas as
mulheres com uma árvore no seu ventre, e esta árvore transformou-se no que hoje é
o nosso útero. Assim todas as mulheres podem recuperar o seu enraizamento à Mãe
Terra nutrindo-se do seu amor, pois o útero é o vínculo com a sua verdadeira
essência. No seu centro está a forma de como recuperar a razão primeira do que é
ser mulher. E o maravilhoso da bênção da Avó Árvore é que tenhamos ou não um
útero físico, sempre teremos um útero energético que ninguém nunca nos poderá
tirar.
Esta árvore que está em nosso útero nos conecta com a vida e a morte.
Quando damos nascimento à uma criança, estamos no mesmo instante
condenando-a à morte. Isto porquê a natureza da vida-morte-vida é uma só. É
através da observação e da comunhão com as árvores que aprendemos sobre a
natureza cíclica. Esta é uma das faces misteriosas do Divino Feminino que
precisamos honrar.
Quando nos aproximamos da natureza com respeito, humildade e entrega,
ela compartilha muitos de seus segredos. Dizem que todas as respostas estão
dentro de nós e sinto que elas podem ser acessadas com bastante facilidade
quando estamos entre árvores, rios, mares, animais, flores.
Para Clarissa Pinkola Estés, autora do Best Seller “Mulheres que correm com
os Lobos”, amar significa emergir de um mundo de fantasias para um mundo real,
onde o amor duradouro é possível. O que morre? As ilusões, as expectativas, a
voracidade de querer tudo, de querer que tudo seja lindo, tudo isso morre. Como o
amor sempre provoca uma descida até a natureza da morte, podemos perceber por
que é preciso grande poder sobre si mesmo e plenitude da alma para assumir esse
compromisso. (...)
“Às vezes aquele que está fugindo da natureza da vida-morte-vida insiste em
pensar que o amor é apenas uma dádiva. No entanto, o amor em sua plenitude é uma
série de mortes e de renascimentos. Deixamos uma fase, um aspecto do amor, e
entramos em outra. A paixão morre e volta. A dor é espantada para longe e vem à
tona mais adiante. Amar significa abraçar e ao mesmo tempo suportar inúmeros finais
e inúmeros recomeços — todos no mesmo relacionamento.”
As perguntas e mandinga são sugeridas pela própria Clarissa Pinkola Estés em seu livro.
• Ao que eu preciso dar mais morte hoje, para gerar mais vida?
• O que eu sei que precisa morrer mas hesito em permitir que isso ocorra?
• O que precisa morrer em mim para que eu possa amar?
• Qual é a não-beleza que eu temo?
• Que utilidade pode ter para mim hoje o poder do não-belo?
• O que deveria morrer hoje?
• O que deveria viver?
• Qual vida tenho medo de dar à luz?
• Se não for agora, quando?
Carta / Força Catorze – Diarum, a onça preta
Aprendi com Kaká Werá Jacupé que a arte da espreita está ligada ao
coração, assim como a mestria da consciência de Ser está ligada a mente e a
mestria do propósito ou intento, como ele chama, está ligada ao espírito.
Nesta batalha silenciosa para alcançar nossos objetivos, temos que ter um
domínio sistemático do nosso comportamento. A espreita é uma forma de relacionar-
se com as pessoas visando afinar e desenvolver o observador de Si.
• descartar tudo o que não é necessário pois seu objetivo é ser simples e direto
ao ponto
• relaxar e confiar, sem nada temer para que os guias possam nos ajudar
Diarum, a onça preta, é este olho brilhante que tudo pressente como no
ensinamento da espreita de Carlos Castaneda e ao mesmo tempo tem a capacidade
de dar o bote e fazer o que precisa ser feito para trazer consciência a uma situação
perigosa, eliminando os obstáculos do caminho da beleza e da harmonia. Com ela
aprendemos a dar limites e inspirar respeito e admiração.
“Se gostei e gozei muito do Amazonas, a verdade é que vivi metido comigo por todo
o caminho largo de água”. O turista Aprendiz – Mário de Andrade.
A lenda conta que é nos rios do norte do país, nas pedras das encostas, que
Yara costuma viver. Ela tem longos cabelos; ora verdes, ora castanhos, um
espelho e um pente. Seus cabelos são fortes e ela se admira no espelho, na
mesma hora em que sai da água para venerar e se banhar à luz da lua. É de uma
beleza apaixonante, e por isso pode cegar quem a vê ou encantá-lo com seu canto,
atraindo a pessoa para o seu lar nas profundezas do rio, de onde as vítimas nunca
mais voltam. Os poucos que conseguem emergir acabam ficando loucos em função
dos encantamentos da sereia. Neste caso, conta a lenda, somente um ritual
realizado por um pajé muito poderoso pode livrar o homem do feitiço.
Há quem diga que se tornou um espírito vingativo. Ser encantado pela beleza
da Yara é algo irreversível: ou se submerge na escuridão dos rios e ali se fica para
sempre, ou se permanece na solidão da vida coletiva, sempre com a cabeça e/ou o
coração atraídos por ela. A Yara vem evocar a anima em seu aspecto sentido como
ameaçador, aspectos que num período da história foram abominados num caldeirão
de outras qualidades e por isso muitas de nós foram queimadas na fogueira,
torturadas, vigiadas e violentadas, porque tinham sabedoria, sensualidade
aflorada, autonomia em relação às escolhas sexuais e reprodutivas. Muitas de nós
fomos sufocadas na sombra daqueles que têm a atitude da consciência rígida e
polarizada. A Yara também pode simbolizar uma versão vingativa do encontro dos
índios brasileiros com os portugueses.
Instabilidade, imprevisibilidade, eros aflorado, princípio do prazer, são
ameaças ao controle e à razão, características do padrão de consciência
patriarcal. Também são qualidades atribuídas ao demônio, representado no
Arcano XV do Tarô, o aspecto Dionisíaco, impossível de controlar.
O envolvimento com a sensualidade anímica que encontramos facilmente
nas histórias de sereia fica também concentrada nas mulheres que representam as
que são banidas, marginalizadas, demonizadas, encontradas na figura de Eva,
Lilith ou de prostitutas. À partir da “caça às bruxas " na Idade Média, surgiu um
novo modelo de feminilidade: a mulher como esposa ideal— passiva, obediente,
parcimoniosa, casta, de poucas palavras e sempre ocupada com suas tarefas"
(FEDERICI, em Calibã e a Bruxa). Para os Jesuítas também foi impossível associar
a Grande Mãe Brasileira Cy em sua dança extática e criativa com a pura e casta
Virgem Maria, em sua imagem distorcida pelo patriarcado. Cy também foi caçada.
Mais uma vez na história do Brasil, a postura europeia colonialista,
cartesiana, fálica, de exclusão, negação, imposição da razão, com algo de
paranoico, avança sobre as tentativas de sobrevivência de um povo mais
abrangente, integrado, agregador, bastante relacionado ao princípio feminino. Nas
diferentes culturas indígenas no Brasil, uma coisa é certa somos todos filhos e parte
da Mãe Terra. A discriminação com respeito ao feminino presente nas
caboclas indígenas e na cultura afrodescendente remete à inquisição contra as
bruxas medievais que receberam projeções negativas do feminino, que passou a
ser visto como perigoso a serviço de instrumentos de controle e dominação,
sobretudo do ponto de vista reprodutivo.
O espelho que a Yara carrega, ou ainda que ela representa, nada mais é do
que o reflexo sombrio daquilo que quem a olha não é capaz de enxergar em si
mesmo. A Yara da mitologia brasileira simboliza, dentro dos sincretismos culturais, a
integração das características femininas de sedução e fertilidade de Oxum e de
Yemanjá, de origem africana, da serenidade e proteção das santas católicas de
origem europeia, e da agressividade e independência das caboclas, de origem
indígena.
Pergunta: Você tem alguma aspiração ou desejo que não admite?
Não se sabe a exata origem das Bruxas, constam relatos de que elas existem
desde os primórdios da humanidade. As práticas de bruxaria envolvem rituais
simbólicos desde os tempos neolíticos, onde havia ilustrações dos rituais de
adoração às deusas da fertilidade dos povos primitivos. Dessa forma, as
experiências visionárias, rituais de caça e cerimônias de cura sempre estiveram
presentes nos símbolos e metáforas de várias culturas. Por aqui, também tivemos
nossas bruxas: raizeiras, benzedeiras e parteiras. Mas desde sempre, mulheres de
sabedoria incomodavam por transgredir as hierarquias e valores patriarcais.
Essas drogas eram muito comuns entre mulheres pagãs na Europa daquele
período. Elas gostavam de usar para se embriagarem e terem um escape da horrível
realidade que elas viviam. Contudo, a maioria dessas ervas e fungos provocava uma
série de efeitos colaterais como náusea, vômito e alergias quando ingeridas, e não
demorou muito para que as bruxas descobrissem que todos esses problemas
podiam ser eliminados se as poções fossem absorvidas através da pele. E mais: que
algumas partes do corpo absorviam essas substâncias de maneira mais eficiente,
que eram as glândulas sudoríparas das axilas e as mucosas da genitália feminina.
Com esse conhecimento em mãos, logo a mulherada começou a produzir poções
mais espessas e bálsamos afrodisíacos, e, como as vassouras estavam sempre por
perto, logo elas começaram a ser usadas com fins recreativos — por assim dizer.
Oribá tem uma vassourinha cheia de florzinha. Ela varre os caminhos , varre
todo o nosso lar, varre prá longe os feitiços e ela pode inté voar.” No passado, a
mulherada costumava fazer uso de ervas para fazer suas vassouras e também para
preparar suas medicinas. Aqui no Brasil , temos uma erva chamada vassourinha de
Nossa Senhora muito usada pelas mulheres de sabedoria de várias Tradições
religiosas para limpar energéticamente suas casas e os lugares onde faziam seus
rituais. E também usavam outras ervas de poder de acordo com o resultado que
queriam obter. Ervas e mulheres andam juntas desde muito tempo. A intimidade das
mulheres com as vassouras dispensa toda a explicação.
O mundo espiritual não é muito diferente do mundo físico e ambos estão
completamente interligados. Então é fácil entender que é preciso limpar
energeticamente o seu corpo, sua casa e o local do seu ritual quando percebemos
que a energia está estagnada, perceba como o ambiente fica pesado, perceba a
densidade da energia que esse hábito de negligenciar a limpeza do ambiente e do
campo energético traz, você não precisa ser médium pra perceber isso.
Pergunta: Onde você percebe que precisa fazer uma limpeza energética? No seu
corpo, casa, altar, em tudo?
Você pode “varrer” o lugar com a vassoura tocando ou não o chão, você
pode colocá-las atrás de sua porta de entrada da casa ou de cômodos
específicos, vai de você escolher isso como vai usar e com qual
frequência. Use sua intuição.
O mito
Esta é a história de Catxerê, a mulher estrela, que desceu do céu, dormiu
com o índio e ensinou os Kraô a plantar e preparar o milho, batata, inhame,
mandioca e amendoim.
Foi assim:
O último rapaz solteiro da tribo dormia sozinho, sobre a sua esteira, no pátio
da aldeia. Uma estrela o viu lá de cima, e, condoída, resolveu casar com ele. Para
isso, transformou-se em um sapo e, pula que pula, subiu em seu peito. O
dorminhoco acordou assustado e, com um tapa, atirou-o no chão. Mas então o sapo
virou formosa mulher e dormiu com o jovem.
Uma noite, porém, quando o índio andava a caça, apareceram em sua casa
cinco homens que, sabendo de sua ausência, violentaram a mulher-estrela. Depois
deitaram-se para dormir. Ela aproveitou o seu sono e cuspiu na boca de todos eles,
matando-os. Os Kraô davam grande importância mágica ao cuspe. Quando o marido
voltou, contou-lhe tudo e subiu para o céu. E nunca mais voltou....
Inúmeras são as Deusas-Estrelas por nós conhecidas na mitologia. Nossa
brasileirinha deusa Catxerê é uma divindade estelar que nos desperta a intuição e
nos ajuda a perder o medo de nos mostrar como somos, sem máscaras,
manifestando o nosso direito essencial de brilhar em paz. Ela confia em si mesma,
no outro e na própria existência.
Pergunta: Quais as suas maiores qualidades? Quais os dons que você
aprecia em Si?
Mandinga: Faça uma lista das coisas que você herdou de seus
antepassados e que você considera uma boa herança: qualidades do corpo físico,
emocional, mental e espiritual. Faça um inventário e faça um pequeno ritual de
agradecimento pelos dons e heranças genéticas que o constituem. Aprecie-se e
brilhe em paz.
Outra lenda conta que Jaci foi criada pelo Deus Sol Guaraci (ou Coaraci). Um
dia, Guaraci estava muito cansado e por isso teve que fechar os olhos para
descansar um pouco. Com os olhos fechados, tudo foi abraçado pela escuridão e
então, para iluminar tudo enquanto ele dormia, ele criou a lua, Yaci. Ela era tão linda
que Guaraci logo se apaixonou. Infelizmente, quando ele abria os olhos para admirar
a lua, ela sempre desaparecia. Então ele criou Rudá, o Amor e seu mensageiro,
para que ele pudesse dizer a Yaci o quanto ele a amava. Além disso, Guaraci criou
as estrelas para estarem com ela enquanto ele dormia.
Outra versão: Yaci estava vagando pela Floresta amazônica, quando viu
Guaraci. Ele era um guerreiro bonito, com olhos de fogo, pele dourada, e uma
energia radiante. Guaraci observou Yaci e caiu fulminado de amor com sua beleza
prateada e sua timidez. Conforme eles declaravam seu amor um pelo outro, Guaraci
começou a queimar com tal paixão que ele percebeu que estava colocando a Terra
em perigo. Ao mesmo tempo, Yaci estava tão dominada pelo amor que ela começou
a chorar lágrimas de felicidade, que quase inundaram a Terra.
Incapazes de controlar suas emoções, Yaci e Guaraci decidiram que seria
perigoso demais eles ficarem juntos. Relutantemente, eles concordaram nunca se
encontrarem no mesmo local novamente. Guaraci logo esqueceu Yaci, que se
certificou de nunca aparecer antes que Guaraci durma. No entanto, Yaci ficou tão
inconsolável que ela chorava todas as noites. Suas lágrimas escorriam sobre as
folhas das árvores, formando poças no chão da floresta e descendo pelas
montanhas, criando assim o grande Rio Amazonas.
Pergunta: Você se sente preso a algum aspecto do passado. O que precisa ser
perdoado para que todos os envolvidos possam ser livres e felizes?
Se tudo na natureza tem mãe (ou Cy). O dia que nasce é Coaracy, a “Mãe deste
dia”, revelando a primeira visão do sol matinal que nasce para todos, tingindo o céu
de vermelho, emanando um halo de luz rosa amorosa e compassiva. Coaracy nos
mostra que a vida continua e deve ser aproveitada. Como Força Feminina, Coaracy
possui grande energia ensinando-nos a estar presentes no aqui e agora, no hoje
abençoado, nos convida a deixarmos nossa marca no mundo a cada dia, vivendo
plenamente a realidade do agora.
Pergunta: O que precisa ser vivificado hoje?
Num dos sonhos em que recebi ensinamentos sobre o oráculo do Xamaiar uma
das imagens que veio nitidamente foi a mandala da flor da vida. Como uma teia
luminosa ela envolvia o corpo de quem deveria ser tratado. Neste trabalho de cura à
distância que desenvolvemos como uma das práticas do Juremar Yaci Uaruá,
visualizamos essa teia luminosa vibrando no campo do que está sendo curado em
diversas cores, de acordo com a intuição do xamã para finalmente unificarmos todas
as cores num branco cristalino que se expande infinitamente envolvendo o paciente,
o xamã até finalmente envolver todo o planeta e além.
Neste momento, junho de 2021, estamos vivendo uma pandemia que nos afeta
planetariamente há mais de um ano e o ensinamento de Mingyur Rimpoche sobre
como a compaixão pode mudar o mundo, faz muito sentido para nós. Trabalhando
simplesmente com a visualização da Teia da Flor da Vida, vivificamos o planeta
como um todo para resistirmos ao sombrio aspecto da morte de entes queridos que
o vírus carrega todos os dias.
Pergunta: Quem são as pessoas que com você formam esta rede de apoio
mútuo e que a quem quando você está bem ou mal, isso afeta.
Pergunta: Você percebe o poder que existe por trás daquilo que você mais teme?
Mandinga: Use um instrumento de sopro ou a sua própria voz para entoar uma
melodia da alma que permite que você se conecte com os aspectos mais elevados e
profundos da sua alma. Permita que estes sons se expandam , ampliando o seu
campo magnético. Sinta-se envolto nestas ondas sonoras que se expandem infinita
mente. Procure usar o som das vogais.
Carta / Força Vinte e três – Kaolim , A fumaça do Cachimbo
Pergunta: O que você gostaria de comunicar agora aos seus mestres, para
que eles possam te ajudar a penetrar na dimensão do mistério, compreender um
problema ou revelar as possíveis saídas para um dilema?
Na região amazônica esta cobra gigantesca vai singrando pelos rios, virando
barcos, transformando-se em homem e em mulher. A necessidade de sentir,
degustar, banhar-se, animar todas as espécies vivas coloca a água doce em
primeiro plano, tanto no que diz respeito à realidade, como no mais profundo do
inconsciente. Na imaginação, a água doce representa a primeira bebida, tão doce
quanto o leite materno. O simbolismo da Cobra Grande encarna o psiquismo
misterioso, a mãe obscura e constitui-se como um dos arquétipos mais importantes
da alma humana, nos quais a água exerce o papel de fundamento da vida, do
mundo, de um povo. Sobre a terra, entre os frutos de árvores monumentais, a cobra
grande é a Senhora das Transformações. Guardiã da energia vital é a Mãe que dá
simultaneamente a vida e a morte a seus filhos. Como o símbolo alquímico, oroboros
representa uma serpente que morde a própria cauda e contém as idéias de
movimento, continuidade, auto fecundação e, em consequência, eterno retorno.
Constelação importante na astronomia indígena brasileira, conhecida como
serpentário, é arquétipo essencial da mitologia nativa brasileira, presente na cestaria
e no trançado de várias tribos amazônicas. De fato, existem cobras enormes,
grossas e compridas como os troncos das árvores, e quase todos que costumam
viajar pela complexa teia aquática da região amazônica, bem como os ribeirinhos e
moradores das matas, conhecem e contam histórias da Cobra Grande. A Boiúna é
uma corruptela de Mboi (cobra) e Una (preta), mas também é chamada de boiaçu,
boiuaçu ou boiguaçu.
O mito da Origem da Noite compõe o imaginário dos povos da floresta,
expressando a aura mítica que envolve o cenário da Amazônia e é contado assim: “
As águas se confundiam com as trevas e a noite dormia no fundo do rio. Não havia
animais; todas as coisas falavam. A Cobra Grande era a Senhora da Noite. Amana
era também, a primeira mulher e guardava todas as suas estrelas num caroço de
tucumã. A filha da Cobra Grande, a bela Meruri, casara- se com um moço valente,
mas não queria dormir com ele porque a noite não existia. - Se queres dormir
comigo, manda buscar a noite no fundo do rio, dizia a filha da Cobra Grande. O
marido era um grande e poderoso guerreiro, Poromina Minari, que ao invés de
cuidar do assunto pessoalmente, ordenou aos seus criados que fossem cumprir a
missão. Os servos foram e trouxeram a noite encerrada no caroço de tucumã. A
Cobra Grande, antes de entregá-lo aos servos, ordenou que ele não fosse aberto
em hipótese alguma, pois do contrário todas as coisas se perderiam. No meio do
caminho os servos ouviram barulhos que vinham de dentro do coco de tucumã,
assim: tem, tem... xiiiiiiiiiiiiiiiiiii. Não controlaram a curiosidade e o abriram. Era o
barulho dos grilos e sapos que cantam à noite. De repente, tudo foi ficando escuro e
a noite pesou sobre a natureza. As coisas começaram a se transformar: nasceram
os animais, os pássaros, os peixes. Nesse momento, Merurí viu Tatacy (o planeta
Vênus) brilhar no céu e disse à Poromina Minari: - A madrugada vem chegando. Vou
separar o dia da noite. E fitando profundamente os olhos do guerreiro, tirou um fio do
seu próprio cabelo e, enrolando-o nos dedos da mão esquerda, delicadamente
ordenou: - Tu serás o Cajubin da cabeça branca, de quem mais tarde nascerão
todos os acauãs. Assim, Merurí fez o Cajubin, do fio de cabelo. Pintou-lhe de barro
branco a cabeça e os pés com tinta vermelha do urucum e deu-lhe a ordem de
cantar no romper da madrugada para acordar toda a mata, duas horas antes do sol
chegar. Quando os criados chegaram, Merurí, pela desobediência, transformou-os
em coatás, de pelos negros e braços longos, para sempre a pular de galho em
galho. Assim nasceram os macacos”. (Couto Magalhães, 1935: 231).
Outra lenda nos fala de Norato, filho da Cobra Grande, irmão gêmeo da
Cobra Maria. Norato é um bom moço, mas que sofre com sua condição de não
poder permanecer sempre na sua forma humana. Cobra Maria, malvada, é morta
pelo irmão. Sombra e sexualidade sob controle, Norato pode ser humano. Cobra
Norato, dorme aos pés da Virgem Maria de Belém, repetindo a iconografia
consagrada da Virgem Imaculada Conceição, que mantém a serpente sob seus pés.
Nítida influência jesuítica nos mitos amazônicos. Mesmo subjugada, a cobra é
associada à mulher e a energia sexual. Cidadãos de Belém afirmam que a cidade foi
feita sobre a morada da cobra. E quando a Cobra se mexe... A cidade estremece.
Seu corpo ligaria uma Igreja à outra, a cabeça no altar da Catedral da Sé - onde está
a imagem de Santa Maria de Belém - e a cauda sob o altar da Basílica de Nazaré. A
Mboi-Açu, como uma procissão, ondula no trajeto de uma igreja a outra. Raul Bopp
dedicou à Cobra Norato um poema que é ícone da produção modernista brasileira.
Nossos ancestrais influenciaram nossas escolhas, medos, sonhos, impulsos
e, também, a nossa etnia, nossas crenças e inspirações. Herdamos força, beleza e
sabedoria, mas , também, herdamos padrões negativos. Para honrar nossa
ancestralidade nativa precisamos perdoá-los, para curar as feridas dessa terra, em
especial no que diz respeito às mulheres que aqui viviam e reinavam no matriarcado
Pindorama.
O primeiro ponto é recordar/descobrir as memórias do passado. Nosso
passado não acaba, ele acontece todos os dias. Na alma, a raiz ancestral é tão
profunda que pode alterar o destino dos descendentes. Em nossos genes está
codificada a nossa herança. Somos programados pelo nosso passado. Quando nos
libertamos dos padrões negativos de nossos antepassados podemos curar nossa
árvore genealógica, fortalecer nossa linhagem espiritual, avançando como
consciência. Segredos, mentiras familiares, que se baseiam no medo, vergonha e
culpa têm sido mapeados através dos processos de constelação familiar e de
terapias de vidas passadas. São um fardo para toda a linhagem. Através da
consciência dos padrões negativos que nos aprisionam, podemos liberar não só a
nós mesmos, mas toda a linhagem através de preces e rituais. Isso também se
aplica a carmas coletivos. Cabe a nós, fazer um poderoso trabalho de cura para
perdoar todos os aspectos negativos que herdamos de nossos antepassados
individual e coletivamente. Em especial, damos atenção aos padrões negativos e
limitadores que herdamos de nossas ancestrais femininas subjugadas por séculos e
condenadas a um lugar de coadjuvância discreta, onde rir, cantar e dançar é coisa
de mulher “sem dono”.
Perguntas e Mandinga: vamos modelar em argila uma linda cobra e no interior
do corpo de barro vamos colocar os nomes dos nossos antepassados familiares e
dos mestres das nossas linhagens espirituais. Munid@s de lápis e papel, nos
visualizamos envolvid@s numa luminosidade brilhante e acendemos uma vela na
intenção de todos os nossos ancestrais. Escrevemos em pequenos pedaços de
papel os nomes dos nossos ancestrais e os colocamos dobradinhos ou enrolados no
interior da cobra. Vamos recorrendo a nossa memória para nos lembrar o máximo
possível em sua ordem de surgimento neste mundo: pais, avôs e avós, bisavós,
tataravós e assim por diante…Também, incluímos num segundo momento aqueles
que são nossos padrinhos e madrinhas espirituais, nossos mestres de todas as
tradições às quais nos vinculamos até este momento da nossa jornada sobre a terra.
Nos perguntamos: 1 - O que de mais valioso eu herdei da minha família? Escreva a
resposta num pedacinho de papel, enrole a resposta delicadamente e insira no
corpo da nossa cobra. 2 - Qual a melhor maneira de oferecer essas qualidades ao
mundo? Escreva a resposta num pedacinho de papel e novamente, enrole e insira
no corpo da nossa cobra. 3 - Quais as tendências negativas dentro de mim que
vieram do passado? Queime na vela acesa, uma a uma, as anotações feitas em
pequenos pedaços de papel. Apenas as cinzas e restos são colocados sobre a mãe
cobra... 4 - Qual a melhor maneira de curar esse ciclo? Proceda da mesma maneira
como nas perguntas anteriores, colocando as respostas nos papéis enrolados no
corpo da cobra. Ao final do trabalho levem a cobra inteira ou aos pedaços para
dissolver em algum lugar da natureza. Nós cobrimos todo o nosso corpo com argila
cosmética e nos imaginamos como filhos da cobra grande. Na medida em que a
argila vai secando vamos mentalizando todos os padrões negativos que queremos
transformar. Em seguida, quando estivermos prontos, mergulhamos no lago, na
piscina ou no chuveiro da ducha, para nos lavar e purificar de todos esses padrões.
Carta / Força Vinte e Cinco - A Vitória Régia
Uma cunhã, chamada Naiá, acreditava que a lua escolhia as moças mais
bonitas para virar estrelas que brilhariam para sempre no firmamento. A índia Naiá
era mesmo muito linda, sensível e muito sonhadora. Todos os homens da aldeia
queriam conquistar o seu coração, mas Naiá só pensava em a ser escolhida pela
lua. Queria tocá-la, aprisioná-la entre os dedos e embriagar-se na sua luz redentora.
Todas as noites de lua cheia, Naiá fazia como todas as cunhãs da tribo, que subiam
nas árvores, nas mais altas colinas, e tentavam em vão tocar a lua. Naiá foi ficando
triste. Já não dormia mais… Passava as noites caminhando na beira do Lago e
cantando para chamar a atenção da lua para si.
Numa noite, de lua cheia, em que Naiá descia de uma das altas colinas que
cercavam a aldeia, caminhando cansada de volta para casa, viu a lua brilhante e
silenciosa a banhar-se nas águas misteriosas do lago. A cunhã sorriu vitoriosa. O
seu sonho estava próximo. Perseguira a lua nos lugares mais altos da mata e agora
ela estava ali, mansa e à mão, pronta para satisfazer seu sonho. Naiá, finalmente,
tocaria a lua. Sem pensar duas vezes, atirou-se às águas em busca da lua. Quanto
mais tentava tocar o astro prateado, mais se afundava e encontrava apenas a
escuridão. E ao que pensou tocá-la, afundou sumindo nas águas...
Do alto do céu, a lua assistiu a tudo, condoída com o infortúnio de tão bela
jovem e não podendo satisfazer seu desejo de levá-la para o céu em forma de
estrela, transformou-a na bela estrela das águas, a linda planta aquática que é a
Vitória Régia... cuja beleza e perfume delicado são inconfundíveis. Dizem que o local
onde o fato aconteceu é o lago Espelho da Lua, situado no município de Faro,
próximo ao rio Nhamundá, na região do baixo amazonas paraense...
Pergunta: O que você está disposto a fazer para se tornar quem você
realmente quer ser?
Este mito aprendi com o cacique Yawanawa, Biraci, reza a lenda que os
primeiros habitantes da floresta queriam saber o que havia lá longe, do outro lado da
margem rio, onde ninguém nunca havia chegado e mal podiam avistar. Neste tempo os
bichos também falavam e o primeiro homem foi falar com o Jacaré para ver se ele
podia levar alguns homens até lá. O Jacaré percebendo o tamanho da curiosidade dos
homens resolveu negociar o serviço: se você me trouxerem comida todos os dias , aí
eu levo vocês para conhecer a outra margem daqui há algumas luas. Mas só não pode
me trazer carne de filhote de jacaré, certo?
Os dias se passaram com os homens levando boa caça para o jacaré e nada de
chegar o evento da famosa travessia. O jacaré no bem bom ia enrolando e adiando
para poder comer cada vez mais sem se esforçar, às custas da curiosidade dos
humanos. Aquilo já estava cansando os homens, até que um deles resolveu que o
jacaré já estava abusando e ao invés de buscar a caça no meio da floresta matou ali
mesmo uns filhotes de jacaré pensando que no meio do resto da caça dos outros
homens, o jacaré nem ia notar a diferença. Mas que engano, ninguém percebeu a
mentira do preguiçoso, exceto o Jacaré, é claro!
No dia seguinte, o Jacaré anunciou ter chegado a hora da travessia, deixou que
subissem em suas costas tantos quanto podia levar e partiram em direção à outra
margem. No meio da travessia, o Jacaré começou a sacudir o seu corpo e todos foram
lançados longe: um foi parar na China, outro no fim do mundo, outro no Rio de Janeiro,
uns foram parar até além do oceano, cada um mais longe que o outro, em lugares que
nunca tinham visto antes e não sabiam mais como voltar para casa, para sua família, e
seus amigos da tribo.
Então o primeiro homem do mundo que tinha ficado na margem esperando prá
saber o resultado da aventura ficou também com muita saudade dos seus amigos e
entrando em sintonia com o vôo da grande arara amarela levou uma mensagem
através do canto kanaro para lembrar a cada humano espalhado pelo mundo que
éramos todos da mesma tribo, que vínhamos da mesma fonte sagrada, que somos
todos parentes.
Pergunta: Quem são as pessoas queridas, muito importantes em nossas vidas que
andam esquecidas, perdidas no tempo/espaço?
Uma das faces da mãe escura é a Caamanha, a Mãe do Mato que protege as
florestas e os animais silvestres, punindo quem produz os desmatamentos, as
queimadas, os caçadores , invasores e mineradores. Ela pune toda e qualquer
violência contra a natureza.
O terror causado pela Mãe do Mato era tão grande que os trabalhadores que
atuavam na floresta usualmente desatavam suas redes, por medo que a Mãe do
Mato, protetora dos animais fabulosos, colocasse nelas gravetos enfeitiçados, que
teriam efeito de morfina e fariam os homens cair em sono profundo para serem
devorados por animais.
Mandinga : Faça uma ação capaz de produzir consciência ecológica. Pode ser
um cartaz, uma campanha ou algo que seja capaz de criar um impacto e se for
preciso denuncie onde os santuários da natureza estiverem sendo agredidos. Muitas
vezes uma boa conversa educativa pode gerar grandes transformações e se a
destruição persistir, é preciso impedir mais violência contra a Mãe Terra..
Ela é a nossa Bruxa Brasileira e sua história começa na Origem dos Remédios
da Mata. Para os kaxinawá, Yushã Kuru é aquela que detém o poder máximo de curar
ou de matar.Com ela aprendemos a não temer o nosso próprio poder e a usá-lo com
consciência. O mito nos ajuda a descobrir os nossos dons e usá-los com sabedoria,
compaixão e humildade. Assim, não corremos o risco de cair na mesma armadilha que
capturou a nossa bruxa brasileira: o poder pessoal, centrado no ego e na manipulação.
Um dia, o genro da velha Yushã Kuru foi caçar na mata. Quando saiu da caçada,
resolveu ir pegar barro para fazer panela e tigela. O lugar onde pegavam barro para
fazer cerâmica era o mesmo da caçada. Lá, o genro viu a velha Yushã Kuru
concentrada preparando uns remédios. O genro veio escondido para pegar a velha
sem avisar e fez amor com ela à força, que gritava: ─ Me solta. Quem é que faz esse
mal comigo? Quando o genro acabou, botou a velha Fêmea dentro do buraco de onde
tiravam o barro e correu pela mata. Yushã Kuru ficou lutando para sair, até que
conseguiu. Nessa hora, ela viu as costas do genro e falou assim: ─ É homem morto
aquele que me fez mal. Voltou para sua casa chorando e pegou o mato venenoso no
caminho para matar o genro. Quando chegou em casa, foi pescar no igarapé. Pegou
piaba e mandim mole, temperou com o veneno e embrulhou na palha de sororoca para
muquinhar. Quando o genro chegou da caçada, ela deu o peixe para ele comer. No dia
seguinte, ele morreu. Todo mundo chorava de dó, até que o filho dele, neto dela,
descobriu e disse assim: ─ Olha, meu pai morreu porque minha avó envenenou ele. O
nosso pai está morrendo por causa da minha avó. Ela é que sabe botar feitiço no outro.
O neto foi pegar o cesto da avó. O cesto estava cheio de coração, tudo em fileirinha.
Quando a velha Fêmea pegava o coração para botar feitiço e veneno, a pessoa morria.
Ela colocava dentro do cesto arrumado em carreirinha. Cada um tinha um nome: um
era aquele do homem trabalhador e o outro da moça bem bonita. Tinha muita carreira
no cesto grande da velha Yushã Kuru.
O neto descobriu todos os segredos da velha e contou para o povo, que ficou
muito assustado. ─ Ah, essa velha feiticeira! Desse jeito, não presta para viver com
nosso povo. Se ela não morrer, vai acabar com todo mundo. Então, resolveram matar
Yushã Kuru. Muitos homens ajeitaram suas armas. Quando a velha Fêmea soube
dessa conversa, fugiu para a mata. Eles caçaram, caçaram e nada de Yushã Kuru.
Resolveram pedir ajuda a um rapaz, chamado de grilo zarolho, para ajudar na caçada
da velha. Este rapaz era muito danado. Ele enxergava até muito distante. O rapaz grilo
pulou no terreiro, olhou e falou: ─ Lá está a velha Yushã sentada. Vocês podem ir, que
vão encontrar com ela nessa direção. As pessoas foram procurando, até que
encontraram. Ela estava bem escondida e sentada. Falaram com ela. Ela acreditou na
conversa, desistiu de fugir e acompanhou as pessoas, no rumo da sua casa. Quando já
estavam perto de sua casa, a velha Fêmea Roxa falou assim: ─ Eu vou no mato cagar.
E fugiu de novo. As pessoas caçaram e procuraram novamente. Não acharam. Então,
voltavam para casa e chamavam o rapaz grilo de novo. Ele sempre dizia onde a Fêmea
Roxa estava, mas ela sempre fugia, danada que era, até que um dia, finalmente,
mataram a velha Fêmea Roxa. Dizem que foi assim.
Pergunta: Como você tem usado o seu poder de curar? Como você tem trabalhado
com os seus venenos internos: a raiva, a inveja, o desejo de vingança?
Mandinga : Prepare o seu caldeirão ( pode ser imaginário) e coloque ali todos os
ingredientes para transformar venenos em poções curativas. Vá fazendo esta alquimia
e transformando tristeza em alegria , ódio em amor, inveja em admiração, trabalhe para
si e também para curar situações de amigos, parentes . Perceba como a sua intenção
é poderosa e curativa.
Mandinga – Pinte o seu rosto com urucum e lápis preto e olhe-se no espelho.
Veja a beleza da estética da cultura dos nossos povos originários. Sinta-se parte da
tribo brasileira .Valorize a nossa força, beleza e sabedoria ancestral.
Por que tanto segredo? Para entender por que este órgão sexual passou tanto
tempo no obscurantismo, é preciso ter em conta algumas questões sociais e políticas.
Vivemos em uma sociedade que ainda é extremamente misógina, feita por homens e
para homens. Dentro desse contexto, as mulheres foram criadas para serem
coadjuvantes de suas próprias vidas, educadas para apoiar, para servir e reproduzir.
Por isso, faz muito sentido que nossa maior ferramenta de sexualidade tenha sido
reprimida por tantos séculos.