Você está na página 1de 14

Artigo Original DOI:10.

5902/2179-460X 16745

Ciência e Natura, Santa Maria v.37 n.3, 2015, Set.- Dez. p. 920 – 933
Revista do Centro de Ciências Naturais e Exatas - UFSM
ISSN impressa: 0100-8307 ISSN on-line: 2179-460X

Modelos de processos difusivos e solução aproximada usando


volumes finitos
Models of diffusive processes and approximate solution using finite volume

Uilbiran Chaves Santos1 e Domingos Boaes Garcia2


1
Docente, Departamento de matemática - Instituto Federal do Maranhão, MA - Brasil
uilchaves28@ifma.edu.br

2
Docente, Departamento de matemática - Instituto Federal do Maranhão, MA - Brasil
domingos.boaes@ifma.edu.br
Modelos de processos difusivos e solução aproximada usando
volumes Resumo finitos
Models of diffusive processes and approximate solution using finite volume

Resumo

Discutimos, neste trabalho, o papel das equações diferenciais, ordinárias e parciais, na representação matemática de processos
reais que envolvam leis de conservação usadas na física, dando enfoque nas equações de difusão que resultam do princípio de
conservação de energia. Apresentamos o método dos volumes finitos, uma técnica atual e bastante útil usada na discretização de
equações diferenciais parciais parabólicas e hiperbólicas. Aplicamos tal método para encontrar aproximações para a solução da
equação do calor transiente bidimensional.
Palavras-chave: Modelos matemáticos, Equações de calor, Método de volumes finitos.

Abstract

We have discussed in this work the role of differential ordinary and partial equations in mathematical representation of real
processes involving conservation laws used in physics, focusing on diffusion equations that result from energy conservation
principle. Here we present the finite volume method, a modern technique and widely used in the discretization of partial parabolic
and hyperbolic differential equations. We applied this method to find approximations for the transient equation of heat.
Keywords: Mathematical models, heat equations, finite volume method.

Recebido: 12/01/2015 Aceito: 29/06/2015


* uilchaves28@ifma.edu.br
Ciência e Natura v.37 n.3, 2015, p. 920 – 933 921
Ciência e Natura 2

1 Introdução derivadas de funções de uma única variável. São exem-


plos de Equações Diferenciais Ordinárias, cuja expressão
De modo geral, um modelo matemático são equações geral é:
escritas usando símbolos matemáticos que retrata uma dy(t)
= f (t,y), y(0) = y0
visão idealizada da realidade e tem como objetivo o dt
entendimento do fenômeno e possíveis predições do na qual f representa a relação entre as variáveis e y0 é a
comportamento futuro. Nesta formulação, o que nos condição inicial.
interessam são as incógnitas que, em geral são funções No caso de mais de uma variável independente te-
de outras variáveis. mos as Equações Diferenciais Parciais, mais realísticas
Nas aplicações encontramos numerosos fenômenos quando representamos o mundo real, tridimensional e
nos quais a taxa de variação de algumas quantidades também a variação no tempo. Por exemplo, de acordo
presentes no modelo estão relacionadas entre elas e às com Lin e Segel (1974), o princípio de conservação de
outras variáveis do modelo. Neste caso as incógnitas massa numa região do espaço tridimensional, conside-
do modelo são funções que aparecem sob a operação rando que não há fonte de massa, é representado pela
de diferenciação e na matemática são catalogadas como equação diferencial parcial, conhecida como equação da
Equações Diferenciais. As equações diferenciais têm continuidade:
papel importante há mais de quatro séculos, principal-
mente por que elas representam os princípios básicos da ∂ρ ∂ ∂ ∂
+ (ρu x ) + (ρuy ) + (ρuz ) = 0
física, que são usados na compreensão da natureza. Por ∂t ∂x ∂y ∂z
exemplo, são equações diferenciais as representações
Nesta equação a incógnita é a velocidade no ponto
dos princípios de conservação de massa, de energia e do
momento do sistema. Vamos citar alguns exemplos de
( x, y, z) e no instante t e o vetor u( x, y, z, t) = (u x ,uy ,uz )
representa a velocidade no meio.
fenômenos cuja representação matemática envolve taxas
de variações. O ideal da modelagem matemática é também encon-
Exemplo 1. A taxa de decaimento de uma substância trar métodos matemáticos que forneçam soluções exatas
radioativa, e a quantidade de radiação que ela emite é, para os modelos, isto é, suas soluções analíticas. Por
em cada momento, proporcional a sua massa m(t) na- exemplo, o modelo apresentado no exemplo 1 tem como
quele instante. Desta forma, o processo de desintegração solução analítica a função m(t) = m0 exp(− at), onde m0
é a equação diferencial ordinária de primeira ordem: é a massa da substância radioativa no instante inicial.
Entretanto em problemas mais complexos, como por
dm(t) exemplo a equação da continuidade em regiões com
= − am(t).
dt geometria irregular, dificilmente conhecemos a solução
Nesta equação o parâmetro a > 0 representa o coefici- analítica. A dificuldade em obter soluções analíticas fa-
ente de proporcionalidade, uma característica do mate- voreceu o desenvolvimento de métodos numéricos para
rial radioativo. O sinal negativo reflete o decaimento da calcular soluções aproximadas. Embora muitos métodos
radioatividade com o passar do tempo. numéricos eficientes já fossem usados antes do século
Exemplo 2. O crescimento de uma população é fre- XX, a questão do cálculo numérico restringia bastante
quentemente proporcional à população existente. Assim, sua utilização em modelos mais realísticos. O desenvol-
o modelo simplificado é: vimento dos computadores nos últimos sessenta anos
tem ampliado de forma expressiva a gama de proble-
dp(t)
= ap(t). mas que podem ser investigados usando aproximações
dt fornecidas por métodos numéricos. Presenciamos um
Para melhorar o modelo precisamos considerar as restri- crescente desenvolvimento de programas computacio-
ções alimentares, a competição entre espécies, etc. nais, chamados simuladores em algumas áreas, que tem
Exemplo 3. Quando um objeto quente, com tempera- como modelo sistemas de equações diferenciais que in-
tura T, é colocado em um ambiente com temperatura T0 corporam mais e mais as complexidades dos fenômenos
(que se presume constante), o objeto esfria a uma taxa em estudo.
que é proporcional à diferença entre sua temperatura
no instante t e a temperatura circundante, T − T0 . As-
sim, o resfriamento do objeto tem como modelo a lei do 2 Processos Difusivos: Equações Pa-
resfriamento de Newton:
rabólicas
dT (t)
= − a [ T ( x ) − T0 ] .
dt Nesta seção usa-se o Princípio da conservação de Ener-
Nos exemplos anteriores as funções incógnitas depen- gia, na forma de calor, para obter uma equação diferen-
dem apenas do tempo e suas taxas de variação são cial que representa matematicamente este princípio. Esta
922 Garcia: Modelos
Santos e Autores:
3 Modelosde
deprocessos
processosdifusivos
difusivoseesolução
soluçãoaproximada ....
aproximada...

é a Equação do Calor, protótipo das equações parabóli- de sua massa m pela taxa de variação da temperatura,
cas, que são amplamente usadas no estudo de processos aqui representada pela função T ( x,y,t):
difusivos.
∂T
De acordo Kreider (1972), para obter a versão bidi- ∆Q = cm , (1)
mensional desta equação, considera-se uma placa homo- ∂t
gênea fina para uma constante positiva c, conhecida como calor
específico do material que compõe o corpo representado
R = {( x,y); 0 < x < L e 0 < y < M }, matematicamente por R. Dessa forma, se ρ designa
isolada de modo que nenhum calor flua através de suas a densidade do material (massa por unidade de área),
faces, conforme Figura 1, isto é, que o fluxo de calor na então, em razão da equação (1) a quantidade de calor
placa se realiza apenas na direção dos eixos x e y. Além que se acumula em R p por unidade de tempo, é :
disso, suponha que a temperatura na placa seja uniforme ∂Q ∂T
em cada seção perpendicular aos eixos coordenados. = cρ x y , (2)
∂t ∂t
∂T
sendo calculada em algum ponto de R p .
∂t
Passa-se ao cálculo do fluxo que atravessa a fronteira
de R p . A lei de Fourier nos diz que o fluxo de calor
que passa através de uma superfície é proporcional à
derivada normal da temperatura. No caso da placa
R p , Figura 2, o fluxo de calor se dá nas seções retas
localizadas na direção dos eixos coordenados e, portanto,
Figura 1: Placa retangular homogênea. a taxa de variação do fluxo de calor num ponto ( x, y),
por unidade de área e unidade de tempo pode ser escrito
O Princípio da Conservação do calor nos diz que: em termos do gradiente da temperatura neste ponto:
A quantidade de calor acumulado numa região R, por unidade
∂T ∂T
de tempo, é igual à resultante do fluxo de calor que passa pela − kx − ky . (3)
∂x ∂y
fronteira de R somado à quantidade de calor gerado no interior
de R, por unidade de tempo. Esta é a Equação Constitutiva que informa como se
Os símbolos matemáticos podem ser usados para difunde o calor no material que compõe a placa, e as
reescrever cada uma das três parcelas que estão presen- constantes de proporcionalidades k x e k y são chamadas
tes no balanço acima: termo de acumulação, termo do coeficientes de condutividade térmica, uma caracterís-
fluxo e termo de geração. Esta é a forma de obter uma tica do material. Sendo k x e k y positivos, e como o fluxo
equação matemática que represente um princípio físico. ocorre na direção da diminuição da temperatura, o sinal
Detalha-se cada uma das parcelas separadamente negativo na equação (3) é necessário. Adotando a con-
considerando uma porção arbitrária da placa R, definida venção de sinais dos eixos x e y, o calor que entra em
por R p , na direção x é:
R p = {( x,y)/ x̄ ≤ x ≤ x̄ + ∆x e ȳ ≤ y ≤ ȳ + ∆y}, ∂T
k x y ( x̄,y, t)
∂x
conforme Figura 2.
e o que sai :

∂T
−k x y ( x̄ +  x,y, t),
∂x
com ȳ ≤ y ≤ ȳ + ∆y.
Analogamente, na direção y o calor que entra e que
sai é, respectivamente:

∂T ∂T
ky x ( x,ȳ, t) e − ky x ( x,ȳ +  x,t) ,
∂y ∂y
com x̄ ≤ x ≤ x̄ + ∆x. Assim, o fluxo de calor resul-
Figura 2: Porção da placa R. tante (o calor que entra menos o calor que sai) é:
 
A quantidade de calor, ∆Q, que se acumula em qual- ∂T ∂T
quer porção de uma placa, é proporcional ao produto k x ∆y ( x + ∆x,y,t) − ( x,y,t) +
∂x ∂x
Ciência e Natura v.37 n.3, 2015, p. 920 – 933 923
Ciência e Natura 4

  T ( x,0,t) = g1 ( x,t) e T ( x,M,t) = g2 ( x,t),


∂T ∂T
k y ∆x ( x,y + ∆y,t) − ( x,y,t) . (4) com t ≥ 0.
∂y ∂y
Se o fluxo de calor é conhecido, incluindo o
O terceiro termo do balanço de energia, que repre- caso de fronteiras isoladas: h1 (y,t) = h2 (y,t) = 0 e
senta o calor gerado por unidade de área e de tempo, w1 (y,t) = w2 (y,t) = 0, tem-se Condições de Neumann:
no interior de R p é escrito em termos da função f ( x,y,t).
∂T ∂T
Assim, a quantidade de calor gerada em R p , por unidade (0,y,t) = h1 (y,t) e ( L,y,t) = h2 (y,t);
de tempo, é dada por : ∂x ∂x
∂T ∂T
∆x∆y f ( x,y,t) . (5) ( x,0,t) = w1 ( x,t) e ( x,M,t) = w2 ( x,t),
∂y ∂y
Usando as equações (2), (4) e (5) no princípio de con- com t ≥ 0.
servação de calor, tem-se: Se a temperatura da vizinhança da fronteira é co-
  nhecida, tem-se Condições Mistas. Neste caso, pode-se
∂T 1 ∂T ∂T
cρ = kx ( x + ∆x,y,t) − ( x,y,t) + utilizar a Lei de Fourier para obter as seguintes relações:
∂t ∆x ∂x ∂x
  ∂T
1 ∂T ∂T (0,y,t) = λ1 [ T (0,y,t) − f 1 (y,t)];
ky ( x,y + ∆y,t) − ( x,y,t) + ∂x
∆y ∂y ∂y
∂T
( L,y,t) = λ2 [ T ( L,y,t) − f 2 (y,t)] ;
f ( x,y,t) , ∂x
∂T
( x,0,t) = µ1 [ T ( x,0,t) − g1( x,t)];
e passando ao limite quando ∆x e ∆y tendem a zero, ∂y
obtém-se ∂T
( x,0,t) = µ2 [ T ( x,M,t) − g2 ( x,t)],
∂T ∂2 T ∂2 T ∂y
a2 = k x 2 + k y 2 + f ( x,y,t), (6)
∂t ∂x ∂y com t ≥ 0.
onde cρ foi substituída por a2 para ressaltar que ela
é positiva. Esta equação é conhecida também como a 3 O Método dos Volumes Finitos
equação da difusão bidimensional.
De acordo com Cunha (2003), os problemas físicos O método dos volumes finitos é um método de discre-
têm condições de contorno que devem descrever ma- tização que é utilizado para obter a solução numérica
tematicamente o que está acontecendo no contorno do de vários tipos de equações diferenciais, a partir da
corpo em estudo. Além da razão física, adicionar condi- integração da equação diferencial em uma região, cha-
ções extras à equação diferencial é crucial na descrição mada volume de controle. Uma característica importante
adequada do problema, do ponto de vista matemático. do método dos volumes finitos é que em cada volume
Em outras palavras, o conjunto equação diferencial, discretizado, a grandeza física em questão, por exemplo
condições de contorno e condições iniciais, deve ser a massa, obedece à uma lei de conservação, ou seja, sua
um problema bem posto: ter uma única solução e esta quantidade permanece conservada a nível discreto. Esta
solução deve depender continuamente dos dados do característica torna o método dos volumes finitos muito
problema (pequenas pertubações nos dados implicam útil quando se quer modelar problemas para os quais o
em pequenas variações da solução). fluxo é importante, como por exemplo, na mecânica dos
Através da condição inicial informa-se como é a so- fluidos.
lução no início do processo em estudo, t = 0. No caso O fluxo de uma grandeza, como massa ou energia, é
da equação do calor (6), a condição inicial é uma fun- definido pela a quantidade dessa grandeza que atravessa
ção que traduz a distribuição da temperatura no tempo uma região com área A, por unidade de tempo. Em geral
inicial: são os experimentos que nos informam as características
do fluxo da grandeza em estudo. Por exemplo, a lei de
T ( x,y,0) = T0 ( x,y), 0≤x≤L e 0 ≤ y ≤ M. Fourier estabelece a relação entre o fluxo de calor e a
As condições de contorno devem ser usadas nas derivada normal da temperatura, conforme equação (3).
seções retas localizadas nos eixos coordenados, as quais A quantidade de uma grandeza U que atravessa as
podem ser dos seguintes tipos. fronteiras de um volume de controle V por unidade de
Se a temperatura é conhecida nos extremos, tem-se tempo, é calculada pelo balanço na fronteira, isto é, pela
condições do tipo Dirichlet: diferença entre o fluxo que entra e o que sai de V. Os
fluxos, de um modo geral, são classificados conforme
T (0,y,t) = f 1 (y,t) e T ( L,y,t) = f 2 (y,t); de Oliveira Fortuna (2000) em:
924 Santos e Garcia: Modelos de processos difusivos e solução aproximada ....
5 Autores: Modelos de processos difusivos e solução aproximada...

• Fluxos convectivos, que estão associados à veloci- O método dos volumes finitos consiste em integrar a
dade do fluido. Por exemplo, se U for a tempe- equação diferencial em cada volume de controle, isto é,
ratura, o fluxo convectivo seria o fluxo de calor transformar (7) na equação diferencial
devido ao escoamento de água quente de uma   
∂U
região mais quente para a região onde a água esti- dΩ = ∇.FdΩ + QdΩ.
Ωj ∂t Ωj Ωj
vesse mais fria.
A integral da divergência de um vetor de funções
• Fluxos difusivos, que são causados pela 
∇. F no volume de controle Ω j é, pelo teorema de Gauss,
não-uniformidade da distribuição espacial de U.
igual à integral de superfície de n.F:
Novamente considerando U como temperatura,  
surge um fluxo de calor na direção x, por exemplo, ∇.FdΩ = n.Fds,
quando há um gradiente de temperatura presente Ωj ∂Ω j
nessa direção. A componente do fluxo de calor na onde ∂Ω j é o contorno fechado de Ω j e n o vetor unitário
∂U
direção x, dada por k , onde k é o coeficiente de normal a ∂Ω j . Assim, tem-se:
∂x
condutividade térmica do meio, aparece no sen- 
∂U
 
tido da temperatura mais alta para a mais baixa. dΩ = n.Fds + QdΩ. (8)
Ωj ∂t ∂Ω j Ωj
Como vê-se, a natureza do fluxo difusivo é dife-
rente do convectivo, pois mesmo sem movimento Esta é a equação básica do Método dos Volumes
pode ocorrer fluxo difusivo. Finitos, que tem como uma de suas principais vanta-
gens trabalhar com as componentes dos fluxos sobre o
O resultado do balanço da grandeza que cruza a contorno do domínio.
fronteira de V somado à produção de U em V, é propor- Aproxima-se as integrais da equação (8) para se che-
cional à variação temporal de U dentro do volume de gar na forma discretizada da lei de conservação.
controle. Em resumo, o método consiste em 4 etapas:
Dessa forma, considerando apenas fluxo difusivo,
• Divisão do domínio de análise em volumes de
pode-se escrever a lei de conservação de uma grandeza
controle finitos;
U em um volume de controle V:
• Integração da equação diferencial nos volumes de
Taxa de variação temporal elevado de U em V = Entrada controle;
de U em V + Produção de U em V.
• Discretização de cada integral de modo a obter um
conjunto de equações algébricas;
Na expressão acima consideramos produção positiva
(geração) ou negativa (sumidouro). • Solução do sistema de equações resultantes, em-
A seguir vamos usar o método dos volumes finitos pregando métodos numéricos.
para obter equações discretizadas associadas a esta ex-
pressão, e que serão usadas na obtenção de soluções
aproximadas para uma equação diferencial difusiva.
5 Malhas e Volumes de Controle
Uma malha é um conjunto de linhas que se intersectam
em pontos que são os nós. Cada nó da malha pode ser
4 Discretização Conservativa da Lei conceptualizado como o ponto representativo do volume
de Conservação de controle que o rodeia. A malha deve abranger todo
o domínio físico da solução e os seus nós são os pontos
Suponha que o fluxo de uma grandeza U seja represen- onde a variável dependente, temperatura para o caso da
tado pela função vetorial F. O modelo matemático que condução de calor, assumirá valores que são a solução
representa uma lei de conservação de U, num domínio da equação discretizada.
Ω, é a equação diferencial Dentre os possíveis tipos de malhas, há malhas es-
truturadas, que apresentam uma estrutura ou regulari-
Ut = ∇.F + Q, (7) dade entre os pontos na distribuição espacial e malhas
não-estruturadas, devido à ausência de regularidade na
onde Q é o termo fonte, que representa a produção de distribuição dos pontos.
U em Ω. Em malhas estruturadas, as fronteiras dos volumes
Como veremos, discretiza-se o domínio, isto é, gera- de controle são definidas pelas mediatrizes dos segmen-
se uma malha que será usada na divisão de Ω em volu- tos que unem dois nós consecutivos, conforme Figura 3.
mes de controle Ω j .
Ciência e Natura v.37 n.3, 2015, p. 920 – 933 925
Ciência e Natura 6

Na próxima seção utiliza-se o método dos volumes


finitos na discretização da equação da condução de calor
bidimensional utilizando uma malha estruturada com
espaçamentos uniformes.

6 Uma aplicação: condução do calor


Considere a equação da condução térmica bidimensio-
nal, transiente e com termo fonte, deduzida na seção 2.
Assim sendo, procura-se a temperatura T ( x,y,t) que é
governada pela equação (6):
Figura 3: Malha em coordenadas cartesianas (linhas ∂T ∂2 T ∂2 T
cheias) e volumes de controle (linhas tracejadas). cρ = k x 2 + ky 2 + f , (9)
∂t ∂x ∂y

onde ( x,y) ∈ R, uma região do plano ( x,y), t ≥ 0,


Apesar dessa figura induzir tal raciocínio, uma ma- ρ( x,y,t) > 0 é a densidade do meio, c( x,y,t) > 0 é o
lha estruturada não tem necessariamente que ter um calor específico do material pelo qual o calor é condu-
espaçamento uniforme. No caso da malha ser uniforme, zido, k x ( x,y,t) > 0 e k y ( x,y,t) > 0 são os coeficientes
o nó que representa um determinado volume de con- de condutividade térmica nas direções x e y, respectiva-
trole se localizará no centro geométrico desse volume, mente, e f ( x,y,t) o termo fonte.
tal como se pode observar na Figura 4, que representa A equação (9) pode ser rescrita usando o operador
um volume de controle interno, isto é, que não possui divergente:
nenhuma face no contorno do domínio. ∂ →
(cρT ) = ∇. F + f , (10)
A notação usada também é apresentada na Figura 4. ∂t
As interfaces dos volumes de controle são denotadas por onde
e, w, n e s e suas dimensões são ∆x na direção do eixo x → ∂T ∂T
F = kx i + k y j (11)
e ∆y na direção do eixo y. As outras dimensões como ∂x ∂y
por exemplo ∆x EP ou ∆y PS , são auto-explicativas. Neste denota o fluxo que passa através das faces do volume
caso, em que a malha é uniforme, ∆x EP = ∆x PW = ∆x de controle.
e ∆y NP = ∆y PS = ∆y. As variáveis qe , qw , qn e qs
No caso em que R é um retângulo
representam os fluxos nas interfaces dos volumes de
controle. R = {( x,y); 0 < x < l1 e 0 < y < l2 } ,

a malha usada na discretização espacial é:


 
2i − 1
xi = ∆x i = 0 : m1 , onde (m1 − 1)∆x = l1 ;
2
 
2j − 1
yj = ∆y j = 0 : m2 , onde (m2 − 1)∆y = l2 .
2
Na variável tempo, toma-se tn = n∆t, n = 0,1,....
Denota-se por Ti,j n a aproximação de T ( x,y,t ) no ponto

da malha ( xi ,y j ) no tempo tn , isto é,


n ∼
Ti,j = T ( xi ,y j ,tn ).

A Figura 3 ilustra os volumes de controle definidos


pela malha.
Integrando a equação (10) no volume de controle V
de referência e no intervalo de tempo
[tn , tn+1 ], obtém-se:
 t   t 
n +1 ∂ (cρT ) n +1 →
Figura 4: Volume de controle interno dVdt = ∇. F dVdt +
tn V ∂t tn V
926 Santos e Garcia : Modelos
7 Autores: Modelosde
deprocessos
processosdifusivos
difusivose esolução
soluçãoaproximada ....
aproximada...

 t 
n +1
f dVdt. (12) integrando no ponto médio de cada interface por seu
tn V comprimento. Por exemplo:
Considerando c e ρ constantes e supondo suavidade    
∂T ∂T 
∂T kx dS ∼
= ∆y k x ,
de , pode-se inverter a ordem de integração do lado Se ∂x ∂x 
∂t e
esquerdo da equação (12):
 
  t  t  ∂T 
n+1 ∂T n +1 → onde k x  é o valor do fluxo no ponto médio da
cρ dtdV = ∇. F dVdt + ∂x 
V tn ∂t tn V e
interface e. Assim,
 t 
n +1
f dVdt. (13) 
     
→ ∂T  ∂T 
tn V n F dS ∼
= kx  − kx  ∆y +
S ∂x  ∂x 
e w
    
7 Desenvolvimento do termo transi- ky
∂T 
 − ky
∂T 
 ∆x.
∂y  ∂y 
ente n s

Usando o teorema fundamental do cálculo, tem-se: Considerando k x e k y constantes e aproximando os


termos difusivos por diferenças centrais,
  t   
n+1 ∂T
cρ dtdV = cρ T n+1 − T n dV    
V tn ∂t V ∂T  ∼ TE − TP
kx  = kx , (16)
  ∂x  ∆x
e
= cρ TPn+1 − TPn ∆V,

com erro de ordem (∆x )2 , tem-se
onde na última passagem usa-se a fórmula de integração      
dos retângulos (ponto médio). → TE − TP TP − TW
n F dS ∼
= kx − kx ∆y +
S ∆x ∆x
    
8 Desenvolvimento do termo diver- ky
TN − TP
− ky
TP − TS
∆x, (17)
∆y ∆y
gente  
com erro de truncamento de ordem O (∆x )2 + (∆y)2 .
Aplicando o teorema da Divergência de Gauss, transforma-
Dessa forma, o lado direito da equação (17) fica:
se a integral de volume em uma integral de linha:
   
 t   t  ∆y ∆x ∆y
n +1 → n +1 → F ( T (t)) = −2 k x + ky TP (t) + k x TE (t) +
∇. F dVdt = n. F dS, (14) ∆x ∆y ∆x
tn V tn S
   
∆y ∆x
sendo S o contorno fechado do volume V, e n um vetor kx TW (t) + k y TN (t) +
∆x ∆y
unitário normal a S que aponta para fora de S. Por outro
 
lado: ∆x
  ky TS (t).
→ → ∆y
n. F dS = ∑ n. F dS,
S q Sq
Assim, obtém-se a seguinte aproximação para a equação
onde q representa as interfaces e, w, n e s, conforme mos- (14):
tra a Figura 4. Desta forma, n = (1,0) na interface e,  t   t
→ → n +1 → n +1
n = (−1,0) na interface w, n = (0,1) na interface n e ∇. F dVdt ∼
= F ( T (t))dt, (18)
→ tn V tn
n = (0, − 1) na interface s. Assim, pela equação (11):
 



∂T

∂T com erro de truncamento de ordem O (∆x )2 + (∆y)2 .
n. F dS = kx dS − kx dS + O lado direito da equação (18) só pode ser integrado
S Se ∂x Sw ∂x
  se for feita alguma aproximação temporal para F, utili-
∂T ∂T zando as regras usuais de integração numérica.
ky dS − ky dS. (15)
Sn ∂y Ss ∂y Considera-se as seguintes aproximações:
Utilizando a regra do ponto médio, aproximamos cada  t
n +1

uma das integrais na equação (15) pelo produto do (i ) = F ( T n )∆t,


F ( T (t))dt ∼ (19)
tn
Ciência
Ciência ee Natura
Natura v.37 n.3, 2015, p. 920 – 933 9278

com erro de ordem ∆t, 10.1 O Método Explícito


 t
n +1
Fazendo θ = 0 em (22), o método de discretização é o
(ii ) = F ( T n+1 )∆t,
F ( T (t))dt ∼ (20)
tn Método Explicito definido por
com erro da ordem de ∆t,  
TPn+1 − TPn 1 F(T n )
 t 
F ( T n +1 ) + F ( T n )
 = + f Pn . (23)
(iii )
n +1
F ( T (t))dt ∼ ∆t, (21) ∆t cρ ∆V
=
tn 2
Levando em conta as expressões dos erros das discretiza-
com erro da ordem de (∆t)2 , pois de acordo com de Oli- ções no espaço, equação (17), e no tempo, equação (19),
veira Fortuna (2000), esta aproximação é a regra dos verifica-se que o erro de truncamento da aproximação
 
trapézios. definida por (23) é de ordem O ∆t + (∆x )2 + (∆y)2 .
As três formulações anteriores podem ser generaliza-
das pela expressão Com este método, o valor de TP no instante tn+1 , TPn+1 ,
 t
pode ser encontrado explicitamente em função dos valo-
 
n +1
res da temperatura em P e nos nós vizinhos no instante
= θF ( T n+1 ) + (1 − θ ) F ( T n ) ∆t,
F ( T (t))dt ∼
tn tn .
em que θ é uma constante real que varia entre 0 e 1. Substituindo os pontos nodais de (23) pelos seus
respectivos índices, definidos na Figura 4, obtém-se:

9 Equação (9) discretizada n +1


Ti,j n
− Ti,j
=
∆t
 
Inicialmente, discretiza-se o termo fonte usando a meto- Tin+1,j − 2Ti,j
n + Tn n n n
1 i −1,j Ti,j +1 − 2Ti,j + Ti,j−1
dologia da seção anterior, isto é: kx + ky +
cρ ∆x2 ∆y2
 t   t
n +1 n +1
f dVdt ∼
= f P ∆Vdt 1 n
tn V tn f ,
cρ i,j
 
= θ f Pn+1 + (1 − θ ) f Pn ∆V∆t,
∼ n ∼ T ( x ,y ,t ), i = 2 : ( m − 1) , j = 2 : ( m − 1)
onde Ti,j = i j n 1 2
onde θ varia entre 0 e 1 e f P é valor de f no centro do e n = 0,1,....
n +1
volume de controle V de referência, conforme Figura 4. Explicitando Ti,j em função dos demais termos,
Reunindo todos os termos da equação (13), na forma resulta:
discretizada, obtém-se: n +1 n
    Ti,j = [1 − 2 (α + λ)] Ti,j +
cρ TPn+1 − TPn ∆V = θF ( T n+1 ) + (1 − θ ) F ( T n ) ∆t +    
α Tin+1,j + Tin−1,j + λ Ti,j
n n
+1 + Ti,j−1 +
 
∆t n
θ f Pn+1 + (1 − θ ) f Pn ∆V∆t. f , (24)
cρ i,j
Dividindo por ∆V∆t, tem-se:
∆t k x ∆t k y
  com α = e λ= .
TPn+1 − TPn 1 θF ( T n+1 ) + (1 − θ ) F ( T n ) cρ ∆x2 cρ ∆y2
= + Na Figura 5, assinala-se os pontos envolvidos em
∆t cρ ∆V
cada passo do processo. Designa-se por “×” os pontos
1  n +1 
nos quais T é conhecida e usada para as aproximações
θ f P + (1 − θ ) f Pn , (22)
cρ nos pontos assinalados por “◦”.
que é uma forma discretizada da equação (9), utilizando
o método dos volumes finitos.

10 Formulações Explícita, Implícita


e de Crank-Nicolson
De acordo com os valores assumidos por θ na equação
(22), resulta nas formas explícita implícita e de Crank-
Nicolson para a equação (9). A seguir detalha-se estes
métodos. Figura 5: Esquema para o Método Explícito.
9928 Garcia: Modelos
Santos e Autores: Modelosde
deprocessos
processosdifusivos
difusivoseesolução
soluçãoaproximada ....
aproximada...

A precisão da aproximação obtida na equação (24) que substituídas em (26), fatorando os termos comuns,
pode ser melhorada com o refinamento da malha, isto é, fornecem
pela diminuição dos valores de ∆x, ∆y e ∆t,
 uma vez que Φn+1 = Φn [1 + 2α (cos ( Q∆x ) − 1) + 2λ (cos ( R∆y) − 1)]
o erro é de ordem O ∆t + (∆x )2 + (∆y)2 . Neste caso, o
= GΦn .
número de pontos nodais aumenta com o decréscimo de
∆x e ∆y, e o número de intervalos de tempo necessários O termo G,
para calcular a aproximação até o tempo final também
aumenta com a diminuição de ∆t. Logo, o tempo de G = 1 + 2α (cos ( Q∆x ) − 1) + 2λ (cos ( R∆y) − 1)
computação aumenta com o refinamento da malha. é conhecido como fator de amplificação, pois ele controla
Uma vez escolhidos ∆x e ∆y, o valor de ∆t nem a amplificação ou atenuação de Φn .
sempre pode ser escolhido arbitrariamente. De fato, ele Para que a amplitude Φn não aumente a cada passo
é determinado pelas exigências da estabilidade. no tempo, a condição
Segundo de Oliveira Fortuna (2000), uma maneira de  n +1 
analisar a estabilidade é escrevendo os valores Φ 
 
n = T ( x ,y ,t ) na forma
Ti,j  Φn  = | G | ≤ 1
i j n

deve ser satisfeita. Isso implica que α e λ devem satisfa-


n
Ti,j = Φn e IQxi e IRy j , (25)
zer à inequação

em que I = −1, Φn sua amplitude no instante n, Q e R −1 ≤ 1 + 2α (cos ( Q∆x ) − 1) +
os números de onda nas direções x e y, respectivamente. 2λ (cos ( R∆y) − 1) ≤ 1. (27)
Para que Ti,j não aumente sem limites, nenhuma
das amplitudes Φ na equação (25) pode crescer arbi- Em função dos valores máximos e mínimos de
trariamente. “Esta técnica é conhecida como análise de cos ( Q∆x ) e cos ( R∆y), o lado direito da equação (27)
estabilidade de Von Neumann, de acordo com Thomas é satisfeito para quaisquer Q∆x, R∆y, α e λ. Já para
(1995)". o lado esquerdo, resulta, para os valores mínimos de
Como exemplo de aplicação, vamos obter o critério cos ( Q∆x ) − 1 = −2 e cos ( R∆y) − 1 = −2:
de estabilidade para a discretização da equação (24), no
1 − 4 ( α + λ ) ≥ −1 (28)
caso particular em que f ( x,y,t) = 0.
Substitui-se cada termo da equação (24) usando a ∆t k x ∆t k y
Lembrando que α = eλ = , a desi-
equação (25), isto é, insere-se cρ ∆x2 cρ ∆y2
gualdade (28) será:
n +1
Ti,j = Φn+1 e IQxi e IRy j
∆t k x ∆t k y 1
Tin±1,j = Φn e IQ( xi ±∆x) e IRy j 2
+ 2
≤ ,
cρ ∆x cρ ∆y 2
n
Ti,j ±1 = Φn e IQxi e IR(y j ±∆y) . ou seja, o passo no tempo deve satisfazer a condição
na equação (24). Assim, obtém-se: cρ
∆t ≤  . (29)
−2
2 k x (∆x ) + k y (∆y)−2
Φn+1 e IQxi e IRy j = [1 − 2 (α + λ)] Φ e n IQxi IRy j
e +
 
αΦ en IQ( xi +∆x ) IRy j
e +e IQ( xi −∆x ) IRy j
e + Este é o critério de estabilidade para o método explícito
  (24).
λΦn e IQxi e IR(y j +∆y) + e IQxi e IR(y j −∆y) . Em resumo, a desigualdade (29) estabelece a rela-
ção entre o passo na discretização do tempo, ∆t, e os
Divide-se os dois lados dessa equação pelo fator comum espaçamentos na discretização em x e y, ∆x e ∆y respec-
e IQxi e IRy j e agrupa-se os termos, obtendo tivamente, de modo que o esquema numérico associado
   à discretização (24) seja estável.
Φn+1 = Φn 1 − 2 (α + λ) + α e IQxi + e− IQxi + Quando a estabilidade de um método depende de
  uma relação entre os tamanhos dos passos utilizados na
Φn λ e IRy j + e− IRy j . (26) discretização das variáveis independentes da equação,
dizemos que ele é condicionalmente estável. Assim, a con-
Os termos que envolvem as exponenciais complexas
dição (24) está nos dizendo que o Método Explícito para
podem ser simplificadas por meio das identidades
a equação do calor (9) é condicionalmente estável. Ob-
e IQxi + e− IQxi = 2cos ( Q∆x ) serve que esta condição pode ser restritiva. Por exemplo,
se cρ = 1, k x = k y = 5 e ∆x = ∆y = 10−2 , a estabilidade
e IRy j + e− IRy j = 2cos ( R∆y) estará garantida se ∆t ≤ 12 10−5 .
Ciência e Natura v.37 n.3, 2015, p. 920 – 933 929
Ciência e Natura 10

10.2 O Método Implícito


Para θ = 1 na equação (22), o método de discretiza-
ção é o Método Implícito. Com este método, o valor
da temperatura em cada instante tn+1 , TPn+1 , pode ser
calculado implicitamente em função de alguns valores
temperatura T no mesmo intervalo de tempo, conforme
a equação
 
TPn+1 − TPn 1 F ( T n +1 )
= + f Pn+1 . (30)
∆t cρ ∆V Figura 6: Esquema para o Método Implícito.
Como o erro de truncamento na discretização da
equação (30) é a soma dos erros de truncamento das
discretizações (17) e (20) utilizadas, o erro do
 Método ∆t k x ∆t k y
em que α = eλ= , Q e R são os números
Implícito é de ordem O ∆t + (∆x )2 + (∆y)2 . cρ ∆x 2 cρ ∆y2
Substituindo os pontos nodais pelos seus índices, de ondas nas direções x e y, respectivamente.
obtém-se a equação que define o Método Implícito: Em função dos valores máximos e mínimos de
cos( Q∆x ) e cos( R∆y), a inequação | G | ≤ 1 é sempre
n +1 n
Ti,j − Ti,j satisfeita. Assim, conclui-se que o Método Implícito é

∆t incondicionalmente estável, ou seja, o método permanece
 
1
Tin++1,j n +1
− 2Ti,j + Tin−+1,j1 n +1 n +1 n +1 estável para qualquer escolha de ∆x, ∆y e ∆t.
1 Ti,j +1 − 2Ti,j + Ti,j−1
kx + ky Dessa forma, uma vez que valores maiores de ∆t
cρ ∆x2 ∆y2
podem ser usados com o Método Implícito, os tempos
1 n +1 de cálculo podem ser reduzidos, com pouca perda de
= f
cρ i,j precisão. Todavia, para poder maximizar a precisão, ∆t
com i = 2 : (m1 − 1) , j = 2 : (m2 − 1) e n = 0,1,.... deverá ser suficientemente pequeno.
Separando as aproximações conhecidas, as do nível
de tempo tn , das não conhecidas, as do nível de tempo 10.3 O Método de Crank-Nicolson
tn+1 , obtém-se:
Fazendo θ = 12 na equação (22) chega-se ao Método de
n +1
λ Ti,j −1 + αTin−+1,j1 n +1
+ [1 − 2 (α + λ)] Ti,j + αTin++1,j1 n +1
+ λTi,j +1Crank-Nicolson, no qual os valores da temperatura são
∆t n+1 definidos por uma média entre os valores das tempera-
n
= Ti,j + f , (31) turas nos instantes tn e tn+1 . Assim sendo, a equação
cρ i,j
(22) toma a forma:
∆t k x ∆t k y  
com α = e λ= . TPn+1 − TPn
cρ ∆x 2 cρ ∆y2 1 F ( T n +1 ) + F ( T n )
= + f Pn+1 + f Pn ,
Assim, resolve-se um sistema pentadiagonal a cada ∆t 2cρ ∆V
nível de tempo. O aumento do custo para resolver o
sistema é compensado pelo fato do Método Implícito ser com erro de truncamento
 de ordem
O ∆t 2 + ( ∆x )2 + ( ∆y )2 , que é a soma dos erros das
incondicionalmente estável, como mostra-se a seguir.
Na discretização pelo Método Implícito, aparecem discretizações (17) e (21).
aproximações das soluções nos pontos da malha Com a substituição dos pontos nodais pelos seus
( xi ,y j ,tn+1 ), ( xi−1 ,y j ,tn+1 ), ( xi ,y j ,tn ),( xi+1 ,y j ,tn+1 ), índices, o Método de Crank-Nicolson tem a forma
( xi ,y j−1 ,tn+1 ) e ( xi ,y j+1 ,tn+1 ), conforme Figura 6, onde n +1 n
“×” representa os pontos nos quais T é conhecida e Ti,j − Ti,j −
usada para as aproximações nos pontos assinalados por ∆t
 1 n +1 n +1 
“◦”. 1 Tin++1,j − 2Ti,j + Tin−+1,j1 n +1
Ti,j n +1
+1 − 2Ti,j + Ti,j−1
Com relação à estabilidade do Método Implícito, pro- 2cρ k x ∆x2
+ ky
∆y2
cedendo de modo análogo à subseção anterior, isto é,  
utilizando a componente de Fourier dada pela equação 1 Tin+1,j − 2Ti,j
n + Tn
i −1,j
n
Ti,j n n
+1 − 2Ti,j + Ti,j−1
(25) e a análise de von Neumann, verifica-se que o fator − 2cρ k x ∆x2
+ ky
∆y2
de amplificação do Método Implícito, na ausência de
1 n+ 12
termo fonte, aplicado à equação (31) é dado por = f ,
2cρ i,j
1
G= , com i = 2 : (m1 − 1) , j = 2 : (m2 − 1) e n = 0,1,....
1 − 2α (cos( Q∆x ) − 1) − 2λ (cos( R∆y) − 1)
930 Santos e Garcia : Modelos
11 Autores: Modelosde
deprocessos
processosdifusivos
difusivose esolução
soluçãoaproximada ....
aproximada...

Colocando T n+1 em função dos demais termos, tem- realizada para os volumes internos, respeitando as con-
se: dições de contorno impostas. Assim, as condições de
contorno ficam embutidas nas equações para os volumes
n +1 n +1 n +1 n +1
λTi,j −1 + αTi −1,j + 2 [1 − ( α + λ )] Ti,j + αTi +1,j + de fronteira.
n +1 n n n A seguir detalha-se o procedimento no caso do Mé-
λTi,j +1 = αTi −1,j + λTi,j−1 + 2 [1 − ( α + λ )] Ti,j +
todo Explícito. De forma análoga obtém-se as equações
∆t n+ 12 discretizadas, referentes aos volumes na fronteira, nos
αTin+1,j + λTi,j
n
+1 + f , (32)
cρ i,j Métodos Implícitos e Crank-Nicolson.
Dessa forma, integrando a equação (9) no volume
∆t k x ∆t k y
com α = e λ= . de referência, na fronteira, conforme Figura 8,
cρ ∆x 2 cρ ∆y2
Na equação do Método de Crank-Nicolson (32), apa-
recem valores das aproximações em dez pontos da ma-
lha, como ilustrado na Figura 7, onde “×” representa
os pontos nos quais T é conhecida e usada para as apro-
ximações nos pontos assinalados por “◦”. Cinco destes
pontos são conhecidos, pois correspondem às aproxima-
ções no nível de tempo tn . Os outros cinco valores são
calculados ao se resolver um sistema pentadiagonal. Por
isso, o Método de Crank-Nicolson também é implícito.
De acordo com Thomas (1995), é possível mostrar que o
método de Crank-Nicolson é incondicionalmente estável.

Figura 8: Volume de fronteira-uma face na fronteira

tem-se a seguinte equação:


 
Figura 7: Esquema para o Método Crank-Nicolson. TPn+1 − TPn 1 F̄ ( T n ) ˜n
= + fP , (33)
∆t cρ ∆V

onde
11 Inclusão das Condições de Con-   
∂T
  
∂T 

F̄ ( T (t)) = kx  − kx ∆y +
torno na Discretização ∂x  ∂x 

e cw
      
A equação (22) representa a equação discretizada para ∂T  ∂T 
ky  − ky  ∆x,
um volume de controle interno. Para se obter o sistema ∂y  ∂y 
n s
de equações algébricas completo, é também necessário
 
obter as equações para os volumes que estão na fronteira. ∂T 
sendo kx  o fluxo no contorno w.
Para isso, existem várias alternativas de implemen- ∂x 
cw
tação das condições de contorno do problema; os mais As derivadas que não estão na fronteira são avaliadas
comuns são discretização com meio volume, volumes como na equação (16), e as que estão na fronteira são
fictícios e balanços para volume de fronteira, conforme modificadas, ficando
Maliska (2004).
   
Neste texto, apresenta-se apenas a técnica de balanço ∂T  TP − Tcw
kx  = kx .
para volumes de fronteira. Este é o procedimento consi- ∂x  ∆x/2
cw
derado adequado por vários autores, conforme Maliska
(2004). Substituindo na equação (33) os pontos nodais pelos
Segundo Sperandio et al. (2003), esta técnica consiste seus índices, obtém-se:
em integrar, no espaço e no tempo a equação diferen-  
n +1 n n n
cial também nos volumes de fronteira, da mesma forma T1,j = (1 − 3α − 2λ) T1,j + α T2,j + 2T0,j +
Ciência e Natura v.37 n.3, 2015, p. 920 – 933 931

Ciência e Natura 12

  ∆t
n n
λ T1,j +1 + T1,j−1 + fn , (34)
cρ 1,j

∆t k x ∆t k y
com j = 2 : (m2 − 2), α = e λ= .
cρ ∆x2 cρ ∆y2
Esta é a discretização da equação (9), utilizando
volumes de fronteira, com uma face na fronteira, no
caso, face w.
Para volumes de fronteira com uma face em e, ou
uma face em n, ou uma face em s, considerando α e λ
como definidos na equação (34), as discretizações são
respectivamente:

• Fronteira a Leste: face e

Tmn+−1 1,j = (1 − 3α − 2λ) Tmn 1 −1,j + Figura 9: Volume com duas faces na fronteira
1
 
α 2Tmn − 1 ,j + Tmn 1 −2,j +
1 2
  • Volume de fronteira nas faces w e s
λ Tmn 1 −1,j+1 + Tmn 1 −1,j−1 +
∆t n  
f , n +1
T1,1 n
= [1 − 3 (α + λ)] T1,1 n
+ α T2,1 + 2T n1 ,1 +
cρ m1 −1,j 2
  ∆t
n
com j = 2 : (m2 − 2). λ T1,2 + 2T1,n 1 + fn .
2 cρ 1,1
• Fronteira ao Norte: face n
• Volume de fronteira nas faces e e s
n +1 n
Ti,m
2 −1
= (1 − 2α − 3λ) Ti,m 2 −1
+
 
α Tin+1,m2 −1 + Tin−1,m2 −1 + Tmn+−1 1,1 = [1 − 3 (α + λ)] Tmn 1 −1,1 +
1
   
n n
λ 2Ti,m − 1 + Ti,m 2 − 2 + α 2Tmn − 1 ,1 + Tmn 1 −2,1 +
2 2 1 2
 
∆t n λ Tm1 −1,2 + 2Tmn −1, 1 +
n
f ,
cρ i,m2 −1 1 2
∆t n
f .
com i = 2 : (m1 − 2). cρ m1 −1,1

• Fronteira ao Sul: face s • Volume de fronteira nas faces w e n


n +1 n n +1 n
Ti,1 = (1 − 2α − 3λ) Ti,1 + T1,m 2 −1
= [1 − 3 (α + λ)] T1,m 2 −1
+
 n     
α Ti+1,1 + Tin−1,1 + λ Ti,2
n
+ Ti,n1 + n
α T2,m 2 −1
+ 2T n1 ,m −1 +
2 2 2
 
∆t ˜n n n
λ 2T1,m − 1 + T1,m2 −2 +
f ,
cρ i,1 2 2
∆t n
f .
com i = 2 : (m1 − 2). cρ 1,m2 −1

No caso do volume de controle ter duas faces na • Volume de fronteira nas faces e e n
fronteira, por exemplo, como o da Figura 9, as condições
  Tmn+ 1
= [1 − 3 (α + λ)] Tmn 1 −1,m2 −1 +
∂T  1 −1,m2 −1
de contorno são inseridas pelos termos k x  e  
∂x  α 2Tmn − 1 ,m −1 + Tmn 1 −2,m2 −1 +
cw
  1 2 2
∂T   
kx  , de maneira análoga à dos casos anteriores. λ 2Tm −1,m − 1 + Tmn 1 −1,m2 −2 +
n
∂x  1 2 2
cs
Assim, as formas discretizadas para a equação (9) ∆t n
f .
são as seguintes: cρ m1 −1,m2 −1
932 Santos e Garcia: Modelos de processos difusivos e solução aproximada ....
13 Autores: Modelos de processos difusivos e solução aproximada...

12 Experimento Computacional
0.01

Neste experimento aplicou-se os métodos Explícito, Im- 0.005


plícito e de Crank-Nicolson para encontrar aproximações
para a equação do calor 0

-0.005
 
∂T ∂2 T ∂2 T
− 2
+ 2 = 0, (35) -0.01
1
∂t ∂x ∂y
1
0.8
0.5 0.6
0.4
com 0 ≤ y ≤ 1, 0 ≤ x ≤ 1 e t ≥ 0, à qual adicionou-se 0 0
0.2

as condições iniciais e de contorno:


Figura 10: Aproximação do método explícito
T (0, y, t) = T (1, y, t) = 0
T ( x, 0, t) = T ( x, 1, t) = 0
T ( x, y, 0) = sen(πx )sen(2πy) 0.01

Por derivação nas variáveis t, x e y verifica-se direta- 0.005

mente que 0

-0.005
2
Te ( x, y, t) = e−5π t sen(πx )sen(2πy)
-0.01
1

satisfaz a equação diferencial e as condições adicionais 0.5


0.8
1
0.6
do problema. Para encontrar soluções aproximadas com 0.2
0.4
0 0
os métodos Explícito, Implícito e de Crank-Nicolson,
aplicadas neste caso em particular, utilizou-se o software
Figura 11: Aproximação do método implícito
Matlab.
Na Tabela 1, apresenta-se o erro correspondente ao
método explícito no tempo t = 0.1 para N pontos da
malha nas direções x e y. Para obter este resultado 0.01

1
usamos ∆x = ∆y = e ∆t = 0, 8 · 10−4 para N = 51. 0.005

N
Esta Tabela também indica os erros correspondentes aos 0

métodos implícitos e de Crank-Nicolson, considerando -0.005

∆t = 0.005 também para N = 51 e no tempo t = 0.1 .


-0.01
1

Tabela 1: Erros das aproximações 0.5


0.8
1
0.6
0.4
0.2
0 0
o
t N N de Passos Erros
Explicito 0.1 51 1250 0,4 · 10−4 Figura 12: Aproximação do método de CranK- Nicolson
Implícito 0.1 51 20 0.2004
Crank-Nicolson 0.1 51 20 0.0461
0.01

0.005
Adotou-se como medida de erros na Tabelas 1,
0

 1 -0.005

2 2
Erro ( T ) = ∑(Tij − Te ) . -0.01
1
ij 0.8 1
0.6 0.8
0.4 0.6
0.4
As Figuras 10, 11 e 12 mostram os resultados das 0.2
0 0
0.2

aproximações para a equação (35) correspondentes aos


métodos Explícitos, Implícitos e de Crank-Nicolson, res- Figura 13: Solução exata
pectivamente, para N = 51. Para comparação apresenta-
se também na Figura 13, o gráfico da solução exata.
Ciência e Natura v.37 n.3, 2015, p. 920 – 933 933
Ciência e Natura 14

13 Conclusões
No presente estudo, encontra-se resultados significativos
para aproximações da solução da equação do calor tran-
siente e bidimensional. Tais resultados foram obtidos
utilizando o método de volumes finitos, usando uma
malha estruturada; a fronteira do domínio coincide com
as linhas coordenadas, facilitando o trabalho de discreti-
zação e de aplicação das condições de contorno. Todavia,
o método é aplicável em malhas não-estruturadas e em
domínios com contornos arbitrários, de acordo com Ma-
liska (2004).
Segundo Ertekin et al. (2001), outros problemas que
envolvem equações diferenciais parciais podem ser es-
tudados utilizando esta ferramenta. Em particular, esta
técnica pode ser usada para encontrar a aproximação da
solução para problemas complexos em várias áreas da
ciência e da engenharia. Como por exemplo, pode-se
avaliar a eficiência da recuperação do petróleo disponí-
vel num reservatório.

Referências
Cunha, M. C. C. (2003). Métodos Numéricos, 2o edn. Edi-
tora da Unicamp.

Ertekin, T., Abou-Kassem, J. H., King, G. R. (2001). Basic


Applied Reservoir Simulation. Richardson, TX: Society
of Petroleum Engineers.

Kreider, D. L. (1972). Introdução à análise linear. Ao Livro


Tecnico.

Lin, C., Segel, L. A. (1974). Mathematics Applied to Deter-


ministic Problems in the Natural Sciences. SIAM.

Maliska, C. R. (2004). Transferência de calor e mecânica


dos fluidos computacionais, 2o edn. Livros Técnicos e
Científicos.

de Oliveira Fortuna, A. (2000). Técnicas computacionais


para dinâmica dos fluidos: Conceitos Básicos e Aplicações.
Edusp.

Sperandio, D., Mendes, J. T., e Silva, L. H. M. (2003).


Cálculo numérico: características matemáticas e computa-
cionais dos métodos numéricos. Prentice Hall.

Thomas, J. W. (1995). Numerical partial differential equati-


ons: finite difference methods. Springer.

Você também pode gostar