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ANAIS

Vol 3
pesquisa em museologia e
perspectivas disciplinares

GT 4 GT 5

GT 6 GT 13
museu do homem do nordeste 16 a 20 de novembro de 2015
2O SEMINÁRIO BRASILEIRO DE MUSEOLOGIA
16 a 20 de novembro de 2015
Museu do Homem do Nordeste
Recife - PE

Realização
Rede de Professores e Pesquisadores do Campo da Museologia
Museu do Homem do Nordeste – Fundação Joaquim Nabuco
Departamento de Antropologia e Museologia – Universidade Federal de Pernambuco

Apoio
Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientíco e Tecnológico – CNPq
Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco – FACEPE

Comissão Organizadora Nacional Equipe de Apoio Administrativo (FUNDAJ)


Prof. Dr. Marcelo Cunha – UFBA (coordenador da Rede) Priscilia Coelho da Silva (secretária)
Profª M.ª Silmara Kuster – UnB (coordenadora da Rede) Itala Serrath de Lira (auxiliar administrativo)
Prof. Dr. Hugo Menezes - UFPA Josineli Maria do Nascimento (auxiliar administrativo)
Profª Mª Vanessa Barrozo - UFRGS Rafaela Carneiro (assistente de produção)
Profª Mª Ana Audebert - UFOP Sarah Moura (assistente de design)
Prof. Me. Pablo Lisboa - UFG Olga Fernandes (turismóloga)
Suzianne França (auxiliar administrativo)
Comissão Organizadora Local Gilvanice Silva (secretária)
Prof. Msc. Henrique de Vasconcelos Cruz – FUNDAJ (Presidente)
Prof. Dr. Maurício Antunes – FUNDAJ Comissão CientíFIca
Profª. M.ª Sílvia Barreto – FUNDAJ Profª Drª Emanuela Sousa Ribeiro – UFPE (Presidente)
Profª. Simone Luizines – FUNDAJ Profª Drª Cristina Bruno - USP
Profª. Elizabeth Dobbin – FUNDAJ Profª Drª Helena Uzeda - UNIRIO/MAST
Profª Drª Emanuela Sousa Ribeiro – UFPE Profª Drª Joseania Freitas - UFBA
Profª Drª Ana Cláudia Rodrigues da Silva – UFPE Profª Drª Áurea da Paz - UFPI
Profª Mª Ana Cláudia Santos – UFPE Profª Drª Vânia Dolores de Oliveira – UFG
Prof. Dr. Francisco Sá Barreto – UFPE Prof. Dr. Clóvis Brito - UFS
Prof. Msc. Wagner Damasceno - UFSC

Programação visual e Diagramação


Manoela Lima

Agradecimentos
Instituto Ricardo Brennand
Laboratório de Tecnologia da Informação da Universidade Federal de Pernambuco
Museu Cais do Sertão
Paço do Frevo
gt 6 •
Museu e Museologia na
Amazônia: história,
teoria e prática

Prof. ME. Diogo Jorge de Melo (UFPA) e


ProfA. ME. Helena Alves Quadros (Museu Paraense

A região Amazônica possui um histórico bem antigo em relação à


sua musealidade, com concepções e ações que se remetem ao século
XIX, com instituições como: o Museu Paraense Emílio Goeldi (PA) e o
extinto Museu Botânico do Amazonas (AM). Nesse sentido, reconhece-
-se a tradição museal desse território, destacando a existência de uma
diversidade de museus nessa região, de tipologias mais tradicionais e
de aspectos extremamente distintos. Destacando algumas experiências
singulares temosd: o Museu Magüta (AM), Museu do Seringal (AM),
Ecomuseu da Amazônia (PA), Museu do Açaí (PA), Museu do Marajó
(PA), o Museu Sacaca (AP), Museu Kuahí (AP).

Além deste fato, reconhecemos que atualmente vem se consolidado


uma tradição museológica na região, principalmente com a implanta-
ção do curso de graduação em Museologia da Universidade Federal do
Pará e a proposta em andamento da Universidade Federal do Amazo-
nas. Realidade que vem ampliando o foco das discussões sobre Museus
e Museologia na Ama ônia, permitindo que surjam novos conhecimen-
tos históricos, teóricos e ações práticas. Assim como o aumento de pro-
ssionais atuando nessa expectativa. Possibilitando desta forma uma
ampliação sobre as pesquisas sobre Museus e Museologia. Tudo isso
sem falar da realidade da região amazônica não brasileira.

Desta forma, este GT procura viabilizar espaço para pesquisas em


âmbito teórico, prático e histórico. Discutindo a realidade de um terri-
tório marcado por diversos estereótipos, do qual destacamos a oresta
amazônica, com o maior rio e biodiversidade do mundo.
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NOVAS TENDÊNCIA EM MUSEOLOGIA, PERSPECTIVAS PARA UMA


MUSEOLOGIA AMAZÔNICA1

Diogo Jorge de Melo2

Luciana Menezes de Carvalho3

Vinicius de Moraes Monção4

Resumo
Este trabalho tem o objetivo de desenvolver um contexto de possibilidades e
perspectivas sobre as novas tendências na Museologia. Enfatizando
especificamente esta perspectiva com relação ao campo na região Amazônica,
no Brasil. Uma importante referência para esta premissa está no fato de que se
faz pouco tempo que foi criado o primeiro curso de graduação em museologia
na região. Dessa forma, pensar em uma expansão dos cursos de graduação e a
implementação de programas de pós-graduação é um dos sonhos a ser
concretizado. No entanto, não se pode negar que a região possui uma antiga
“tradição museológica”, principalmente em decorrência das experiências do
Museu Paraense Emílio Goeldi, um dos mais antigos do país. No entanto existe
outros experimentos museológicos único como o Museu Magüta, dos índios
Ticuna no Amazônas e o Museu Sacaca de sustentabilidade, em Macapá, dente
outros. Desse modo, a reflexão deste trabalho está se pautando no contexto
amazônico brasileiro, com suas possíveis diversidades e singularidades.

Palavra-chaves: Museología; Museu; Amazônia; Brasil.

Abstract
This work aims to develop a context of possibilities and perspectives on new
trends in Museology. Specifically adding the perspective of the field in the
Amazon region, Brazil. An important reference for the premise is the fact that
recently this region had the first class of graduates in Museology at the Federal
University of Pará, the only specific course of higher grade in the region. So, to
think about an expansion of higher-level courses and implementation of a
graduate program is a dream that begins to be desired. However, there is no
denying that the region already has an old “museological tradition”, mainly by
Emilio Goeldi Museum of Pará, one of the oldest in the country; beyond unique

1
Esse artigo e uma modificação do trabalho apresentado no ICOFOM de 2015 na França,
publicado no ISS de 2015.
2
Mestre em Geologia, Professor do Curso de Museologia da Universidade Federal do Pará, E-
mail para contato: diogojmelo@gmail.com
3
Doutorando em Museologia e Patrimônio na UNIRIO, Museóloga da Universidade Federal de
Alfenas, bolsista Capes, E-mail para contato: estudante.lu@gmail.com
4
Doutorando em Educação, UFRJ, Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, E-mail
para contato: vinimoncao@gmail.com
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museological experiments as Ticunas Indians’ Magüta Museum in Amazonas


and Sacaca Museum of Sustainability in Macapa, among others. Thus, the
reflection of the work was based on the Amazonian context, with its possible
diversities and museological singularities.

Keywords: Museology; Museum; Amazonia; Brazil.

••••••••••

PARA PENSAR EM AMAZÔNIA E TENDÊNCIAS MUSEOLÓGICAS

“... discutir a Amazônia como patrimônio, nos envolve num campo


inusitado, optando para várias possibilidades de análise, sem que
possamos chegar a um denominador comum, ainda que
determinados marcos já se encontrem assentados, mas, ainda assim,
nos aventuramos por julgarmos pertinentes as preocupações que as
originaram.” (MONTYSUMA, 2012, p.381).

Ao longo do seu desenvolvimento prático e teórico, a Museologia vem se


renovando e se delineando como campo acadêmico. Consequentemente para
se ampliar o pensamento em novas tendências na Museologia é necessário
realizar uma retrospectiva, mesmo que demasiadamente pontual, de alguns dos
processos e discussões debatidos ao longo de sua história. Fato que deve se
somar a uma leitura da contemporaneidade, pautada na observação e análises
de questões sociais e culturais, para que se possa construir um discurso que
busque dialogar com um futuro, mesmo que relativamente próximo. Dessa
forma delineando, mesmo que de maneira ficcional, uma possível trajetória
para o campo, que almeje o desenvolvimento concreto do mesmo.

Apesar de considerar que uma análise de novas tendências na


Museologia possui um caráter de ceticismo, por mais que o condutor deste
discurso busque objetividade e racionalidade de suas perspectivas ao construir
seu discurso, precisa assumir que esta análise não só se baseará em
fundamentos concretos, empíricos, mas estará conduzido por imaterialidades,
presentes em sentimentos e posicionamentos ético e ideológicos. Fato que
poderá por tornar esta análise tendenciosa, e consequentemente o afastará de
uma dada realidade pretendida.

Contudo, este fato não inviabiliza uma análise em relação a novas


tendências e suas perspectivas, pois ao entendermos a Museologia como um
campo do conhecimento e nos referirmos a seu objeto de estudo, agente
delimitador de sua área de ação e conforto, entendemos que o real é uma
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verdade circunstancial, que se constrói por probabilidades de representação da


realidade.

Logo, o “fato museal”, por exemplo, pode ser entendido como uma
relação específica entre o homem e sua realidade, dada pela existência de um
processo social denominado “Museu”, é entendido como uma das vertentes
para a compreensão do pensamento museológico (CÂNDIDA, 2011;
CARVALHO, 2011).

Por exemplo, Peter van Mensh (1994), ao fazer uma leitura sobre o
Museologia apontou a existência das seguintes perspectivas de entendimento e
compreensão para o campo museológico:

• Museologia como estudo da finalidade e organização de museus;

• Museologia como o estudo de implementação e integração de um


conjunto de atividades visando à preservação e o uso da herança cultural e
natural;

• Museologia como o estudo de objetos de museu;

• Museologia como estudo da musealidade;

• Museologia como estudo da relação específica do homem com a


realidade.

Além destes fatores apresentados, pode-se identificar por uma série de


trabalhos de Scheiner (1998; 2008; 2012) uma percepção da problemática na
questão do entendimento da Museologia a partir da compreensão conceitual de
“Museu”. Pois a autora acaba fazendo uma leitura onde reconhece o termo
“Museu”, por um processo fenomenológico, e consequentemente amplia a
percepção deste termo e permite o entendimento de uma diversidade de
possibilidades de manifestações museológicas.

Consequentemente podemos entender esta percepção, como uma teoria


que está em pleno dialogismo entre o fazer museológico das décadas finais do
século XX. Momento em que se somou ao universo dos museus templos, os
ecomuseus, economuseus, museus comunitários e museus de vizinhança.

Lembrando que Scheiner (1998) ainda instiga a pensar em nossos


museus interiores e na percepção que o universo, como um todo, é plenamente
musealizável, bastando olhares específicos de empoderamento, para tal fato se
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consagrar. Algo semelhante ao que Yves Klein fez, quando se apropriou do céu
como uma de suas obras de arte5.

Deste ponto, entende-se que este tipo de análise que se pretende realizar
nos proporciona uma infinidade de leituras do Museu, da Museologia e de suas
perspectivas de atuação. Ao pensarmos historicamente e entendermos que a
Museologia inicialmente se afirmou por uma prática referente ao espaço museu,
e que no foco de seu olhar se encontrava os objetos de suas coleções. Podemos
perceber o quanto esta realidade se modificou e se reestruturou ao longo do
tempo. Não que estes objetos tenham perdido o seu valor, mas que outras
questões e outros valores se fizeram presentes ao longo da história da
Museologia.

Um destes valores, não entrando no foco histórico do objeto de estudo da


Museologia e da ascensão de uma “Sociomuseologia”, e a Museologia como
disciplina acadêmica dentro das universidades - seja por disciplinas (matérias),
cursos de graduação e pós-graduação. Pois, assim como o ICOM e o ICOFOM,
os espaços universitários se constituem como lugares de produção de
conhecimento em Museologia.

A partir deste fato, pode-se entender que a Museologia amplia seus


braços além do Museu e nos faz refletir que futuramente as universidades
poderão ser entendidas como uma tipologia museológica. Brincadeiras e
indagações a parte, queremos com isto mostrar que a Museologia se processa
não só em Museus, mas que as Universidades devem ser lembradas e
entendidas como espaços de produção da Museologia prática e teórica e que
elas devem ser pensadas como agentes importante para o entendimento de
diversos aspectos referentes a Museologia de um determinado território.

Por exemplo, especificamente no caso do Brasil, possuímos uma das mais


antigas graduações de Museologia do mundo, fundada em 1932 por Rodolfo
Garcia6, como Curso Técnico de Museus, no Museu Histórico Nacional e sendo
reconhecida como curso superior em 1944 (MAGALHÃES, 2006). Hoje este
curso pertence à Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro e de fato
não podemos negar a sua influência na estruturação de uma Museologia
Prática e Teórica do país:

5
Yves Klein é famoso por se utilizar do azul em suas obras, logo em um dia de céu limpo,
pegou e assinou no ar, fazendo uma alusão de que o céu era uma obra de arte sua. Um
mecanismos de apoderação realizado nas artes depois do ready-made de Marcel Duchamp.
6
Rodolfo Garcia apesar de ser o fundador do Curso Técnico de Museus, sendo diretor interino
na ocasião do Museu Histórico Nacional, seu nome normalmente é sobrepujado pelo de
Gustavo Barroso, grande mentor das questões museológicas e patrimoniais no Brasil na década
de 1930 e como posteriormente assumiu a direção do museu e do curso fez com que seja
considerado o patrono da Museologia Brasileira.
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“Em 1951, o Curso de Museus por meio de convênio firmado com a


Universidade do Brasil, atual Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),
passou de seu status técnico para status universitário, mas, de fato, a efetiva
mudança física e conceitual do curso notadamente marcado pelo estilo
Barrosiano, ocorreu somente quando o curso foi definitivamente transferido, em
1979, de uma instituição de memória para um local voltado para o ensino,
pesquisa e extensão, a Federação das Escolas Federais Isoladas do Rio de
Janeiro (FEFIERJ), atual Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
(UNIRIO). Assim, após essa transferência, o Curso de Museus teve sua
denominação modificada para curso de Museologia, o qual passa, em 1991, a
vincular-se a única escola de Museologia do país, a Escola de Museologia da
UNIRIO.” (TANUS, 2013, p.79).

Assim como também evidenciamos o curso da Universidade Federal da


Bahia, fundado em 1969 pelo arqueólogo e historiador da arte Valetin
Calderón (TANUS, 2013).

Por muito tempo estes dois cursos foram praticamente os únicos do país
ligados a esta área do conhecimento. As exceções foram o curso de Museologia
da Universidade Estácio de Sá no Rio de Janeiro e da especialização em
Museologia da Universidade de São Paulo. Desta forma podemos pontuar que a
Museologia no Brasil, do ponto de vista da produção acadêmica, esteve por
longas décadas se constituindo por base em três núcleos de formação, Rio de
Janeiro, Bahia e São Paulo.

Por fim, na primeira década do século XXI, o plano de reestruturação


universitária proposta e efetivada pelo governo federal, proporcionou a
disseminação dos cursos de graduação de Museologia pelo país nas
universidades federais. Neste movimento está inserido o curso criado na
Universidade Federal do Pará; o primeiro da região norte. As experiências
referentes a este curso, serão abordados mais adiante.

Deste ponto gostaríamos de ressaltar, que neste trabalho se abordará


como base de análise o entendimento do campo museológico ou museal, em
uma tríade, em que considerará para região amazônica: os Museus, conforme
as suas perspectivas fenomenológicas, baseado principalmente em Scheiner
(1998); as universidades como áreas de produção e legitimação do
conhecimento museológico; e a produção realizada por órgãos de caráter
internacional, que desenvolvem e investem no desenvolvimento dos Museus e da
Museologia, dos quais o de maior destaque, sem dúvida é o International
Council of Museums (ICOM) e seus subcomitês. Contudo, não podemos nos
esquecer que se somam a esta realidade as instituições de cunho nacional e
local com finalidades similares, tais como sociedades e associações.

Destacando que este terceiro item, pouco se tem a dimensionar, em


relação ao ICOM, podemos identificar um pequeno grupo de associados, assim
como membros efetivos da Associação Brasileira de Museus. Também se podem
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apontar a presença do Conselho Federal de Museologia e o Conselho Regional


da Região Norte, responsáveis pela gestão do campo profissional dos
Museólogos. Profissão reconhecida e regulamentada no país em 1984, pela lei
de número 7.287 de 18 de dezembro. No entanto, a região norte do país ainda
possui pouquíssimos profissionais vinculados.

Consequentemente, dialogando com a temática em evidência no 36º


Simpósio Internacional do ICOFOM, “Novas tendências em Museologia”, o
objetivo deste trabalho consiste em somar a experiência vivenciada e
presentificadas pelos autores, referente a região Norte do Brasil, território em
sua grande maioria atribuído a Amazônia Legal7 (Figura 1), para construir um
discurso, sobre o panorama museólogico da região e se possível apontar
perspectivas para a mesma.

Figura 1 Mapa com os estados brasileiros pertencentes a Amazônia Legal. Retirado de


https://geobrainstorms.wordpress.com/tag/amazonia-legal/.

A princípio, precisa-se mencionar e pontuar qual é esta Amazônia a qual


conseguimos nos referir. Pois este é um território que abrange um dos maiores e
mais complexos biomas mundiais, caracterizado por um alto índice de umidade
e altas temperaturas, assim como sua alta biodiversidade vegetal e animal.

Também não se pode deixar de mencionar que existe um forte


imaginário social referente a esta localidade, que em grande parte está
relacionado a uma selva intocada, perigosa, que está sendo destruída por
madeireiras ilegais, por queimadas destinadas a criação de pastos para a
pecuária, monoculturas e garimpagem. Além do imaginário da
megadiversidade deste território, com animais de destaque, como botos e

7
A Amazônia Legal compreende além dos estados da região norte do Brasil (Acre, Amapá,
Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins), os estados de Mato Grosso e parte do
Maranhão (MONTYSUMA, 2012).
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peixes-boi de água doce, macacos, jacarés e onças, assim como uma forte
presença de índios.

No entanto, será realmente essa a essência do que entendemos e que


temos na Amazônia? Logo ao nos depararmos com esta questão, outra
pergunta está atrelada, pois também devemos nos questionar em relação a qual
Museologia queremos para a região. Para que consequentemente possamos
pensar em uma identidade museológica para a localidade, bem como o
desenvolvimento de ações museológicas para essa área.

Lembrando que na região encontra-se: grandes cidades, com grandes


periferias, como Belém e Manaus e uma diversidade de grupos indígenas,
quilombolas e ribeirinhos, que se integram principalmente a imigrantes
nordestinos, principalmente Maranhenses e Cearenses, grupos do movimento
sem-terra, que foram assentados no território. Consequentemente a cultura
amazônica é extremamente rica e que se constitui em hibridismos destes
diferentes grupos sociais.

Desta forma, não se deve deixar de mencionar que a Amazônia de longe


é apenas o perfil do imaginário social apontado e que dentro deste território
existe uma complexidade de ecossistemas e de culturas. Desta maneira, cabe
em nossa análise nos referenciar a que Amazônia estamos nos referindo neste
trabalho ou apontar que partes deste território é conhecido pelos autores. Por
sua vez, tomamos como referência o estado do Pará, mais especificamente a
cidade de Belém e regiões e cidades adjacentes ou cidades mais distantes, mas
com um desenvolvimento urbano considerável. Este fato deve ser mencionado,
pois o estado do Pará possui um amplo território geográfico, com o tamanho8
de 1.247.954,666 Km2. Território cortado pelos rios da Bacia Amazônica onde
a locomoção da população ocorre majoritariamente por hidrovias ou por vias
aéreas, já que as rodovias não se encontram interligadas e as poucas existentes
carecem de manutenção.

Também devemos mencionar que a dita floresta Amazônica, fortemente


presente no imaginário social, cada vez se faz menos presente nas paisagens do
território paraense, assim como seus animais. Por exemplo, em Belém,
denominada de cidade portal da Amazônia, por encontrar-se na foz do rio
Amazonas, a floresta está cada vez mais se limitando a refúgios urbanos da
biodiversidade como parques ambientais e museus, contudo ela ainda é vista
nas margens do rio, opostas ao território da cidade.

8
Para termos um pouco da noção da grandeza desse estado, ele é a décima terceira maior
subdivisão mundial, e se fosse um país seria o vigésimo segundo maior país do mundo. Seu
território é equivalente aos territórios da Tailândia, Camboja, Laos e Vietnam somados.
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Contudo ao observar esta vegetação de perto, na cidade de Belém, de


maneira nenhuma se assemelha as expectativas do imaginário social, pois se
constitui em uma vegetação ciliar, que não possui um porte tão frondoso como
o esperado. Assim como faz parte da região do entorno, vegetação de cerrado,
cocais, mangais e manguezais, que se constroem em um diálogo entre o espaço
do salgado com o da água doce, o que os biólogos denominam de ecótono9.
Outros encontros parecidos, que ocorre também no estado do Pará é o encontro
do rio Tapajós, com águas esverdeadas cristalina, com as águas barrentas do
rio Amazônas, também no estado do Amazonas temos o encontro do Rio Negro
com o Amazônas nos arredores de Manaus.

Não podemos negar que em muitos dos casos a floresta se faz presente
na cidade, demonstrando mesmo em poucos momentos e locais a força natural
deste território. Da mesma maneira, os aspectos culturais, principalmente de
grupos indígenas, ribeirinhos e quilombolas que habitaram e habitam esse
território. Apesar de não estarem em destaque aparentemente na sociedade,
basta apenas um pequeno olhar direcionado para perceber a sua marcante
presença, através de comidas, costumes e ritos, inclusive na arte contemporânea
da região.

Um exemplo interessante desta presentificação é feita por Melo et al.


(2012a), que descreve como culturas indígenas extintas, conhecidas apenas por
vestígios arqueológicos e poucos relatos etnográficos se fazem fortemente
presente na cidade de Belém, principalmente por intermédio de coleções
museológicas, compondo o que os autores denominam de uma estética
Marajoara, presente do artesanato à arquitetura da cidade.

Este processo nos demonstra a força e a potencialidade que a


Museologia tem na região, pois um dos principais museus de Belém e também o
segundo mais antigo do país em funcionamento, o Museu Paraense Emílio
Goeldi (MPEG), foi um dos promotores deste processo. Conforme Melo et al.
(2012b), este processo ocorreu em consequência do MPEG possuir diversas
coleções arqueológicas da região e consequentemente acabou por promover o
contato entre as culturas do passado com a do presente, o que possibilitou um
processo de hibridação cultural, que contribui para a formação da identidade
da região.

Mencionamos, ainda, que além da experiência dos autores no território


paraense, podemos somar as suas experiências em outras áreas do território
amazônico, como a cidade de Manaus no Amazonas, a de Macapá no Amapá
e Porto Velho em Rondônia, além de somar relatos dos territórios de Roraima.

9
Áreas de transição entre ecossistemas distintos.
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Lembrado que ainda existem poucas experiências museológicas no


interior destes estados e que as poucas que existem são normalmente ligadas a
processos compensatórios realizados por grandes empresas, exploradoras dos
recursos naturais, que são obrigadas por lei a realizarem estudos ambientais,
salvamentos de sítios arqueológicos e realização de atividades vinculadas à
educação patrimonial10.

MUSEUS DA AMAZÔNIA

Como já mencionado, podemos tomar como base o início da experiência


museológica na região amazônica a estruturação de alguns museus como: o
Museu Paraense Emílio Goeldi, criado em 1871 por Domingos Soares Ferreira
Pena a partir da Sociedade Filomática; e o Museu Botânico do Amazonas,
criado em 1982 por iniciativa da princesa Isabel, se concretizado no ano
seguinte e foi inaugurado em 1984, por João Barbosa Rodrigues, seu único
diretor, que foi extinto em 1890 (LOPES, 1997).

Além do Museu Paraense Emílio Goeldi, para o estado do Pará,


devemos citar o Sistema Integrado de Museus do Estado do Pará, que reúne os
museus sob administração da Secretaria Estadual de Cultura, estando eles em
sua quase totalidade na cidade de Belém. São eles
(http://www.secult.pa.gov.br/):

• São José Liberto – constitui-se em uma espécie de centro cultural,


que além de expor e vender artesanatos locais, possui um espaço para
apresentações e um complexo joalheiro que consta de lojas e espaço onde os
visitantes podem observar os ofícios de ourives e lapidadores. Também integram
o espaço o Museu de Gemas; uma sala (cela) onde possui uma pequena
exposição sobre o período em que funcionou o presídio e uma capela, que
funciona como um espaço para apresentações culturais;

• Museu de Gemas do Pará - inaugurado em 2002, localizado no


antigo presídio, São José Liberto;

• Museu da Imagem e do Som Pará – inaugurado em 1971, foi


idealizado pela escritora paraense Eneida de Moraes. Atualmente não possui
uma cede própria, estando funcionando juntamente com o Sistema Integrado de
Museus na Igreja de Santo Alexandre;

10
A legislação que define essas ações é a Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente
(CONAMA), que legisla os Estudos e Relatórios de Impacto Ambiental (MINISTÉRIO DO MEIO
AMBIENTE, 2012).
2o Seminário brasileiro de museologia • 485

• Museu do Círio – criado em 1986, foi reaberto em 2002 e


localiza-se no Complexo Feliz Luzitânia11;

• Memorial Amazônico da Navegação – constitui de um espaço


dentro do Mangal das Garças, criado em 200512;

• Museu Histórico do Estado do Pará – criado em 1981, iniciou suas


atividades em 1986. Atualmente encontra-se no Palácio Lauro Sodré, antiga
sede do Governo do Estado;

• Corveta Museu Solimões – antigo navio da Marinha Brasileira,


musealizado em 2004. Pertence ao Complexo Feliz Luzitânia;

• Museu do Forte do Presépio – constitui-se em um espaço


museológico no Forte do Castelo, construção arquitetônica que remete a
fundação da cidade de Belém, o museu foi inaugurado em 2002 e pertence ao
Complexo Feliz Luzitânia;

• Casa das Onze Janelas – espaço cultural inaugurado em 2002,


voltado principalmente à arte contemporânea brasileira, principalmente das
regiões norte e nordeste. Pertence ao Complexo Feliz Luzitânia;

• Museu de Arte Sacra – inaugurado em 1998 no Antigo Palácio


Episcopal, onde encontra-se a Igreja de Santo Alexandre. Neste mesmo prédio
funciona a sede do Sistema Integrado de Museus e o Museu da Imagem do
Som.

Além dos museus do Sistema Integrado, vinculados ao estado, a cidade


de Belém possui outras instituições museológicas, como o Museu da Santa Casa
de Misericórdia, o Museu de Medicina, o Museu da Assembleia de Deus 13 e
alguns museus e espaços museológicos da Universidade Federal do Pará e da
Universidade Estadual do Pará. Da primeira podemos citar o Museu da UFPA,
especializado em artes, o Museu de Zoologia, o Museu de Geologia, o Museu
da Anatomia14, Museu Experimental de Física15, além dos bosques Camilo Viana

11
O Complexo Feliz Luzitânia encontra-se em uma das áreas centrais da cidade de Belém,
referente a parte mais antiga da cidade, estando localizado nesta área a maioria dos museus do
Sistema Integrado de Museus do Estado do Pará.
12
O Mangal das Garças pode ser entendido como um espaço museológico, pois constitui-se em
um parque (zoológico) especializado em aves regionais.
13
Assembleia de Deus é uma religião de segmento cristão, protestante, do grupo das igrejas
neopentecostais e sua origem remonta ao estado do Pará.
14
Consiste em uma sala com peças anatômicas em formol, assim como modelos didáticos para
o ensino de anatomia. Sendo que está mais para um depósito do que para museu.
15
Consiste em um laboratório didático e experimental de física, onde seus experimentos são
utilizados para divulgação científica.
2o Seminário brasileiro de museologia • 486

e Benito Calzavara16 do Instituto de Tecnologia e laboratórios que realizam


atividades afins como o Núcleo de Astronomia17. Da segunda instituição
destacamos um Planetário e um Museu de Ciências, do tipo exploratório.
Também sabemos que o governo do estado prevê a criação de um Aquário e
um Museu de Ciências.

Também existem dois espaços museológicos na cidade de Belém, que


devem ser evidenciados, por estarem ligados a processos museológicos ligados
aos movimentos sociais, o Ecomuseu da Amazônia e o Ponto de Memória da
Terra Firme.

O primeiro, o Ecomuseu da Amazônia, surge a partir da experiência de


Laïs Aderne, que trouxe para região norte do país a sua experiência com o
Ecomuseu do Cerrado em Goiás. Apesar do nome amplo este espaço
museológico pertence a Secretaria Municipal de Cultura e atua em diversas
comunidades da região metropolitana de Belém, incluído a diversidade de ilhas
em seu entorno.

Já o Ponto de Memória da Terra Firme, surgiu do projeto do Instituto


Brasileiro de Museus do Ministério da Cultura de promoção da
Sociomuseologia18 no país. Tal projeto selecionou várias áreas de comunidades
pelo país e auxiliou a implantação do Ponto de Memória, promovendo a troca
de experiências entre eles. Na região do Pará, houve a disputa de duas
comunidades vizinhas da cidade de Belém, a do Guamá e a da Terra Firme,
ganhando a segunda por ter se articulado mais eficientemente no período de
seleção. Devemos destacar que antes de ser um Ponto de Memória esta
comunidade já era ponto de intervenção social, cultural e científica do MPEG,
que foi e é um dos grandes responsáveis pela percepção museológica da
comunidade.

Para outras regiões do estado do Pará podemos ainda destacar alguns


espaços museológicos significativos, lembrando que nosso intuito não é realizar
um inventário da Museologia e dos Museus e sim pensar como a área vem se
constituindo pelo território amazônico.

16
Espaço a céu aberto dentro do Campus do Guamá da Universidade Federal do Pará onde
são realizadas diversos projetos e programas de extensão, se tornado desta forma um espaço
de divulgação da ciência e de diversas experimentações ligadas a sustentabilidade, Educação
Ambiental e Patrimonial. Inclusive são desenvolvidas diversas experimentações expográficas
nestes bosques.
17
Laboratório de Astronomia que realiza atividades de divulgação científica e observações do
céu.
18
Sociomuseologia ou Museologia Social são termos referente a processos museológicos e
tipologias de museus oriundas do desdobramento da “Nova Museologia”, ondo os autores que
defendem a terminologia a entendem como uma Museologia voltada para as questões dos
movimentos sociais e consequentemente, agente transformadora de realidades.
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Por exemplo na cidade de Santarém encontra-se o Museu de Arqueologia


vinculado ao patrimônio arqueológico encontrado na região e como
mencionado muitos museus locais seguem este padrão, mas este sem dúvida e
um dos mais antigos e marcantes da região.

Vale destacar o Museu do Marajó, criado pelo padre Giovanni Gallo, que
apesar de se constituir também com uma configuração fortemente vinculada ao
patrimônio arqueológico, apresenta diversas experimentações museológicas
singulares. Principalmente considerando que este museu foi criado em Santa
Cruz do Arari e depois transferido para Cachoeira do Arari, duas pequenas
cidades no arquipélago fluvial do Marajó, em que seu principal acesso se dá
por via pluvial.

Segundo os próprios relatos de Giovanni Gallo, o museu foi desenvolvido


como uma alternativa de ensino das pessoas da região, sendo uma
complementação do ensino escolar. Este museu, além da arqueologia, aborda a
cultura local dos ribeirinhos e vaqueiros - de suas crenças religiosas e míticas,
fazeres, preconceitos, a natureza da região, além de possuir uma série objetos
curiosos, como cachorros de três patas, bezerro de duas cabeças, fotografia de
um homem devorado por piranhas na região, dentre outras, que fazem com
que o espaço se pareça com um Gabinete de Curiosidades (OLIVEIRA 2012;
COSTA, 2014).

No entanto, no Museu do Marajó existem uma série de experimentos do


tipo hand on que fazem com que o museu seja altamente interativo. Também
fazem parte do Museus uma área arborizada onde se encontra o mausoléu do
padre Giovanni Gallo, a casa onde ele viveu, uma reserva técnica e uma
palafita rustica representando a moradia dos ribeirinhos.

Outra cidade que merece destaque é Vigía, pois se constitui em uma


cidade pequena, mas com um potencial histórico grande. Houve nesta cidade
um projeto, da Secretaria de Cultura do Estado, que se denominou de Museus
Contextual. Este identificou diversos patrimônios desta localidade, como
menciona a publicação produzida pelo projeto:

“O Museu tem a propriedade de preservar a memória de prédios com


significado arquitetônico-cultural; de seus construtores, proprietários e
ocupantes; seus significados históricos, políticos e culturais. Reflexões sobre a
sociedade que estamos construindo” (PARÁ, 2012).

Este projeto, que foi denominado de Museu Contextual, nos traz uma
experiência interessante, pois o museu se configurou e foi pensado como uma
espécie de museu de território, no entanto, este museu aparentemente só existiu
no momento de execução do projeto, pois não possui nenhuma constituição
administrativa e nenhum segmento social e burocrático que responda
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atualmente pelo projeto. Só existindo atualmente alguns vestígios indicativos de


que ocorreu em algum momento um processo de musealização neste espaço
urbano (Figura 2). Também destacamos que projeto similar também foi
realizado em outra cidade do estado, Óbidos.

Figura 2 Capela do Senhor dos Passo, mais conhecida como Igreja de Pedra é um dos marcos históricos
da cidade de Vigía e um dos patrimônios identificados e musealizados pelo “Museu Contextual”. Nota-se
ao lado da porta da igreja placas de identificação do patrimônio, colocadas pelo projeto citado.

Ainda cabe mencionar nas experiências museológicas do estado do Pará


a cidade de Bragança, que se constitui em uma cidade com o perfil semelhante
de Vigia, onde além dos bens históricos arquitetônicos, podemos destacar dois
museus: o primeiro se constitui em um Museu de Arte Sacra, localizado na Igreja
de Nossa Senhora do Rosária; e o segundo o Museu da Marujada, que
representa uma festividade religiosa e folclórica que ocorre na região. Esta
realizada em louvor a São Benedito, possui uma musicalidade, vestimenta,
dança singular, comandadas pelas “Marujas”. Sendo este museu uma mistura
entre espaço museológico e um local de manifestação da festividade (Figura 3),
pois ele se constitui em um grande galpão com áreas reservadas, com painéis e
vitrines sobre a festividade.

Figura 3 Estrutura do Museu da Marujada na cidade de Bragança no Pará.


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Finalizando nossa leitura do Estado do Pará, apenas mencionarei que


existe atualmente a intenção de implementação do Ecomuseu de Algodoal, que
se localiza em uma ilha de grande beleza natural, onde existe uma vila de
pescadores, que se abriu para o turismo.

Encerrando o estado do Pará, como já mencionado, apresentaremos


algumas iniciativas museológicas de destaque em outros estados da região
norte, sem o intuito de fazer um levantamento destes museus e sim apresentar
relatos de experiências singulares da região.

No estado do Amapá, por exemplo, existem duas experiências


museológicas interessantes. A primeiro na capital, Macapá, onde surgiu o
Museu Sacaca, a partir de 1995 com proposta de sustentabilidade do Instituto
de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá (IEPA), executando
e formulando políticas públicas voltadas para questões ecológicas e ambientais,
conceito que se adequou através do tempo e se configurou no seguinte objetivo:

“... mostrar as relações que o homem amazônico mantém com o meio natural
que ele explora através do seu saber tradicionais. O museu reproduz no centro
da cidade de Macapá a vida dos ribeirinhos, índios, castanheiros, caboclos,
quilombolas. O museu abre uma reflexão sobre as possíveis alternativas ao
modelo predatório de desenvolvimento para a Amazônia, cujo saldo é o
desmatamento e as queimadas, a perda da biodiversidade e o aquecimento
global” (OLIVEIRA & JESUS, 2013, p.7).

Desta forma o Museu Sacaca, se configura na cidade como um espaço


alternativo de lazer e entretenimento, mas além disso possibilita um encontro
com a Amazônia não urbana, com sua rica diversidade natural e cultural.
Também nesse sentido se estabeleceu a segunda experiência museológica que
iremos citar neste estudo que é a do Museu Kuahí dos povos do Oiapoque, um
museu que representa diversas etnias indígenas (LUX, 2013). Ambos os projetos
foram constituídos por apoio de João Capiberibe e estas experiências
museológicas trazem muito da essência da Amazônia, uma experiência em que
os locais, sejam eles índios, ribeirinhos, moradores das cidades da região nos
seus centros ou periferia, estão construindo uma realidade museológica
singular.

Nessa concepção, o estado do Amazônas onde temos a mais notável


experiência museológica, no sentido de pioneirismo e de apropriação dos
grupos locais. O Museu Magüta, dos índios Ticuna, surgiu em 1988 em
Benjamin Constant, como uma estratégia deste grupo para serem reconhecidos
como indígenas e não como ribeirinhos. Através de estratégias de afirmação da
cultura Ticuna e consequentemente da possibilidade de demarcações de terra
para a etnia (FREIRE, 2009). Segundo o próprio relato dos índios: “O Museu é
importante para os ticunas porque aí tem muita coisa boa da gente. Os brancos
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vão ver e vão nos respeitar” (Boletim do Museu Magüta, 1993 apud FREIRE,
2009, p.221).

Cabe mencionar que o Museu Magüta foi premiado internacionalmente,


sendo reconhecido como “Museu Símbolo de 1995”, pelo ICOM e
nacionalmente, ganhou o prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade, concedido
pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, por contribuir para
preservação e memória da cultura brasileira (FREIRE, 2009).

Ainda no estado do Amazonas, na cidade de Manaus, muitos museus


podem ser contemplados, mas cabe destacar um museu que se localiza nos
arredores da cidade, o Museu do Seringal. Este museu surgiu do set de
filmagem do filme “A Selva” de Leonel Vieira. Um filme que retrata o ciclo da
borracha, nas primeiras décadas do século XX na região Amazônica.
Consequentemente apesar do filme ser baseado em fatos reais e do seringal
onde ocorre a história ter existido em outra localidade, o museu se constituiu a
partir de um suporte ficcional, uma criação cenográfica (Figura 4).

Figura 4 Vista do Museu do Seringal e parte do seu interior. Localizado nos arredores da cidade de
Manaus, no estado do Amazonas, nas margens do Rio Negro.

Em Roraima, pouco ou autores podem mencionar, no entanto isso não


significa a inexistência de processos museológicos interessantes para o estado,
mas apenas desconhecimento dos mesmos. No entanto, sabemos que existem
uma proposta sendo pensada, mas que se acredita que ainda não se consolidou
de um museu voltado para a diversidade linguística da região e que atue com a
possibilidade de valorização das diversas culturas indígenas do estado e
promovendo atividades que auxiliem a manutenção destas línguas, pois muitas
delas correm o risco de extinção.

Finalizando, no estado de Rondônia temos em destaque na capital, Porto


Velho, o Museu da Ferrovia Madeira Mamoré (Figura 5). Apesar de apenas ser
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reconhecido como museu um antigo galpão com diversos objetos relacionados


com o fazer e a história da ferrovia. Basta uma visita no local para se perceber
que toda a área se constitui como um complexo museológico – dos trilhos do
trem, locomotivas abandonadas e diversos prédios desse complexo. Todos
necessitando de diversas ações de musealização. Estando este espaço
atualmente servindo de área de lazer e entretenimento. O local é fortemente
reconhecido por um lugar de memória e patrimônio da cidade.

Figura 5 Vista geral da área onde se localiza o Museu da Ferrovia Madeira Mamoré e seu interior.
Localizado na cidade de Porto Velho, Rondônia.

Terminando este breve panorama dos Museus amazônicos, visando que


a complexidade museológica deste território é bem maior do que os fatos
apresentados, não podemos deixar de mencionar o ensino de Museologia na
região. Atualmente só existe um curso de Bacharelado em Museologia na região
o da Universidade Federal do Pará (UFPA) e a possibilidade da implantação de
um segundo curso na Universidade Federal do Amazonas.

O curso da UFPA foi implantado em 2009 e atualmente possui duas


turmas formadas e consequentemente se tornou um marco para a Museologia
da região, pois anteriormente a Museologia como área do conhecimento se
estabelecia por profissionais de outras áreas, que buscaram aperfeiçoamento
em Museologia ou pouquíssimos profissionais diaspóricos, com formação
específica na área.

Desta forma este curso de Museologia na região norte do Brasil, começou


a possibilitar uma produção científica e acadêmica singular para com o universo
da Amazônia. Como exemplo desta realidade apresenta-se na tabela 1,
algumas das temáticas dos Trabalhos de Conclusão de Curso defendidos no
Bacharelado em Museologia da UFPA. Estes trabalhos abrangem aspectos
teórico e práticos, representando temáticas locais, estreitamente vinculado com
a museologia paraense.
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Trabalhos que versam da teoria à prática museológica, sempre com


temáticas locais, no entanto podemos perceber que todos ainda estão
fortemente vinculados à uma museologia paraense.

Tabela 1 Quadro com os trabalhos de conclusão de curso, defendidos no Bacharelado em Museologia da


Universidade Federal do Pará.

Ano Título Autor

2013 A Mediação Educativa da Pintura “A Conquista do Antônio Eutálio Costa Corrêa


Amazonas” de Antônio Parreiras

2013 A Conservação na Arte Contemporânea: Um Estudo de Antônio Magno Alves Araujo


Caso da Performance Artística “Gallus Sapiens” de Victor
de La Rocque

2013 Museu da Imagem e do Som do Pará: Lugar de Memória e Deyse Ane Ribeiro Marinho
Esquecimento

2013 Museu, Educação e Público: No Museu de Arte Sacra de Elinelma Pereira do Nascimento
Belém

2013 A Poética Museal de Antônio Juraci Siqueira Jaddson Luiz Sousa Silva

2013 O Público na Comunicação Museológica: Lucimery Ribeiro de Souza

Um estudo sobre a recepção da divulgação em exposição


em no Museu da UFPA

2013 O patrimônio arqueológico e as práticas preservacionistas Maíra Santana Airoza


dos moradores da Vila de Joanes, Ilha do Marajó –Brasil

2013 Monumento e Memória: A Conservação das Placas Wanderson Amorim Costa


Comemorativas da UFPA

2013 Museologia e Memória do Museu Arquivo Histórico da Wanderlena do Socorro Correa


Santa Casa Dr. Alípio Bordalo de Belém –PA Veríssimo

2013 Olhar Museológico para Arqueologia: potencialidades de Raiza Cristina dos Santos
Musealização do Sítio Colonial “Engenho Murucutu” em Gusmão
Belém – PA.

2014 Museologia, Educação e Ciência: A Coleção Didática de Bruna de Campos Antunes


Paleontologia do Museu Paraense Emílio Goeldi

2014 Curadoria Museológica de Microfósseis: A coleção de Christiane Sofhia Godinho Santos


Ictiólitos do Museu Paraense Emílio Goeldi

2014 A Conservação Preventiva da Coleção de Doriene Monteiro Trindade


Paleoinvertebrados do Museu Paraense Emílio Goeldi:
análise de microambiente

2014 Público Familiar no Parque Zoobotânico do Museu Emilly Cristine Barbosa dos
Paraense Emílio Goeldi Santos
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2014 Os Arquivos do Pe. Giovanni Gallo: “Os Arquivos de Glêice Stefani Cardoso Costa
Giovanni Gallo: a construção de um museu na Ilha do
Marajó”

2014 A Cultura Arqueológica Maracá na Perspectiva da Jéssica Michelle Rosário de Paiva


Documentação Museológica

2014 “Hoje Tem Visita Lá no Museu”: Estudo Museológico de Kaliane Barros de Souza
Visita Orientada no Parque Zoobotânico do Museu
Paraense Emílio Goeldi

2014 Museologia e Ciência da Informação: um estudo dos Renata Rodrigues Maia


processos de Documentação

NOVAS TENDÊNCIAS PARA MUSEOLOGIA AMAZÔNICA

Assim como Scheiner (1998) menciona que os Museus são espelhos da


sociedade, esse breve panorama, com certeza cheio de lacunas, acaba por
refletir um pouco o contexto da realidade amazônica. Um cenário, que se refere
a uma densa e complexa região, onde seu caráter ambiental, social e cultural,
compõe uma diversidade única, que está além do imaginário social existente.

A partir dos fatores apresentados no texto, compreendemos que a


“Museologia Amazônica” está em seu estágio embrionário, apesar de já ter tido
suas primeiras experiências museais no século XIX. No entanto, pela criação de
distintos museus é possível identificar uma aparente tentativa de recuperar o
“tempo perdido”. Seja pela ausência de museus, discussões centradas no
âmbito museológico ou experimentações circunstanciais.

Desta forma, esperamos que a Museologia Amazônica e os museus em


seu território, permitam inovações e perpetuem de sua função de preservação
do patrimônio material e cultural, promovendo a discussão museológica. Fato
que só ocorrerá de maneira mais intensa com a ampliação dos cursos de
graduação em Museologia, assim como a criação de programas de pós-
graduação stricto-sensu e consequentemente a inserção de profissionais nos
museus da região, que atualmente é praticamente inexistente. Também é
necessário a instalação de uma unidade do Instituto Brasileiro de Museus na
região norte, que muito pode contribuir para esse processo

Neste processo, a Museologia Amazônica e a musealidade do território


devem ser capazes de produzir uma Amazônia para além dos estereótipos
imaginativos. Fato que será possível através da produção de conhecimento e o
aprimoramento técnico e teórico dessas questões. Destacando a presença de
produção no International Council of Museums (ICOM) e seus subcomitês, no
qual se destaca o (ICOFOM), contribuindo com trocas de conhecimento para
com o cenário amazônico. Portanto, só com a presença de profissionais nestes
2o Seminário brasileiro de museologia • 494

espaços de discussão e produção museológica, será possível obtermos


contribuições para o desenvolvimento museológico local.

Finalmente, para se fazer Museologia nessa região, precisa-se pensar na


tríade apresentada: entre os Museus, o ensino de Museologia e áreas afins,
principalmente nas instituições competentes, incluindo o ICOM e o ICOFOM.
Para conquistarmos a superação das barreiras existentes, entre os segmentos
que compõe a tríade, devem ser superados pelo fortalecimento do campo
através da criação e enriquecimento dos vínculos colaborativos entre as
instituições existentes e com as que serão criadas.

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