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A América Latina na geopolítica mundial: perspectivas históricas e

situação contemporânea do Cone Sul


Latin America and the world geopolitical framework: historical
perspectives and the contemporary context of the Southern Cone

Paulo Roberto de Almeida


(www.pralmeida.org; http://diplomatizzando.blogspot.com)
Revista Eletrônica de Direito Internacional do CEDIN (Belo Horizonte: CEDIN, vol. 17,
2016, ISSN: 1981-9439; p. 342-367; link para a revista:
http://www.cedin.com.br/publicacoes/revista-eletronica/#Volume_17; link para o artigo:
http://www.cedin.com.br/wp-content/uploads/2014/05/Vo-Paulo-Roberto-Almeida_A-
Am%C3%A9rica-Latina-na-geopol%C3%ADtica-mundial-perspectivas-
hist%C3%B3ricas-e-situa%C3%A7%C3%A3o-contempor%C3%A2nea-do-Cone-Sul-
OK.pdf).

1. A sucessão de preeminências na economia mundial e a América Latina


Existem duas maneiras de analisar a questão da sucessão de hegemonias políticas
e econômicas no sistema internacional e a posição da América Latina nesse contexto:
uma pelo lado histórico ou sistêmico, ou seja, pelas tendências estruturais de longo prazo,
a outra pelos dados da conjuntura, que são naturalmente caracterizadas por flutuações na
economia mundial e por dinamismos diferenciados entre as principais economias
planetárias. A América Latina, a despeito de estar situada numa posição relativamente
excêntrica em relação às grandes disputas hegemônicas mundiais, sempre sofreu a
influência ou o impacto dos grandes conflitos internacionais, ainda que sua condição de
região periférica esteve sempre vinculada aos poderes do Atlântico norte, Europa
ocidental, desde cinco séculos, e Estados Unidos da América, desde o final do século 19,
e com maior ênfase a partir da Segunda Guerra Mundial.
Na primeira vertente, a do contexto histórico, podemos falar de uma lenta
sucessão de hegemonias econômicas e militares – e o lado estratégico sempre depende da
dinâmica econômica dos países ou impérios – e uma acomodação sucessiva entre centros
mais dinâmicos e outros em declínio relativo. Por vezes existem choques globais, como
os ocorridos com as grandes guerras nacionais do período napoleônico, ou os dois
grandes conflitos globais do século 20, que de certa forma já sinalizaram para o fim da
grande dominação europeia sobre o mundo, depois de cinco séculos, aproximadamente,
de predominância absoluta sobre vários continentes. Esses grandes conflitos são

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relativamente raros, e de toda forma, a emergência da arma atômica ao final do último
grande conflito global já sinaliza para sua inviabilidade prática, restando, portanto,
analisar os dados relativos às tendências latentes, sempre existem, à substituição de
hegemonias pelo lento acumular de mudanças econômicas, geralmente tecnológicas, mas
também comerciais e financeiras.
Foi assim que, desde a era dos grandes descobrimentos, nos séculos 15 e 16,
tivemos vários grandes protagonistas na vanguarda do comércio e das ocupações
territoriais pela via militar: primeiro os dois reinos ibéricos, que partiram à conquista do
mundo e de certa forma o dividiram entre si, no Tratado de Tordesilhas, em 1494; depois
tivemos a emergência da Holanda, como império marítimo e comercial-financeiro, nos
séculos 17 e 18, com a introdução de novas tecnologias comerciais e financeiras, como os
mercados de futuros, por exemplo, extremamente comuns em Amsterdã e Antuérpia, e as
tecnologias bancárias, que fizeram da Holanda o país mais rico do mundo até o século 18;
a Inglaterra veio em seguida, tendo aprendido com a Holanda várias dessas novas
técnicas, que ela aperfeiçoou tremendamente, tornando-se senhora dos mares durante os
dois séculos seguintes, inclusive liderando a revolução industrial que transformou o
mundo a partir de novas tecnologias de produção em massa, pela introdução de novas
formas de energia, não apenas a caldeira a vapor, mas igualmente, a partir da segunda
revolução industrial, motores elétricos e a diesel.
Não podemos esquecer que até essa época, a China era a maior economia
planetária, respondendo sozinha por cerca de um terço do PIB mundial, ainda que
essencialmente voltada para si própria e isolada das grandes transformações que estavam
alterando a relação de forças no mundo, justamente; ao se eximir de participar do
comércio internacional, e ao não absorver as novas técnicas que estavam surgindo no
Ocidente, a China se atrasou relativa e absolutamente, terminando por ser suplantada,
dominada e até humilhada pelas potências ocidentais, que antes buscavam apenas
comerciar com o Império do Meio; a China atravessou uma longa decadência de
aproximadamente dois séculos, e aprofundou ainda seu retrocesso econômico e industrial
com a dominação esquizofrênica do maoísmo delirante: no auge desse regime
catastrófico, com milhões de mortos acumulados, o PIB da China não passava de 5% do
PIB global. Hoje, depois da recuperação, da China na era Deng Xiao-ping, ele já

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ultrapassou as duas segundas maiores economias, Japão e Alemanha, e caminha para
aproximar-se do PIB dos Estados Unidos (mas evidentemente não o per capita).
Como consequência de uma lenta evolução econômica desde o final da guerra
civil, os EUA já tinham se consolidado como uma nova potência econômica, industrial e
financeira ao final do século, o que foi imediatamente confirmado ao final da Primeira
Guerra Mundial, quando os Estados Unidos financiaram os principais contendores
aliados naquele conflito, inclusive a própria Alemanha, no seguimento de sua humilhação
e imposição de reparações no curso dos anos 1920. Ainda que, ao final da Segunda
Guerra Mundial, a União Soviética tenha emergido como a outra grande potência militar,
inclusive com a paridade atômica alcançada poucos anos depois, a hegemonia americana
permaneceu praticamente indisputada pelo restante do século, condição confirmada pela
grande ruptura nas relações internacionais ocorrida em suas duas décadas finais.
O que ocorreu, no último terço do século 20, foi que o socialismo implodiu, por
força, não da competição com o Ocidente, mas de suas próprias contradições internas: o
mundo passou a viver, de novo, sob a hegemonia ocidental, doravante mais
marcadamente americana. Há, portanto, uma evolução natural, por vezes acidental, no
panorama das economias dominantes, e na hegemonia político-militar, sempre vinculada
a fatores de dinamismo ou de declínio econômico relativo. No cenário mundial atual, de
ausência de grandes conflitos globais no terreno militar, observa-se o crescimento da
interdependência econômica, e sobre esta poderíamos fazer uma paráfrase da famosa
ironia de George Orwell na sua fábula Animal Farm (A Revolução dos Animais, na
edição brasileira): “todos os animais são iguais, mas alguns são mais iguais do que
outros”. Pois bem, na interdependência ocorre algo similar: todos os países são
interdependentes, mas alguns são mais interdependentes do que outros.

Aqui podemos deixar o terreno histórico, para entrar na conjuntura, e dentro desta
os efeitos da crise econômica americana, primeiro imobiliária, depois bancária e
financeira, sobre o resto do mundo. A interdependência – e ela é evidente no terreno
financeiro, ainda mais que no domínio industrial ou tecnológico – tem isso que ela
propaga mais facilmente choques adversos e os chamados efeitos de dominó. A crise
financeira americana contaminou parceiros na Europa e em outros continentes, inclusive

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porque os mercados financeiros trabalham interligados, e muitos bancos ao redor do
mundo, e mesmo certos fundos soberanos havia adquirido uma quantidade exagerada de
derivativos financeiros americanos – as chamadas hipotecas subprime, transformadas em
investimentos em carteira classificados como triple A. O mundo passou a vivenciar os
aftershocks da primeira crise de 2008. Mas, cabe registrar igualmente que várias das
crises na Europa – Irlanda e Islândia, Grécia, Portugal, Espanha – não tiveram muito a
ver com os derivativos ou movimentos especulativos de Wall Street, que certamente
existiram, e sim com o endividamento excessivo e gastos exagerados de vários governos
de países cuja dinâmica econômica já não era, digamos assim, a mais dinâmica possível.
Tais crises europeias – bastante diferentes entre si – são típicas crises fiscais e de alto
endividamento externo, muito conhecidas na América Latina em décadas passadas.

Pois bem, que fenômenos diversos – como a inserção da China nas cadeias
produtivas globais, a incorporação de enormes massas de trabalhadores nos circuitos da
divisão internacional do trabalho, com seu deslocamento das zonas rurais ou do sistema
socialista para a moderna economia de mercado – esteja alterando, novamente, a relação
de forças no mundo, nisso não há nenhuma novidade. Que os EUA declinem,
relativamente, em face de países com taxas elevadas de crescimento como a China e
alguns outros, isso é absolutamente normal e esperado.
Mas, cabe retornar novamente à história e registrar que, diferentemente dos
velhos impérios do passado, que baseavam o seu poderio na dominação puramente
militar, no controle de territórios e na extração de recursos, o império ocidental, ou
americano, atual não está baseado nesses processos de força bruta e sim no império do
livre comércio, dos investimentos, da inovação tecnológica e, sobretudo, da inteligência.
Se impérios militares podem ser vencidos por uma coalizão de oponentes, ou por algum
adversário mais poderoso, um império baseado na inteligência e na interdependência é
relativamente indestrutível, podendo-se, então, prever um declínio muito relativo para os
EUA, e para a própria Europa, na atual configuração da economia mundial. Eles são o
império da sociedade do conhecimento, e por mais avanços industriais que possam
ocorrer em outras regiões, eles sempre estarão na vanguarda das descobertas científicas e
das inovações tecnológicas.

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Quanto à China atualmente, o que ela fez, nos últimos vinte ou trinta anos, é
absolutamente extraordinário e insuscetível de ser reproduzido por qualquer outro país
nos próximos séculos. Nunca houve, e se supõe que nunca haverá, nenhum país no
mundo, que tenha crescido, continuamente, à razão de 8, 9, 10% ao ano, ou mais, durante
mais de vinte anos. Isso nunca ocorreu na história da humanidade, e provavelmente não
ocorrerá nunca mais. A razão desse crescimento extraordinário está em que, por um lado,
a China tinha decaído muito, enormemente, sob o socialismo e sob as loucuras do
maoísmo delirante, e portanto tinha uma carga represada de não-crescimento que só
podia manifestar-se em taxas aceleradas de crescimento uma vez que a sociedade fosse
liberada de todo o peso de uma burocracia paralisante, com políticas totalmente
esquizofrênicas. A outra razão é que a China partiu de muito baixo, de uma renda per
capita inferior a 1.00 dólares e, portanto, tinha muito espaço para crescer rapidamente
durante algum tempo.
Mas o que a China fez foi extraordinário: ela praticamente dobrou a renda per
capita em menos de 20 anos e isso pelo menos duas vezes, ou seja, saiu de meros 800
dólares nos anos 1970, para cerca de 8 ou 9 mil dólares atualmente. Se ela continuasse
crescendo no ritmo anterior, ela ultrapassaria o Brasil entre 5 e 10 anos e chegaria à renda
atual da OCDE em mais ou menos 20 a 25 anos. Ora, um ritmo desses é fisicamente
(pelos recursos naturais e energia) e economicamente insustentável; então, é normal que
sua taxa se reduza atualmente, mas registre-se que isso se dá no quadro da crise atual e
dos modelos atuais de localização industrial e com as políticas econômicas e sociais da
China, situação que pode não se confirmar indefinidamente. Então, é normal esperar que
a China venha a arrefecer seu ritmo de crescimento, o que tem consequências para a
América Latina e para o Brasil, obviamente, em termos de demanda e de preços de
matérias primas, o que já se manifestou de maneira concreta nos anos recentes. Vários
dos países da região já exibem a China como seu primeiro parceiro comercial – o Brasil
desde 2009 – ainda que não tecnológico ou financeiro, depois de décadas, mais de um
século de preeminência econômica dos Estados Unidos.

2. O megabloco em negociação pelos EUA e pela Europa e seus possíveis efeitos

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Em face da conclusão de um grande acordo comercial no âmbito do Pacífico,
Estados Unidos e União Europeia ensaiam igualmente algo do gênero, o que não deixa de
ter consequências para a América Latina igualmente, região na qual alguns países – em
especial os da Aliança do Pacífico – já se preparam para essa nova conformação das
relações econômicas planetárias. O Cone Sul, relativamente inerme nos últimos anos,
pode voltar-se agora a uma aspiração antiga, a da conclusão de um acordo comercial
entre o Mercosul e a União Europeia. Trata-se, contudo, de um acordo de certa forma
irrelevante, em face da retomada, e eventual finalização, de negociações para a assinatura
de um acordo de livre comércio entre as duas maiores economias do planeta, a União
Europeia, de um lado, e os Estados Unidos, de outro. Cada um tem, aproximadamente,
cerca de 17 trilhões de dólares de PIB global, o que daria a esse novo bloco, tomado
conjuntamente, a metade da riqueza mundial e praticamente igual proporção dos fluxos
comerciais, das trocas de tecnologia e possivelmente de fluxos financeiros. Seria uma
super-zona de livre comércio, com o potencial, inclusive, de “arrastar” o Canadá e o
México, já sócios dos EUA no Nafta, e, do outro lado, possivelmente, outros países
associados, por diferentes tipos de acordos, à UE ou aos próprios Estados Unidos.
Se realmente levada a termo, essa antiga ideia de promotores da liberalização
comercial dos dois lados do Atlântico tem o potencial de produzir uma pequena
revolução na economia mundial. Sua importância, na verdade, é bem maior do que a
própria dimensão dos fluxos comerciais que seriam criados a partir desse acordo, de
escopo reconhecidamente limitado, uma vez que as duas grandes economias já desfrutam
de amplo grau de abertura e de imbricação recíprocas, independentemente da conclusão
bem sucedida – isto é, sem muitas exceções setoriais – de um acordo desse tipo.
Afinal de contas, ambas economias regionais já estão vinculadas entre si por laços
históricos de comércio, investimentos, licenciamentos tecnológicos, joint-ventures
industriais, seja no âmbito bilateral, seja no contexto da OCDE, além da intensa troca de
capital humano que se estabelece continuamente nas mais diferentes esferas da
cooperação científica e educacional. Não é preciso falar, obviamente, das barreiras
notoriamente limitadas que existem para os mais diversos intercâmbios que existem,
desde mais de três séculos, entre as duas regiões, tanto sob a forma de poucos obstáculos
substantivos às trocas privadas e oficiais, como na modalidade tarifaria, com alíquotas

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bastante reduzidas praticadas na maior parte dos casos. Esses dois grandes “animais
hegemônicos” pertencem ao mesmo arco civilizatório e se completam amplamente em
termos de economias de mercado e de valores democráticos e de direitos humanos.
Em outros termos, existem poucos entraves ao intenso fluxo de bens, de serviços,
de capitais, de tecnologia, e de pessoas entre essas duas grandes regiões econômicas do
mundo, a da UE e a da América do Norte, inclusive porque a segunda foi construída,
historicamente, pela primeira, até que o dinamismo da segunda, expressa em suas
maiores taxas de crescimento da produtividade, veio a colocar em segundo plano o peso
da primeira, a fonte original da ordem econômica global, tal como a conhecemos nos
últimos cinco séculos. Mas, se o impacto econômico efetivo desse tipo de acordo é
pequeno, por que destacar com tanta ênfase, o que não parece deixar de ser, até aqui, uma
mera possibilidade teórica, tantas vezes anunciada e tantas vezes frustrada em sua
implementação prática? Existem muitas razões, e elas têm a ver com diferentes aspectos
que que são discutidos pelos especialistas, e que podemos agora seletivamente para tentar
visualizar o possível mundo do futuro de médio ou de longo prazo.
A importância de um acordo entre dois gigantes do comércio internacional – os
quais, justamente, estão no centro do fenômeno da regionalização, um pelo lado do livre
comércio, o outro pela integração profunda – situa-se precisamente no fato concreto de
que ambos mobilizarão proporção relevante, atualmente determinante, do PIB global e do
comércio internacional, mesmo se o acordo, em si, não agregará muito aos fluxos que já
vem sendo efetivados “naturalmente” entre os dois lados do Atlântico. Se e quando
efetivado tal acordo – e as apostas contrárias também são poderosas –, ele terá um
impacto profundo em termos institucionais (ou seja, sobre o sistema internacional de
comércio e suas rodadas de negociação) e em relação a terceiros mercados, para dentro e
para fora dos dois blocos eventualmente unidos pelo livre comércio. Mais ainda, um
acordo desse tipo parece sintetizar todos os bons efeitos e todos os defeitos, todos os
méritos e muitos vícios do “minilateralismo” comercial.
Cabe destacar, em primeiro lugar, que o que se discute entre a União Europeia e
os Estados Unidos não é nenhuma forma mais elaborada de integração, e sim um acordo
de livre comércio, pura e simplesmente, embora bem mais abrangente e complexo do que
aqueles usualmente registrados na OMC, provavelmente concebido, aos olhos e na

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concepção dos americanos, no estilo e no formato do Nafta (cujos principais vetores se
encontram igualmente no acordo da zona do Pacífico). A retomada dessas negociações,
depois de muitos anos de torpor burocrático, apresenta evidências de novos elementos, de
caráter político, que não estavam presentes quando se cogitou, originalmente, de um tipo
qualquer de desarme tarifário entre os mesmos personagens (a UE contando, então, com
um número bem mais reduzido de membros). A resposta está, provavelmente, no fator
China, mas convém, antes de qualquer outra consideração, ressaltar o impacto positivo de
um real arranjo de liberalização que se faça entre a UE e os Estados Unidos.
De fato, a primeira consequência mais geral de um novo acordo desse tipo é,
essencialmente, um efeito demonstração, ou seja, o exemplo positivo dado pelo
engajamento de dois grandes parceiros, na verdade os maiores, do sistema multilateral de
comércio, no sentido de confirmar a vocação liberalizadora que esteve presente no
momento de criação do Gatt e que se manteve mais ou menos constante nas primeiras
cinco ou seis rodadas de negociações comerciais multilaterais. Infelizmente, esse impulso
começou a se perder a partir dos anos 1970, quando, tanto em função do menor peso das
tarifas nos processos de liberalização – já que elas tinham sido consideravelmente
reduzidas desde o final dos anos 1940, adquirindo maior importância, então, os temas
sistêmicos, ou de caráter regulatório – quanto em virtude da perda de competitividade de
velhas indústrias labor-intensive dos países desenvolvidos em face dos chamados “novos
países industrializados”, alguns periféricos da Ásia e da América Latina (Coreia do Sul,
Taiwan, Hong-Kong, Brasil, México, etc.) que passaram a competir agressivamente em
grandes nichos de mercados nos quais possuíam vantagens comparativas (calçados,
têxteis, manufaturas leves, etc.). Acresce a isto a crise fiscal e de “estagflação” dos países
avançados, mais ou menos coincidente com a primeira e a segunda crise das dívidas
externas dos países em desenvolvimento, que redundou no renascimento de instintos
protecionistas no seio mesmo do sistema, entre aqueles que tinham garantido, até então, o
sucesso das rodadas de liberalização de comércio.
O mundo atravessou, desde essa época, fases de maior ou menor fechamento
comercial, ao mesmo tempo em que ensaiava a revitalização dos velhos princípios
multilateralistas que haviam guiado os negociadores em Bretton Woods, e que tinham
resultado na criação de uma primeira organização mundial de comércio, inscrita na Carta

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de Havana (março de 1948), mas que infelizmente não foi implementada na prática. Em
todo caso, o processo foi retomado na segunda fase da rodada Uruguai (entre 1991 e
1992), quando se decidiu relançar a ideia de uma organização de pleno direito – uma vez
que o Gatt era um simples acordo entre partes contratantes, dotado de um secretariado
mínimo, esquema que tinha permanecido “provisoriamente” em vigor durante meio
século – o que foi concretizado em Marrakesh (1993), com a assinatura da Ata Final da
Rodada Uruguai, da qual emergiu a OMC (1995).
Mas a institucionalização da OMC também foi contemporânea da maior expansão
já vista dos acordos regionais preferenciais, um pouco em todos os continentes, como já
constatado nos capítulos precedentes. O minilateralismo parecia querer ganhar
preeminência sobre o multilateralismo e, de fato, nas estratégias comerciais das grandes,
como nas das pequenas e médias potências da economia mundial, ganhava força a ideia
de que a solução para os problemas de acesso a mercados e de compatibilização de regras
não tarifárias não estava mais no âmbito do Gatt, ou da OMC (dependendo do tipo de
acordo), mas na constituição de blocos restritos, ditos de regionalismo aberto, mas
potencialmente discriminatórios.
O anúncio, portanto, de que Estados Unidos e UE voltam a discutir a criação de
uma vasta zona de livre comércio recíproco – a maior do mundo, talvez só superável
quando os países membros da Asean e todos os demais parceiros da bacia da Ásia
Pacífico, incluindo a China, fizerem a sua, em algum momento da próxima década – é
auspiciosa, no sentido em que essa iniciativa pode representar um novo impulso a uma
nova fase de negociações comerciais multilaterais. Supõe-se que, uma vez concretizada a
nova superaliança comercial, seus dispositivos liberalizadores representem inclusive um
avanço sobre o estado atual das negociações comerciais, em termos de desmantelamento
de barreiras e do estabelecimento de regras uniformes para o mútuo reconhecimento de
padrões industriais e de diversas outras normas que podem atuar (deliberadamente,
segundo os casos) como medidas protecionistas disfarçadas.
As respectivas barreiras tarifárias, em si, são pouco relevantes, representando uma
média de 3% para os produtos manufaturados, mas como o comércio inter, intraindustrial
e também intrafirmas, entre os dois lados, é especialmente intenso, mesmo uma pequena
diminuição dos custos pode significar, no plano microeconômico, um incremento

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significativo para as empresas engajadas no intercâmbio, estimulando inclusive novos
investimentos diretos estrangeiros, das duas regiões e de terceiras partes. Subsistem zonas
de protecionismo setorial, sobretudo na agricultura – e aqui é provável que ambos lados
conservem não apenas entraves protecionistas, como subsídios por vezes abusivos –, bem
como políticas de sustentação de setores ditos estratégicos (como aviação civil, por
exemplo) que poderiam ser objeto de mais alguma unificação de critérios nas medidas de
apoio doméstico ou comunitário.
Haveria, do lado americano, bem menos resistências políticas e sociais, no
Congresso ou dos sindicatos, a um acordo com os europeus, uma vez que não estariam
presentes as mesmas preocupações com um suposto “dumping social” mexicano que
quase comprometeram a aprovação do Nafta, exigindo a negociação de acordos paralelos
para lograr a superação de paranoias setoriais e a aprovação congressual. Em resumo,
tanto no plano teórico – como a efetivação de economias de escala e os estímulos ao
crescimento econômico, do emprego e da renda – quanto no plano prático – tendo em
vista a uniformidade relativa de padrões produtivos e financeiros, já obtida no âmbito da
OCDE –, diferentes elementos concorrem para reforçar os traços positivos que esse tipo
de integração comercial entre as duas maiores economias planetárias pode representar
não apenas para as partes no acordo, mas para outros parceiros externos e, sobretudo,
para o sistema multilateral de comércio.
Agora, quais seriam os efeitos disso para o Brasil e para a América Latina, de
modo geral? Acordos regionais de comércio, como já ressaltado tantas vezes por
economistas liberais, são potencialmente discriminatórios contra terceiras partes, e
podem reforçar as tendências ao desvio de comércio e de investimentos, mais do que ao
crescimento global desses fluxos. No caso da UE e dos Estados Unidos, porém, essas
ameaças são relativamente insignificantes, tendo em vista as barreiras tarifárias bastante
reduzidas efetivamente existentes – exceto o setor agrícola, como é amplamente
conhecido – e o amplo grau de uniformização de práticas comerciais e contábeis já
alcançado dentro da OCDE. Mas não resta dúvida de que a retomada de negociações para
um eventual acordo entre os dois gigantes se dá numa conjuntura de crise e de recessão
dos dois lados do Atlântico, com reações setoriais de cunho protecionista sendo agitadas

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nos meios sindicais e políticos, em especial como resultado dos temores despertados pela
destruição de empregos industriais representada pela competição manufatureira da China.
A China, de fato, parece constituir o personagem não revelado dos cálculos
respectivos de europeus e americanos quanto à manutenção de certa margem de
preferências comerciais recíprocas, em face da concorrência julgada predatória dos
produtos de baixo custo de origem asiática. Registre-se, porém, que grande parte da
oferta manufatureira chinesa se faz ao abrigo de marcas registradas americanas e
europeias, já que representam o resultado da alocação “ótima” de investimentos diretos
que fizeram suas multinacionais, visando aproveitar as vantagens comparativas de mão-
de-obra e menores exigências ambientais ou outras que representa uma produção a partir
das plataformas de exportação da China. É bem provável, contudo, que os dirigentes
econômicos e políticos dos dois lados tenham sido estimulados por essa reação defensiva
contra novas “invasões chinesas” ao considerarem a decisão de retomar negociações para
um acordo de livre comércio.
Tendo em vista, por outro lado, o amplo rol de acordos bilaterais, plurilaterais ou
simplesmente minilateralistas que cada uma das duas grandes economias mantém com
parceiros selecionados de suas respectivas preferências políticas, é possível que o viés
discriminatório contra terceiros seja reforçado, caso esse super-acordo venha a ser
concluído num futuro próximo. A UE é, de longe, o bloco que mais acordos de
associação mantém com suas áreas de influência: países do Mediterrâneo, antigas
colônias europeias, antigos países socialistas em transição para a economia de mercado,
com destaque para os já candidatos à adesão ao bloco comunitário (entre eles, mas não
exclusivamente, a Turquia). Não há dúvida, assim, que países dispondo de acordos de
livre comércio com os Estados Unidos ou de associação com a UE são potenciais
beneficiários da formação da mais vasta zona de livre comércio que poderia passar a
existir dos dois lados do Atlântico norte.
Não é improvável, num cenário como esse, que os países da orla do Pacífico, e até
do Índico e da Oceania, acelerem, em consequência, suas próprias negociações –
algumas, no seguimento do TPP, já em curso, como aquelas envolvendo a Asean e as
grandes nações industriais da Ásia Pacífico: China, Japão, Coreia do Sul e Taiwan – com
o objetivo de também estabelecer uma vasta área de preferências tarifárias, podendo

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evoluir, em médio prazo, para um acordo de livre comércio, talvez menos ambicioso do
que o de europeus e americanos (pela amplitude setorial), mas provavelmente tão
importante quanto, em termos de fluxos totais de comércio, investimentos e integração
tecnológica e produtiva. Não foi por outra razão que alguns países latino-americanos –
Chile, Peru, Colômbia e México – decidiram consolidar antigos laços de liberalização
comercial parcial (no âmbito da Aladi) nesse novo esquema que leva o significativo
nome de “Aliança do Pacífico”, provavelmente menos visando reforçar o comércio
recíproco (que é limitado), mas sobretudo com o objetivo de constituir uma frente comum
para aproveitar as melhores oportunidades que possam surgir do lado dos vários
esquemas existentes na bacia do Pacífico (TPP, Apec, Asean e diversos outros de
geometria e de escopo bastante variáveis).
Existiriam aí motivos de preocupação para países visivelmente excluídos desses
processos de liberalização comercial, que podem levar a acordos de integração regional,
entre eles, em especial, os do Mercosul, bloco que parece experimentar uma fase de
retrocessos econômicos e de certa recaída na retórica integracionista de cunho político
com efeitos totalmente inócuos para a integração real de suas economias. Não se pode,
entretanto, culpar aqueles protagonistas principais da bacia do Pacífico e da franja do
Atlântico norte de discriminação deliberada contra os latino-americanos que ficaram à
margem das principais iniciativas liberalizadoras e integracionistas: a culpa recai sobre
eles mesmos. Com efeito, foram os líderes da Argentina, do Brasil e da Venezuela que
decidiram sabotar deliberadamente as negociações do projeto americano da Alca,
terminando por implodi-la em 2005, a Venezuela por motivações claramente políticas
contra o neoliberalismo e contra o princípio de livres mercados. Os dois grandes do
Mercosul apenas mantinham a ilusão de que a UE desejava efetivamente um acordo de
associação bi-regional, à margem e independentemente da “ameaça” da Alca para seus
interesses econômicos junto ao bloco do Mercosul: uma vez afastada essa possibilidade,
as negociações passaram a se arrastar penosamente, sem perspectivas de reais
compromissos de liberalização setorial (na área agrícola, para os europeus, em setores
industriais, no caso dos países do Mercosul).
Não se pode, assim, afirmar que europeus, americanos ou asiáticos estejam
discriminando deliberadamente contra africanos ou latino-americanos (neste caso, bem

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mais “contra” os membros do Mercosul e os “bolivarianos”), uma vez que suas atuais
iniciativas de esquemas de liberalização comercial e, possivelmente, de integração, não
excluem outros acordos de livre comércio que esses “blocos”, ou certos países
individualmente, possam contrair com quaisquer outros parceiros em outras regiões.
Neste caso, são as próprias políticas comerciais introvertidas e suas políticas industriais
protecionistas que contribuem para auto-excluir alguns dos latino-americanos do vasto
movimento liberalizador em curso em outras regiões: afinal de contas, não é por causa do
aparente fracasso da Rodada Doha que Brasil e Argentina decidiram retroceder no
caminho da integração com o mundo, e sim por decisão de suas próprias lideranças
políticas – muitas vezes por pressão de industriais acostumados à proteção estatal – que
esses países adotam medidas comerciais que os remetem aos cenários de
intervencionismo e de protecionismo típicos dos anos de substituição de importações.

3. A situação do Mercosul e o futuro econômico e político do Cone Sul


A base de todo e qualquer empreendimento integracionista é a existência de uma
vontade comum aos participantes, o mais possível convergente, no sentido de adotar as
medidas necessárias, no plano interno, de maneira a viabilizar os requerimentos do
processo de desmantelamento de barreiras à formação de um espaço econômico comum.
Esse foi, por exemplo, o quadro político que presidiu à primeira fase da integração
europeia, a partir da proposta de uma comunidade setorial afetando a produção e
comércio do carvão e do aço (1950-1951), assim como propósitos semelhantes, embora
simplesmente livre-cambistas, estiveram em atuação na América do Norte, desde os
primeiros ensaios de liberalização comercial entre os Estados Unidos e Canadá (1965 e
1988) até a aprovação do Nafta, no início dos anos 1990.
Se, em algum momento, essa comunhão de propósitos existiu entre os membros
do Mercosul – e ela foi bem mais evidente na dramática conjuntura de saída dos regimes
autoritários militares, em meados dos anos 1980 – e se manifestou nos impulsos
sucessivos que levaram do PICE (1986), ao Tratado de Integração Bilateral Brasil-
Argentina (1988), logo depois à Ata de Buenos Aires (1990, que decidiu acelerar o
processo) e finalmente ao tratado quadrilateral de Assunção (TA-1991), que criou o
Mercosul em sua forma atual, essa vontade há muito parece ter deixado de existir. Não é

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difícil de se chegar a esta conclusão ao se constatar, no decurso da segunda década do
bloco, a adoção progressivamente crescente, por parte dos dois membros mais
importantes, de medidas unilaterais de caráter exclusivamente nacional que passaram a
afetar o quadro regional no que ele tinha de mais relevante: sua conformação jurídica
enquanto personalidade de direito internacional sob a forma de uma união aduaneira. Não
é difícil de imaginar que o ingresso da Venezuela no bloco, em condições particularmente
bizarras, venha a contribuir para esse quadro errático no processo decisório e de
ambiguidades na implementação das medidas institucionais e de funcionamento do
Mercosul. Na prática, finalmente, a Venezuela nunca ingressou no Mercosul: incapaz de
cumprir com suas simples regras de liberalização, o país petrolífero encontra-se
afundando em sua própria crise econômica, integralmente fabricada internamente.
Em qualquer hipótese, não é dispensável lembrar que desde o seu início bilateral,
o Mercosul pretendeu seguir um modelo mais sofisticado do que os então existentes na
região – limitados a simples acordos preferenciais ou esquemas de livre comércio – para
aproximar-se de um padrão europeu de integração, adotando, desde o início, o objetivo
final de um mercado comum. Este era o objetivo declarado, aliás estabelecido
formalmente no TA, devendo ser alcançado, otimistamente, em 1/01/1995. Não é inútil
recordar, tampouco, que a partir dessa data, o Mercosul foi declarado “personalidade de
direito internacional”, querendo isso presumivelmente significar que o bloco estava
pronto a negociar, em seu próprio nome, acordos comerciais com terceiras partes e outros
compromissos no plano multilateral.
De fato, o Mercosul engajou-se em negociações coletivas – tanto no plano
regional, com os demais membros da Aladi, como no plano hemisférico, em especial no
contexto do projeto americano da Alca; mas também no inter-regional, entre o Mercosul
e a UE; e, mais importante, no contexto da rodada de negociações comerciais
multilaterais da OMC. Em todas essas ocasiões, com muito poucas exceções, a
coordenação interna ao Mercosul parece ter sido mais complicada do que as negociações
com os demais parceiros, stricto sensu. Isso se deveu – e se deve, ainda agora, e talvez
continue a se dar, no futuro – a que os interesses nacionais, e as posições negociadoras
dos membros do Mercosul, são muito diferenciadas entre si, em função de
posicionamentos distintos quanto às opções de políticas econômicas de cada um deles, o

14
que apenas reflete tipos de inserção e de orientação em políticas macroeconômicas e
setoriais (especialmente comerciais e industriais) também muito diversos entre si. Dentre
as explicações levantadas para tratar desta questão, as “assimetrias estruturais” têm sido
aventadas como a causa principal dessas diferenciação de objetivos, o que não parece
constituir hipótese razoável para a origem das dificuldades do bloco, como se explicitará
mais adiante.
A disparidade de políticas econômicas nacionais parece ser o elemento central
que explica o precário estabelecimento dos pilares essenciais do empreendimento
integracionista em sua segunda década de existência. É ela que fundamenta a dúvida de
saber se, no futuro de médio prazo, o Mercosul conseguirá, ou não, cumprir os requisitos
básicos de seu projeto constitutivo: o acabamento de sua união aduaneira, com vistas a
avançar para o prometido mercado comum. A incapacidade dos países em completar o
próprio programa estabelecido na origem, para o Mercosul, constitui, atualmente, o
elemento central de seu desenvolvimento no futuro de curto e médio prazo, ou seja, a
partir da terceira década de sua existência.
Como seria possível interpretar, assim, as vias prováveis de evolução futura do
Mercosul, em face dos problemas remanescentes e das tendências sistêmicas que se
observam atualmente no bloco, em especial, no que respeita o comportamento dos seus
protagonistas mais importantes? Duas linhas de explicações são aqui seguidas: quanto
aos procedimentos, e quanto à substância do processo de integração.
No que respeita, em primeiro lugar, os procedimentos, e admitindo-se a premissa
estabelecida ao início – que condiciona a evolução do bloco às orientações políticas dos
seus maiores sócios, processo aliás vinculado ao alto grau de personalização do processo
decisório, típico do presidencialismo altamente instável que vige na região – pode-se
vincular o futuro do Mercosul ao que determinarem os presidentes e os mais altos
responsáveis econômicos do Brasil, da Argentina e, doravante, da Venezuela. No que
tange, em segundo lugar, à substância do processo, cabe enfatizar que, a despeito de toda
a retórica política em torno do Mercosul e das iniciativas adotadas pelos governos dos
Estados partes no terreno político (e em suas derivações sociais, culturais, educacionais e
outras), a essência do processo só pode ser econômica e comercial: enquanto não se

15
avançar nesse terreno, é propriamente um engodo falar-se do reforço ou da ampliação da
integração.
Se estas linhas explicativas guardam consistência com a realidade registrada em
sua segunda década de existência, cabe reconhecer que o Mercosul desviou-se
significativamente de seus objetivos originais, a ponto de raramente a agenda de reuniões
na fase recente ocupar-se do cumprimento das metas estabelecidas no artigo 1o. do TA. O
que deveria ser o ponto de partida da integração – o livre comércio pleno e o correto
funcionamento da união aduaneira – parecer ter se convertido num objetivo distante,
quase ausente dos discursos políticos da atualidade.
Resta saber, portanto, se o futuro imediato (e o mediato também) confirmará a
tendência ao esvaziamento do processo econômico real – e sua conversão em um simples
foro de questões gerais lidando com a integração superficial de países contíguos –, ou se
o Mercosul conseguirá retornar, a partir de sua terceira década, a seu projeto original.
Para isso cabe considerar o que ele foi, até aqui, e quais são os problemas e desafios que
deveriam fazer parte de uma agenda real de integração: um exercício retrospectivo,
focando as políticas desenvolvidas nos últimos anos, pode ajudar a antecipar o que pode
– e o que deveria – vir pela frente.
Não é difícil identificar as grandes fases de desenvolvimento do Mercosul: todos
reconhecem que, a despeito dos avanços realizados nos primeiros dez anos, os impulsos
do Mercosul em direção de uma maior liberalização comercial e para a constituição de
um espaço econômico unificado no Cone Sul foram paralisados a partir de 1999, e até
retrocederam nos anos seguintes. A união aduaneira sequer consolidou-se sob uma
autoridade comum, dotada de aplicação uniforme de suas regras, havendo a coexistência
de enorme volume de exclusões à Tarifa Externa Comum. As causas principais foram a
instabilidade econômica e as políticas econômicas divergentes, mas também um reduzido
compromisso político com a realização das reformas necessárias ao alinhamento da
agenda de trabalho do Mercosul com os objetivos do TA. O quadro analítico seguinte
tenta racionalizar esse processo complexo, objeto dos argumentos nos parágrafos
seguintes.

Mercosul: desenvolvimentos registrados nas diferentes fases


1986-1989 1990-1994 1995-1999 1999-2002 2003-2015

16
Início do Aceleração do Crises Crise argentina: Pouco ou
processo processo por econômicas reversão da nenhum avanço
Brasil- meio do livre externas abertura ao comercial; fim
Argentina: comércio e acentuam mundo e da da antiga
gradual, ampla abertura, dificuldades liberalização ênfase
flexível, com como bases do internas; recíproca; econômica;
protocolos mercado reversão parcial abandono novo ativismo
setoriais, sob comum; na liberalização prático da político e
expressa e criação de comercial e na consolidação social; maior
direta comércio; abertura aduaneira; extensão do
administração maior inserção econômica; paralisia esquema a
de ambos mundial; institucional; novos
governos; membros, de
mercado tipo superficial.
comum no
longo prazo;
Concepção e elaboração: Paulo Roberto de Almeida (2016)

A consequência mais evidente derivada da ascensão de novas lideranças políticas


no Brasil e na Argentina – no caso, os já mencionados Lula e Kirchner – foi representada
pelo nítido afastamento desses países (e, no mesmo movimento, do Mercosul) dos
objetivos econômicos basilares do TA, em especial a liberalização comercial recíproca e
a continuidade da abertura econômica no plano global. Em seu lugar, reingressaram na
agenda velhas receitas substitutivas e industrializantes, sob forte dirigismo estatal e
protecionismo aos empresários nacionais; em suma, não apenas um desvio em relação
aos princípios “constitucionais” do Mercosul, mas igualmente um retorno de quase meio
século na história econômica desses países.
Esse movimento regressista foi bem mais forte, numa primeira fase, na Argentina,
do que no Brasil, que não atravessou uma crise tão grave quanto aquela enfrentada pelo
país platino no início do novo milênio. No caso do Brasil, consoante a vontade das novas
lideranças do Partido dos Trabalhadores de exercer uma não-assumida liderança política
no continente – ou seja, ultrapassando inclusive o quadro formal do Mercosul – o que se
observou foi uma espécie de fuga para a frente, em direção de objetivos sociais e
políticos não concebidos originalmente como partes essenciais do processo de integração:
tratou-se nitidamente de um efeito substituição.
Os governos dos países membros favoreceram, em diversos setores da área
econômica, o retorno a velhas posturas nacionalistas e estatizantes, atitudes que estavam

17
em nítida contradição com os requisitos tradicionais da integração, que são a abertura
econômica e liberalização comercial. A incorporação da Venezuela às instâncias
deliberativas – ainda que não todos os procedimentos de adesão tenham sido
efetivamente ratificados e seguidos pelo novo membro – contribui para reforçar os
elementos constitutivos objetivamente anti-integracionistas no Mercosul.
Readaptando velhas receitas de extração keynesiana, numa versão trabalhada
outrora pela Cepal, os países membros começaram a adotar, em diferentes medidas,
prescrições macroeconômicas fortemente embasadas nos modelos de industrialização à la
List; a ênfase tornou-se essencialmente nacional, ou até introvertida, continuando a
adesão retórica a esquemas integracionistas mas num formato o mais superficial possível.
A despeito de críticas acadêmicas quanto às insuficiências institucionais ou a um alegado
déficit democrático no Mercosul – ou talvez, por isso mesmo –, não ocorreu nenhum
esforço para caminhar-se na direção de um tipo “comunitário” de integração, modelado
segundo a experiência europeia; o sistema intergovenamental, portanto, continuou como
antes, mesmo se novas “instituições”, de caráter puramente acessório, foram sendo
criadas para dar a impressão de “progressos” na integração.
No plano dos movimentos hemisféricos e regionais, algumas tendências se
revelaram ou se desenvolveram no novo período: o Chile interrompeu seu movimento de
aproximação econômica ao Mercosul e deu início às negociações para o estabelecimento
de um acordo de livre comércio com EUA, no que foi seguido por outros países andinos,
à exceção dos “bolivarianos”; a Venezuela explicitou sua demanda de adesão ao
Mercosul, com o apoio de todas as lideranças executivas, mas sob intenso escrutínio dos
movimentos de oposição no Brasil e no Paraguai, que questionavam as credenciais
democráticas do candidato, quando o relevante, na verdade, seria a incorporação plena de
todas as normas de política comercial; o Brasil tomou diferentes iniciativas para afastar
os EUA da região, propondo instituições exclusivamente sul-americanas (como a
Comunidade Sul-Americana de Nações, oportunamente transformada em União, Unasul,
segundo proposta e ativismo do coronel Hugo Chávez).
No contexto específico do Mercosul, o governo brasileiro apoiou ativamente a
constituição de novos órgãos – Instituto Social, Parlamento, esforços adicionais de
“inserção social”, etc. – mesmo quando os objetivos primários do TA, que são o livre

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comércio e a união aduaneira, continuaram submetidos a contínua erosão, tanto pelas
crescentes restrições adotadas no plano interno, quanto pelo protecionismo ampliado no
plano externo. A Argentina foi bem mais enfática, e explícita, nos mecanismos
defensivos do seu mercado interno, sob o olhar complacente do governo brasileiro,
mesmo contra os interesses de seus exportadores em geral, dos industriais em particular.
A despeito de todas as políticas defensivas da Argentina, e do fato que elas foram e
continuam sendo ilegais e abusivas, os fluxos do intercâmbio bilateral – que constituem
ainda o grosso do comércio intra-Mercosul – continuaram a beneficiar os exportadores do
Brasil, cujos superávits com o vizinho permanecem significativos.
A acumulação de saldos comerciais e a volta ao crescimento dos fluxos intra e
extra-regionais não impediram que a parte do comércio regional recíproco dos países do
Mercosul diminuísse em relação ao volume global dos intercâmbios do bloco, em
especial no caso do Brasil. A Argentina se mantém ainda na condição que já foi várias
vezes caracterizada como de “Brasil dependência”, que ela se esforça em diminuir, mas
recorrendo a métodos claramente anti-integracionistas, no limite antibrasileiros. Desde
meados dos anos 1990 que ela recorre – no início moderadamente, nos anos 2000 de
forma intensa e aberta – a diferentes mecanismos protecionistas (como antidumping,
salvaguardas, licenças de importação, quotas informais, etc.), muitas vezes de forma
ilegal e abusiva, não apenas contra o espírito e a letra dos instrumentos constitutivos do
Mercosul, mas também em oposição a dispositivos do sistema multilateral de comércio
(como o Código de Salvaguardas, por exemplo).
Mas é também um fato que a parte do Mercosul no comércio global brasileiro,
depois de ter aumentado em dez pontos percentuais, a partir de sua pequena base de 4%
ao início da criação do bloco, tornou a diminuir na segunda década; ainda que os valores
absolutos tenham voltado a crescer a partir de meados dessa década, relativamente eles
passaram a representar parte decrescente do comércio exterior brasileiro. Isto significa
que o Mercosul continua a ser significativo no plano microeconômico – ou seja,
representa um importante mercado para empresas individuais – mas já pode não ser
macroeconomicamente relevante para o Brasil.
Para assegurar, ainda assim, sua pretensão à liderança dentro do bloco, e na
região como um todo, bem como para apoiar projetos específicos ou diminuir

19
reclamações de parceiros e resistências a suas iniciativas políticas, o Brasil começou a
desenvolver o que foi chamado de “diplomacia da generosidade”. Esta foi feita de
diferentes elementos não recíprocos no relacionamento regional, a começar por um
duvidoso programa de “substituição de importações”, que consistiria na importação
voluntária, por parte dos empresários brasileiros, de produtos dos países vizinhos, mesmo
que eles “fossem mais caros”, mas seria para “ajudar países mais ‘pobres’ do que o
Brasil, segundo os argumentos do presidente Lula. Como os empresários privados não se
entusiasmaram muito pela ideia – de fato, inconsistente, no plano da lógica, e
economicamente prejudicial a seus interesses de capitalistas – o ministério das Relações
Exteriores implementou ele mesmo um programa destinado a ajudar os vizinhos a
exportar para o Brasil, numa notável demonstração de “promoção comercial” ao revés.
Todavia, a iniciativa mais consistente com a pretensão à liderança regional por
parte do governo Lula – e supostamente para sanar diferenças estruturais entre os países
membros, que estariam, ao que parece, dificultando a integração – consistiu no desenho e
implementação de um programa de correção das “assimetrias estruturais” existentes no
Mercosul, criado e financiado à razão de 70% de seus montantes pelo próprio Brasil.
Justamente por ser grande, extremamente bem dotado de recursos e industrialmente mais
avançado, o Brasil passou a ser visto, pelos seus parceiros do bloco, como o “fazedor de
normas”, o principal beneficiado e, segundo alguns, o “aproveitador”, de todo o processo
do Mercosul.
Independentemente do perfil econômico de médio e de longo prazo do
Mercosul, e das características políticas e institucionais que ele poderia assumir, em
decorrência das ações futuras dos governos dos Estados partes, um aspecto parece seguro,
qualquer que seja seu itinerário no horizonte previsível: o Mercosul não corre o risco de
desaparecer pela vontade deliberada de seus membros. Nenhum dos líderes políticos,
atuais ou futuros, parece pronto a descartá-lo como projeto, ou estaria disposto a assumir
o ônus de decretar seu fracasso e inadequação, apenas por ineficiência relativa de seus
mecanismos ou devido ao aumento das irracionalidades econômicas acumuladas nos
últimos anos. Uma nova liderança política na Argentina pode, eventualmente, mudar
significativamente o curso (atualmente estagnado) do processo de construção de uma

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verdadeira zona de livre comércio e de união aduaneira mais ou menos completa no Cone
Sul, mas tal perspectiva precisa ainda ser confirmada na prática.
O fato é que, considerando-se os experimentos de integração respectivos da Ásia
e da América Latina em perspectiva comparada, a conclusão a que se poderia chegar,
com base unicamente nos volumes envolvidos e na intensidade de comércio registrado,
bem como em sua composição, é que os esquemas latino-americanos carecem de
densidade e de profundidade, quando confrontados aos asiáticos. Não se trata exatamente
de esquemas diferentes em sua estrutura e características – uma vez que em ambas as
regiões predominam os acordos puramente preferenciais, com uma ou outra manifestação
de livre comércio – mas de disposição efetiva para um real processo de liberalização
comercial e de integração com o mundo, ou seja, o fenômeno que já foi chamado de
regionalismo aberto.
Na América Latina, em geral, e na América do Sul em especial, as únicas
manifestações de regionalismo aberto são representados por aqueles acordos que unem os
países, individualmente, de um lado, e os Estados Unidos, de outro, e cujas disposições,
até por exigência dos EUA, cobrem uma vasta gama de áreas (incluindo serviços,
investimentos e propriedade intelectual) e tendem a admitir menor número de exceções.
Nos casos exclusivamente latino-americanos, as preferências são mínimas, muitas vezes
fixas, as exceções são muitas, e a abrangência desses acordos costumam limitar-se ao
comércio de bens.
Em consequência, o comércio global dos países asiáticos tende a se expandir
exponencialmente – inclusive roubando parcelas dos intercâmbios globais aos latino-
americanos – com ampla cobertura de setores e intensa integração de cadeias produtivas,
pela via dos próprios investidores diretos e de suas decisões microeconômicas. A
América Latina, em contrapartida, parece se contentar com modestos acordos
preferenciais e abertura muito limitada aos investimentos e aos fluxos de livre comércio,
que dependem sempre do dirigismo macroeconômico de seus governos. Na região, o
único país a libertar-se dessas características introvertidas é o Chile, que possui mais de
90% de seu comércio ao abrigo de acordos de livre comércio, tendo assegurado – por
meio da assinatura de dezenas desses acordos com os mais importantes países do mundo
– o acesso consolidado aos mercados de países que devem representar cerca de 80% do

21
PIB mundial; o Peru, o México e a Colômbia pretendem seguir os seus passos, mediantes
negociações trans-Pacíficas. Em contrapartida, Brasil e Argentina são os países da região
que menos comércio exibem ao abrigo de acordos preferenciais, com a possível exceção
dos EUA (mas neste caso em virtude de seu imenso mercado interno, o que diminui seu
coeficiente de abertura externa).
Estas evidências – absolutamente claras quanto a suas manifestações concretas,
sob a forma de crescimento do PIB e da renda per capita, numa e na outra região –
poderiam estimular Brasil e Argentina – ou uma Venezuela “pós-socialista” – a
empreenderem novas rodadas de liberalização comercial, tanto recíprocas, quanto no
“bloco” da América do Sul e externamente, como ocorreu ao início dos anos 1990,
quando da criação do Mercosul. É, no entanto, pouco provável que isto ocorra, tendo em
vista as políticas econômicas em curso nos dois países desde o início do milênio e suas
reações ao que vem sendo apontado como “concorrência predatória de produtos
estrangeiros”, em face do que as respostas tem sido mais protecionismo e tendências à
introversão. No final de 2011, se saudou a constituição da Comunidade dos Estados da
América Latina e do Caribe – Celac – cujos objetivos primordiais parecem ser mais os de
realizar reuniões retóricas nas quais se enaltece a capacidade da região de buscar sua
união sem “tutelas externas” e de praticar um pouco mais de introversão econômica, do
que de abrir-se às “multinacionais do Império” e intensificar os laços econômicos de
todos os tipos, em especial os de comércio e investimentos, como se faz na Ásia.
Ainda que os países do Mercosul pretendessem fechar-se aos desafios da
competição chinesa – que vem conquistando posições cada vez mais preocupantes em
toda a região – seria normal esperar que, valorizando como o fazem os “benefícios” do
Mercosul, eles decidissem reforçar os laços de abertura recíproca e de liberalização
comercial, ou seja: decidissem simplesmente atender aos requisitos mínimos do artigo 1o.
do TA, ainda carente de implementação em seus pontos essenciais. Independentemente
de algum novo cronograma que Brasil e Argentina decidissem fixar – a primeira fase de
transição era, obviamente, muito curta, de apenas quatro anos –, seria preciso um
engajamento credível com os objetivos por eles mesmos fixados no instrumento original.
Não parece provável, contudo, que isto ocorra no horizonte visível, tendo em vista as

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tendências crescentemente “separatistas” em vigor entre os dois mais importantes sócios
do bloco.
Em última instância, o que está em jogo, em cada um dos países, são os instintos
soberanistas de cada um dos parceiros, sentimentos bastante exacerbados nos dois
grandes sócios do empreendimento integracionista. O retraimento na defesa dos
mercados nacionais e a proteção dos produtores locais ainda são iniciativas mais fortes, e
de forte apelo político, do que as dolorosas decisões pela abertura e pelo
desmantelamento de barreiras, ainda que apenas e tão somente no bloco, exclusivamente.
Compreende-se que a ausência de reformas dificulte a abertura, o que por sua vez reforça
a tendência à inércia: reformar a estrutura fiscal, renunciar a tributos, eliminar controles
que servem aos instintos burocráticos das corporações estatais, modificar os direitos
sindicais que produzem reservas de mercado (e, de fato, desempregos setoriais), alterar a
paridade do câmbio ou deixá-lo flutuar sem controles, todas essas medidas são
extremamente difíceis de serem tomadas. A probabilidade de que Brasil e Argentina
consigam se entender sobre uma plataforma comum de reformas internas e sobre uma
agenda partilhada de retomada do processo de integração passou a depender, na presente
conjuntura, muito mais da Argentina do que do Brasil, enredado numa vasta crise
econômica e política cujo desenlace é totalmente imprevisível.
Na verdade, os dois países – e outros países na região – não deixam de fazer
ajustes, cada vez que circunstâncias inesperadas alteram as condições do jogo econômico
num ou noutro país. Mas essas medidas são adotadas de forma ad hoc, sem obedecer a
uma visão compartilhada de quais medidas são favoráveis, ou não, ao processo de
integração, o que afasta ainda mais a perspectiva de uma coordenação de políticas entre
os dois grandes parceiros do Mercosul. Uma simples listagem de todas as medidas de
política fiscal, tributária, cambial, comercial ou industrial adotadas em cada um dos
países permitiria que se chegasse à constatação que sua orientação se deu, não num
sentido integracionista, mas objetivamente com propósitos restritivos ou protecionistas:
de fato, o grau de proteção efetiva aumentou, não diminui, desde 1995, e não apenas para
terceiros países, mas internamente ao Mercosul igualmente.
Uma análise realista do “estado da arte” no Mercosul poderia, por exemplo,
chegar à conclusão de que o projetado mercado comum, ou sequer a união aduaneira

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proclamada são factíveis, de fato, cabendo, então, dar lugar a uma discussão sobre os
meios e os procedimentos aplicáveis a um processo ordenado de construção de uma
simples zona de livre comércio, formato que é, de longe, um dos mais comuns – junto
com os simples esquemas de preferências tarifárias – dos experimentos de integração
conhecidos no sistema multilateral de comércio. Seria um reconhecimento de que a
arquitetura concebida no momento da redemocratização dos países do Cone Sul foi
ambiciosa demais para as capacidades organizacionais dos parceiros nesse tipo de
empreendimento, cabendo, assim, reconhecer as virtudes mais modestas dos esforços de
cooperação focados em metas realistas de liberalização comercial de escopo mais
limitado ou de alcance não tão profundo.
Se o Mercosul quiser ser bem sucedido ele tem de voltar ao básico, e cumprir o
acordado no artigo 1o. do TA, ou então começar por assumir a responsabilidade de
efetuar uma reforma profunda de seus instrumentos constitutivos. A reprodução mimética
de um esquema do tipo europeu sempre foi uma quimera do ponto de vista prático, e não
existem soluções institucionais indolores que consigam fazer do Mercosul um edifício
integracionista para o qual lhe carecem fundações apropriadas.

Um bom começo de um processo de reformas seria um diagnóstico realista dos


impedimentos sistêmicos ou contingentes ao acabamento da união aduaneira, a partir do
qual se poderia prescrever uma arquitetura institucional com a qual as autoridades
políticas dos atuais parceiros poderia concordar em dar o seu apoio. Nenhuma solução
“cooperativa” em torno de um processo de integração elude, porém, a necessidade de
reformas internas em cada um dos países participantes. E um compromisso
inquebrantável com o respeito à legalidade democrática e aos bons princípios do Estado
de direito seria uma condição essencial para o sucesso de todo e qualquer esquema
integracionista que se empreenda na região.

Paulo Roberto de Almeida


Brasília, 2 de março de 2016

Resumo: Ensaio de caráter histórico e também analítico-prospectivo sobre os processos


de desenvolvimento econômico e de inserção econômica internacional dos países latino-
americanos do Cone Sul, com destaque para os ensaios de integração comercial, em
escala sub-regional, ou plurilateral. Evidencia-se o relativo isolamento da região dos

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mercados e dos intercâmbios mais dinâmicos da economia mundial contemporânea, ao
terem os países da América Latina privilegiado processos nacionais de desenvolvimento
econômico e social, com pouca abertura aos fluxos e cadeias produtivas e comerciais
englobando outras regiões, ainda que alguns países – a Aliança do Pacífico, por exemplo,
formada por México, Colômbia, Peru e Chile – tenham buscado inserir-se nos novos
exercícios de abertura econômica, de liberalização comercial e de integração produtiva,
que se deslocam paulatinamente do Atlântico norte para a bacia do Pacífico.
Palavras-chave: economia mundial; integração econômica; comércio internacional;
Cone Sul da América Latina.

Abstract: Historical and analytical essay on the economic development and the world
economic integration of the Southern Cone Latin-American countries, with emphasis on
the attempts at commercial integration, at sub-regional level, or in the plurilateral context.
There is a clear pattern of a relative insulation of those countries from the most dynamic
flows and markets of the world economy, as Latin American Southern Cone relayed
mostly on national developmental processes, with very few opening towards those flows
and value chains that encompasses other regions, albeit some countries – those of the
Pacific Alliance, that is Mexico, Colombia, Peru and Chile – have endorsed those new
exercises of economic opening and trade liberalization, moving preferentially from the
north Atlantic toward the Pacific basin.
Key words: world economy; economic integration; international trade; Latin American
Southern Cone.

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